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Se quer evitar o apocalipse jogue na bolsa do clima

Não é novidade que os grandes senhores do capitalismo deitaram as mãos à suposta luta contra as alterações climáticas, vendo nela grandes oportunidades de negócio.

CréditosRobert Perry / EPA

Cumpriu-se o ritual. A Cimeira das Partes (COP) das Nações Unidas sobre as alterações climáticas reuniu-se este ano em Glasgow com o número de série 26. Não faltaram as pompas e solenidades, nem os discursos dos grandes líderes da humanidade e do mundo repletos de promessas garantindo um clima paradisíaco para lá de 2050. Quanto aos resultados, em relação às alterações climáticas asseguram um pouco mais do mesmo. Mas há quem não possa queixar-se: a grande finança internacional afia as farras para se deliciar e especular com aquilo a que convencionou chamar-se a «transição energética». E nisso a COP ajudou-a.

Já com os trabalhos da cimeira em fase final, o Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA) afirmou que os compromissos assumidos na Escócia não servirão para travar o aumento de temperatura do planeta – afinal, o grande objectivo que estaria supostamente em causa. Segundo as estimativas desta entidade, que desempenha um papel determinante na organização das COP, por este caminho a temperatura da Terra aumentará numa faixa entre 2,7 e 2,1 graus centesimais até 2100, provocando a chamada «catástrofe climática» inerente ao aquecimento global.

Antes da reunião de Glasgow, sempre segundo o PNUA, as previsões estavam entre 2,7 e 2,2. Tanto fausto, tantas promessas para um eventual ganho de um décimo de grau que, segundo os entendidos, não chegará para evitar o «apocalipse». Sendo que estes valores estão bastante acima das metas estabelecidas na tão incensada COP de Paris, em 2015: uma subida máxima de dois graus, de preferência 1,5 graus.

Entretanto, segundo o PNUA, a concentração de gases de efeito de estufa, considerada a grande responsável pelo aquecimento global, atingiu um valor recorde em 2020. Em 2020, imagine-se – apesar de ser o ano em que a actividade económica desacelerou brutalmente devido à pandemia...

O que parece ter acontecido para ditar o fracasso dos objectivos de Paris, apesar de já terem passados seis anos, é que não se cumpriram os pressupostos tecnológicos em que as previsões assentavam. Situação que parece não ter-se alterado de então para cá.

No início deste ano, o ex-secretário de Estado da administração norte-americana de Obama, John Kerry, que veio a ser o principal operacional da delegação dos Estados Unidos em Glasgow, afirmou que «50% das reduções que temos de fazer para chegar à neutralidade de carbono em 2050 virão de tecnologias que ainda não temos, mas veja-se o que fizemos para impulsionar a criação de vacinas, veja-se o que fizemos para ir à Lua, veja-se o que fizemos para inventar a internet». Por isso, acrescentou o representante norte-americano já na Cimeira, «não há necessidade de acção política» para «fechar a produção», por exemplo, de combustíveis fósseis – cuja utilização é considerada incompatível com um verdadeiro combate às alterações climáticas.

«Entretanto, segundo o PNUA, a concentração de gases de efeito de estufa, considerada a grande responsável pelo aquecimento global, atingiu um valor recorde em 2020. Em 2020, imagine-se – apesar de ser o ano em que a actividade económica desacelerou brutalmente devido à pandemia...»

Os ambientalistas do PNUA parecem não partilhar da visão cor-de-rosa e voluntarista de Kerry. E consideram: «Dada a falta de transparência dos compromissos de neutralidade de carbono, a ausência de um mecanismo de responsabilização e de um sistema de verificação (…) a realização destes objectivos de neutralidade de carbono permanece incerta».

Em suma, as COP mantêm-se pouco convincentes em matéria de travagem da temperatura global porque esta depende de promessas não verificáveis e pouco consistentes dos principais dirigentes mundiais, flutuando ao sabor dos interesses que na realidade representam, entre eles o das poderosas indústrias de combustíveis fósseis.

O petróleo e a propaganda

Os combustíveis fósseis são, naturalmente, o calcanhar de Aquiles das sucessivas COP e os maiores inimigos das empolgadas campanhas de propaganda montadas em torno delas por aquilo a que a pena sempre oportuna de Carlos Matos Gomes qualifica como os meios de manipulação social.

A ciência, como vamos aprendendo, é uma componente secundária do combate às alterações climáticas, muito mais organizado em função de interesses económicos, financeiros, geo-estratégicos e políticos. Nas COP não se discute climatologia, as ciências do clima – mas sim a política climática, coisa completamente diferente, interesseira e sem conteúdo coerente. E no GIEC, grupo intergovernamental de peritos climáticos que está na base da organização das COP, os cientistas são membros secundários, com o estatuto de funcionários, cabendo a diplomatas os papéis representativos.

As COP são o espelho de toda esta realidade. Porém, parece mais ou menos adquirido que um combate real contra o aquecimento planetário só pode ser travado com base na supressão gradual da utilização dos combustíveis fósseis, considerados os principais responsáveis pelas emissões dos gases de efeito de estufa.

«Nas COP não se discute climatologia, as ciências do clima – mas sim a política climática, coisa completamente diferente, interesseira e sem conteúdo coerente.»

Criou-se e alimenta-se, entretanto, o mito segundo o qual os interesses e os lobistas desta indústria foram suprimidos da COP de Glasgow pelos organizadores, o que não passou de uma patética manobra de engana tolos. O presidente da cimeira, nomeado pelo primeiro-ministro britânico Boris Johnson – que tem o seu governo repleto de personalidades vinculadas ao sector petrolífero – foi Alok Sharma (ex-ministro britânico da Economia e Indústria) que, segundo a imprensa inglesa, está na lista de pagamentos de empresas petrolíferas a um nível das dezenas de milhares de libras anuais.

Entre os patrocinadores directos da cimeira de Glasgow esteve o banco Nat West, inscrito na lista Banking Climate Chaos dos 50 maiores poluidores. E também o Bank of Scotland, que em 2019/20 investiu mais de mil milhões de libras nos sectores petrolífero e do gás natural.

Patrocinador da COP26 foi igualmente o Boston Consoulting Group (BCG), o maior fornecedor de serviços de consultadoria da indústria petrolífera, com o objectivo de procurar «novas oportunidades» para o sector. Lema do BCG: «apoiar as indústrias do petróleo e do gás para manter-se competitivas, ajudando-as a desenvolver a eficiência operacional e a reduzir custos».

Por outro lado, desde a Cimeira da Terra no Rio de Janeiro que os maiores potentados petrolíferos e outras multinacionais de âmbito global formaram organizações de lobby defendendo a harmonia entre os combustíveis fósseis e o meio ambiente. É o caso da Coligação para o Clima Global (CCG) e do Conselho do Clima, sempre com influência garantida nas COP.

A CCG diz de si própria que «vem liderando a voz dos negócios na mudança do clima». Entre os seus membros estão o American Petroleum Institute, a DuPont, Dow, Ford, GM, Texaco, Chevron, Exxon Mobil e a Shell. Gigantes de actividades consideradas nocivas para o ambiente.

Neste cenário, onde «negócios» parece ser a palavra mágica, há uma questão de fundo e de senso comum que invalida quaisquer exercícios de linguagem sobre o fim da utilização do petróleo e de outros combustíveis fósseis no âmbito da «transição energética»: passa pela cabeça de alguém que as continuadas e agressivas procura e exploração de novas fontes de petróleo e gás natural continuem a desenvolver-se para que estes produtos não sejam aproveitados enquanto não se esgotarem – se isso chegar a acontecer?

Faz sentido que se travem guerras e outros conflitos geo-estratégicos de alto grau em torno da instalação e dos percursos de oleodutos e gasodutos se o fim da utilização de petróleo e gás natural estiver previsto a curto/médio prazo? Não é certamente para suspender a utilização de combustíveis fósseis que numerosos países no mundo, entre eles os Estados Unidos e o Reino Unido, desenvolvem o fracking ou fractura hidráulica, método de extracção altamente poluidor de terras e águas subterrâneas.

Não esqueçamos, entretanto, que o ex-vice-presidente dos Estados Unidos Albert Gore, agora um verdadeiro «papa» da ecologia e dos negócios «verdes», acarinhou entusiasticamente a guerra do Kosovo, conflito que teve como um dos objectivos a construção de um oleoduto transbalcânico. Foi ainda na administração Clinton/Gore que os Estados Unidos negociaram com os Talibã a passagem de um oleoduto através do Afeganistão.

E que dizer do desesperado jogo de ameaças e sanções conduzido pelos Estados Unidos contra o gasoduto Nord Stream II entre a Rússia e a Alemanha?

Mais elucidativo ainda foi o discurso do presidente norte-americano Joseph Biden na COP26, onde o seu país chegou com os mais negros recordes de sempre em termos de poluição e existência de condições favoráveis às alterações climáticas.

Dando largas ao seu passatempo favorito, disparar acusações contra a Rússia e a China, Biden culpou Moscovo e a OPEP de serem responsáveis pela inflação e pelas subidas de preços dos combustíveis e do petróleo. Disse: os preços sobem «por causa da recusa da Rússia e da OPEP em extrair maiores quantidades de petróleo».

Ora, em plena cimeira alegadamente anti-combustíveis fósseis como base da luta contra o aquecimento global, o presidente dos Estados Unidos – que foi considerado uma espécie de patrono da magna reunião – defendeu a extracção de mais petróleo. Pouco mais seria preciso dizer sobre a credibilidade deste sonante conclave e da solidez do conceito de «transição energética».

As finanças «verdes»

As alterações climáticas são para levar a sério, muito a sério; a chamada «transição energética» também, mas não pelos mesmos motivos de quem a prega em redundantes discursos para prometer a neutralidade de carbono – alguns grandes poluidores garantem que já a atingiram, como publicita a BP.

Os mesmos discursos prometem também a sustentabilidade, esse grande milagre tornado o maior lugar-comum da actualidade, engodo saído das cabeças pensantes do FMI e Banco Mundial, Goldman Sachs, Deutsche Bank, Fundação Rockfeller, Fórum Económico Mundial (Davos) e outras instituições de bem para não deixar pedra sobre pedra nos processos actuais de produção de riqueza.

Não é novidade que os grandes senhores do capitalismo deitaram as mãos à suposta luta contra as alterações climáticas, vendo nela grandes oportunidades de negócio através da alteração das bases da economia e de uma ainda mais vantajosa reformulação das finanças globais.

Na COP de Glasgow um dos mais apregoados resultados é a criação de alianças bancárias de âmbito global com o objectivo de recolher pelo menos 130 mil milhões de dólares para ajudar à «transição energética», principalmente nos países mais pobres do mundo.

«As alterações climáticas são para levar a sério, muito a sério; a chamada «transição energética» também, mas não pelos mesmos motivos de quem a prega em redundantes discursos para prometer a neutralidade de carbono – alguns grandes poluidores garantem que já a atingiram, como publicita a BP.»

Percebe-se assim que não são os bancos e as multinacionais que se comprometem a alcançar o zero de emissões; na verdade, financiam e endividam milhões e milhões de pessoas que deverão ser responsáveis pela neutralidade de carbono, muitas delas em países e regiões onde o principal combustível é ainda a madeira. Tornando esses países e regiões mais dependentes, mais endividados, menos capazes de conduzir as suas políticas respeitando os interesses dos seus povos, integrados assim num globalismo de rapina que beneficia não mais de 1% da população mundial.

No site da COP proclama-se que «as finanças tornaram-se verdes e resilientes», nascendo para isso a «Aliança Financeira para a Neutralidade de Carbono de Glasgow». 

A nova «aliança» envolve bancos internacionais e regionais, além do Banco Mundial, e também grandes expoentes globais como os já citados bancos Goldman Sachs (que «faz o papel de Deus na Terra», segundo o seu presidente) e o Deutsche Bank. «Trata-se de investir nos próximos três anos», informa a COP, «mais de 130 mil milhões de dólares privados para transformar a economia até às emissões zero em 2050».

Os capitais serão constituídos através de «obrigações verdes» (green bonds), os famosos «títulos verdes» em que os patronos do globalismo neoliberal assentam as transformações na economia planetária para supostamente combater as alterações climáticas; e também com investimentos de fundos comuns e fundos de pensões, pelo que as poupanças de milhões e milhões de pequenos aforradores vão ser lançadas em mais uma grande bolha especulativa.

Voltemos a Albert Gore. Foi ele quem fundou, juntamente com o Goldman Sachs e o Blackrock, o maior fundo de investimento do mundo, a Bolsa do Clima de Chicago. É uma organização vocacionada para especular com os «títulos verdes» e os «créditos de carbono» (inventados igualmente por Gore), que mais não são do que licenças para emitir gases de efeito de estufa compradas a países e regiões que, pelo precário desenvolvimento das suas economias, não atingem sequer os níveis de poluição considerados ainda aceitáveis.

Enfim, temos o sistema financeiro global a criar mais uma, e promissora, fonte de especulação, que se moverá essencialmente por acção da propaganda apocalíptica em torno das alterações climáticas mais do que pela essência esclarecedora do fenómeno. O conhecimento e a informação objectiva e sustentada são inimigos da alienante cultura de sound bite que alimenta a relação das pessoas com o aquecimento global.

Os estatutos da Bolsa do Clima de Chicago, fundada em 2003, foram redigidos então por um jovem advogado chamado Barack Obama, que, enquanto presidente norte-americano, viria a criar condições para alimentar a campanha obsessiva em torno das alterações climáticas como via para reformar e revitalizar o sistema financeiro – a essência do neoliberalismo globalizante.

Na COP de Glasgow estiveram presentes dirigentes políticos que, enquanto proclamam a ameaça do «apocalipse climático», investem milhões de milhões de dólares em armas nucleares, engenhos capazes, numa ínfima percentagem dos existentes, de destruir num ápice a vida no planeta. Uma possibilidade na verdade muito mais aterradora, a curto prazo, do que os efeitos das alterações climáticas. Disso não se falou e não se fala nos meios de manipulação social.

«Na COP de Glasgow estiveram presentes dirigentes políticos que, enquanto proclamam a ameaça do «apocalipse climático», investem milhões de milhões de dólares em armas nucleares, engenhos capazes, numa ínfima percentagem dos existentes, de destruir num ápice a vida no planeta.»

Pelo que é da essência das organizações e dos militantes anticapitalistas tomar em mãos o combate contra todas as ameaças à vida do ser humano na Terra, sejam a guerra, nuclear ou não, as alterações climáticas, as desigualdades, a rapina de matérias-primas, a agroindústria transnacional, as circunstâncias que criam milhões de refugiados e desalojados, a deflorestação. Como diz a canção, isto anda tudo ligado – e o traço de união é o capitalismo.

Entretanto, a oposição oficial à habitual falta de consistência dos resultados das COP e à via imposta para suposto combate às alterações climáticas – mas só às alterações climáticas – é folclórica, imberbe, inconsequente, inconsistente. Mas nada disto é inocente.

O símbolo do movimento, significativamente endeusado pelos media, continua a ser a adolescente sueca Greta Thunberg, por sinal, segundo jornalistas independentes, de alguma maneira vinculada a empresas e projectos que têm à cabeça o várias vezes citado Albert Gore. Compreende-se assim que Thunberg seja frequentadora das reuniões do Fórum Económico Mundial e dos ambientes da Comissão Europeia, onde discursa para puxar as orelhas aos principais dirigentes internacionais, que a escutam com sorridente bonomia.

Desta feita, em Glasgow, Greta Thunberg ficou do lado de fora dos espaços da reunião, distribuindo mensagens pela comunicação social. Talvez o convívio directo e visível com os autores da estratégia oficial não seja muito favorável à credibilidade da oposição oficial.

Na Escócia, depois de um imponente e ameaçador dinossauro ter aberto os trabalhos anunciando o fim da espécie humana na Terra – a extinção dos dinossauros não teve origem no aquecimento global provocado por gases de efeito de estufa e outros subprodutos dos processos industriais – o primeiro-ministro britânico iniciou a série de intervenções na COP26.

Com a particularidade de ser um crente de última hora nas alterações climáticas, porque durante muito tempo foi conhecido como um negacionista. Enquanto colaborador do Daily Telegraph escreveu mesmo um impactante artigo sob o título: «Esqueçam o aquecimento global, o problema é a superpopulação global».

Agora, já convertido, Boris Johnson aterrorizou os presentes com uma intervenção sobre a «ameaça apocalíptica das alterações climáticas», uma catástrofe, segundo disse, à qual o próprio James Bond poderá nem chegar a tempo de evitar.

Não sabemos se, por enquanto, James Bond vai jogando com green bonds ou créditos de carbono na Bolsa de Chicago para ajudar a financiar o combate ao aquecimento global e evitar «o apocalipse».

Mais fácil é perceber que as alterações globais são consequência directa e inevitável do capitalismo, pelo que não será o capitalismo, para mais na sua versão neoliberal e globalista, que as irá combater. Para já, vai diversificando as suas áreas de negócio; depois, por este caminho, o último sobrevivente que apague a luz do candeeiro a petróleo.

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