As propostas que Manuel Pizarro, ministro da Saúde, apresentou ao fim de 14 meses de infrutíferas negociações não foram apenas rejeitadas pelas estruturas sindicais dos médicos. A enorme adesão à greve nacional de dois dias (5 e 6 de Julho), convocada pela Federação Nacional dos Médicos (FNAM), comprovam a rejeição total do pacote de medidas do Governo PS.
Ao final do dia de ontem, «a adesão geral em todos os serviços de saúde que não estão abrangidos pelos serviços mínimos – que cumprimos escrupulosamente – rondava os 90%, com 95% nos blocos operatórios», informa a FNAM: nos «Cuidados de Saúde Primários – quer nas Unidades de Cuidados de Saúde Personalizados, que nas Unidades de Saúde Familiar – a adesão também foi de 100%».
A federação sindical destaca ainda a adesão total dos médicos internos. «Estes números reforçam a nossa convicção sobre a justiça de integrar os médicos internos no primeiro escalão da carreira médica». No caso dos médicos hospitalares, a greve rondou os 90%.
Ao final da tarde de dia 6 de Julho, os dados de adesão à greve são esclarecedores: 95% de todos os médicos do SNS em Portugal participaram em pelo menos um dos dias de greve.
São dezenas de milhares de profissionais «insatisfeitos», «abandonados», «esquecidos», mas muito mobilizados na luta pela valorização das suas carreiras e na melhoria das condições do Serviço Nacional de Saúde (SNS). As intenções de Manuel Pizarro parecem, por isso, ter caído por terra: os médicos não caíram na armadilha montada pelo Governo PS.
FNAM identifica 10 pontos irreconciliáveis em relação à proposta do Ministério da Saúde
O que Manuel Pizarro propõe não é aquilo de que os médicos precisam. Muito pelo contrário. De acordo com a FNAM, o pacote de medidas apresentado à pressa (no último dia de negociações) para tentar boicotar a greve dos médicos, traz, encapotado, um agravar das condições de trabalho para os médicos do SNS.
O Ministério da Saúde, explica a federação, quer aumentar o limite das horas extraordinárias trabalhadas para as 350 horas por ano, «valores medievais, completamente contrários às boas práticas dos países de referência»: é um aumento de 200 horas extraordinárias em relação ao que acontece nos dias de hoje.
Neste novo regime de trabalho, o ministro quer que os médicos hospitalares que não façam serviço de urgência, «em virtude da sua especialidade ou idade», sejam obrigados a trabalhar um sábado por mês, uma medida que os médicos consideram «discricionária e inaceitável».
A dedicação exclusiva que o Governo PS propõe é, também, alvo de grandes críticas: «a FNAM não abre mão de uma dedicação que seja exclusiva mas opcional e devidamente majorada». Não é o caso. Os aumentos salariais ficam-se por valores entre os 18 e os 145 euros (para a maioria, o aumento fica-se pelos 30/40 euros).
Médicas obstetras do Hospital CUF Descobertas denunciam falta de médicos no sector privado
Por decisão do Ministério da Saúde, opção da maioria do Partido Socialista, as grávidas «de baixo risco» (partos menos complicados e também menos onerosos) estão a ser enviadas do Hospital Santa Maria para hospitais privados, decisão que, defende a FNAM, resulta de «um conjunto de más decisões por parte do Conselho de Administração».
O facto de as escalas estarem reduzidas a três obstetras, quando deveriam ser cinco, motivou a decisão de redireccionar pacientes para hospitais privados (encerrando o serviço no Santa Maria em Agosto). Num grupo de whatsapp privado, duas obstetras da CUF Descobertas, denunciam as mesmas carências na instituição privada de saúde.
Uma portaria de 2014 determina que as unidades que «recebam grávidas com mais de 32 semanas de gestação» tenham, obrigatoriamente, a presença física, por turno, de três obstetras.
As declarações de António Costa espelham os verdadeiros objectivos do Governo PS para o SNS. À afirmação grosseira de que não é do «Sindicato dos Médicos», é, sim, «do Sindicato dos portugueses», os médicos responderam com uma adesão massiva à greve da FNAM, demonstrando que, contra os ataques do Governo PS, existe «uma maioria que luta pelo SNS» e que dele não abdica.
Estas afirmação não mostram apenas desprezo pelos médicos e a sua exaustão: mostra «desprezo também pelos 1,7 milhões de cidadãos sem médico de família, as pessoas que esperam meses ou anos por consultas ou cirurgias, as grávidas que são desviadas como peças de um jogo de tabuleiro».
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