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|clima

Vai uma COP28 à saúde da semântica imaginativa

É interessante ver como uma salada de palavras conseguiu produzir um milagre: transformar o escuro impasse numa dinâmica global considerada luminosamente verde.

CréditosMartin Divisek / EPA

A COP28 deu por concluídas as negociações através de uma aceleração vertiginosa nas últimas horas, com os olhos postos no anúncio de um acordo final feliz.

O discurso de encerramento feito pelo presidente da COP28, o Sheikh Mohamed bin Zayed Al Nahyan, mostrou-se cautelosamente inspirado: «Amigos... deixem-me dar uma palavra de cautela. Um acordo só é tão bom quanto o for a sua implementação. Nós somos o que fazemos, não o que dizemos!» Antes disso tinha referido: «Trata-se de um plano que é liderado pela ciência. É um plano equilibrado, que combate as emissões, colmata as lacunas em matéria de adaptação, e reinventa o financiamento global».

Notar que na véspera, perto do final da noite o estado das negociações estava num ponto muito recuado, como se verá na Tabela 1.

 Estado da discussão no curto prazoEstado da discussão no longo prazoNOTAS
Fundo para perdas e danosAcordoAcordoAcordo Anunciado logo na Abertura. Longe das necessidades quantificadas
Rede Santiago para LDPerto de AcordoTexto Final 
WIM para Perdas e DanosNão AcordoTexto Final 
Balanço globalNão AcordoTexto InformalG77 contra; Arábia Saudjta e outros fortemente contra
Objetivo global e adaptaçãoAdiadoEsboço de TextoFundamental. OCDE e EU contrários
Relatório do Comité para a AdaptaçãoNão AcordoRegra 16Fundamental. OCDE e EU contrários
Fundo para a AdaptaçãoNão AcordoEsboço de TextoFundamental. OCDE e EU contrários
Programa de trabalho para a Transição JustaNão AcordoEsboço de TextoFundamental. OCDE e EU contrários
Programa de trabalho para a MitigaçãoPerto de AcordoEsboço de TextoFundamental. OCDE e EU contrários
Medidas propostasSem TextoTexto limpo 
Objetivos Financeiros pós-2025Não AcordoSem Texto 
Comité permanente para FinançasSem TextoEsboço de Texto 
Plano financeiro longo-prazoNão AcordoSem Texto 
Comércio bilateral. Artigo 6.2Não AcordoEsboço de Texto 
Mercados de Carbono. Artigo 6.4Não AcordoEsboço de TextoG77 contra
Abordagens não baseadas no mercado. Artigo 6.8Não AcordoEsboço de Texto 
Clima e GéneroAdiadoEsboço de Texto 
Planos Nacionais para a AdaptaçãoAdiadoAdiado 
Acção para a capacitação climáticaNão AcordoRegra 16 
Segurança agrícola e alimentarPerto de AcordoEsboço de TextoFundamental. OCDE e EU contrários
Apoio ao reforço das capacidadesPerto de AcordoTexto limpo 
Fundo Verde para o ClimaNão AcordoTexto limpo 
lnfraestruturas Globais para o AmbienteNão AcordoEsboço de TextoFundamental. OCDE e EU contrários
Relatório FinanceiroSem Texto 

A linguagem de compromisso que os negociadores encontraram para substituir a anterior fórmula «eliminar gradualmente» a utilização de carvão, petróleo e gás natural nas próximas décadas, foi a de «transição para longe de» (transition away from) que teve a preferência dos defensores da transição energética ecoliberal. 

O mais notório passa pela linguagem que foi possível consensualizar no âmbito das cerca de 200 nações participantes: «transition away from» os combustíveis fósseis. Será necessário reflectir sobre esta expressão: significa, de facto, «abandonar» como poderia inferir-se da tradução que foi posta a circular, muito marcada pelas nuances semânticas? Ou será apenas «transição para longe de», sem se saber bem como nem quando, não obstante continuar a referir-se o horizonte 2050 e a anunciar vários milhares de milhão?

Os defensores da perspectiva optimista afirmam que a COP28 é «histórica», porque acham que significa a decisão de «abandonar» os combustíveis fósseis. De facto, é a primeira vez nas conferências COP que se menciona abertamente num acordo final a «transição para longe de» na utilização de combustíveis fósseis.

Na interpretação oficial portuguesa, alinhada com a da União Europeia, a expressão «transição para longe de», vale tanto, segundo ministro do ambiente e da acção climática, como a linguagem do phasing out, ou seja, vamos sair rapidamente da era dos combustíveis fósseis.

Mas, vistas as coisas de uma forma mais objectiva e racional, esta linguagem «histórica», não será apenas a reafirmação de compromissos que muitos dos governos signatários já assumiram há anos e não foi ainda possível cumprir?

É interessante ver como uma salada de palavras conseguiu produzir um milagre: transformar o escuro impasse numa dinâmica global considerada luminosamente verde.

Cada país, cada bloco e cada corporação energética e financeira irá actuar de acordo com as interpretações mais convenientes do que significa a expressão «transição para longe de», estando desde logo garantido que a busca do lucro, das rendas e das distribuições de dividendos optimizadas continuarão no topo dos seus desígnios.

Em Portugal, o Presidente da República congratulou-se e disse, assertivo: «O acordo realça também a importância da aprovação, pelas partes, dos objetivos, propostos pela União Europeia, de triplicar as energias renováveis e duplicar a eficiência energética até 2030».

Fixemos o objectivo de triplicar até 2030 as energias renováveis e, no mesmo período, duplicar a eficiência energética.

Considerando que o acordo final atingido na COP28 não é uma farsa, há que questionar como se poderá, na realidade, abandonar todas as fontes de energia fóssil (cerca de 87% da energia total do mundo) até 2050, e desde já triplicar a produção de eletricidade à base de energias renováveis até 2030 (daqui a sete anos), quando no presente elas representam apenas 12,7% da energia final consumida no mundo?

Veja-se, na figura anexa, o que se passa actualmente no mundo (2022) em termos de consumos finais de energia primária, de acordo com o Energy Institute Statistical Review of World Energy (https://ourworldindata.org):
 

Na tabela abaixo inserida poderá verificar-se que o consumo global de energia primária é, em todo o mundo, cerca de 160 765 TWh, representando as FER cerca de 20 849 TWh.

 BiofueisOutras renováveisFotovoltaicaEólicaHidroelétricaNuclearGás NaturalPetróleo e destiladosCarvãoBiomassa tradicional
% em 20220,750,480,821,312,701,6724,5232,9527,906,91
em TWh1 199,21776,861 322,622 104,844 334,192 679,0139 413,0452 969,5944 854,0411 111,00

A partir de 12,87% de energia renovável pretende-se, nos termos das conclusões da COP 28, chegar aos 100% daqui a cerca de vinte e cinco anos. Em 2030 o objectivo seria o de passar a comparticipação das renováveis de 20 849 TWh para cerca de 62 544 TWh!

Serão tais objectivos razoavelmente credíveis? No futuro, talvez já a breve prazo, haverá respostas colocadas ao nível da realidade.

Para já o que obteve, segundo as Nações Unidas, é o seguinte:

- O fundo de perdas e danos destinado a apoiar os países em desenvolvimento vulneráveis ao clima ganhou vida logo no primeiro dia da COP. Até à data, alguns países comprometeram-se a contribuir com 792 milhões USD para este fundo;

- Compromissos no valor de 3 500 milhões de dólares para reconstituir os recursos do Fundo Verde para o Clima;

- Novos anúncios totalizando 150 milhões USD para o Fundo dos Países Menos Desenvolvidos (LDC) e o Fundo Especial para as Alterações Climáticas (SCCF); 

- Um aumento de 9000 milhões de dólares anuais por parte do Banco Mundial para financiar projectos relacionados com o clima em 2024 e 2025 (financiamento de projectos que, a serem feitos da forma habitual, significarão libertar dinheiro para empresas ocidentais fornecerem equipamentos e infraestruturas ao Sul Global);

- Quase 120 países apoiaram a Declaração sobre Clima e Saúde da COP28 para acelerar as acções destinadas a proteger a saúde das pessoas dos crescentes impactos climáticos;

- Mais de 130 países subscreveram a Declaração sobre Agricultura, Alimentação e Clima da COP28 para apoiar a segurança alimentar e, ao mesmo tempo, combater as alterações climáticas; e

- O Compromisso Global de Arrefecimento foi aprovado por 66 países para reduzir as emissões relacionadas com o arrefecimento em 68% a partir de hoje.

- Mais de 100 países comprometeram-se a triplicar as energias renováveis (UE em destaque).

- Os principais intervenientes no sector do petróleo e do gás comprometeram-se a descarbonizar as suas emissões diretas (por exemplo fugas de metano, o que constitui uma medida central para a otimização dos seus próprios lucros).  

- Para o Fundo de Adaptação obtiveram-se apenas 134 milhões de dólares.

Para se avaliar com maior credibilidade estes «espantosos» números, há que notar que o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) de Portugal tem um valor de 16 600 milhões de euros: 13 900 milhões de euros em subvenções e 2 700 milhões de euros em empréstimos.

Será necessário recordar que os benefícios da ação multilateral no domínio do clima têm vindo a ser distribuídos de forma muito desigual no espaço e no tempo.

Aliás, notar que, paradoxalmente, as alterações climáticas poderão libertar muito solo para a agricultura, além de que abrirão rotas marítimas para a navegação global. Ou seja, alguns países ou regiões podem beneficiar da alteração dos padrões climáticos. É certo que noutras regiões do mundo haverá continuidade na desertificação, alteração que se verifica desde há muitas décadas e que pode ter remédios ao nível da adaptação, tal como, nas regiões costeiras, se verificará a continuação das inundações, agravadas por uma ocupação urbanística oportunista e desenfreada, completamente fora dos cânones do planeamento territorial sustentável. Assim, os efeitos desastrosos, não são apenas devidos aos vectores atmosféricos, mas sim, derivados das atividades humanas especulativas, desde as urbanístico-imobiliárias, passando pelas operações criminosas de desflorestação até à exploração intensiva dos recursos marítimos.

Regressando às palavras ditas pelo presidente da COP 28 em que evocou a ciência, dizer que, também neste domínio, há muito rigor que falta e bastante esclarecimento por fazer.

«Os efeitos desastrosos, não são apenas devidos aos vectores atmosféricos, mas sim, derivados das atividades humanas especulativas, desde as urbanístico-imobiliárias, passando pelas operações criminosas de desflorestação até à exploração intensiva dos recursos marítimos.»

Citar apenas, a terminar, artigos recentes publicados sob a chancela da The Royal Society britânica entre eles, um com título Revisiting Causality Using Stochastics: 2. Applications, de autoria de um conjunto de cientistas, inclusive do Imperial College London, que concluíram que «foi o aumento da temperatura que causou o aumento da concentração de CO2. Embora esta conclusão possa parecer contraintuitiva, porque contradiz a perceção comum (e por esta razão avaliámos o caso com uma metodologia paramétrica alternativa no material suplementar eletrónico, secção S2.4, com resultados que confirmam os aqui apresentados), na realidade é razoável. Deixando que os registos geofísicos falem por si, com a ajuda da nossa metodologia original, descobrimos uma regularidade que aparentemente contradiz a opinião comum. As nossas descobertas inovadoras devem ser objeto de uma atenção considerável, bem como de um exame cuidadoso e crítico sob a forma de discussão pública pela comunidade científica, o que, sem dúvida, melhorará a compreensão.

Se a metodologia que propusemos no documento de acompanhamento resistir ao escrutínio, então os nossos resultados novos e de grande impacto, ou seja, os dos casos #23 - #28 do presente documento, terão de ser levados a sério e interpretados. É urgentemente necessária mais investigação sobre as regularidades do comportamento causal do sistema climático aqui relatado, que é de considerável importância e relevância».

É necessária muita mais humildade e militância na procura da verdade objetiva, o que passa por férrea vontade de investigar a fundo todas as correlações técnico-científicas, antes de, apressada e interesseiramente, se prescreverem receitas imperiosas que, supostamente, se destinariam a salvar o Planeta e a Humanidade.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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