O primeiro-ministro, Luís Montenegro, apresentou-o como «um programa de mudança e de esperança», mas o radical, na óptica da CGTP-IN, mantém-se inalterado. «O ponto de partida é sempre a perspectiva das empresas e a ênfase é colocada na necessidade de aumentar a sua produtividade e competitividade, alegando-se que só assim será possível melhorar os salários e as condições de trabalho», critica a central sindical num comunicado divulgado ao início da tarde.
Sem prejuízo de uma análise mais aprofundada, a Intersindical considera que o programa do Governo do PSD e do CDS-PP centra-se «exclusivamente» nos interesses do capital e nas necessidades das grandes empresas, e «falha» na resposta aos problemas com que os trabalhadores e as populações estão confrontados. «Estamos perante um Programa de Governo que não serve os trabalhadores nem o país e nos lança no caminho do retrocesso social e da intensificação da exploração laboral e das desigualdades sociais e económicas, que terá da parte da CGTP-IN uma resposta organizada de luta», lê-se na nota.
Na generalidade das medidas apontadas para áreas como a economia, fiscalidade, trabalho, serviços públicos e protecção social, «o que encontramos», adianta a Inter, «é a promoção do sector privado e a protecção dos interesses das grandes empresas». Por outro lado, denuncia, não há «qualquer referência à centralidade do trabalho e à valorização dos trabalhadores como elementos determinantes para assegurar o desenvolvimento económico e social do país, promover uma justa distribuição da riqueza e combater as desigualdades».
Para a maior central sindical nacional, o programa do Governo liderado por Luís Montenegro propõe-se aprofundar «o actual modelo de baixos salários, precariedade laboral e social, despedimentos facilitados e a baixo custo, horários de trabalho longos e desregulados e más condições de trabalho».
Foi hoje apresentado o Programa de Governo. Sem prejuízo de uma análise mais aprofundada, numa primeira leitura consegue identificar-se o retrocesso como marca indelével do Governo da AD. Do trabalho à Habitação, o ataque é claro. Só os mais ingénuos esperariam um programa diferente. Durante a campanha, a AD disse ao que vinha e o Programa de Governo espelha exactamente aquilo que estava contido no seu programa eleitoral - a linha de continuidade do governo PSD/CDS-PP/Troika. Nas várias áreas, fica patente o retrocesso e a satisfação das vontades dos grandes grupos económicos. Naturalmente que a avaliação deve ser mais aprofundada, mas uma análise preliminar consegue logo identificar as opções contidas num programa assente no ataque aos direitos do povo e dos trabalhadores e nos benefícios dados ao grande capital. O ponto sobre os salários e o trabalho é onde se torna mais claro a quem serve o Governo. O grande capital revanchista, não satisfeito com tudo o que o governo de maioria absoluta do PS lhe dava, viu neste novo Governo a maneira de ver vingadas todas as suas pretensões. O Governo liderado por Luís Montenegro, ao longo do documento, sempre que aborda aumentos de salários (tanto do mínimo, como do médio) opta por alimentar a narrativa falaciosa da produtividade, dando a entender que os rendimentos só podem ser aumentados se esta última aumentar. A realidade desmente essa narrativa, até porque é facil comprovar que a produtividade tem aumentado e os salários não têm acompanhado esse mesmo ritmo. Assim como o PS, o Governo compromete-se com um Salário Mínimo Nacional de 1000 euros em 2028. Ou seja, colocar daqui a quatro anos o mesmo valor que actualmente é já praticado em Espanha. É por via do SMN que o Governo instrumentaliza a aproximação ao Salário Médio como se tal não fosse culpa dos ataques à legislação laboral e da caducidade da contratação colectiva. É neste sentido que o Governo é mais vocal na satisfação dos interesses do grande capital. Pegando nos baixos salários, instrumentalizando as reivindicações dos trabalhadores, e conjugando estes elementos com a composição do tecido empresarial português (constatando que as micro-empresas representam 90% do mesmo), o Governo abre a porta à revisão da legislação laboral. Diz o Programa de Governo que o tecido empresarial «está fortemente dependente das convenções coletivas de âmbito profissional e de sector de actividade» e que «a legislação laboral continua firmemente ancorada nos modelos tradicionais de trabalho, tendo dificuldade em enfrentar os desafios do trabalho na era digital». A vontade é evidente. A questão vai mais longe. O Programa de Governo diz que «a Concertação Social, parceiro imprescindível de qualquer acção governativa na área social e laboral, não tem sido adequadamente valorizada nos últimos anos», não diz é para quem. Fica tudo claro quando o Governo apresenta uma proposta desenhada pela CIP: «Aumentar a produtividade com medidas como a isenção de contribuições e impostos sobre prémios de produtividade por desempenho no valor de até 6% da remuneração base anual (correspondendo, dessa forma, a um 15º mês, quando aplicado), até à diminuição da carga fiscal sobre as empresas». Importa recordar que esta foi a proposta apresentada pelo patronato aquando da renegociação do Acordo de Rendimentos no passado ano. O Governo assume assim que é um mero fantoche do patronato e está pronto para fazer tudo o que for necessário para intensificar a exploração de depauperar o Estado com os benefícios fiscais às grandes empresas. Mais uma vez, o Governo diz ao que vem. Certo é que o programa «Mais Habitação» não dava as respostas necessárias ao problema em questão, mas o revanchismo do Governo fica bem espelhado neste campo. «A aposta ideológica em medidas restritivas que limitam e colidem com o direito de propriedade, que colocam uns contra outros, que limitam a iniciativa económica privada, que reduzem o investimento privado e cooperativo, e que apostam em exclusivo em promessas falhadas de Habitação Pública, deixam o Estado sozinho e incapaz de garantir um impulso ao mercado de habitação que garanta o acesso para todos», pode ler-se no Programa, sobre o «Mais Habitação». Nunca é dito que satisfazia grande parte das reivindicações dos grandes proprietários. Se relativamente ao Turismo, o Governo diz que irá «eliminar de imediato a Contribuição Extraordinária sobre o Alojamento Local, a caducidade das licenças anteriores ao programa Mais Habitação, e revendo simultaneamente as limitações legais impostas pelo Governo socialista», sobre a Habitação é prometida uma «injecção no mercado, quase-automática, dos imóveis e solos públicos devolutos ou subutilizados; a criação de um «regime Excepcional e temporário de eliminação ou Redução dos Custos Tributários em obras de construção ou reabilitação em imóveis destinados a habitação permanente»; e a criação de uma «programa de Parcerias Público-Privadas para a construção e reabilitação em larga escala». O Governo procura mais uma vez satisfazer os interesses dos grupos económicos, colocando o Estado a oferecer tudo e mais alguma coisa. A solução da direita passa por borlas fiscais, subsidiar com dinheiros públicos os interesses privados e oferecer tudo o que possa oferecer para agradar os interesses grandes interesses do sector imobiliário. Não deixa de ser curioso que as palavras «especulação imobiliária» nunca aparecem no documento. Aquando da apresentação da composição do Governo e da sua urgência, ficou patente o desrespeito pelo sector da Educação, acabando com o Ministérios da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, integrando-o no Ministério da Educação, Ciência e Inovação, e nem lhe conferindo uma Secretaria de Estado. Ao ler o Programa de Governo entende-se que o foco passará por reduzir o financiamento público às Instituições de Ensino Superior: «A estratégia de diferenciação do sistema de ensino superior deve ser aprofundada através do reforço da sua autonomia e da diversificação das fontes de financiamento». Naturalmente que transferindo a sua responsabilidade para os grandes grupos económicos não é necessário nem um ministério nem uma secretaria de Estado. A visão de mercantilização do Ensino Superior é bastante óbvia. Prevê o Governo «encorajar a participação de representantes do setor empresarial nos conselhos consultivos das instituições de Ensino Superior e de Investigação»; «avaliar o reforço dos incentivos fiscais para empresas que investem em programas de I&D em parceria com instituições de Ensino Superior»; «potenciar o regime de mecenato às instituições de ensino superior públicas; e «fomentar a criação de cátedras de índole empresarial que promovam uma forte ligação entre a Instituição de Ensino Superior e de Investigação e as empresas». Ainda na área da Educação, mas na questão da Escola Pública, o desrespeito pelos docentes é notória. Se por um lado há a promessa da «recuperação integral do tempo de serviço perdido dos professores, a ser implementada ao longo da Legislatura, à razão de 20% ao ano», em nenhum ponto há uma promessa clara de melhoria dos rendimentos dos mesmos. A AD promete sim, instrumentalizado as revindicações dos docentes, «criar uma dedução em sede de IRS das despesas de alojamento dos professores que se encontrem deslocados a mais de 70 km da sua área de residência» e criar um «programa de emergência para atrair novos Professores» que passa por «promover as horas extra dos professores, de forma temporária e facultativa». Mais uma vez nada de novo já que o que se encontra no Programa do Governo já se encontrava no programa eleitoral da AD. Ardilosamente, várias são as referência a um «Sistema Nacional de Saúde», uma forma de esvaziar o Serviço Nacional de Saúde e integrar os grupos de saúde privados na definição de políticas públicas. Nunca surge um compromisso com a real resolução do Serviço Nacional de Saúde, mas é dito que só «uma a articulação entre toda a capacidade instalada no Sistema de Saúde conseguirá responder às necessidades em saúde de forma eficaz, eficiente, previsível e sustentável». A tal articulação passará por manter os problemas estruturais do SNS enquanto os negócios privados da doença recebem subsídios para realizar aquilo que poderia ser realizado pelo Público. Neste sector o Governo foge a medidas concretas de resposta ao SNS e apresenta uma promessa abstrata: «Propor o Plano de Emergência do SNS e o seu modelo de implementação, nos primeiros 60 dias do mandato. Este plano de emergência visa garantir que os tempos máximos de resposta são garantidos, para consultas de especialidade, e cirurgias e meios complementares de diagnóstico e terapêutica». Sobre as reivindicações dos profissionais, o Governo apenas promete «criar um Plano de Motivação dos Profissionais de Saúde, de forma a valorizar autonomamente todos os recursos humanos envolvidos na prestação dos cuidados de saúde às pessoas, em especial no SNS», mas nunca diz o que é esse Plano. O Programa de Governo é um verbo de encher. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Nacional|
Programa de Governo é tão mau que ainda não doi, mas vai fazer doer (muito)
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A pretexto da necessidade de modernizar a legislação laboral, alerta a Intersindical, podemos esperar um maior reforço dos poderes patronais, e consequente enfraquecimento dos direitos colectivos, em particular da negociação colectiva e do papel dos sindicatos, bem como um agravamento dos desequilíbrios de forças entre trabalhadores e empregadores.
Embora, na campanha para as legislativas, Montenegro tenha constatado que «estamos cada vez mais nivelados por baixo», o programa do seu Governo «passa ao lado da emergência nacional do aumento geral dos salários e da valorização das carreiras e profissões», e, diz a CGTP-IN, cria condições para a intensificação da exploração».
O Governo propõe-se fixar, apenas em 2030, um salário médio de 1750 euros, inferior ao da média da União Europeia em 2021 (2402 euros). Quanto ao salário mínimo, o novo executivo trava o que vinha sendo a trajectória de aumento, mesmo assim insuficiente, dos últimos anos, prevendo uma subida anual de 45 euros, até atingir 1000 euros, em 2028, quando na vizinha Espanha, os trabalhadores com salário mínimo ganham, hoje, 1134 euros brutos.
A opção de proteger os interesses do grande capital regista-se também no plano da fiscalidade, aponta a CGTP-IN. Além da redução da taxa nominal de IRC em dois pontos percentuais até atingir os 15%, «é sintomática a intenção de "acabar com a progressividade da derrama estadual"», observa a Intersindical, salientando que, de acordo com os últimos dados da Autoridade Tributária, havia apenas 70 empresas no último escalão da derrama, que pagavam mais de 800 milhões de euros por esta via. «É a estes que se dirige a política fiscal deste Governo», regista, salientando que o documento «nada diz» sobre os impostos indirectos, nomeadamente sobre a redução do IVA da energia, «agravando assim as injustiças da política fiscal vigente, num quadro em que a tão apregoada descida do IRS é manifestamente insuficiente para equilibrar os pratos desta balança».
As críticas recaem ainda na ausência de referências ao necessário investimento nos serviços públicos e na falta de reconhecimento dos trabalhadores da Administração Pública, designadamente através da valorização dos seus salários. Mas também no aprofundar do «enfraquecimento e desresponsabilização do Estado», nomeadamente com a promoção do negócio com os grupos privados da saúde ou no enfraquecimento do direito à habitação, como hoje também denunciou o Porta a Porta.
Na breve análise, a Inter salienta ainda que, relativamente ao sistema público de Segurança Social, o programa do Executivo aponta para o enfraquecimento dos princípios de solidariedade laboral e intergeracional em que assenta o sistema previdencial, bem como para o reforço da vertente assistencialista do sistema, «proclamando que o sistema de protecção social deve estar focado apenas na protecção dos mais vulneráveis».
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