As afirmações, que mais tarde o ministro da Educação disse estarem descontextualizadas, foram proferidas esta terça-feira, em Lisboa, na apresentação do «Novo Sistema de Acção Social no Ensino Superior». Segue o trecho: «Aquilo que nós fazemos no Ensino Superior é não misturar, é pôr nas residências universitárias os estudantes dos meios socio-económicos mais desfavorecidos. E por isso, também já agora, é que depois elas se degradam, é por isso que elas depois se degradam, é por isso que elas depois não são cuidadas […] quando nós metemos pessoas que são basicamente todas de rendimentos mais baixos, a beneficiar de um serviço público, nós sabemos que esse serviço público se deteriora. É assim nos hospitais, é assim nas escolas públicas, nós sabemos que é assim».
Em reacção, o PCP apresentou um requerimento para audição urgente do ministro da Educação no Parlamento, o PS defendeu que Fernando Alexandre não reúne condições para continuar no cargo e o Livre condenou as declarações do ministro, que classificou de «estigmatizantes» e «graves».
«Vamos entregar um requerimento na Comissão de Educação para ouvir o ministro da Educação a propósito destas declarações, mas aquilo que pretendemos é confrontá-lo com esta concepção e com estas opções, que vão ao arrepio da Constituição. A nossa Constituição diz que a educação é um direito para todos e é assim que tem que ser», afirmou a líder parlamentar do PCP, Paula Santos, esta terça-feira, na Assembleia da República.
Numa publicação nas redes sociais, o coordenador do BE, José Manuel Pureza, considerou que «culpar os estudantes mais pobres pelo estado das residências é a forma mais baixa de desresponsabilização política», acrescentando que o ministro «deve um pedido de desculpas ao país». Também a deputada única do PAN, Inês Sousa Real, se juntou às críticas, considerando que as afirmações «são mais do que lamentáveis».
Posteriormente, em declarações na RTP Notícias, o ministro considerou que as suas palavras foram descontextualizadas: «O que eu disse é que, quando tenho um serviço público que é usado apenas por pessoas que não têm voz, que são de rendimentos mais baixos, por razões de gestão, o serviço se degrada», disse Fernando Alexandre.
Estudantes bolseiros «não são o problema»
O Movimento de Utentes dos Serviços Públicos (MUSP) afirma num comunicado que as «declarações elitistas» do ministro da Educação revelam «uma lógica classista que criminaliza a pobreza e transfere para os mais vulneráveis a responsabilidade por problemas estruturais que o próprio Estado se recusa a resolver». O movimento sublinha que a degradação das residências «não nasce da condição social dos estudantes», mas antes do «subfinanciamento crónico, da falta de manutenção, do abandono político e da mercantilização do direito à habitação».
Acrescenta que, associando pobreza e degradação, o ministro «legitima o preconceito, normaliza a exclusão e reforça uma visão elitista da universidade — como se o Ensino Superior devesse ser reservado apenas a quem pode pagar». O MUSP recorda que as residências universitárias surgiram para garantir a igualdade de oportunidades, e insiste que os estudantes trabalhadores, bolseiros e de origens populares, além de não serem o problema, «são vítimas de um sistema que os precariza e os silencia».
«Exigimos um investimento público sério nas residências universitárias, gestão democrática dos espaços e uma política educativa que coloque a dignidade, a justiça social e o direito à educação acima dos preconceitos de classe», lê-se na nota.
Uma declaração de «ódio»
Para a Juventude Comunista Portuguesa (JCP), o ministro Fernando Alexandre e o Governo «deixaram cair a máscara». «Num momento em que com o dito "novo" sistema de Acção Social pretendem pintar de solidário e benéfico mais um ataque aos estudantes do Ensino Superior, embelezado com medidas propagandísticas avulsas, as declarações do ministro não deixam espaço para dúvidas relativamente ao que se pode esperar: desprezo, manutenção das barreiras no Ensino Superior, elitização e privatização do Educação», refere a JCP em comunicado.
A juventude comunista deixa a garantia de uma resposta «ao ódio que o ministro e o Governo sentem» dos estudantes com luta, concluindo que o «desdém» possa estar relacionado com o facto de, este ano, terem «derrotado a sua ambição» de aumentar as propinas.
«Tão certo é que o ministro disse mesmo aquilo que disse, independentemente de quantos esclarecimentos possa vir emitir, como é certo que a luta dos estudantes do Ensino Superior continuará por um Ensino Superior público, gratuito, democrático e de qualidade, onde ninguém fica para trás», alerta.
Contribui para uma boa ideia
Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.
O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.
Contribui aqui
