A IL é cada vez mais o CH queque. Explico: usa os mesmos truques, assenta toda a sua estratégia na mentira, age com a agressividade de quem tem a comunicação social a apoiar a causa, e os seus argumentos têm a profundidade da conversa de tasca, mas realizada num Brunch.
Para o dia da greve geral, a IL montou uma provocação e leva à Assembleia da República um agendamento potestativo claramente abusivo, onde sob o mote «Um país, dois sistemas» apresenta propostas para liquidar desde o Sector Empresarial do Estado (SEE) até ao regime laboral em funções públicas. Num debate onde os partidos do sistema terão todo o tempo para vender as suas aldrabices (IL, PSD, PS e CH terão todos mais de 20 minutos para intervir) e o PCP terá 50 segundos para intervir sobre cada uma das 7 iniciativas parlamentares que a IL quer fazer aprovar. Um debate profundo e profundamente democrático.
Olhando para as propostas que não serão debatidas no dia 11, vemos como ilustram isto mesmo. Começamos hoje pela primeira das sete propostas agendadas pela IL: o Projecto de Lei 306/XVII sobre o SEE.
O mesmo tratamento?
A proposta da IL sobre o Sector Empresarial do Estado parte de um pressuposto completamente falso, e citamos: «O objetivo de impor ao Setor Empresarial do Estado (SEE) um nível de transparência, responsabilidade e escrutínio idêntico ao que é exigido às empresas privadas.» Ora isto é uma falsificação completa, verdadeira conversa de tasca. Só alguns exemplos: (1) As empresas públicas têm de publicar os seus Relatórios e Contas, as privadas não. (2) As empresas públicas precisam de apresentar um Plano de Actividades e um Orçamento, depois destes aprovados pela tutela precisam de autorização da tutela e muitas vezes do próprio Tribunal de Contas para concretizarem as medidas neles incluídas. As privadas não. (3) As compras das empresas Públicas têm que ser, para determinados valores, feitas por Concurso Público, com custos de contexto brutais, as empresas privadas só têm de pedir factura. As empresas públicas são muito mais escrutinadas que as privadas, e a IL sabe-o bem. O que a IL quer e propõe é um regime ainda mais burocrático, moroso e complicado para travar ainda mais o funcionamento das empresas públicas e facilitar a sua privatização.
Prejuízos? O SEE dá lucro!
Depois a IL tenta montar-se nas falsificações realizados há 15 dias pelo Conselho de Finanças Públicas, e afirma: O «SEE continua a representar um peso significativo para os contribuintes, acumulando prejuízos recorrentes, ineficiências operacionais e uma cultura de opacidade que dificulta o escrutínio democrático.» Mas como o AbrilAbril já demonstrou, a verdade é que o Sector Empresarial do Estado (sem contar as dezenas de novas e artificiais empresas públicas criadas com os Hospitais e Centros de Saúde) deu 2,2 mil milhões de euros de lucros em 20241, mais precisamente DOIS MIL CENTO E OITENTA E OITO MILHÕES DE EUROS DE LUCRO que isto dos algarismos significativos é de evitar quando se trata de milhões. De facto «um peso significativo para os contribuintes». Só que positivo.
Continuando a cavalgar o último relatório do CFP sobre o SEE, a IL indigna-se com o esforço financeiro do Estado para com o SEE: «Mais de 4,2 mil milhões». Só desvaloriza algumas realidades: o mesmo relatório do CFP refere que as empresas do SEE realizaram 4,1 mil milhões de euros de investimento público – na ferrovia, nos metropolitanos, nos barcos, na TAP. Se não fossem as empresas públicas e as autarquias não havia quase investimento público em Portugal. Quem paga as obras na ferrovia? O SEE. Quem paga as obras no Metro, os barcos da Transtejo, os comboios da CP, os aviões da TAP? O SEE. Quem paga as PPP nas auto-estradas que são exploradas por privados? O SEE. Quem paga a manutenção de toda a rede viária? O SEE. Quem paga a construção e manutenção de hospitais e centros de saúde? O SEE. E os equipamentos para os hospitais? O SEE. Acham muito 4,2 mil milhões? Mas se todos estes investimentos foram anunciados pelo Governo e aprovados pelo Governo, como é que deveriam ser pagos se não pelo Orçamento de Estado? Nós percebemos o problema da IL – esse dinheiro devia ser oferecido a empresas privadas...
Falta de Transparência... das públicas?
O facto de nem todas as empresas terem publicados todos os muitos instrumentos de reporte é onde a crítica da IL cai em seguida. Mas também aqui o problema está completamente empolado. Ao contrário do que a IL quer dar a entender, as principais empresas do SEE têm as suas contas feitas e publicadas.
Das 146 empresas do SEE, de acordo com o CFP, 136 têm o seu Relatório e Contas de 2024 elaborado e apresentado. São 93% que cumprem. O que se deveria destacar é que apenas 51% têm o seu Relatório e Contas aprovado – e aí importaria perceber as causas, se são as contas que têm algo de errado, ou são as entidades fiscalizadoras que têm falta de meios para realizar essa análise de forma expedita, ou se existe desleixo por parte da tutela (o governo).
«Se não fossem as empresas públicas e as autarquias não havia quase investimento público em Portugal. Quem paga as obras na ferrovia? O SEE. Quem paga as obras no Metro, os barcos da Transtejo, os comboios da CP, os aviões da TAP? O SEE. Quem paga as PPP nas auto-estradas que são exploradas por privados? O SEE. Quem paga a manutenção de toda a rede viária? O SEE. Quem paga a construção e manutenção de hospitais e centros de saúde? O SEE.»
Como 93% de cumprimento é um número que se torna complicado de criticar, a IL opta por destacar um outro número: o do Relatório do Governo Societário elaborado pelas empresas do SEE. Aproveitam-se que para a malta que os ouve ao Brunch, um Relatório e Contas e um Relatório do Governo Societário (RGS) são a mesma coisa. Ora, de acordo com o CFP, 44% das empresas do SEE não apresentaram o RGS de 2024. Também aqui a situação está, em primeiro lugar, exagerada. De facto, o CFP diz que no sector das «Actividades de saúde humana e apoio social» apenas nove das 44 empresas do SEE teriam apresentado o RGS de 2024, e é por este dado que o SEE todo «só» tem 56% de cumprimento. Mas o autor destas linhas em meia hora retirou da Internet 14 RGS de 2024 destas novas empresas da saúde2... e 11 de 2023 de outras empresas do SEE da Saúde. Talvez afinal o problema não seja das Empresas não prestarem contas, talvez seja preciso explicar porque o CFP não encontra o que está disponível na Internet e a IL tenta martelar conclusões com tão pouco.
Também aqui o problema é outro: Não só os números do CFP e da IL estão exagerados, como é costume acontecer nos Brunch's depois do primeiro copo, como estão completamente ao lado das verdadeiras questões:
– Uma Empresa Pública tem que ter disponível no seu site o Relatório e Contas, o Orçamento, o Plano de Actividades e o Relatório do Governo Societário. E normalmente tem. E as empresas privadas? Obrigatório, nada disto. E normalmente não têm. Mas o essencial das receitas das empresas privadas da saúde vêm do Estado. E aqui já não há necessidade de transparência, de controlo? Já não se trata «do dinheiro de todos nós»?
– São mais as empresas com as contas apresentadas e não aprovadas do que as que não apresentaram contas. E não é que tenham sido rejeitadas, só não foram analisadas. 49% das empresas não têm as suas contas aprovadas, apesar de apresentadas. O mesmo se passa para todos os instrumentos de gestão. Por culpa de quem? Das empresas ou das diferentes tutelas? Há indiferença e irresponsabilidade por parte dos governos. Há falta de meios das entidades públicas de auditoria. E como se propõe a IL resolver o problema? Extinguindo as empresas públicas! O governo não aprova nem desaprova o Orçamento da Empresa A? Extingue-se a empresa A, já está. O Governo não financia devidamente a empresa B? Extingue-se a empresa B pois dá prejuízo. Isto é tudo tão estúpido e simplista, que a IL foge à crítica mais fácil e acrescenta um ponto no seu projecto de lei onde exclui o Sector da Saúde deste medida purificadora… pois de outra forma estaria a fazer um projecto de lei para encerrar quase todos os hospitais e centros de saúde do país (porque o Orçamento do Estado que a IL acaba de aprovar subfinancia esses hospitais e centros de saúde e torna impossível estes apresentarem contas equilibradas)!
E esta última questão é mesmo a questão central. É o Orçamento do Estado que determina as verbas que vão ou não vão para as empresas públicas. E o mesmo Estado que sobrefinancia as empresas privadas (veja-se o caso das PPP), subfinancia as empresas públicas.
No dia 11 de Dezembro, a IL defenderá o seu projecto de lei recorrendo à mentira e a soundbites falsos e demagógicos. Em 50 segundos, que ainda serão silenciados, é preciso demonstrar o atrás exposto. Vai ser difícil...
- 1. E mesmo suportando os prejuízos de 1,7 mil milhões das «empresas» do SNS, o lucro ainda seria de 489 milhões em 2024!
- 2. ULS de: Santo António, Póvoa do Varzim/Vila do Conde, Coimbra, Lezíria, Amadora-Sintra, Região Leiria, Lisboa Ocidental, Braga, Algarve, São José, Médio Ave, São João, Alto Tâmega. E Serviços Partilhados do Ministério da Saúde.
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