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Em Montevideu, uma multidão pediu vontade política e justiça para os desaparecidos

A 29.ª Marcha do Silêncio juntou um mar de gente na capital uruguaia, tanta que as avenidas ficaram estreitas e pouco se avançava. Reclamou-se memória, verdade e justiça para os presos desaparecidos na ditadura.

A 29.ª Marcha do Silêncio juntou uma multidão em Montevideu CréditosCamilo dos Santos / La Diaria

À frente da marcha, seguiram os membros da associação Mães e Familiares de Uruguaios Presos Desaparecidos, junto a uma faixa que mostrava o lema anunciado para este 20 de Maio: «Eles sabem ondem estão! Exigimos respostas. Terrorismo de Estado nunca mais. Memória, verdade e justiça».

No contexto da mobilização, organizada desde 1996, Elena Zaffaroni, membro da associação, disse que se pedem respostas ao Estado, aos governantes, a quem tem o «poder de mandar nas Forças Armadas, de exigir, porque a verdade está aí».

Sobre a lei dos arquivos da ditadura que serão colocados à disposição do público sem restrições, Zaffaroni defendeu que se trata de arquivos «conhecidos há muitos anos», tendo denunciado que, entre eles, não se encontram os dos serviços secretos, os que dizem o que fizeram aos desaparecidos.

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«Há indícios de que tudo isso está guardado mas não lhe acedemos, nunca lhe acedemos», afirmou, sublinhando que é a instituição militar no país que mantém a «verdade escondida».

No mesmo sentido se pronunciou Alba González, também membro da Mães e Familiares: «Exortamos a sociedade e exigimos respostas e que se entregue a informação que as Forças Armadas mantêm retida até hoje.»

Um mar de gente

Apesar do intenso frio, juntou-se tanta gente na Marcha do Silêncio que esta pareceu por momentos perder a característica de manifestação e assumir a de uma enorme concentração, sem avançar ou fazendo-o lentamente.

Em declarações a La Diaria, Nilo Patiño, igualmente membro da associação, congratulou-se com a grande adesão à marcha, que também se realiza noutros pontos do país austral, no aniversário dos assassinatos, perpetrados em 1976 em Buenos Aires, de Zelmar Michelini, Héctor Gutiérrez Ruiz, Rosario Barredo e William Whitelaw, e evoca o desaparecimento do comunista Manuel Liberoff, a 19 de Maio de 1976, igualmente na capital argentina.

Em destaque, como é hábito, as fotos dos presos desaparecidos durante a ditadura (1973-1985), assim como cartazes a reclamar justiça. Nalguns perguntava-se «Onde estão?». Noutro lia-se: «Como teria sido a vida com eles?»

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«Para mim é impressionante a quantidade de gente que vem à marcha», destacou Patiño, afirmando que, de ano para ano, as pessoas têm vindo a aderir cada vez mais, «implicando cada vez mais sectores da sociedade».

Só pelas 21h a manifestação chegou à Praça Cagancha, onde foram lidos os nomes dos 197 presos desaparecidos e se cantou o hino nacional.

Avanços lentos

Em Junho do ano passado, encontraram-se os restos ósseos de uma mulher no Batalhão de Infantaria Pára-quedista 14, em Toledo. No entanto, a Instituição Nacional de Direitos Humanos, que trabalha na busca dos presos desaparecidos da ditadura, ainda não conseguiu identificar estes restos – os sextos encontrados desde que começaram os trabalhados de busca, em 2005.

Os primeiros a ser encontrados foram os de Ubagésner Chaves Sosa, operário metalúrgico e militante do Partido Comunista, em 2005; seguiram-se, no mesmo ano, os do escrivão Fernando Miranda, também militante do Partido Comunista.

Em 2011, foram encontrados os do professor Julio Castro (atado com arame e com um buraco de bala no crânio); em 2012, foram encontrados os restos de Ricardo Blanco, militante do Partido Comunista Revolucionário, e, em 2019, os de Eduardo Bleier, militante do Partido Comunista.

A este propósito, Patiño disse que, apesar dos avanços, persiste «a mesma dívida pendente dos governos», porque «falta decisão política».

No actual cenário de campanha eleitoral, disse que seria muito bom que «todos os partidos políticos se envolvessem», dessem uma resposta às reivindicações da Mães e Familiares de Uruguaios Presos Desaparecidos.

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