O sector universitário no Reino Unido enfrenta grandes desafios políticos e financeiros derivados da alteração do modelo de financiamento que começou com a introdução de propinas em 1998 (inicialmente de 1000 libras, passando para 3000 libras em 2006, 9000 em 2012 e, mais recentemente, para 9250 libras). O consequente desinvestimento público nas universidades implica que actualmente estas dependem das propinas para manter a sua sustentabilidade financeira. Ironicamente, o governo Britânico gasta mais do seu orçamento no sector do que há dez anos atrás, mas o dinheiro vai para cobrir os empréstimos, em vez de apoiar directamente as instituições de ensino.
Nos últimos 15 anos, a maior parte das instituições apostou em aumentar, ano após ano, o número de alunos que recebe (sobretudo estrangeiros, cujas propinas são quase o dobro), ao mesmo tempo que diminuiu o rácio de docentes para alunos. Atrair alunos tornou-se num fim em si, o que levou muitas universidades a recorrerem a grandes empréstimos para investirem em infra-estrutura e mecanismos de recrutamento (e.g. campanhas publicitárias). Os maiores «financiadores» do sector universitário no Reino Unido neste momento são a China e a Índia. No entanto, a estagnação do valor das propinas (que mesmo assim vê os alunos a acabarem os cursos com dívidas gigantescas), a crise da inflação e a diminuição de alunos estrangeiros nos últimos anos (devido sobretudo ao «ambiente hostil» – slogan oficial do governo britânico – e a mudanças no panorama geopolítico) criaram desafios impossíveis para a maior parte das instituições do ensino superior – que, apesar de tudo, continuam a pagar salários exorbitantes aos seus reitores e equipas de liderança.
«Atrair alunos tornou-se num fim em si, o que levou muitas universidades a recorrerem a grandes empréstimos para investirem em infra-estrutura e mecanismos de recrutamento (e.g. campanhas publicitárias).»
Universidades como Durham e Newcastle em Inglaterra, Dundee e Edimburgo na Escócia, ou Bangor, Swansea e Cardiff no País de Gales, anunciaram planos para cortes significativos nos docentes, e/ou no pessoal não docente.
No caso de Cardiff, a maior universidade no País de Gales, os cortes anunciados em Janeiro deste ano incluíram inicialmente pelo menos 400 académicos, o fecho da faculdade de Música e a de Línguas Modernas (que inclui cursos de Português), bem como dos cursos de Enfermagem, História Antiga e Religião. A ironia é que, apesar de ter reportado um défice financeiro este ano, a universidade de Cardiff é das instituições com melhor situação financeira no Reino Unido, cujas reservas amontam a 400 milhões de libras e incluem pelo menos 144 milhões em dinheiro disponível. Os sindicatos declararam as propostas cruéis e desnecessárias e têm combatido a narrativa da universidade nos processos de negociação e nos meios de comunicação social, incluindo com uma ameaça de greve. Como resultado, a universidade reverteu já alguns dos cortes propostos e garantiu que não haveria despedimentos pelo menos até ao final do ano. Nas redes sociais têm surgido testemunhos de estudantes e docentes que atacam a liderança da universidade e pintam uma imagem negra do ambiente instalado.
O País de Gales enfrenta grandes dificuldades sociais e económicas, em parte resultado ainda do período de austeridade dos anos 80, quando Margaret Thatcher destruiu as importantes indústrias de carvão e do aço do país. Em relação ao resto do Reino Unido, o País de Gales sofre por exemplo de salários mais baixos e maior pobreza infantil, e menos pessoas têm acesso a educação universitária. Esta crise do sector universitário, com o tipo de cortes propostos por várias instituições do país têm graves implicações para o país e as suas comunidades. Os sindicatos têm apelado aos governos britânico e galês que apoiem o sector e revertam o modelo financeiro de volta para o domínio público.
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