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A trama do golpe: os milhões da NED e «estudantes» a pedir apoio em Washington

O jornalista Max Blumenthal trouxe mais luz sobre a ingerência norte-americana na Nicarágua, centrando-se na ajuda de NED-USAID à «insurreição» e no giro de dirigentes estudantis do golpe em Washington.

Onda de violência alimentada pela oposição de direita com o apoio dos EUA já provocou quase 200 mortos na Nicarágua, desde 18 de Abril
Créditos / annurtv.com

No artigo intitulado «Máquina intervencionista da administração norte-americana vangloria-se de "preparar o terreno para a insurreição" na Nicarágua», publicado recentemente pelo jornalista norte-americano Max Blumenthal em The Gray Zone Project, as teorias conspirativas do golpe com apoio gringo – para o qual o governo sandinista tem chamado a atenção – ganham densidade.

«Se alguma imprensa mainstream tem procurado retratar o violento movimento de protesto na Nicarágua como uma corrente progressista de base, os líderes estudantis do país deixaram entender outra coisa», afirma-se no texto, que lembra como, no início deste mês, os líderes estudantis nicaraguenses, com papel destacado no movimento de oposição a Daniel Ortega, se deslocaram a Washington, sendo acolhidos pela Freedom House, ONG de direita que financiou a sua viagem, e procurando o apoio no seio da administração dos EUA e da fina flor da extrema-direita intervencionista – vide Ted Cruz ou Mark Rubio –, com quem se reuniram e posaram para a fotografia.

Também foram recebidos por altos funcionários do Departamento de Estado e por Mark Green, presidente da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID, na sigla em inglês), caracterizada por Blumenthal como a organização do soft power da administração norte-americana.

Maradiaga na OEA

Na mesma altura, a investir contra a «ditadura de Ortega», fez-se representar na Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington, uma delegação da oposição liderada por Félix Maradiaga, presidente do Instituto de Estudos Estratégicos e Políticas Públicas (IEEPP) de Manágua, que, segundo Blumenthal, recebeu pelo menos 260 mil dólares da Fundação Nacional para a Democracia (NED, na sigla em inglês) desde 2014.

As subvenções destinavam-se a apoiar o trabalho do IEEPP na área da educação de activistas, com vista «a fomentar o debate e gerar informação sobre segurança e violência». O financiamento também se destinava a cobrir os esforços para monitorizar a «presença crescente da Rússia e da China na região», refere-se no texto.

Sobre Maradiaga, Max Blumenthal afirma que a sua agenda veio à tona mal se iniciaram os protestos violentos na Nicarágua contra Ortega. «Ex-líder do Young World Forum, educado em Yale e Harvard, foi elogiado por La Prensa por "suar, sangrar e chorar ao pé dos jovens estudantes que lideraram os protestos na Nicarágua"», que, de acordo com a informação ontem divulgada pela Comissão da Verdade, Justiça e Paz, já provocaram 194 vítimas mortais.

Enquanto Maradiaga estava em Washington, a Polícia nicaraguense acusou-o de supervisionar uma rede criminiosa organizada que assassinou várias pessoas durante os ataques violentos no país centro-americano. Maradiaga afirmou ser vítima de uma «perseguição política» e classificou as acusações como «ridículas», mas, entretanto, adiou o regresso à Nicarágua, recebendo total apoio do Departamento de Estado dos EUA.

O grupo Hagamos Democracia é o que mais fundos recebe da NED – 525 mil dólares desde 2014. De acordo com Blumenthal, o presidente do grupo, Luciano García, que supervisiona uma rede de repórteres e activistas, declarou que Ortega transformou a Nicarágua num «Estado falido», tendo exigido a «sua demissão imediata».

O autor afirma que a NED procurou esconder bem a identidade das organizações que financiava para alimentar a oposição a Daniel Ortega, mas estas eram bem conhecidas na Nicarágua. No entanto, quem mais dinheiro «investe» contra os governos de «orientação socialista na América Latina» é a USAID. Só na Nicarágua, o orçamento desta organismo centrado na ingerência, no intervencionismo e na desestabilização «ultrapassou os 5,2 milhões de dólares em 2018», na sua maioria destinados ao «treino da sociedade civil e de meios de comunicação social».

A ingerência, dita sem rodeios

No dia 1 de Maio, cerca de um mês antes do giro da direita em Washington, Benjamin Waddell, director académico da School for International Training in Nicaragua, afirmou sem rodeios numa publicação financiada pela NED que «organizações apoiadas pela NED passaram anos e milhões de dólares a "criar as bases para a insurreição" na Nicarágua».

Publicado no Global Americans – um portal noticioso centrado na América Latina –, o artigo de Waddell «vangloria-se abertamente da ingerência dos EUA», afirma Blumenthal, que sublinha o carácter «francamente sincero da avaliação do impacto dos investimentos realizados pela NED» na sociedade nicaraguense.

De «forma inadvertida», as conclusões do autor fazem eco das do presidente sandinista Daniel Ortega e seus apoiantes, que «enquadraram os protestos no âmbito de um golpe cuidadosamente montado e apoiado até aos dentes por Washington», frisa Blumenthal.

Numa publicação financiada pela NED, Benjamin Waddell salienta o «engano» da imprensa internacional ao descrever a «rápida escalada de distúrbios» na Nicarágua «como uma explosão espontânea de descontentamento colectivo», desencadeada, entre outros factores, pelas mudanças do governo no sistema de Segurança Social. Waddell esclarece: «Se é verdade que havia causas subjacentes à confusão enraizadas na má administração e na corrupção do governo, é cada vez mais claro que o apoio dos Estados Unidos teve um papel no fomento dos levantamentos actuais.»

Noutra passagem igualmente esclarecedora e «sem rodeios», destacada por Blumenthal, Waddell afirma que «o actual envolvimento da NED na alimentação de grupos da sociedade civil na Nicarágua deita luz sobre o poder do financiamento transnacional de influir nos resultados políticos no século XXI».

Waddell defende os resultados da NED e nem se esquece do seu papel nas Primaveras Árabes... Ainda em relação à Nicarágua, afirma que o organismo intervencionista norte-americano gastou 4,1 millhões de dólares entre 2014 e 2017, financiando 54 «projectos» para «criar as bases para a insurreição» – a «mudança», em versão posterior, alterada do texto.

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