Após um mês de protestos contra as medidas anti-populares do governo do presidente Daniel Noboa, a CONAIE decidiu suspender a greve em curso e «recuar para os nossos territórios para proteger a vida das nossas gentes», informa a TeleSur.
Marlon Vargas, dirigente da confederação indígena, exigiu ao presidente Noboa «a desmilitarização das comunidades, a libertação dos detidos e reparações às famílias das vítimas». Exortou também as bases a não terminar mas ampliar a luta a partir de «assembleias territoriais permanentes», preparando «a defesa da democracia e dos direitos do povo» através da oposição à proposta de consulta que o presidente Noboa se propõe realizar em Novembro próximo, para autorizar a instalação de bases militares estrangeiras no país, cessar o apoio do Estado aos partidos políticos legalizados e promover uma Assembleia Constituinte para alterar a actual Constituição.
Aumento dos combustíveis foi rastilho para alargamento reivindicativo
A eliminação do subsídio ao diesel, que fez disparar o preço do galão de 1,80 para 2,80 dólares (um aumento de 56%), foi o rastilho para o desencadear de uma luta com reivindicações mais amplas, entre as quais a redução do IVA de 15 para 12%, o aumento do salário mínimo, um maior investimento social, a defesa do território face à rapina das indústrias mineiras e a já referida consulta com vista a alterações constitucionais.
Os protestos tiveram por epicentro a localidade de Imbabura, região de forte implantação indígena e mestiça no norte do Equador, mas com o passar dos dias estenderam-se à capital, Quito, a Cuenca e a Guayaquil, onde estudantes, trabalhadores e colectivos sociais se juntaram à greve.
A mobilização indígena, uma das mais prolongadas desde as jornadas de 2022 contra o anterior presidente, Guillermo Lasso, evidenciou a fractura entre Governo e povos indígenas, bem como o descontentamento face ao aumento do custo de vida e à insegurança.
Os bloqueios de estrada atingiram 11 vias principais e cortes intermitentes em diversas outras. O governo declarou o estado de excepção, que proíbe o encerramento de estradas, e fez intervir forças policiais e militares. A repressão causou já três mortos, 15 desaparecidos, cerca de 300 feridos e mais de 200 detidos entre os manifestantes.
Segundo organizações locais de direitos humanos, entre as quais a Aliança pelos Direitos Humanos do Equador, dois dos mortos foram por impacto directo de balas e um terceiro, uma mulher de 61 anos, por inalação fatal de gás lacrimogéneo.
As prisões efectuadas foram feitas com recurso a disparos directos sobre os detidos, inclusive dentro de habitações.
Autoritarismo e impopularidade de Noboa crescem a par
Para a TeleSur, a greve confirmou o autoritarismo crescente do presidente Daniel Noboa e a sua incapacidade de diálogo. O governo, pela voz do ministro do Interior, John Reinberg, rejeitou a continuação de conversações com as comunidades locais, alegadamente por «falta de condições», tendo acusado a CONAIE de «usar as mobilizações para fins políticos».
O conflito desenrola-se no contexto de uma crescente tensão política, marcada pela quebra de popularidade de Noboa e as críticas de sectores sociais ao acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), que teria impulsionado a eliminação do subsídio ao preço do combustível.
Analistas, como o ex-ministro Francisco Jiménez, advertem que o Executivo subestimou a capacidade de mobilização indígena e falhou ao não conseguir estabelecer canais de diálogo legítimos. «Os governos não podem impor-se com quem se sentam a negociar. Se as organizações não reconhecem o interlocutor, o diálogo não funciona», afirmou Jiménez.
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