Numa altura em que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) acusa o toque de várias décadas de desinvestimento, nomeadamente nos seus profissionais, que o País arde, fruto de uma floresta desordenada e sem guardas – cujo corpo foi extinto era António Costa ministro da Administração Interna, e a pobreza aumenta, em virtude de salários cada vez mais comidos pela inflação, o primeiro-ministro apresentou-se no debate do Estado da Nação de forma optimista e a evocar medidas em que tem apostado, e que ajudarão a desequilibrar mais o País.
Costa puxou dos galões ao evocar o chamado acordo da descentralização estabelecido com a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) que ameaça a viabilidade dos serviços públicos a nível nacional pela ausência das dotações necessárias ao financiamento das escolas e unidades de saúde. E que, apesar de algumas críticas dos sociais-democratas, foi consensualizado no Parlamento com o PSD, liderado então por Rui Rio, que esta tarde recebeu um elogio de António Costa.
Na área da saúde, onde esta quarta-feira os utentes apelaram a medidas capazes de travar a degradação que deixa milhares sem médico de família, entre outras carências, o líder do executivo escuda-se no estatuto do SNS, que ameaça a gestão pública, alegando que ele assegurará uma melhor organização e condições de motivação dos profissionais de saúde. As dificuldades que o SNS enfrenta, tal como a escola pública, foram também evidenciadas pelo secretário-geral do PCP, salientando que as opções do Governo provam a insuficiência do Orçamento do Estado para 2022, e daí o voto contra dos comunistas.
Voltando-se para a bancada do PS, onde a intervenção do seu líder alinhou pelo diapasão do primeiro-ministro, Jerónimo de Sousa, advertiu que a frase de Eurico Brilhante Dias tinha ficado a meio. «Devia ter dito que reduziu o desemprego, mas aumentou a precariedade», frisou.
A chamada de atenção levou António Costa a referir a «revalorização» do salário-base dos técnicos superiores em função da sua qualificação, alegando que a valorização salarial é para prosseguir, mas «sem dar um passo maior do que a perna».
O executivo foi acusado pelo líder comunista de seguir o mesmo caminho do PSD e do CDS-PP, apesar de se ter comprometido a combatê-lo, salientando a necessidade de se apostar na produção nacional e na soberania alimentar, e de avançar para a «aquisição pública de factores de produção, venda a preços controlados e escoamento dos produtos a preços justos».
A parte inicial do discurso do primeiro-ministro foi dedicada a justificar o estado da economia portuguesa e o brutal aumento da inflação com as consequências da conjuntura internacional, salientando a pandemia da covid-19 e agora a guerra na Ucrânia. Apesar disso (ou também por isso), os lucros dos grandes grupos económicos não têm parado de crescer, graças à crescente apropriação da riqueza e dos recursos nacionais.
Pobreza e acumulação de lucros
Jerónimo de Sousa disse tratar-se de um contraste; a concentração da riqueza dos grandes grupos e o aumento do custo de vida com que os trabalhadores e os pensionistas estão confrontados. Um contraste que o Governo tem alimentado graças às suas opções políticas, a começar pela recusa em controlar e fixar os preços, e valorizar salários e pensões de forma a impedir o aumento da pobreza. Opções que têm determinado muitas acções de luta, a nível nacional, de que é exemplo a manifestação promovida pela CGTP-IN, no passado dia 7, em Lisboa.
«Ao recusar estas medidas que se impõem, o Governo não só alinha com os objectivos dos grupos económicos, como impõe aos trabalhadores e ao povo que, com a sua perda de poder de compra, baixos salários e pensões e degradação das suas condições de vida, paguem e garantam os lucros desses mesmos grupos», denunciou Jerónimo de Sousa.
António Costa alega que a resposta à situação que o País vive tem passado pela tentativa de contenção do aumento do preço da energia «na medida do possível», salientando o apoio à produção das grandes empresas (mais expostas ao consumo de energia) e paliativos como a atribuição de auxílios às famílias mais carenciadas, que o primeiro-ministro volta a anunciar para Setembro.
António Costa divulgou também no Parlamento que hoje foi concluído o acordo com a União das Misericórdias e a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade com vista a assegurar o «cumprimento da gratuitidade das creches para crianças que entram já em Setembro no 1.º ano», conforme diploma aprovado em Outubro.
PSD foi à lã e saiu tosquiado
Na sua estreia como líder parlamentar do PSD, Joaquim Miranda Sarmento falou de empobrecimento e foi contestado por Eurico Brilhante Dias, líder da bancada parlamentar do PS, primeiro, e por António Costa, depois.
Depois de afirmar que há «um PSD que existe na bolha mediática» e «um PSD que existe no terreno», a propósito dos vários entendimentos sobre a descentralização, Costa recuperou um manual de Miranda Sarmento e uma síntese das políticas defendidas pelo líder da bancada social-democrata, como o fim das licenças dos funcionários públicos a trabalhar em sindicatos, o congelamento de salários e das prestações sociais, a redução do investimento das autarquias e regiões para as verbas de 2016 e o aumento do IVA da restauração para 23%.
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