A acção é convocada pelo Manifesto em Defesa da Cultura, juntamente com a Ação Cooperativista, o Sindicato dos Trabalhadores de Arqueologia (STARQ/CGTP-IN), a Apordoc – Associação pelo Documentário e o Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculos, do Audiovisual e dos Músicos (CENA-STE/CGTP-IN), todos subscritores de um texto sobre «o estado da Arte da Cultura em Portugal», intitulado «Chegámos ao limite!», partilhado nas redes sociais, na passada sexta-feira.
O protesto está marcado para as 18h, em frente à Assembleia da República, onde por essa hora o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, irá ser ouvido sobre a proposta do Governo de Orçamento do Estado para 2024, mas a ideia dos organizadores é alargar a subscrição do documento a outras estruturas e levar o protesto até outras cidades. «Queremos falar dos impactos nas pessoas da sucessiva pobreza orçamental» do Ministério da Cultura, advertem.
No texto, os subscritores alertam para «bola de neve» que se formou com o reforço de orçamento dos concursos de apoio sustentado de 2022 da Direcção-Geral das Artes (DGArtes), que abrangeu apenas a modalidade quadrienal, fazendo com que centenas de candidatos aos apoios na modalidade bienal não fossem apoiados, apesar de serem considerados elegíveis, e que levou ao «total desvirtuamento da especificidade de cada linha de apoio, obrigando as pessoas a viver sempre numa lógica de sobrevivência pura». E sobreviver, aclaram, «quer dizer que continuamos a viver depois de qualquer coisa ter deixado de existir», salientando que, ano após ano, desaparece a possibilidade de projectar «o nosso presente e o nosso futuro».
Uma política que «rompa com o alheamento do Estado» e «garanta o efectivo acesso à Cultura» em todo o território são algumas das reivindicações de um grupo de entidades em defesa da Cultura. Cucha Carvalheiro (actriz), Ana Biscaia (ilustradora), André Albuquerque (actor), Catarina Romano (realizadora de cinema de animação), Fernando Tavares Marques (director artístico do Intervalo Grupo de Teatro), José Moz Carrapa (músico), Susana Domingos Gaspar (bailarina e coreógrafa) e Manuel Freire (cantor) são alguns dos subscritores de um documento posto a circular, tendo em conta que «o estado a que a Cultura chegou não é mais suportável». A iniciativa partiu do Manifesto em Defesa da Cultura e congrega um conjunto de associações e outras entidades, como a Ação Cooperativista de apoio a profissionais do setor da Cultura e das Artes, as associações Casa B, Casa das Cenas, corpodehoje, O Lugar do Meio, Procur.arte e Mente de Cão, e o Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculos, do Audiovisual e dos Músicos (CENA-STE/CGTP-IN). «A política cultural de apoios miseráveis, de mercantilização e de desresponsabilização do Estado tem apenas agravado as desigualdades das populações no acesso à criação e fruição culturais», lê-se na Carta de Princípios Orientadores para uma Nova Política de Cultura, a que o AbrilAbril teve acesso, e que brevemente será apresentada ao público, em data a anunciar. Este grupo de trabalho denuncia que as opções dos sucessivos governos «destroem a diversidade e a paisagem cultural» do País e promovem o abandono por parte de artistas e trabalhadores, tendo em conta o «agudizar da incerteza, da precariedade e da insegurança no trabalho». Problemas que, segundo o texto, o Estatuto dos Profissionais da Área da Cultura agrava e legitima, «com a criação de novos encargos e barreiras para as estruturas culturais e para os trabalhadores e trabalhadoras da Cultura». O CENA-STE critica o facto de a proposta de Orçamento do Estado para 2022 estar longe do 1% reclamado, salientando que também os baixos salários e a precariedade ameaçam a fruição e criação cultural. Ao mesmo tempo que constata o desfasamento relativamente ao objectivo, «que seria de facto transformador», de 1% do Orçamento do Estado (OE) para a Cultura, «sem subterfúgios nem cativações», o Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculos, do Audiovisual e dos Músicos (CENA-STE/CGTP-IN) denuncia, através de comunicado, que dos cerca de 20 milhões de euros anunciados no OE do ano passado de apoio directo à produção cultural, apenas foram executados 12 milhões. O sindicato admite que «não existe intenção séria por parte do Governo em apoiar de forma consistente a produção artística nacional» e frisa a necessidade de se implementarem as verbas anunciadas, de forma a tornar possível o combate aos vínculos precários e ilegais, o financiamento adequado das estruturas artísticas e a instituição da obrigatoriedade contratual em todos os projectos com subvenções públicas. Na proposta do Governo para 2022, a Cultura mantém um peso residual no quadro das áreas governativas, não valendo mais do que 0,25% do Orçamento. A estrutura sindical admite, no entanto, que as consequências do OE para a Cultura «não vêm só» do financiamento do Ministério da Cultura. «Medidas como o aumento do salário mínimo e o combate generalizado à precariedade têm como consequência maior capacidade de acesso à fruição e criação cultural», refere, salientando que, actualmente, os trabalhadores «estão distantes desses direitos, fruto das suas condições de vida e do empobrecimento». Também a merecer crítica está o facto de as medidas e apoios de emergência do último ano e meio não terem chegado «à grande maioria» dos trabalhadores do sector e precisarem de uma avaliação urgente. «Há medidas que têm de ser mantidas ou retomadas, como é o caso das moratórias e dos apoios extraordinários aos trabalhadores independentes», alerta o CENA-STE. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. «Tais medidas avulsas e inconsequentes, a par de sucessivas campanhas de mistificação de uma crise generalizada e permanente, não são dignas da Democracia, não respondem às expectativas de gerações no limiar dos 50 anos do 25 de Abril e, sobretudo, não dão resposta ou garantem o direito, constitucionalmente consagrado, à Cultura para todos e todas», lê-se no documento. As estruturas criticam as «práticas de mercantilização da Cultura e de privatização do património e de todos os espaços da vida», realçando, no entanto, que a dinâmica proporcionada pela Revolução dos Cravos deixou nas sucessivas gerações «as marcas e as sementes de uma Outra Política para a Cultura». Política que, a partir do texto constitucional, «impõe ao Estado o compromisso e a responsabilidade central de promotor e garante do acesso generalizado das populações à criação e fruição dos bens e actividades culturais, em todo o território nacional, através do investimento de, pelo menos, 1% do OE [Orçamento do Estado], com perspectiva da sua subida para 1% do PIB [Produto Interno Bruto], sendo este último o valor mínimo recomendado pela UNESCO». A plataforma reivindica uma política que assegure o investimento público necessário e o «dever estatal da criação e acompanhamento dos necessários equipamentos e estruturas físicas, humanas e legislativas», a partir do desenvolvimento de um Serviço Público de Cultura em todo o território nacional e que «deriva da própria Constituição». «O Serviço Público que queremos não significa a estatização da Cultura, antes a garantia, pelo Estado, do livre acesso de todos e todas ao trabalho artístico e cultural», frisam as organizações. Ao mesmo tempo, salientam, «Cultura é trabalho» e «não há uma verdadeira democratização da Cultura sem o trabalho com direitos». Como tal, e «ao contrário do que os sucessivos governos têm imposto, a pretexto de uma excepcionalidade de fachada», exigem o fim da desregulação, dos baixos salários, da precariedade e da insegurança, «no presente e no futuro». Com vista a proporcionar «apoios justos, equitativos e adequados a toda a actividade artística de qualidade, em todo o território nacional», reclamam um serviço público que assuma o «apoio integral» às artes, bem como um sistema de financiamento dos programas plurianuais e pontuais de apoio, seja por via de concursos, contratos-programa ou de outras modalidades. «Um sistema de apoio ampliado, com diversas modalidades de acesso ao financiamento, apoiado nos meios logísticos e técnicos atrás referidos e munido de um plano plurianual de financiamento», acrescentam. 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Plataforma exige outra política para a Cultura
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Trabalhadores da Cultura reivindicam mais orçamento
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«Mesmo os projectos que receberam apoio, continuam até hoje (8 meses depois das candidaturas entregues), desenvolvendo processos de criação sem o apoio transferido para as associações, tendo alguns, inclusive, já estreado», alertam. «Até hoje, foi, provavelmente, o programa que mais tempo demorou para avaliar, publicar resultados, avaliar reclamações, verificar documentos e contratualizar, emparedando o pessoal técnico da DGArtes num volume de trabalho desumano e empurrando profissionais para calendarizar processos de criação e estreias, pressupondo, à partida, que o Estado não vai cumprir prazos e só vai disponibilizar os apoios, pelo menos, 5 meses depois do anunciado», denunciam.
Os subscritores salientam que «uma política cultural não se faz em modo de sobrevivência, com profissionais da área artística e cultural a viverem sem os mínimos direitos», criticando a «ausência de financiamento para a criação, equipas reduzidas à força e sem dinheiro para contratar, um muro intransponível na Rede de Teatros e Cineteatros que impossibilita a circulação de criações, fonte de financiamento nesta altura crucial, pessoas desempregadas sem direito a qualquer tipo de apoio social, pessoas abrangidas pelo Estatuto dos Profissionais da Área da Cultura que, ao invés de ser célere, é demorado e burocrático». Mas condenando também a ausência de um serviço público de Cultura.
Os activistas criticam ainda os «feitos» enaltecidos pelo Ministério da Cultura, como o aumento da dotação para reabilitação do património cultural ou de 10% do Orçamento do Estado para a Cultura em 2024 (excluindo a RTP), apesar de não se saber que parte deste «parco orçamento» será executada, nem em que se traduzem as ditas «melhorias» anunciadas para o sector. Na realidade, denunciam, «as pessoas continuam sem vínculos profissionais, sem qualquer apoio social, num aumento de precariedade e instabilidade emocional e económica».
Além disto, no texto recorda-se que os profissionais do sector da Cultura «também sofrem dos mesmos problemas que atingem o resto da população: falta de habitação a preços acessíveis nas grandes cidades, aumento do preço dos bens e serviços essenciais, etc., fazendo dezenas abandonarem a profissão ou viverem numa permanente angústia».
«Chegámos ao limite com a má gestão do financiamento para a cultura! Chegámos ao limite com as medidas e slogans que na prática não se concretizam! Chegámos ao limite com o silêncio do Ministério da Cultura! Chegámos ao limite da sobrevivência!», desabafam.
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