Em 28 de Agosto deste ano, António Guterres exigiu o fim de «mentiras», «desculpas» e «obstáculos» do governo israelita à ajuda humanitária em Gaza. As imagens divulgadas pela TV, os comentários jornalísticos e a recente eliminação física de cinco jornalistas, em 25 de agosto, demonstram bem a fúria e amplitude do massacre em curso num contexto de cerca de 63 000 palestinianos mortos, parte considerável dos quais constituída por crianças, mulheres e idosos.
Netanyahu pertence àquela classe de políticos «fora da lei» para quem a Carta das Nações Unidas, as Resoluções do Conselho de Segurança, o direito internacional, a democracia e os direitos humanos são letra morta. É com base neste postulado que, fugindo à prática do consenso mundial civilizacional de nações democráticas, considerou o secretário-geral da ONU persona non grata no Estado de Israel.
Este indivíduo é um político vulgar que não tem pejo em pôr em causa a dignidade da religião a que pertence, utilizando-a para fins políticos. Por outro lado, faz desacreditar o seu próprio povo, invocando-o para a prática de atrocidades humanitárias, estas que mereceram já críticas de altas individualidades israelitas, como o escritor David Grossman (entrevista ao jornal italiano La República de 1 de Agosto de 2025) e Moshe Yaalon (antigo ministro de defesa de Israel), (o 1.º alude ao genocídio e o 2.º a crimes de guerra).
«Este indivíduo é um político vulgar que não tem pejo em pôr em causa a dignidade da religião a que pertence, utilizando-a para fins políticos. Por outro lado, faz desacreditar o seu próprio povo, invocando-o para a prática de atrocidades humanitárias, estas que mereceram já críticas de altas individualidades israelitas (...).»
As chamadas IDF – Forças Armadas de Israel não estão isentas de responsabilidade e culpa apesar da alegação de que «cumprem ordens». Elas dispõem de meios mais modernos de tecnologia bélica, mesmo baseada na IA, nada justificando por isso a proporção de civis indiscriminada e aleatoriamente trucidados. Esta atuação viola a Resolução do Conselho de Segurança n.º 1655 de 31 de janeiro de2006; o artigo 3.º da Convenção de Genebra relativa à Proteção de Pessoas Civis em Tempo de Guerra, de 12 de agosto de 1949 e o Direito Internacional Humanitário (t.c.p. Direito Internacional de Conflitos Armados) que tem o seu fundamento na IV Convenção de Genebra e seus Protocolos Adicionais de 1977 e 2005.
As recentes manifestações em Israel vêm demonstrar que o povo já não acredita na motivação de «libertação de reféns» propalada por Netanyahu para justificar a sua fúria destruidora de bens e pessoas civis de Gaza, desde logo porque nada garante que os cadáveres de reféns que vão sendo encontrados não possam ser o resultado do indiscriminado bombardeamento a que a Faixa de Gaza é sujeita. Aliás, o bom senso aponta que, em termos negociáveis do lado de Hamas, um refém vivo valeria mais que um refém morto.
Em termos da política internacional, à parte, o prometido reconhecimento de um Estado Palestiniano por ocasião da próxima Assembleia-Geral da ONU, é de domínio público o quase incondicional apoio dos EUA à política do Estado de Israel – «a Riviera de Gaza» incluída.
«As recentes manifestações em Israel vêm demonstrar que o povo já não acredita na motivação de «libertação de reféns» propalada por Netanyahu para justificar a sua fúria destruidora de bens e pessoas civis de Gaza»
Neste ponto é de avaliar é a posição da UE sobre este conflito, tendo em conta que esta se assume depositária de valores democráticos e de respeito pelos direitos humanos. Para salvar a face, Kala Kallas, Alta-Comissária da UE para Negócios Estrangeiros, informou que haviam sido «acordadas medidas significativas por parte de Israel para melhorar a situação humanitária na Faixa de Gaza». Tudo não passou, porém, de uma miragem já que, quando este escrito é elaborado, a Faixa de Gaza é qualificada de «cemitério de direito humanitário internacional» (declaração de Phillipe Lazzarini – Chefe da Agência da ONU de Assistência aos Refugiados da Palestina - UNRWA - ao El País, em 3 de setembro de 2025).
Aqui chegados, e feito este breve balanço da realidade no Médio Oriente, o que será que o futuro reserva neste domínio? Ameaças graves perfilam no horizonte. A repulsa generalizada que continua a se registar por este mundo fora é de molde a colocar historicamente Netanyahu como o político maquiavélico do séc. XXI e de ser o responsável pelo eventual ressurgimento de um antissemitismo israelita, que parecia estar a desvanecer-se em homenagem ao Holocausto nazi. Por outro lado, as feridas geradas deste conflito serão muito difíceis de sarar e podem gerar condições propícias para um estalar de novas organizações anti-israel, caso um Estado Palestiniano não entre em efetividade.
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