A Comissão Executiva do Conselho Nacional da CGTP-IN, encabeçada pelo seu secretário-geral, Tiago Oliveira, vai entregar o pré-aviso de greve geral na próxima segunda-feira, às 13h, no Ministério do Trabalho, em Lisboa. Em causa está o pacote laboral apresentado pelo Governo e saudado pelas confederações patronais, que a Intersindical define como um «dos maiores ataques já feito aos trabalhadores», e que significaria um retrocesso civilizacional.
«Querem individualizar cada vez mais as relações de trabalho, atacar a capacidade de luta e organização dos trabalhadores, desregular os horários de trabalho, promover a precariedade e facilitar ainda mais a exploração», criticou Tiago Oliveira, no final da acção de luta que juntou mais de 100 mil trabalhadores em Lisboa, no último sábado, em que foi anunciada a greve pela CGTP-IN.
Em reacção ao anúncio, o primeiro-ministro adjectivou a greve geral de «anacrónica» e «extemporânea», admitindo inclusive que «não fica bem ao movimento sindical». Numa entrevista ao Público, esta quinta-feira, Tiago Oliveira salientou a urgência do processo de luta. «Não vamos estar à espera que nos roubem os direitos para depois virmos para a rua lutar», disse.
As alterações previstas na proposta designada «Trabalho XXI», que o Governo apresentou em Julho, vão desde a redução dos direitos na maternidade e paternidade, a uma maior desregulação dos horários, facilitação dos despedimentos, maior promoção da precariedade ou ataques ao direito à greve, à liberdade sindical e à contratação colectiva.
Vejamos algumas das mais flagrantes.
Aumento da duração dos contratos a termo
O Governo alarga a lista de motivos a justificar a celebração de contratos a termo certo, que dificultam a estabilidade e realização de planos a longo prazo, e aumenta a sua duração de dois para três anos. Nos contratos a termo incerto, a proposta é que passe dos actuais quatro para cinco anos.
Fim das restrições no acesso ao outsourcing após despedimentos
Ao propor a revogação da proibição de recorrer à terceirização de serviços (outsourcing) por 12 meses após um despedimento colectivo ou extinção de posto de trabalho, as empresas ficam com mãos livres para substituir funcionários por serviços mais baratos, aprofundando a precarização.
Banco de horas
Uma das medidas a promover a desregulação do horário de trabalho e, consequentemente, da conciliação com a vida pessoal e familiar, é a reposição integral do banco de horas individual e do banco de horas grupal original. Na proposta apresentada pelo Governo, o banco de horas individual pode ser aplicado «por acordo» entre as partes ou «adesão a regulamento interno», permitindo que o período normal de trabalho possa ser aumentado até duas horas diárias e 50 semanais, num máximo de 150 horas de trabalho por ano, cujo valor fica no bolso das entidades patronais.
Mais fácil despedir
A simplificação dos processos de despedimento por justa causa é das propostas mais ilustrativas da opção de classe do Governo do PSD e do CDS-PP. Na prática, o executivo propõe-se desproteger os trabalhadores ao revogar o artigo que pede a audição de testemunhas e apresentação das provas durante um processo disciplinar. Perante isto, os trabalhadores ficam sem possibilidade de contrariar os factos de que são acusados e de fazer prova de novos factos em sua defesa – medida sobre a qual o Tribunal Constitucional já se tinha pronunciado em 2009, considerando-a inconstitucional.
Em matéria de despedimentos, o anteprojecto do Governo vai ainda mais longe, dificultando a reintegração dos trabalhadores que foram despedidos de forma ilícita ao obrigá-los a prestar caução à ordem do tribunal, mas só no caso de optarem pela reintegração na empresa. Situações em que apenas sejam reivindicados os créditos devidos não carecem da dita caução.
Direitos das crianças
O impacto das medidas apresentadas pela ministra Maria do Rosário Palma Ramalho alastra-se aos mais novos. Actualmente, os trabalhadores pais de filhos menores de 12 anos ou com deficiência/doença crónica (independentemente da idade) têm a possibilidade de recusar o trabalho à noite ou aos fins-de-semana e feriados. No entender do Governo (e dos patrões), o horário flexível ou trabalho a tempo parcial para trabalhadores com responsabilidades familiares deve ajustar-se ao funcionamento da empresa, incluindo o trabalho nocturno, aos fins-de-semana e feriados.
Entre as medidas a gerar polémica está também a redução do período de amamentação até aos dois anos da criança com atestado médico, que o Governo exige ser renovado de seis em seis meses, e também a eliminação da falta por luto gestacional.
Prolongamento de «férias» não remunerado
Depois de o executivo de Passos e Portas (PSD/CDS-PP) ter cortado o direito a 25 dias de férias, medida que os sucessivos governos recusaram repor, a ministra do Trabalho anunciou a possibilidade de «comprar» dois dias de férias, violando a natureza do direito. Apesar de o Governo os designar de «férias», são dois dias não remunerados, ou seja, faltas justificadas que o trabalhador poderá usar antes ou após o período de férias, e que terão de ser acordadas com a entidade patronal.
Subsídios em duodécimos
Iludindo a necessidade que os trabalhadores têm de levar mais dinheiro para casa ao fim do mês, num país em que mais de um milhão de pessoas ganha o salário mínimo, o Governo serve-se de uma proposta da Iniciativa Liberal, aplicada no famigerado período da troika, para propor o pagamento dos subsídios de férias e de Natal em duodécimos.
Entretanto, no parecer da CIP à alteração da legislação laboral, divulgado esta semana, ficámos a saber que a confederação patronal propõe a possibilidade de redução de salário em «negociação» directa com o trabalhador e outras medidas gravosas, como o regresso do regime de lay-off simplificado e a não remuneração de faltas justificadas.
Limitação do direito à greve e à liberdade sindical
O aumento das actividades consideradas como «necessidade social impreterível» foi a forma que o Governo de Montenegro encontrou de cercear o direito à greve. A prestação de serviços mínimos, que está prevista na lei, passa a ser sempre devida em serviços como creches e lares de idosos.
Previstos estão também constrangimentos à actuação sindical, com o Governo a limitar a actividade em empresas sem trabalhadores sindicalizados.
Ataque à contratação colectiva
De acordo com a alteração proposta pelo Governo, a decisão sobre que convenção aplicar fica na mão do empregador, nos casos em que esta se aplique a mais de metade dos trabalhadores, subvertendo o direito da contratação colectiva (processo através do qual as empresas e os representantes dos trabalhadores negoceiam condições específicas de trabalho numa determinada empresa) e retirando poder negocial aos sindicatos. A oposição à escolha patronal só pode ser realizada por escrito.
Outra das alterações propostas passa pela fragilização da contratação colectiva, nomeadamente ao nível da caducidade. Segundo a proposta do Governo do PSD e do CDS-PP, a convenção colectiva pode caducar ao fim de quatro anos de vigência. Após essa data, os direitos consagrados perdem validade e será preciso negociar novo contrato colectivo com a entidade empregadora, com prejuízo para a qualidade de vida dos trabalhadores.
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