Com a campanha para as presidenciais a ocupar a principal faixa do espaço mediático, longe das propostas de cada um dos candidatos, mas embrulhada na espuma de alianças pouco naturais e tiradas para o efeito, Portugal acorda com uma nova lei da nacionalidade, indicações de cortes nos serviços de saúde e uma ameaçadora nova lei do trabalho condimentadas por um discurso cada vez mais serôdio e conservador no Primeiro-Ministro. Cada vez mais Luís Montenegro se vem investindo numa figura de compromisso entre a tenacidade conservadora dos governos de Cavaco Silva e uma agressividade nacionalista que o governo de Pedro Passos Coelho apresentara de forma invertida.
Não engana um discurso que adota a recorrente ameaça do caos para tornar aparentemente necessária uma ordem que é apresentada como pedida pela população. A tática trumpiana de recorrer a episódios mediáticos para transformar as sensações de pessoas que vivem presas nos seus dispositivos digitais ganha corpo num Governo que ainda não tem o apoio das ramificações mais extremistas da Direita, elaborando com ela uma espécie de jogo do rato e do gato que pretende fazer deslizar para o seu meio a aparência do debate entre governo e oposição. É curioso que seja com o mesmo discurso, as mesmas opções de fundo, os mesmos investidores e os mesmos beneficiários de classe que se engendre, neste mundo de aparências, a ilusão do debate.
«Cada vez mais Luís Montenegro se vem investindo numa figura de compromisso entre a tenacidade conservadora dos governos de Cavaco Silva e uma agressividade nacionalista que o governo de Pedro Passos Coelho apresentara de forma invertida.»
Luís Montenegro encontrou na Lei da Nacionalidade um escudo para se predispor ao agrado de uma larga faixa da população que desistiu de construir. Na sua ânsia de recuperar qualquer migalha, dedicam-se agora à destruição do Estado social, solidário e cooperante, começando, nas bocas dos instrumentos mediáticos, pelos estrangeiros, mas elaborando, na sombra e no silêncio, uma ressuscitada lei de estreitamento orçamental que retirará cuidados de saúde às populações, levará a maiores riscos de pobreza e fragilidade, retificará o equilíbrio de forças ao nível laboral para fortalecer o lado dos patrões. A tudo isto, na verdade, o cada vez mais ignóbil representante de uma esperança de centro-esquerda acena com um sentido de Estado a que assistimos como um Estado sem sentido.
Segue, debaixo do nosso nariz, a transformação do nosso país num recreio para quem vai cortando as linhas que poderiam ligar uma reacção popular ao fragilizar das condições de vida, impedindo a compreensão das semelhanças entre nós e acicatando diferenças que são apenas meios de afiar a lâmina da tesoura que nos poda o acesso a uma reação. Contra o reforçar desta ofensiva, pela força que encontra em grupos onde anteriormente o acesso lhes estava vedado, a necessidade de estabelecer uma clara organização que saiba como construir e plantar sobre terreno queimado.
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