Discursando na 77.ª Assembleia Geral das Nações Unidas, Joe Biden surgiu no papel de grande Tartufo, num discurso pleno de demagogia, de fio a pavio atravessado pelo cinismo, a hipocrisia e a mentira. Centrando-se na guerra na Ucrânia, o presidente norte-americano adoptou a postura de «gato de fora com o rabo escondido», numa chocante encenação do lobo em pele de cordeiro. Entre outras pérolas, afirmou: [esta é] «uma guerra escolhida por um homem»[Putin]; «ninguém ameaçou a Rússia, e ninguém além da Rússia procurou o conflito».
O presidente russo é retratado como a besta negra que esgrime «ameaças nucleares contra a Europa». Ao invés, transmutado em impoluto paladino da Carta da ONU, Biden asseverou: «rejeito o uso da violência e da guerra para conquistar nações ou expandir fronteiras através do derramamento de sangue».
A afirmação, condensando o tom de toda a intervenção, constitui um rude insulto à verdade. Por muito que (não) pese aos urradores do «mundo livre» e demais servidores encartados do pensamento único, nada é menos consentâneo com a doutrina e a prática continuadas dos EUA, de que a prestação da sua Administração, a meio do mandato, também é prova cabal.
Os EUA são os campeões do espezinhamento do direito internacional e do seu revisionismo arbitrário, propugnando a fórmula ardilosa de «um mundo baseado em regras». A grande potência imperialista encontra-se há décadas em estado de guerra permanente, fora das suas fronteiras. Jugoslávia, Afeganistão, Iraque, Síria, Líbia, são apenas alguns exemplos mais recentes, de uma lista longa de intervenções dos EUA (e da NATO), que afrontaram o espírito e a letra da Carta das Nações Unidas. Pelo meio, temos Guantánamo e a infame guerra ao terror, a institucionalização das execuções arbitrárias em operações encobertas e à distância (com recurso a drones). Não chegando porém para abalar os pilares da ordem livre e democrática internacional emanada do sistema de poder em Washington.
Após as declarações de Biden sobre o uso da força militar em Taiwan, rapidamente «esclarecidas» pela Casa Branca, a China avisou os EUA para não usarem essa «cartada», porque «se podem queimar». O Gabinete dos Assuntos de Taiwan do Conselho de Estado chinês acusou os Estados Unidos de usarem a «cartada de Taiwan para conter a China», depois de o presidente norte-americano ter afirmado claramente, em Tóquio, que o seu país interviria militarmente para defender a ilha, em caso de um ataque da China. O porta-voz do gabinete, Zhu Fenglian, afirmou esta segunda-feira que os EUA estão a «brincar com o fogo», avisando que «se podem queimar», refere a agência Xinhua. Reafirmando que o princípio de «Uma só China» é a base política das relações sino-americanas, Zhu instou os EUA a não fazerem quaisquer declarações ou acções que violem esse princípio e os comunicados conjuntos dos dois países. A declaração chinesa segue-se ao «sim» dito por Joe Biden, numa conferência de imprensa em Tóquio, quando questionado sobre o eventual envolvimento militar dos EUA na defesa de Taiwan. «Esse é o compromisso que fizemos», disse, dando a entender uma aparente mudança de posição na política dos Estados Unidos. «Ouça, é esta a situação: concordamos com a política de "Uma só China", aderimos a ela e a todos os acordos feitos a partir daí», disse, acrescentando que «a ideia de que [Taiwan] possa ser tomada pela força não é correcta, destabilizaria toda a região». As declarações de Biden, entendidas como «perigosas» por vários jornalistas norte-americanos, segundo refere hoje a agência Prensa Latina, mereceram um esclarecimento rápido da parte do secretário da Defesa, Lloyd Austin, que, no Pentágono, disse à imprensa que as afirmações do presidente norte-americano não representavam uma fuga à política de «Uma só China», mantida nas últimas décadas. O novo pacto de «defesa e segurança» firmado por Austrália, EUA e Reino Unido marca uma escalada grave na nova guerra fria com a China, advertiu a coligação britânica Stop the War. «Os submarinos nucleares e mísseis de cruzeiro não visam a protecção, mas a agressão», referiu esta quinta-feira a organização na sua conta de Twitter. A Stop the War Coalition, conhecida pelas campanhas contra a guerra e pela defesa de uma política assente na cooperação e na diplomacia, sublinhou ainda que o acordo trilateral deixou claro que o Reino Unido Global defendido pelo primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, significa «mais militarismo e confronto». Também Jeremy Corbyn, ex-líder do Partido Trabalhista, se posicionou ontem contra a nova aliança, afirmando que «começar uma nova guerra fria não trará paz, justiça e direitos humanos ao mundo». Sem se referir às tensões persistentes com a China, o primeiro-ministro australiano anunciou melhoramentos substanciais em quatro bases no Norte e o alargamento dos exercícios militares com os EUA. Scott Morrison, que evitou mencionar as disputas comerciais e diplomáticas crescentes com a China, afirmou que a Austrália precisa de expandir os seus recursos militares no Território do Norte para ser capaz de responder a tensões (não especificadas) na região da Ásia-Pacífico. «O nosso objectivo é um Indo-Pacífico livre e aberto, para assegurar uma região de paz, uma região em que, ao mesmo tempo, a Austrália esteja sempre em condições de proteger os seus interesses», disse Morrison à imprensa esta quarta-feira, em Darwin, citado pela Reuters. Na ocasião, o político conservador anunciou um orçamento de 580 milhões de dólares destinados a modernizar quatro bases militares no Território do Norte – entre 2021 e 2026 – e a expandir os exercícios militares conjuntos com as tropas norte-americanas. A verba agora anunciada, refere a agência, faz parte de um plano de investimentos militares mais amplos do país austral, de acordo com o qual Canberra deve gastar 270 mil milhões de dólares na próxima década para melhorar a sua capacidade de ataque de longo alcance. Vários académicos chineses estão a cortar a comunicação com os seus colegas australianos e a cancelar os planos de viagem à Austrália, num contexto de crescente «retórica virulenta contra a China». De acordo com uma peça publicada esta terça-feira na Australian Financial Review (AFR), intitulada «Os centros de pensamento da China cortam ligações académicas enquanto as hostilidades crescem» [tradução nossa], alguns académicos chineses disseram que se está a tornar «quase impossível colaborar com universidades australianas por causa do crescendo da retórica anti-China». A agência Xinhua refere que este cenário é subsequente a uma reportagem de investigação «parcial» do periódico The Australian sobre o programa chinês Plano dos Mil Talentos, na qual, citando o director do FBI, Christopher Wray, o jornal «procurou retratar o programa chinês de recrutamento de talentos estrangeiros como "espionagem económica e uma ameaça à segurança nacional"». A Academia das Ciências da Austrália afirmou que seria «uma grande pena se o esforço global de investigação fosse posto em causa por calúnias sem fundamento», enquanto a Universities Australia declarou que a maior parte da pesquisa de relevo no país ocorreu para lá das fronteiras nacionais e «com investigadores chineses», refere a mesma fonte. Por seu lado, Wang Xining, representante da Embaixada chinesa na Austrália, sublinhou que a ciência e a tecnologia faziam parte da cooperação China-Austrália. «Trouxe e há-de trazer um bem enorme aos nossos negócios, à nossa sociedade e ao nosso povo», disse. «seria "uma grande pena se o esforço global de investigação fosse posto em causa por calúnias sem fundamento"» Academia das Ciências da Austrália Enquanto os cientistas trabalham para «espalhar a luz», alguns órgãos de comunicação social «lançam sombras», disse Wang, acrescentando que a Embaixada foi sempre questionada com base em «boatos e bisbilhotices», que eram «extravagantes e absurdas». A Xinhua lembra que, quando surgiu a pandemia de Covid-19, o Herald Sun a classificou como «vírus chinês». Além disso, na sequência da detenção de Jimmy Lai Chee-ying, instigador dos distúrbios em Hong Kong e fundador do jornal Apple Daily, a imprensa australiana apresentou-o como um «herói», sem ter em conta aqueles que, em Hong Kong, tinham um posicionamento diferente. Mas nem todos os jornalistas australianos alinharam pela mesma bitola. Robert Ovadia, também jornalista, escreveu no Twitter que «o Apple Daily de Lai destruiu a paz e a estabilidade em Hong Kong com mentiras deliberadas para distorcer a percepção» e que o jornal era «propaganda para si mesmo» e não era, «seguramente, nenhum campeão do jornalismo honesto ou da liberdade». Da mesma forma que as acusações lançadas contra o Plano dos Mil Talentos partiram do FBI, «a influência norte-americana encontra-se por trás de muita da retórica contra a China na Austrália», refere a Xinhua. A agência recorda que uma grande quantidade de jornais australianos, incluindo o Herald Sun e The Australian, pertence à News Corp Australia, um dos maiores monopólios mediáticos da Austrália, que faz parte da News Corp sediada nos EUA. «[...] outras vozes afirmam que a Austrália está, de facto, sob "influência americana" e que a "Austrália está cheia de vontade de agradar a Washington"» Segundo um artigo publicado pela AFR, o Instituto Australiano de Política Estratégica (ASPI, na sigla em inglês) «estava a receber aproximadamente 450 mil dólares australianos [cerca de 278 mil euros] do Departamento de Estado norte-americano para seguir colaborações de cientistas chineses com universidades australianas». O ASPI foi responsável por várias peças sobre as políticas na região autónoma uigure de Xinjiang, no Noroeste da China, que foram repetidamente refutadas pelo goveno chinês. Para o antigo embaixador australiano na China Geoff Raby, o ASPI é o «arquitecto da teoria da ameaça chinesa na Austrália». Enquanto alguns políticos australianos se têm manifestado preocupados com a chamada «influência chinesa» no país, outras vozes afirmam que a Austrália está, de facto, sob «influência americana» e que a «Austrália está cheia de vontade de agradar a Washington». Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Alguns especialistas militares chegaram inclusive a sugerir que a Austrália ponderasse o desenvolvimento do potencial nuclear, refere a AFP. No entanto, os críticos de Morrison acusam-no de apostar no militarismo e de encenar uma crise para desviar as atenções da situação parada na vacinação contra a Covid-19 e da queda nas sondagens. O ex-primeiro-ministro Kevin Rudd disse à AFP que Morrison, o ministro da Defesa, Peter Dutton, e Rupert Murdoch, magnata da imprensa de direita, «estavam a tentar desesperadamente virar a agenda política doméstica para longe do desastre das vacinas, do fiasco da mudança climática e dos escândalos de abusos em Canberra». Já Morrison justificou a despesa com o facto de a região Ásia-Pacífico estar a viver o maior nível de incerteza económica e estratégica desde a Segunda Guerra Mundial. Daí, em seu entender, a necessidade de reforçar os exercícios militares com os Estados Unidos, que vê com bons olhos a política agressiva de Canberra. «Os EUA e a Austrália têm estado profundamente envolvidos na cooperação defensiva há mais de meio século», disse o encarregado de negócios na Embaixada norte-americana em Canberra, Michael Goldman, que também não se referiu à China. Mais de 2000 fuzileiros norte-americanos encontram-se no Norte da Austrália para participar em actividades militares conjuntas. Os dois aliados costumam realizar exercícios militares de dois em dois anos no país austral, habitualmente com uma participação superior a 30 mil tropas. O próximo deve começar em Agosto. O anúncio de Scott Morrison ocorre poucos dias depois de o Secretário do Departamento de Assuntos Internos, Mike Pezzullo, ter afirmado que as democracias liberais têm de se preparar para a guerra. Pezzullo não especificou a razão de ser para este alerta, mas, de acordo com a Reuters, as suas afirmações inserem-se no contexto da deterioração das relações com a China. No domingo, o ministro australiano da Defesa também se referiu à possibilidade de um conflito entre a China continental e Taiwan. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Boris Johnson, o primeiro-ministro australiano, Scott Morrison, e o presidente norte-americano, Joseph Biden, anunciaram na véspera a criação de uma associação de defesa trilateral na região Ásia-Pacífico, que é encarada como uma forma de fazer frente à influência da China na região. No âmbito do pacto, conhecido como Aukus, a Austrália vai adquirir uma frota de submarinos nucleares fabricados com tecnologia norte-americana e mão-de-obra britânica, informa a agência Prensa Latina. A França, país-membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) e aliado das três potências referidas, também reagiu mal ao anúncio, na medida em que o governo australiano decidiu rescindir um contrato no valor de 66 mil milhões de dólares assinado com a indústria de armamento francesa com vista à construção de submarinos. Zhao Lijian, porta-voz do Ministério chinês dos Negócios Estrangeiros, afirmou esta quinta-feira que a exportação, por parte dos EUA e do Reino Unido, de tecnologia de submarinos nucleares para a Austrália é «extremamente irresponsável», noticia a Xinhua. Vários académicos chineses estão a cortar a comunicação com os seus colegas australianos e a cancelar os planos de viagem à Austrália, num contexto de crescente «retórica virulenta contra a China». De acordo com uma peça publicada esta terça-feira na Australian Financial Review (AFR), intitulada «Os centros de pensamento da China cortam ligações académicas enquanto as hostilidades crescem» [tradução nossa], alguns académicos chineses disseram que se está a tornar «quase impossível colaborar com universidades australianas por causa do crescendo da retórica anti-China». A agência Xinhua refere que este cenário é subsequente a uma reportagem de investigação «parcial» do periódico The Australian sobre o programa chinês Plano dos Mil Talentos, na qual, citando o director do FBI, Christopher Wray, o jornal «procurou retratar o programa chinês de recrutamento de talentos estrangeiros como "espionagem económica e uma ameaça à segurança nacional"». A Academia das Ciências da Austrália afirmou que seria «uma grande pena se o esforço global de investigação fosse posto em causa por calúnias sem fundamento», enquanto a Universities Australia declarou que a maior parte da pesquisa de relevo no país ocorreu para lá das fronteiras nacionais e «com investigadores chineses», refere a mesma fonte. Por seu lado, Wang Xining, representante da Embaixada chinesa na Austrália, sublinhou que a ciência e a tecnologia faziam parte da cooperação China-Austrália. «Trouxe e há-de trazer um bem enorme aos nossos negócios, à nossa sociedade e ao nosso povo», disse. «seria "uma grande pena se o esforço global de investigação fosse posto em causa por calúnias sem fundamento"» Academia das Ciências da Austrália Enquanto os cientistas trabalham para «espalhar a luz», alguns órgãos de comunicação social «lançam sombras», disse Wang, acrescentando que a Embaixada foi sempre questionada com base em «boatos e bisbilhotices», que eram «extravagantes e absurdas». A Xinhua lembra que, quando surgiu a pandemia de Covid-19, o Herald Sun a classificou como «vírus chinês». Além disso, na sequência da detenção de Jimmy Lai Chee-ying, instigador dos distúrbios em Hong Kong e fundador do jornal Apple Daily, a imprensa australiana apresentou-o como um «herói», sem ter em conta aqueles que, em Hong Kong, tinham um posicionamento diferente. Mas nem todos os jornalistas australianos alinharam pela mesma bitola. Robert Ovadia, também jornalista, escreveu no Twitter que «o Apple Daily de Lai destruiu a paz e a estabilidade em Hong Kong com mentiras deliberadas para distorcer a percepção» e que o jornal era «propaganda para si mesmo» e não era, «seguramente, nenhum campeão do jornalismo honesto ou da liberdade». Da mesma forma que as acusações lançadas contra o Plano dos Mil Talentos partiram do FBI, «a influência norte-americana encontra-se por trás de muita da retórica contra a China na Austrália», refere a Xinhua. A agência recorda que uma grande quantidade de jornais australianos, incluindo o Herald Sun e The Australian, pertence à News Corp Australia, um dos maiores monopólios mediáticos da Austrália, que faz parte da News Corp sediada nos EUA. «[...] outras vozes afirmam que a Austrália está, de facto, sob "influência americana" e que a "Austrália está cheia de vontade de agradar a Washington"» Segundo um artigo publicado pela AFR, o Instituto Australiano de Política Estratégica (ASPI, na sigla em inglês) «estava a receber aproximadamente 450 mil dólares australianos [cerca de 278 mil euros] do Departamento de Estado norte-americano para seguir colaborações de cientistas chineses com universidades australianas». O ASPI foi responsável por várias peças sobre as políticas na região autónoma uigure de Xinjiang, no Noroeste da China, que foram repetidamente refutadas pelo goveno chinês. Para o antigo embaixador australiano na China Geoff Raby, o ASPI é o «arquitecto da teoria da ameaça chinesa na Austrália». Enquanto alguns políticos australianos se têm manifestado preocupados com a chamada «influência chinesa» no país, outras vozes afirmam que a Austrália está, de facto, sob «influência americana» e que a «Austrália está cheia de vontade de agradar a Washington». Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Para o funcionário da China, a medida mina a paz e a estabilidade regionais, intensifica a corrida às armas e compromete os esforços internacionais de não proliferação nuclear. Zhao lembrou que a Austrália é um país sem armamento nuclear, tendo em conta que assinou e ratificou o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares e integra a Zona Livre de Armas Nucleares do Pacífico Sul. A este propósito, a primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, disse esta quinta-feira que irá vetar a entrada aos submarinos nucleares australianos nas águas territoriais neozelandesas, no contexto da sua política anti-nuclear, indica a TeleSur. Zhao instou os países em causa a abandonarem a «mentalidade desactualizada da guerra fria» e uma «percepção geopolítica estreita», bem como a contribuírem para a paz, a estabilidade e o desenvolvimento. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Austin disse inclusive que os EUA estão empenhados na paz e na estabilidade no Estreito de Taiwan. Já esta terça-feira, Joe Biden reafirmou a continuidade da política de «ambiguidade estratégica» em relação a Taiwan. Ainda em Tóquio, Biden disse que essa política «não mudou de forma nenhuma». Na capital nipónica, o presidente participa numa reunião do Diálogo de Segurança Quadrilateral (QUAD) – que integra os EUA, a Austrália, a Índia e o Japão, e é considerada uma aliança para travar a China na região. Também o Quadro Económico Indo-Pacífico (IPEF, na sigla em inglês), que reúne mais de uma dezena de países e inclui potências como os EUA, o Japão ou a Coreia do Sul, é encarado pela China como uma forma de lhe fazer frente e reafirmar a presença de Washington na região, em declínio nos últimos anos. Apesar das afirmações de Joe Biden de que o bloco vai trazer desenvolvimento e benefícios para a Ásia-Pacífico, a China afirma que a iniciativa não esconde «as intenções sinistras de Washington» de fomentar «a divisão e o isolamento», bem como de «minar a estabilidade regional e manter a hegemonia dos EUA», segundo refere um editorial ontem publicado na Xinhua. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Internacional|
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A mão americana na desestabilização das relações China-Austrália
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A CIA e o «estado profundo» continuam a promover as forças terroristas que os EUA invocam combater para desestabilizar estados soberanos, como acontece na Síria, país que os EUA procuram esfacelar e, embora fracassando na tentativa de derrubar o governo legítimo de Damasco, prosseguem a pilhagem organizada do seu petróleo, perante o escandaloso silêncio da «comunidade ocidental». E agora a explosão da tragédia da Ucrânia, sacrificada em prol do objectivo de enfraquecer e golpear a fundo – até onde for possível – a Federação Russa. Um processo começado a desenhar-se com a desintegração da URSS e o triunfo da restauração capitalista, merecendo todo o empenho e apoio dos EUA e potências do G7.
O alvo central da actual estratégia de confrontação no mundo é a China, o grande adversário sistémico à hegemonia, em declínio, das forças do imperialismo. Simultaneamente, é cada vez mais clara a conexão entre o significado da guerra na Ucrânia, em que a Rússia se afigura o elo estratégico mais fraco, e a larga frente dos EUA de desestabilização da China, incluindo a instrumentalização da questão muito sensível de Taiwan, com a política de Washington a testar linhas vermelhas muito grossas.
O discurso de Biden na tribuna da ONU representa um péssimo sinal, no momento em que o conflito na Ucrânia ameaça conduzir a uma escalada de incalculáveis consequências para a Europa e o mundo, e a própria dinâmica da crise capitalista, agravada pela guerra e a bateria draconiana de sanções impostas à Rússia, coloca na ordem do dia o espectro de uma nova recessão económica.
Na guerra a verdade costuma ser a primeira a tombar. Os círculos dominantes nos dois lados do Atlântico, seguidos pelo exército de formatadores da opinião pública dos grandes meios de comunicação, insistem na tecla gasta da demonização da Rússia e fulanização das causas do conflito, centradas basicamente na culpabilização de Pútin. Uma russofobia sem precedentes, activamente cultivada nos últimos anos, inquina a atmosfera internacional.
Os expedientes da deturpação massiva e reducionismo máximo procuram amplificar o efeito da propaganda, apelando a reflexos e instintos básicos. A mensagem de fundo debitada pelos média do sistema há meses a fio compara Pútin a Hitler, apresenta o líder russo como um ser maligno tomado pela irracionalidade. Que tem agora a humanidade tomada como refém da chantagem nuclear russa.
Contudo, a substância dos factos mostra-nos outra realidade. Na verdade, os EUA são desde a criação da arma nuclear o grande proliferador. Foram os únicos a usá-la (contra o Japão, em 1945), não o fazendo num contexto defensivo, mas para afirmar a sua superioridade perante a URSS que não possuía esta arma. Era o alvor da Guerra Fria, ainda não terminada a II Guerra Mundial. Washington nunca deixou de procurar a supremacia nuclear.
Nos anos 90, tirando partido da fraqueza e caos imperante na Rússia e no espaço pós-soviético, os EUA tentaram promover o desarmamento unilateral e tomar «controlo» do arsenal nuclear russo, com a monitorização de equipas de «inspectores» no terreno. Restam poucas dúvidas de que sem o arsenal nuclear legado pela URSS, a Federação Russa teria conhecido o destino da Jugoslávia no final do século XX.
Em 2002, durante a presidência de G.W. Bush, os EUA romperam unilateralmente o tratado ABM de defesa antimíssil assinado em 1972 com a URSS, dando início ao projecto de instalação do sistema de escudo antimíssil global, justificado com as ameaças fictícias ou empoladas provenientes da Coreia do Norte e Irão. Como é sabido, os seus alvos reais são as capacidades nucleares da Rússia e China e o que se pretende com este projecto ofensivo é anular o potencial dissuasor estratégico, principalmente da Rússia, o que permitiria aos EUA desferir um primeiro ataque nuclear impune.
É um projecto de subversão do equilíbrio estratégico mundial, sublinhe-se. Raiz da verdadeira chantagem nuclear dos nossos dias. Tanto mais que os EUA adoptaram paralelamente o programa de ataque global imediato, visando atingir qualquer alvo no planeta em menos de uma hora. Os EUA são hoje a única potência nuclear que tem estacionadas armas nucleares em bases militares em outros países, incluindo na Europa. A máquina militar dos EUA e da NATO tem sido incessantemente reforçada nas fronteiras da Rússia, muito antes da escalada de guerra em curso na Ucrânia.
«Como é sabido, os seus alvos reais são as capacidades nucleares da Rússia e China e o que se pretende com este projecto ofensivo é anular o potencial dissuasor estratégico, principalmente da Rússia, o que permitiria aos EUA desferir um primeiro ataque nuclear impune.»
À conta do escudo antimíssil, em países como a Roménia e Polónia, os EUA procedem à instalação de sistemas de lançadores universais, capazes de disparar não só mísseis antimísseis, mas também mísseis cruzeiro de ataque. Com ogivas convencionais ou, no limite, nucleares.
Neste contexto, os EUA, em 2019, durante a Administração Trump, saíram unilateralmente do acordo de eliminação de armas nucleares (terrestres) de curto e médio alcance (armas nucleares tácticas), assinado em 1987 com a União Soviética. Acresce que, nos últimos anos, o Pentágono tem reforçado os programas de modernização de armas nucleares e investido na criação de armas nucleares mais pequenas e leves, aptas para a utilização em contextos tácticos de teatro de guerra. Os EUA estão na vanguarda dos projectos de militarização do espaço cósmico, inclusive com armas ofensivas, e recusam a proposta da Rússia e da China de um tratado para o impedir.
Estas são apenas algumas peças principais de um puzzle que tem de ser tomado no seu conjunto. Os EUA têm actuado de forma consistente para baixar o limiar de emprego da arma nuclear. Trata-se de uma verdadeira chantagem nuclear conduzida pelos EUA contra a Rússia (e a China). Na essência, a guerra na Ucrânia é a consequência desta política belicista e de confrontação levada a cabo pelos EUA e aliados, empurrando completamente Moscovo contra as cordas. Ainda em 2008, Fidel Castro advertira para o empenho da NATO «em promover uma guerra de extermínio contra a Federação Russa».
É à luz desta complexa situação de degradação da segurança internacional, criada ao longo das últimas décadas, que a Federação Russa, e também a China, procedem à modernização do seu arsenal nuclear e à criação de armas hipersónicas, campo em que se encontrarão à frente dos EUA. Para os dois países é vital defender a sua efectiva capacidade dissuasora estratégica perante a intensificação das ameaças militares dos EUA e aliados. Veja-se a recente constituição da aliança militar AUKUS (EUA, Reino Unido e Austrália), para dotar o país da Oceânia de uma frota de submarinos nucleares (um passo em ruptura com o tratado de não proliferação de armas nucleares, TNP), a par das tentativas de estender a NATO para a Ásia ou criar uma NATO asiática (de que o Quad será o protótipo), visando fundamentalmente a China.
Com vista a garantir a segurança da Europa e impedir o avanço da NATO para leste, a diplomacia russa defende negociações imediatas e a celebração de acordos juridicamente vinculativos. Na sequência do encontro recentemente mantido entre os presidentes russo, Vladimir Putin, e norte-americano, Joseph Biden, o Ministério russo dos Negócios Estrangeiros afirma que «o diálogo é urgentemente necessário», tendo em conta a «linha crítica» para que caminham as relações entre a Federação Russa e o Ocidente. O apelo da Ucrânia aos EUA para que enviem tropas e sistemas anti-mísseis para o país foi classificado pela Rússia como uma «provocação grosseira», que não ficará «sem retaliação». Numa reunião em Washington com o presidente da Jamestown Foundation, Glen Howard, o vice-ministro ucraniano para a Reintegração dos Territórios Não Controlados, Alexei Reznikov, abordou aquilo a que chamou a necessidade de expandir o pacote de segurança para a Ucrânia. Para esse efeito, sugeriu a instalação de meios de defesa anti-aérea dos Estados Unidos e mesmo o destacamento de unidades de tropas norte-americanas, refere a agência TASS. Reznikov defendeu que a legislação ucraniana permite o destacamento de tropas estrangeiras no país e disse estar preocupado com a alegada intenção da Rússia de colocar armas nucleares na Crimeia. Reagindo a estas «especulações» do lado ucraniano, o presidente da Comissão para os Assuntos Externos da Duma Estatal, Leonid Slutsky, recorreu à rede social Telegram para afirmar que o destacamento de sistemas norte-americanos de defesa anti-mísseis na Ucrânia poderia alterar o equilíbrio de forças na região e fora dela, informa a agência russa. O aviso do Kremlin sobre o reforço das fronteiras russas ocorre depois de Kiev se ter referido à «postura pró-activa» dos EUA no «apoio à soberania» e «restauração da integridade territorial» ucraniana. Moscovo alertou que não irá ficar de braços cruzados caso a NATO destaque tropas para a Ucrânia, um passo que «levaria a um novo aumento de tensões perto das fronteiras» e que «requererá medidas adicionais por parte da Rússia para garantir a sua segurança», afirmou esta sexta-feira à imprensa Dmitri Peskov, porta-voz do Kremlin. Antes disto, revela a RT, o Ministério ucraniano da Defesa emitiu um comunicado sobre a conversa telefónica mantida dia 1 de Abril com o secretário da Defesa dos EUA, Lloyd Austin, que comunicou aos ucranianos a «postura pró-activa» do seu país «no apoio à soberania e aos passos para restaurar a integridade territorial da Ucrânia». «Os EUA não deixarão a Ucrânia sozinha face à escalada da agressão da Rússia», afirmou o Ministério ucraniano da Defesa, que acusa Moscovo de anexar e ocupar a Crimeia, e de apoiar o movimento de resistência antifascista na região do Donbass, no Leste do país, onde recentemente, lembra a RT, se registaram novos episódios de violência na linha de demarcação com os territórios das repúblicas de Donetsk e Lugansk. Na entrevista que a RTP1 transmitiu esta segunda-feira, Jens Stoltenberg, secretário-geral da NATO, falou dos «muitos desafios complexos» com que a Aliança Atlântica se depara, mas nada do expansionismo militarista e das guerras de rapina que promove. Quem tiver visto e ouvido, de cabo a rabo, a conversa de Stoltenberg ontem à noite na RTP terá ficado com a impressão de ter acabado de ver e ouvir o cavaleiro branco de uma «santa aliança» pronta a dar cabo dos negrumes do mundo: terrorismo, o Daesh ou chamado Estado Islâmico, as ameaças cibernéticas, a assertividade da Rússia, a proliferação de armas na Coreia do Norte, os conflitos que «existem» no Norte de África, no Médio Oriente, Iraque, Síria, Afeganistão. Conflitos que por aí «há», que por aí «surgiram», e a que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN ou NATO, na sigla em inglês) tem de fazer frente. Apesar de ter passado uma boa parte da entrevista a falar da Rússia, no início o secretário-geral da NATO rejeitou a ideia de que a Aliança Atlântica esteja a «enfatizar a tensão com a Rússia na Europa de Leste», sublinhando que «a maior operação militar de sempre» da NATO decorre no Afeganistão. Não fez, no entanto, qualquer menção ao histórico, mais recente ou afastado, do intervencionismo dos «aliados da NATO» no país da Ásia Central. Também não se esperava que falasse de Reagan e talibans. Referindo-se à acção global da Aliança Atlântica, disse que esta integra «a coligação global para derrotar o Daesh» e que a NATO «fez muitos progressos nessa coligação, derrotando o Daesh no Iraque e na Síria». Mais à frente, não se quis comprometer em excesso, afirmando que a NATO não está no terreno no Norte da Síria: «Apoiamos a coligação com aviões-radar, mas não estamos no terreno», disse. «Também não se esperava que falasse de Reagan e talibans.» Nem «ai», nem «ui» sobre o facto de a coligação internacional que opera na Síria o fazer sem autorização do governo de Damasco e sem um mandato das Nações Unidas. E, aqui, também não houve menção ao esforço da Rússia – ao lado de Damasco. «A Nato está preparada para defender qualquer aliado, contra qualquer ameaça, é essa a mensagem principal, o ideal principal da NATO», disse, salientando que «a razão pela qual a NATO é forte e unida não é para provocar um conflito, mas sim para evitar um conflito». Percebe-se o ultraje sentido por quem olha para o mundo e vê as guerras de agressão e saque do capitalismo, as operações de desestabilização fomentadas pelos Estados Unidos da América no pátio traseiro global – as de agora e outras mais –, tendo a NATO por braço armado. O ex-primeiro-ministro norueguês trouxe ainda à tona a ideia da «paz na Europa durante quase 70 anos, um dos mais longos períodos de paz durante séculos na Europa», sem lhe ocorrer a menção da destruição da Jugoslávia e do golpe de 2014 na Ucrânia, com o apoio dos Estados Unidos e da União Europeia (UE), com a guerra subsequente no Donbass, onde a população rejeitou a ameaça fascista e se ergueu em armas. Sobre a Rússia, Jens Stoltenberg afirmou que «é possível combinar defesa, dissuasão e diálogo». Ou seja, deu sequência ao discurso do vizinho maléfico que acossa a Europa em paz com os seus bandos de hackers e as suas campanhas de propaganda e desinformação. O secretário-geral da NATO disse mesmo que a Rússia está «mais assertiva». Tão marota que até usa «ferramentas diferentes» e, por isso, a impoluta NATO «está a responder com o reforço das ciberdefesas». A UE também já se precaveu. «Parceria estratégica» com a Rússia é coisa que não existe – não por falta de tentativa da NATO, frisou, mas porque Moscovo «decidiu tentar reestabelecer esferas de influência e, de certa forma, controlar os seus vizinhos, como vimos na Geórgia, Moldávia e na Ucrânia». E isto é algo que a NATO, tutelada pelos Estados Unidos da América, carregada de arsenais em prol da paz no mundo e a cavalgar há anos sobre os despojos da União Soviética e amigos, não pode tolerar. Assim, a NATO vai procurar uma forma de dizer que «são firmes», que «são fortes», mas tentando reduzir a tensão, para evitar um conflito e manter um diálogo, disse Stoltenberg. Já a Rússia não tem nada de se preocupar com o facto de estar rodeada por países que se tornaram membros da NATO, pois foi uma decisão de «nações soberanas e independentes». E, se preocupações tem quanto à existência de uma Frente Leste da Aliança Atlântica, a culpa é sua, «consequência directa das [suas] acções agressivas contra a Ucrânia», justificou Stoltenberg, aludindo à situação no Donbass, no Leste da Ucrânia, e à reintegração da Crimeia na Federação Russa. O secretário-geral da NATO insiste que a integridade territorial e a soberania da Ucrânia foram violadas na Crimeia e no Donbass, por forças apoiadas pela Rússia e com apoio militar russo, mas, como se estivesse num universos paralelo, não fez uma alusão, ao golpe de 2014 em Kiev, ao fascismo na Ucrânia – ou na Polónia ou na Letónia. Nem se referiu como, em Julho do ano passado, a NATO promoveu os Irmãos da Floresta, que lutaram «contra o Exército Vermelho pelas suas pátrias», no Báltico, e que integravam muitos membros das SS nazis ou colaboradores com as forças nazis invasoras. O secretário-geral da NATO afirmou que os EUA têm mostrado que «estão empenhados nos laços transatlânticos», acrescentando que Washington está mesmo a aumentar a presença militar no continente europeu, depois de anos de declínio. «É um compromisso que vemos não são só em palavras, mas também em factos», frisou Stoltenberg. Não abordando a questão do aprofundamento da militarização da UE, a criação da chamada cooperação estruturada permanente (CEP) e a complementaridade – que já defendeu noutros momentos – entre aquilo a que chama Defesa Europeia e a NATO, o responsável da Aliança Atlântica sempre se referiu à necessidade de cooperar em matéria de defesa na UE para «resolver a fragmentação da indústria de defesa europeia». Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Peskov, por seu lado, sublinhou que a percepção da Rússia como inimigo e adversário é «deslocada» e «inadmissível», uma vez que Moscovo «não ameaça ninguém e nunca o tinha feito», baseando toda a sua política neste principio, informa o portal russo. Na quinta-feira, em resposta a alertas do lado ucraniano sobre movimentações de tropas russas junto à fronteira, Peskov já tinha afirmado que a transferência de tropas dentro da Federação Russa não devia preocupar ninguém, nem constitui uma ameaça para ninguém, revelou a TASS. O funcionário do Kremlin reafirmou que «as tropas russas nunca participaram, nem estão a participar agora em conflitos armados em solo ucraniano», acrescentando, citado pela mesma fonte, que «nem a Rússia, nem os países europeus, nem outros países do mundo gostariam de ver a guerra civil na Ucrânia incendiar-se outra vez como resultado das provocações e dos passos provocadores dos militares ucranianos». No Donbass, região do Leste da Ucrânia de maioria russa, onde as populações se insurgiram contra o golpe de Estado fascista de Maidan que depôs Viktor Yanukovich, em 2014, patrocinado pela União Europeia e os Estados Unidos, e onde foram autoproclamadas as repúblicas populares de Donetsk e Lugansk, a situação agudizou-se no passado dia 26 de Março, segundo a RT, com a morte de quatro soldados das Forças Armadas ucranianas, perto da localidade de Shumy, embora outras fontes assinalem, já há algum tempo, a violação repetida do cessar-fogo por parte das tropas ucranianas. O novo governo, imposto sem eleições, permitiu que grupos paramilitares fascistas dessem rédeas ao ódio anti-russo e anti-comunista. Milhares de mulheres e homens deram corpo à resistência. Quando se cumpriam quatro anos da rebelião antifascista que se espalhou como pólvora por todo o leste da Ucrânia, atravessei a fronteira através da Rússia num autocarro onde viajavam meia centena de antifascistas de vários países. Respondendo ao apelo do grupo musical italiano Banda Bassotti, que tocou duas vezes em Portugal na Festa do «Avante!», percorreram durante uma semana os territórios em resistência visitando orfanatos, hospitais, fábricas, sindicatos e autarquias. No primeiro dia, entre Rostov-sobre-o-Don, cidade russa no Norte do Cáucaso, e a fronteira com a auto-proclamada República Popular de Lugansk (RPL), atravessámos cerca de uma centena de quilómetros de estepe. Enquanto viajávamos por terras de cossacos, Mitya Dezhnev explicava-me como teve de fugir da sua terra para a Rússia e de como não podíamos deixar esquecer os comunistas que todavia resistiam na Ucrânia controlada por Kiev. «Queres ouvir uma canção que era muito popular no tempo da União Soviética?», perguntou-me em inglês antes de começar num quase perfeito português a cantar o «Avante, camarada!». Foi em 2014, uma semana depois do massacre que vitimou cerca de meia centena de pessoas em Odessa, na Ucrânia, que as populações do leste do país se insurgiram contra o golpe de Estado patrocinado pela União Europeia e pelos Estados Unidos que depôs Viktor Yanukovich. O novo governo, imposto sem eleições, permitiu que grupos paramilitares fascistas dessem rédeas ao ódio anti-russo e anti-comunista. Sem qualquer protecção e ante a ofensiva fascista, milhares de mulheres e homens concentraram-se nas principais praças das localidades insurrectas e deram corpo à resistência. Primeiro, tomaram as instituições e desarmaram as forças de segurança e, depois, organizaram-se militarmente constituindo milícias antifascistas. Nessa semana, as principais regiões da industrial Bacia do rio Don, conhecida como Donbass, declararam a independência e constituíram-se em dois países: a República Popular de Donetsk (RPD) e a RPL. Depois de pesados bombardeamentos que vitimaram milhares de pessoas, o apoio militar russo foi decisivo para evitar a barbárie e a conquista destes territórios por Kiev. O cessar-fogo que formalmente se mantém é desmentido na prática pelos sucessivos confrontos na linha da frente. As sucessivas provocações patrocinadas pela NATO continuam a causar vítimas entre os civis que moram em localidades ao alcance da artilharia ucraniana. Empurrados, primeiro pelas perseguições e depois pela guerra, dezenas de milhares de ucranianos continuam exilados na Rússia ou nas zonas sob controlo das forças democráticas. Neli Zadiraka foi outra das pessoas que conheci nessa condição. É uma das deputadas da sede do poder legislativo da RPL, o Conselho Popular de Lugansk. Foi obrigada a abandonar a sua casa em Rubezhnoe, território da região ocupado pela Ucrânia. Foi ela que, em 2014, leu a declaração de independência da RPL e, por essa razão, é considerada terrorista pelo governo ucraniano. Neli apontou para a estrela vermelha do brasão da jovem república e explicou-me que se inspira nos símbolos e valores da União Soviética. Esse foi, aliás, um elemento presente em toda a viagem. Para além da preservação e do respeito pelos monumentos e símbolos, a presença da foice e do martelo é constante. Em conversa com vários habitantes de Lugansk e Donetsk, a chegada do fascismo ao poder na Ucrânia veio reforçar as convicções políticas dos cidadãos de ambas as repúblicas. Mas não é algo recente. Em 2012, nas últimas eleições antes do golpe fascista, o Partido Comunista da Ucrânia conquistou 13,2% dos votos em todo o país. Em Kiev, obteve somente 7,23% e no ocidente houve regiões em que aquele partido não superou os 2%. Mas no oriente, sobretudo, nas regiões de Donbass, os valores oscilaram entre os 18% de Odessa e os 29,46% de Sebastopol, na Crimeia. Em Donetsk, os comunistas chegaram aos 18,85% e, em Lugansk, atingiram os 25,14% dos votos. Em Makeeva, cidade vizinha de Donetsk, a organização local do Partido Comunista da RPD organizou uma iniciativa cultural que envolveu centenas de pessoas para receber gente de tantos países, numa cerimónia em que se entregaram os cartões a dois combatentes especiais. Um miliciano vindo do Texas e outro da Colômbia que escolheram atravessar o mundo para abraçar a causa antifascista ao lado dos soldados desta região. O colombiano decidiu baptizar-se com o nome de guerra Alfonso Cano em homenagem ao comandante histórico das FARC e contou-me que decidiu voluntarizar-se para combater o fascismo em Donbass como parte das suas convicções políticas. São muitos os combatentes internacionalistas que participam nos exércitos das duas repúblicas. Na companhia de Boris Litvinov, Primeiro Secretário do Partido Comunista da RPD, que foi, aliás, o primeiro a encabeçar o Soviete Supremo da RPD, o novo órgão legislativo daquele país, conhecemos um dos corações industriais da Europa. Antes de chegarmos a uma das mais importantes minas de carvão da Europa, erguia-se um muro escrito recentemente com spray: «Somos cidadãos da União Soviética». Em 2013, antes do golpe, a Ucrânia produzia 84,8 milhões de toneladas. Três anos depois, esses números baixaram para menos de metade: 41,8. O objectivo do imperialismo, quando interveio na Ucrânia, não foi apenas levar mais longe as fronteiras da NATO, violando uma vez mais os compromissos assumidos com os últimos dirigentes soviéticos. Foi também controlar um país com importantes recursos, sobretudo na região que agora resiste ao avanço das forças apoiadas pelos Estados Unidos e União Europeia. Nas últimas semanas, a guerra intensificou-se e muitas das pessoas com que conversei admitem que o governo de Kiev pode estar a preparar uma provocação a larga escala durante o Campeonato Mundial de Futebol. Petro Poroshenko, presidente da Ucrânia, acaba de ser recebido em Espanha por Pedro Sánchez, novo chefe do governo, e falava abertamente ao diário El País do falso assassinato do jornalista Arkadi Babchenko como uma técnica necessária para proteger os dissidentes. Sem qualquer vergonha, acrescentou que há uma campanha russa de notícias falsas para destabilizar o mundo. É este o carácter de um governante que anunciava meses depois do golpe que faria tudo para que as crianças da Ucrânia pudessem ir à escola e para que as de Donbass ficassem fechadas em caves. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Pelas mortes, o governo da Ucrânia responsabilizou «forças de ocupação russas», referindo-se, segundo a RT, a efectivos da República Popular de Donetsk, cujos representantes negaram qualquer ligação ao facto e, posteriormente, declararam que os militares ucranianos morreram por terem pisado um explosivo durante uma inspecção a campos minados. A este propósito, Peskov disse que «não tentava fazer passar os desejos por realidade». «Para nossa desgraça, a realidade na linha de contacto é bastante aterradora, têm lugar provocações por parte das Forças Armadas da Ucrânia, e não são casos isolados, mas múltiplos», afirmou. No que respeita à Crimeia, o governo russo considera a sua integração no país um facto consumado e inteiramente legítimo. A Ucrânia nunca reconheceu os resultados do referendo realizado em Março de 2014, pouco depois do golpe de Estado em Kiev, em que a maioria esmagadora da população do território se pronunciou a favor da reintegração na Rússia. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. O responsável russo classificou o pedido de Reznikov como «uma provocação grosseira» e sublinhou que a presença dos sistemas de defesa aérea dos EUA «perto das fronteiras com a Rússia irá sem dúvida merecer uma resposta da parte de Moscovo». «As tensões vão simplesmente aumentar», alertou Slutsky. «É lamentável que as leis da Ucrânia permitam privá-la do que ainda resta da sua soberania e aos seus cidadãos de uma oportunidade para viver em segurança. Os políticos ucranianos estão dispostos a sacrificar tudo isto para prolongar a sua participação no projecto anti-Rússia», afirmou o funcionário russo. As relações entre Kiev e Moscovo deterioraram-se bastante na sequência do golpe fascista de Maidan, em Fevereiro de 2014, com a Ucrânia a assumir um posicionamento consistente pró-NATO, UE e EUA e anti-russo, a acusar a Rússia de envolvimento na guerra antifascista na região do Donbass e a reclamar a recuperação da Crimeia, depois de os habitantes do território terem votado num referendo esmagadoramente a favor da reintegração na Rússia, em Março de 2014. A Ucrânia tem acolhido no seu território, de forma recorrente, manobras militares organizadas pelos países da NATO, tanto em terra como no Mar Negro. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. «Aumentar o confronto com o nosso país é absolutamente inaceitável», afirma o governo russo num comunicado emitido dia 10, onde defende a adopção de um acordo juridicamente vinculativo que garanta que a Organização do Tratado do Atlântico Norte não avança mais para leste ou instala armamento de ataque nos países que fazem fronteira com a Rússia. Também insiste em receber uma resposta da NATO a propostas previamente formuladas com vista à diminuição das tensões na Europa, nomeadamente sobre a realização de exercícios operacionais a uma distância acordada da linha de contacto Rússia-NATO; a coordenação da aproximação de navios e aviões de combate, para prevenir actividades militares perigosas, sobretudo nas regiões do Báltico e do Mar Negro; a renovação do diálogo regular entre os ministérios da Defesa nos formatos Rússia-EUA e Rússia-NATO. Sobre a conversa telefónica mantida esta segunda-feira entre Vladimir Putin e o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, o gabinete de imprensa do Kremlin refere que a Rússia expôs a necessidade urgente de negociações, que devem ter início «imediato», para estabelecer acordos internacionais que impeçam qualquer expansão adicional do bloco militar. No decorrer da conversa, Johnson manifestou preocupação com um «alegado movimento de tropas russas em larga escala junto à fronteira com a Ucrânia», a que o chefe de Estado russo respondeu com a sua visão da situação actual no país vizinho, de acordo com a nota do Kremlin, a que a RT faz referência. O aviso do Kremlin sobre o reforço das fronteiras russas ocorre depois de Kiev se ter referido à «postura pró-activa» dos EUA no «apoio à soberania» e «restauração da integridade territorial» ucraniana. Moscovo alertou que não irá ficar de braços cruzados caso a NATO destaque tropas para a Ucrânia, um passo que «levaria a um novo aumento de tensões perto das fronteiras» e que «requererá medidas adicionais por parte da Rússia para garantir a sua segurança», afirmou esta sexta-feira à imprensa Dmitri Peskov, porta-voz do Kremlin. Antes disto, revela a RT, o Ministério ucraniano da Defesa emitiu um comunicado sobre a conversa telefónica mantida dia 1 de Abril com o secretário da Defesa dos EUA, Lloyd Austin, que comunicou aos ucranianos a «postura pró-activa» do seu país «no apoio à soberania e aos passos para restaurar a integridade territorial da Ucrânia». «Os EUA não deixarão a Ucrânia sozinha face à escalada da agressão da Rússia», afirmou o Ministério ucraniano da Defesa, que acusa Moscovo de anexar e ocupar a Crimeia, e de apoiar o movimento de resistência antifascista na região do Donbass, no Leste do país, onde recentemente, lembra a RT, se registaram novos episódios de violência na linha de demarcação com os territórios das repúblicas de Donetsk e Lugansk. Na entrevista que a RTP1 transmitiu esta segunda-feira, Jens Stoltenberg, secretário-geral da NATO, falou dos «muitos desafios complexos» com que a Aliança Atlântica se depara, mas nada do expansionismo militarista e das guerras de rapina que promove. Quem tiver visto e ouvido, de cabo a rabo, a conversa de Stoltenberg ontem à noite na RTP terá ficado com a impressão de ter acabado de ver e ouvir o cavaleiro branco de uma «santa aliança» pronta a dar cabo dos negrumes do mundo: terrorismo, o Daesh ou chamado Estado Islâmico, as ameaças cibernéticas, a assertividade da Rússia, a proliferação de armas na Coreia do Norte, os conflitos que «existem» no Norte de África, no Médio Oriente, Iraque, Síria, Afeganistão. Conflitos que por aí «há», que por aí «surgiram», e a que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN ou NATO, na sigla em inglês) tem de fazer frente. Apesar de ter passado uma boa parte da entrevista a falar da Rússia, no início o secretário-geral da NATO rejeitou a ideia de que a Aliança Atlântica esteja a «enfatizar a tensão com a Rússia na Europa de Leste», sublinhando que «a maior operação militar de sempre» da NATO decorre no Afeganistão. Não fez, no entanto, qualquer menção ao histórico, mais recente ou afastado, do intervencionismo dos «aliados da NATO» no país da Ásia Central. Também não se esperava que falasse de Reagan e talibans. Referindo-se à acção global da Aliança Atlântica, disse que esta integra «a coligação global para derrotar o Daesh» e que a NATO «fez muitos progressos nessa coligação, derrotando o Daesh no Iraque e na Síria». Mais à frente, não se quis comprometer em excesso, afirmando que a NATO não está no terreno no Norte da Síria: «Apoiamos a coligação com aviões-radar, mas não estamos no terreno», disse. «Também não se esperava que falasse de Reagan e talibans.» Nem «ai», nem «ui» sobre o facto de a coligação internacional que opera na Síria o fazer sem autorização do governo de Damasco e sem um mandato das Nações Unidas. E, aqui, também não houve menção ao esforço da Rússia – ao lado de Damasco. «A Nato está preparada para defender qualquer aliado, contra qualquer ameaça, é essa a mensagem principal, o ideal principal da NATO», disse, salientando que «a razão pela qual a NATO é forte e unida não é para provocar um conflito, mas sim para evitar um conflito». Percebe-se o ultraje sentido por quem olha para o mundo e vê as guerras de agressão e saque do capitalismo, as operações de desestabilização fomentadas pelos Estados Unidos da América no pátio traseiro global – as de agora e outras mais –, tendo a NATO por braço armado. O ex-primeiro-ministro norueguês trouxe ainda à tona a ideia da «paz na Europa durante quase 70 anos, um dos mais longos períodos de paz durante séculos na Europa», sem lhe ocorrer a menção da destruição da Jugoslávia e do golpe de 2014 na Ucrânia, com o apoio dos Estados Unidos e da União Europeia (UE), com a guerra subsequente no Donbass, onde a população rejeitou a ameaça fascista e se ergueu em armas. Sobre a Rússia, Jens Stoltenberg afirmou que «é possível combinar defesa, dissuasão e diálogo». Ou seja, deu sequência ao discurso do vizinho maléfico que acossa a Europa em paz com os seus bandos de hackers e as suas campanhas de propaganda e desinformação. O secretário-geral da NATO disse mesmo que a Rússia está «mais assertiva». Tão marota que até usa «ferramentas diferentes» e, por isso, a impoluta NATO «está a responder com o reforço das ciberdefesas». A UE também já se precaveu. «Parceria estratégica» com a Rússia é coisa que não existe – não por falta de tentativa da NATO, frisou, mas porque Moscovo «decidiu tentar reestabelecer esferas de influência e, de certa forma, controlar os seus vizinhos, como vimos na Geórgia, Moldávia e na Ucrânia». E isto é algo que a NATO, tutelada pelos Estados Unidos da América, carregada de arsenais em prol da paz no mundo e a cavalgar há anos sobre os despojos da União Soviética e amigos, não pode tolerar. Assim, a NATO vai procurar uma forma de dizer que «são firmes», que «são fortes», mas tentando reduzir a tensão, para evitar um conflito e manter um diálogo, disse Stoltenberg. Já a Rússia não tem nada de se preocupar com o facto de estar rodeada por países que se tornaram membros da NATO, pois foi uma decisão de «nações soberanas e independentes». E, se preocupações tem quanto à existência de uma Frente Leste da Aliança Atlântica, a culpa é sua, «consequência directa das [suas] acções agressivas contra a Ucrânia», justificou Stoltenberg, aludindo à situação no Donbass, no Leste da Ucrânia, e à reintegração da Crimeia na Federação Russa. O secretário-geral da NATO insiste que a integridade territorial e a soberania da Ucrânia foram violadas na Crimeia e no Donbass, por forças apoiadas pela Rússia e com apoio militar russo, mas, como se estivesse num universos paralelo, não fez uma alusão, ao golpe de 2014 em Kiev, ao fascismo na Ucrânia – ou na Polónia ou na Letónia. Nem se referiu como, em Julho do ano passado, a NATO promoveu os Irmãos da Floresta, que lutaram «contra o Exército Vermelho pelas suas pátrias», no Báltico, e que integravam muitos membros das SS nazis ou colaboradores com as forças nazis invasoras. O secretário-geral da NATO afirmou que os EUA têm mostrado que «estão empenhados nos laços transatlânticos», acrescentando que Washington está mesmo a aumentar a presença militar no continente europeu, depois de anos de declínio. «É um compromisso que vemos não são só em palavras, mas também em factos», frisou Stoltenberg. Não abordando a questão do aprofundamento da militarização da UE, a criação da chamada cooperação estruturada permanente (CEP) e a complementaridade – que já defendeu noutros momentos – entre aquilo a que chama Defesa Europeia e a NATO, o responsável da Aliança Atlântica sempre se referiu à necessidade de cooperar em matéria de defesa na UE para «resolver a fragmentação da indústria de defesa europeia». Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Peskov, por seu lado, sublinhou que a percepção da Rússia como inimigo e adversário é «deslocada» e «inadmissível», uma vez que Moscovo «não ameaça ninguém e nunca o tinha feito», baseando toda a sua política neste principio, informa o portal russo. Na quinta-feira, em resposta a alertas do lado ucraniano sobre movimentações de tropas russas junto à fronteira, Peskov já tinha afirmado que a transferência de tropas dentro da Federação Russa não devia preocupar ninguém, nem constitui uma ameaça para ninguém, revelou a TASS. O funcionário do Kremlin reafirmou que «as tropas russas nunca participaram, nem estão a participar agora em conflitos armados em solo ucraniano», acrescentando, citado pela mesma fonte, que «nem a Rússia, nem os países europeus, nem outros países do mundo gostariam de ver a guerra civil na Ucrânia incendiar-se outra vez como resultado das provocações e dos passos provocadores dos militares ucranianos». No Donbass, região do Leste da Ucrânia de maioria russa, onde as populações se insurgiram contra o golpe de Estado fascista de Maidan que depôs Viktor Yanukovich, em 2014, patrocinado pela União Europeia e os Estados Unidos, e onde foram autoproclamadas as repúblicas populares de Donetsk e Lugansk, a situação agudizou-se no passado dia 26 de Março, segundo a RT, com a morte de quatro soldados das Forças Armadas ucranianas, perto da localidade de Shumy, embora outras fontes assinalem, já há algum tempo, a violação repetida do cessar-fogo por parte das tropas ucranianas. O novo governo, imposto sem eleições, permitiu que grupos paramilitares fascistas dessem rédeas ao ódio anti-russo e anti-comunista. Milhares de mulheres e homens deram corpo à resistência. Quando se cumpriam quatro anos da rebelião antifascista que se espalhou como pólvora por todo o leste da Ucrânia, atravessei a fronteira através da Rússia num autocarro onde viajavam meia centena de antifascistas de vários países. Respondendo ao apelo do grupo musical italiano Banda Bassotti, que tocou duas vezes em Portugal na Festa do «Avante!», percorreram durante uma semana os territórios em resistência visitando orfanatos, hospitais, fábricas, sindicatos e autarquias. No primeiro dia, entre Rostov-sobre-o-Don, cidade russa no Norte do Cáucaso, e a fronteira com a auto-proclamada República Popular de Lugansk (RPL), atravessámos cerca de uma centena de quilómetros de estepe. Enquanto viajávamos por terras de cossacos, Mitya Dezhnev explicava-me como teve de fugir da sua terra para a Rússia e de como não podíamos deixar esquecer os comunistas que todavia resistiam na Ucrânia controlada por Kiev. «Queres ouvir uma canção que era muito popular no tempo da União Soviética?», perguntou-me em inglês antes de começar num quase perfeito português a cantar o «Avante, camarada!». Foi em 2014, uma semana depois do massacre que vitimou cerca de meia centena de pessoas em Odessa, na Ucrânia, que as populações do leste do país se insurgiram contra o golpe de Estado patrocinado pela União Europeia e pelos Estados Unidos que depôs Viktor Yanukovich. O novo governo, imposto sem eleições, permitiu que grupos paramilitares fascistas dessem rédeas ao ódio anti-russo e anti-comunista. Sem qualquer protecção e ante a ofensiva fascista, milhares de mulheres e homens concentraram-se nas principais praças das localidades insurrectas e deram corpo à resistência. Primeiro, tomaram as instituições e desarmaram as forças de segurança e, depois, organizaram-se militarmente constituindo milícias antifascistas. Nessa semana, as principais regiões da industrial Bacia do rio Don, conhecida como Donbass, declararam a independência e constituíram-se em dois países: a República Popular de Donetsk (RPD) e a RPL. Depois de pesados bombardeamentos que vitimaram milhares de pessoas, o apoio militar russo foi decisivo para evitar a barbárie e a conquista destes territórios por Kiev. O cessar-fogo que formalmente se mantém é desmentido na prática pelos sucessivos confrontos na linha da frente. As sucessivas provocações patrocinadas pela NATO continuam a causar vítimas entre os civis que moram em localidades ao alcance da artilharia ucraniana. Empurrados, primeiro pelas perseguições e depois pela guerra, dezenas de milhares de ucranianos continuam exilados na Rússia ou nas zonas sob controlo das forças democráticas. Neli Zadiraka foi outra das pessoas que conheci nessa condição. É uma das deputadas da sede do poder legislativo da RPL, o Conselho Popular de Lugansk. Foi obrigada a abandonar a sua casa em Rubezhnoe, território da região ocupado pela Ucrânia. Foi ela que, em 2014, leu a declaração de independência da RPL e, por essa razão, é considerada terrorista pelo governo ucraniano. Neli apontou para a estrela vermelha do brasão da jovem república e explicou-me que se inspira nos símbolos e valores da União Soviética. Esse foi, aliás, um elemento presente em toda a viagem. Para além da preservação e do respeito pelos monumentos e símbolos, a presença da foice e do martelo é constante. Em conversa com vários habitantes de Lugansk e Donetsk, a chegada do fascismo ao poder na Ucrânia veio reforçar as convicções políticas dos cidadãos de ambas as repúblicas. Mas não é algo recente. Em 2012, nas últimas eleições antes do golpe fascista, o Partido Comunista da Ucrânia conquistou 13,2% dos votos em todo o país. Em Kiev, obteve somente 7,23% e no ocidente houve regiões em que aquele partido não superou os 2%. Mas no oriente, sobretudo, nas regiões de Donbass, os valores oscilaram entre os 18% de Odessa e os 29,46% de Sebastopol, na Crimeia. Em Donetsk, os comunistas chegaram aos 18,85% e, em Lugansk, atingiram os 25,14% dos votos. Em Makeeva, cidade vizinha de Donetsk, a organização local do Partido Comunista da RPD organizou uma iniciativa cultural que envolveu centenas de pessoas para receber gente de tantos países, numa cerimónia em que se entregaram os cartões a dois combatentes especiais. Um miliciano vindo do Texas e outro da Colômbia que escolheram atravessar o mundo para abraçar a causa antifascista ao lado dos soldados desta região. O colombiano decidiu baptizar-se com o nome de guerra Alfonso Cano em homenagem ao comandante histórico das FARC e contou-me que decidiu voluntarizar-se para combater o fascismo em Donbass como parte das suas convicções políticas. São muitos os combatentes internacionalistas que participam nos exércitos das duas repúblicas. Na companhia de Boris Litvinov, Primeiro Secretário do Partido Comunista da RPD, que foi, aliás, o primeiro a encabeçar o Soviete Supremo da RPD, o novo órgão legislativo daquele país, conhecemos um dos corações industriais da Europa. Antes de chegarmos a uma das mais importantes minas de carvão da Europa, erguia-se um muro escrito recentemente com spray: «Somos cidadãos da União Soviética». Em 2013, antes do golpe, a Ucrânia produzia 84,8 milhões de toneladas. Três anos depois, esses números baixaram para menos de metade: 41,8. O objectivo do imperialismo, quando interveio na Ucrânia, não foi apenas levar mais longe as fronteiras da NATO, violando uma vez mais os compromissos assumidos com os últimos dirigentes soviéticos. Foi também controlar um país com importantes recursos, sobretudo na região que agora resiste ao avanço das forças apoiadas pelos Estados Unidos e União Europeia. Nas últimas semanas, a guerra intensificou-se e muitas das pessoas com que conversei admitem que o governo de Kiev pode estar a preparar uma provocação a larga escala durante o Campeonato Mundial de Futebol. Petro Poroshenko, presidente da Ucrânia, acaba de ser recebido em Espanha por Pedro Sánchez, novo chefe do governo, e falava abertamente ao diário El País do falso assassinato do jornalista Arkadi Babchenko como uma técnica necessária para proteger os dissidentes. Sem qualquer vergonha, acrescentou que há uma campanha russa de notícias falsas para destabilizar o mundo. É este o carácter de um governante que anunciava meses depois do golpe que faria tudo para que as crianças da Ucrânia pudessem ir à escola e para que as de Donbass ficassem fechadas em caves. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Pelas mortes, o governo da Ucrânia responsabilizou «forças de ocupação russas», referindo-se, segundo a RT, a efectivos da República Popular de Donetsk, cujos representantes negaram qualquer ligação ao facto e, posteriormente, declararam que os militares ucranianos morreram por terem pisado um explosivo durante uma inspecção a campos minados. A este propósito, Peskov disse que «não tentava fazer passar os desejos por realidade». «Para nossa desgraça, a realidade na linha de contacto é bastante aterradora, têm lugar provocações por parte das Forças Armadas da Ucrânia, e não são casos isolados, mas múltiplos», afirmou. No que respeita à Crimeia, o governo russo considera a sua integração no país um facto consumado e inteiramente legítimo. A Ucrânia nunca reconheceu os resultados do referendo realizado em Março de 2014, pouco depois do golpe de Estado em Kiev, em que a maioria esmagadora da população do território se pronunciou a favor da reintegração na Rússia. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Putin deu exemplos concretos de decisões tomadas por Kiev com o objectivo de desmantelar os acordos de Minsk, com vista a encontrar uma solução para o conflito no Leste da Ucrânia, e acusou as autoridades de Kiev de estarem a agravar a situação no Donbass, recorrendo a armamento pesado e drones de ataque, e de discriminarem a população russo-falante no país. O Kremlin acusa também o Ocidente de estar a utilizar como pretexto a situação na Ucrânia, um país onde «se empenhou no incentivo à russofobia e em justificar as acções do regime de Kiev para minar os acordos de Minsk [de 2015] e se preparar para um cenário militar no Donbass». «Os países da NATO estão a empurrar Kiev para medidas agressivas. A militarização do território da Ucrânia e o fornecimento de armas estão em curso», lê-se na nota emitida dia 10, na qual a Rússia advoga que a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) não deve estar à margem das discussões que dizem respeito à segurança no continente. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Internacional|
Rússia insta países ocidentais a travar avanço para leste
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Ucrânia oferece o seu território para instalar sistema de defesa aéreo dos EUA
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Rússia tomará «medidas adicionais» se a NATO destacar tropas para a Ucrânia
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Secretário-geral da NATO entrevistado na RTP
Fascismo na Ucrânia ou destruição da Líbia? Não, ameaça russa!
Diálogo, sim, mas a culpa é da Rússia
EUA reforçam presença militar na Europa
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«A realidade na linha de contacto é bastante aterradora»
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Resistência antifascista em Donbass
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Negociações devem começar «imediatamente»
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Cabe notar que todas as propostas de Moscovo, ao longo de anos, no sentido de serem adoptadas medidas de fortalecimento da segurança colectiva europeia foram ignoradas. Face ao agravamento sem precedentes da situação na Europa, a Rússia apresentou enfaticamente em Dezembro de 2021 um conjunto de condições com vista a salvaguardar o carácter universal e indivisível da segurança na Europa. Abrangiam medidas de desanuviamento, a reversão da cavalgada para leste da NATO e a garantia efectiva da neutralidade da Ucrânia, estatuto contido na declaração de independência de 1991 e abandonado por Kiev após o golpe de Estado de 2014, dirigido de Washington com recurso decisivo a milícias neonazis. Os EUA e a NATO rejeitaram basicamente as propostas russas, encarando-as como um sinal de fragilidade.
«É à luz desta complexa situação de degradação da segurança internacional, criada ao longo das últimas décadas, que a Federação Russa, e também a China, procedem à modernização do seu arsenal nuclear e à criação de armas hipersónicas, campo em que se encontrarão à frente dos EUA.»
Depois do golpe de 2014, o facto de a Ucrânia não integrar formalmente a Aliança Transatlântica não constituiu uma barreira para a entrada em peso de efectivos e meios da NATO no país. Com a guerra a lavrar no Donbass desde 2014, cerca de uma dezena de bases militares de forças e países da NATO foram criadas sob o biombo de missões militares temporárias, torneando a proibição da existência de bases estrangeiras ainda inscrita na Constituição ucraniana.
Para Moscovo, os riscos colocados assumiam evidente natureza estratégica. A intervenção do presidente ucraniano em Fevereiro na conferência anual de segurança de Munique terá constituído a última gota para o Kremlin. Aplaudido longamente pela fina-flor dos EUA (representados por Harris, Pelosi e Blinken), UE e NATO, com o secretário-geral da ONU também presente, o discurso de Zelensky aludiu à intenção da Ucrânia voltar a dotar-se da arma nuclear e solicitou um calendário claro de adesão à NATO.
Kiev não só confirmava a recusa liminar de implementação dos acordos de Minsk, vertidos na resolução 2202 do Conselho de Segurança da ONU – que garantiam a permanência do Donbass no seio da Ucrânia através de um estatuto de ampla autonomia –, como continuava a rejeitar uma negociação séria com Moscovo que levasse em conta as preocupações de segurança russas. O resultado dramático é conhecido. O reconhecimento por Moscovo das repúblicas autoproclamadas de Donetsk e Lugansk deu-se quase de imediato e logo a seguir tem início a intervenção militar em larga escala da Rússia na Ucrânia.
«Com a guerra a lavrar no Donbass desde 2014, cerca de uma dezena de bases militares de forças e países da NATO foram criadas sob o biombo de missões militares temporárias, torneando a proibição da existência de bases estrangeiras ainda inscrita na Constituição ucraniana.»
Depois de 24 de Fevereiro, a situação na Europa e no mundo entrou definitivamente noutro patamar. A guerra na Ucrânia serve os propósitos estratégicos, económicos, comerciais e políticos dos EUA, acima de tudo. Quiçá, a Casa Branca julgou que serviria igualmente os cálculos eleitorais da desgastada administração democrata em ano de importante ida às urnas, num país fracturado e polarizado como nunca em décadas.
Em Março, na Polónia, Biden exortou ao afastamento de Putin e à mudança de poder na Rússia. Os EUA foram céleres na formação de um centro coordenador internacional de apoio militar à [guerra na] Ucrânia, integrado por cerca de 50 países. Com o apoio em peso de uma UE submissa e resignada ao «martírio» em nome da nova e auspiciosa campanha anti-russa, com Ursula von der Leyen e Borrel à cabeça.
A solução do conflito e a defesa da Ucrânia passava pelo terreno de batalha, garantia-se. Foi nesta toada que o secretário da Defesa dos EUA, Lloyd Austin, assumiu em Abril querer ver «a Rússia enfraquecida ao ponto de não poder fazer o tipo de coisas que fez ao invadir a Ucrânia».
«Depois do golpe de 2014, o facto de a Ucrânia não integrar formalmente a Aliança Transatlântica não constituiu uma barreira para a entrada em peso de efectivos e meios da NATO no país.»
Não restavam dúvidas, que os EUA através desta guerra pretendem atolar, quebrar económica e politicamente a Rússia e, se possível, desmembrar o país, cumprindo o desígnio deixado incompleto após o fim da URSS. Lloyd tem sido secundado por afirmações incomportáveis de antigos chefes militares do Pentágono e da NATO, de Wesley Clark a Ben Hodges, equivalendo, praticamente, a uma declaração não formal de guerra a uma potência nuclear como é a Rússia.
O imperialismo está claramente a forçar uma escalada perigosíssima e é neste contexto que devem ser apreendidas as repetidas advertências da direcção russa sobre a utilização de todas as armas. As palavras recentes de Pútin a este respeito foram descontextualizadas e adulteradas. Recorde-se que a doutrina nuclear da Federação Russa prevê a utilização da arma nuclear em caso de ameaça vital à segurança e integridade.
De facto, após o desaparecimento da URSS, apenas China e Índia afirmam na sua doutrina militar o princípio de não usar a arma nuclear em primeiro lugar. Certamente, no pingue-pongue da escalada retórica que precedeu e acompanha os desenvolvimentos no terreno, afirmações levianas de alguns políticos e figuras públicas russas acerca da ameaça de utilização de armas nucleares são totalmente contraproducentes. Expressam não só uma reacção de fragilidade, mas igualmente uma atitude aventureirista de sectores da classe dirigente russa. O que não inverte no fundamental os dados da equação.
As recentes declarações do Papa Francisco sobre os motivos da guerra na Ucrânia e do candidato brasileiro Lula da Silva sobre a falta de vontade do poder ucraniano negociar a paz mostram que o conflito na Ucrânia não é visto de forma igual em todo o planeta. O Papa Francisco, nascido na Argentina, sugeriu, em entrevista do jornal Corriere della Serra, que a NATO poderá ter motivado a invasão da Rússia à Ucrânia. O Papa disse que a NATO «ladrou» à porta da Rússia e que isto pode ter forçado a invasão da Ucrânia. Por seu lado, o candidato à presidência brasileira, que é vencedor em todas as sondagens, realçou a falta de vontade dos EUA e da União Europeia em que haja uma negociação séria para conseguir a paz na região, numa entrevista à revista Time. «Nós, políticos, colhemos aquilo que nós plantamos. Se eu planto fraternidade, solidariedade, concórdia, eu vou colher coisa boa. Mas se eu planto discórdia, eu vou colher desavenças. Putin não deveria ter invadido a Ucrânia. Mas não é só o Putin que é culpado, são culpados os Estados Unidos e é culpada a União Europeia. Qual é a razão da invasão da Ucrânia? É a NATO? Os Estados Unidos e a Europa poderiam ter dito: ‘A Ucrânia não vai entrar na NATO’. Estaria resolvido o problema.» Para o antigo presidente brasileiro, Putin, mas também Zelensky quiseram a guerra. «Zelensky quis a guerra. Se ele [não] quisesse a guerra, ele teria negociado um pouco mais. É assim. Eu fiz uma crítica ao Putin quando estava na Cidade do México, dizendo que foi errado invadir. Mas eu acho que ninguém está procurando contribuir para ter paz. As pessoas estão estimulando o ódio contra o Putin. Isso não vai resolver! É preciso estimular um acordo.» Ao contrário da maioria das nações ocidentais, lideradas pelos Estados Unidos, os países do Sul estão a tomar uma posição cautelosa em relação ao conflito armado entre Moscovo e Kiev. É indicativo disso a atitude das monarquias do Golfo, aliadas preferênciais de Washington durante décadas, nesta recusa de tomar partido: denunciam tanto a invasão da Ucrânia como as sanções contra a Rússia. Esses países acusam o Ocidente de ser cego à sua própria hipocrisia e aos seus estreitos interesses ao apelar a uma ordem baseada em regras que eles historicamente raramente cumprem.. Será a Ucrânia um confronto global entre «democracia e autocracia», como proclamado pelo Presidente dos EUA Joseph Biden e repetido por comentadores e políticos ocidentais? «Não», diz o jornalista americano Robert Kaplan, citado por Alain Gresh num artigo no Le Monde Diplomatique, «mesmo que possa parecer contra-intuitiva». Afinal de contas, «a própria Ucrânia tem sido uma democracia fraca, corrupta e institucionalmente subdesenvolvida há muitos anos. No índice mundial de liberdade de imprensa, o relatório Repórteres sem Fronteiras 2021 classifica-o em 97º lugar». «A luta», acrescenta Kaplan, «é sobre algo mais amplo e fundamental, o direito dos povos a decidirem o seu próprio futuro e a estarem livres de agressões.». Se, no Norte, as vozes discordantes sobre a guerra na Ucrânia continuam a ser raras e pouco audíveis, de tal modo que uma única forma de pensar em tempos de guerra se impôs mais uma vez , elas dominam no Sul, neste «resto do mundo» que constitui a maioria da humanidade e que observa este conflito com outros óculos. A sua visão foi resumida pelo Director-Geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, que lamenta que o mundo não dê igual importância às vidas de negros e brancos, às dos ucranianos, iemenitas ou dos cidadãos do Tigre, que «não trate a raça humana da mesma forma, sendo uns mais iguais do que outros». Ele já tinha feito esta observação no coração da crise da covid-19, recorda Alain Gresh . Esta é uma das razões pelas quais um número significativo de países, particularmente africanos, se absteve das resoluções das Nações Unidas (ONU) sobre a Ucrânia – entre os quais, a África do Sul , Índia, Arménia e México, Senegal e Brasil. E no final de Abril, nenhum país não ocidental parecia pronto a impor grandes sanções contra a Rússia. O Presidente ucraniano Volodymyr Zelensky tem tido uma prestação muito eficiente junto ao público ocidental. O esmagador apoio ocidental à Ucrânia deve-se não só à brutalidade da invasão ilegal da Rússia, mas também à astúcia e ao carisma com que Zelensky tem conseguido pressionar para ser concedida uma ajuda militar à Ucrânia. Um reforço militar que vai no sentido da política da administração Biden de prolongar uma guerra que desgaste a Rússia. Mas por mais eficaz que Zelensky tenha sido em angariar apoio da opinião pública ocidental, a mensagem da Ucrânia tem sido muito menos convincente para as audiências do Sul Global, onde muitos países se têm recusado a aderir às campanhas para sancionar a economia russa e isolá-la diplomaticamente. Isto ficou muito claro no Fórum de Doha no Qatar, onde Zelensky e a vice-ministra dos Negócios Estrangeiros ucraniana, Emine Dzhaparova, intervieram. A antiga jornalista, poderosa comunicadora por direito próprio, Dzhaparova, tártara da Crimeia, argumentou a partir dos temas usados pelos líderes ocidentais: Esta guerra não tem a ver apenas com a Ucrânia, mas com a sobrevivência da «ordem internacional baseada em regras». Argumentos que o presidente dos EUA Joe Biden e os líderes europeus têm repetidamente iusado para condenar a intervenção russa. Mas é aí que reside o motivo da falta de empatia com grande parte do Sul Global. A maior parte desses países sabe, por experiência própria, que há muito que os países ocidentais não cumprem as regras do direito internacional. É conhecida a velha anedota mexicana, em que o presidente desse país no final do século XIX e início do século XX, Porfírio Díaz, garantiu que «o problema do México era estar muito longe de Deus e muito perto dos EUA», assinalando as dezenas de intervenções que a América Latinha tinha sofrido às mãos do seu poderoso vizinho. Em conversas com diplomatas e analistas de toda a África, Ásia, Médio Oriente e América Latina, o dirigente do Quincy Institute for Responsible Statecraft, Trita Parsi, nota que estes países simpatizam largamente com a situação do povo ucraniano e vêem a Rússia como o agressor. Mas as exigências ocidentais de que façam sacrifícios dispendiosos, cortando os laços económicos com a Rússia para manter uma «ordem baseada em regras», geraram uma reacção alérgica. Essa ordem não tem sido baseada em regras; em vez disso, tem permitido aos EUA violar impunemente o direito internacional. A mensagem do Ocidente sobre a Ucrânia é pouco provável que ganhe o apoio de países que muitas vezes experimentaram os piores lados da suposta ordem internacional. Os países que têm contrariado os apelos ocidentais à ajuda e à unidade diplomática que têm recebido mais atenção são a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos. Numa ruptura brusca com Washington, promoveram o seu abraço económico e político à Rússia, ao mesmo tempo que rejeitaram o pedido de Biden de baixar os preços do petróleo através de bombearem mais petróleo e o disponibilizarem nos mercados internacionai. Os EAU recusaram-se a denunciar a invasão da Rússia no Conselho de Segurança da ONU, e enquanto o seu líder de facto, Mohammed bin Zayed, recusou um telefonema com Biden, ordenou ao seu ministro dos Negócios Estrangeiros que se deslocasse à Rússia para reforçar os laços económicos com Moscovo. As preocupações de Riad e Abu Dhabi diferem nitidamente das da maioria do Sul Global, mais vasto, e radicam principalmente na deterioração dos seus laços com Washington, por problemas económicos e por considerarem que os EUA não os têm apoiado suficientemente em relação à disputa regional que têm com o Irão. Esta degradação das relações políticas tem reflexos na imprensa e na opinião pública desses países. «A NATO é uma das chaves para esta recente crise [...]. É certo que a Rússia - o legítimo herdeiro da União Soviética - não aceitará a expansão da NATO perto das suas fronteiras sob quaisquer condições», afirmou um editorialista no influente diário saudita Okaz a 25 de Fevereiro de 2022, três dias após o início da invasão da Ucrânia. No dia seguinte, outro comentador no mesmo diário observou: «O que é certo é que a invasão da Ucrânia pelo presidente russo, Vladimir Putin, estabeleceu novos factos no terreno que não podem ser ignorados. Impôs uma nova ordem mundial completamente diferente da que o Ocidente impôs à Rússia». Na mesma linha, o diário saudita Al-Riyadh insistiu a 3 de Março: «A velha ordem mundial que surgiu após a Segunda Guerra Mundial era bipolar, mas tornou-se unipolar após o colapso da União Soviética. Hoje estamos a assistir ao início de uma mudança para um sistema multipolar». E, visando o Ocidente, acrescentou: «A posição de alguns países nesta guerra não é defender os princípios da liberdade e da democracia, mas os seus interesses em manter a ordem mundial existente». A mesma crítica foi expressa nos meios de comunicação social dos Emirados Árabes Unidos (EAU). «As flutuações na posição dos EUA não são surpreendentes. Não é novidade para eles entregarem-se ao engano e renegarem os seus compromissos, como têm feito em várias áreas e questões. Têm utilizado de forma consistente as forças locais para servir os seus propósitos, apenas para lhes virar as costas e deixá-las vulneráveis. Washington e o Ocidente encorajaram a propensão ucraniana a opor-se à Rússia [...]. O comportamento de Washington e as posições europeias sobre a crise ucraniana, e a sua exploração da difícil situação de Kiev, revelam um problema nos valores dos seus sistemas políticos». Lendo estes comentários, quase parece que a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos não são aliados estratégicos dos EUA. No entanto, resumem os dois temas que dominam nos meios de comunicação nestes países, para além da condenação mais ou menos pronunciada da invasão da Ucrânia. Primeiro, uma crítica por vezes virulenta ao presidente dos EUA, Joe Biden, e aos Estados Unidos, que, embora permanecendo um aliado, não é considerado fiável porque acaba por trair os seus amigos. Quanto à sua defesa do direito internacional, é hipócrita: não invadiram e destruíram o Iraque em 2003 sem aprovação das Nações Unidas? E se a Ucrânia está parcialmente ocupada há algumas semanas, a Palestina está ocupada há décadas, com o apoio determinado dos Estados Unidos e o apoio mais embaraçado dos europeus. Para não falar do racismo expresso na crise dos refugiados e da «duplicidade de critérios», «dependendo se é ucraniano ou africano». O outro leitmotiv desses orgãos de comunicação social desses países, é a reorganização da ordem internacional, que se tornou multipolar, com um novo lugar para a Rússia e sobretudo para a China (e mais amplamente para a Ásia), acompanhada pela retirada dos Estados Unidos do Golfo. É portanto do interesse de ambos os países prosseguir a diversificação das suas relações e afastar-se de uma relação de um para um apenas com o Ocidente. Para o resto do Sul Global, vários factores estruturais locais e mais amplos contribuíram para uma hesitação em apoiar o isolamento da Rússia. Potências sul-americanas como o Brasil e o México, os pesos pesados africanos África do Sul e Etiópia e a crescente potência asiática Índia são todas maioritárias nas suas regiões na sua recusa em sancionar a Rússia. As relações da Índia com a Rússia remontam à Guerra Fria, quando a União Soviética vetou numerosas resoluções do Conselho de Segurança da ONU sobre Caxemira que a Índia se opunha. A Rússia continua a ser um dos principais fornecedores de armas da Índia até aos dias de hoje. O mesmo se aplica a muitos países africanos. De acordo com o Stockholm International Peace Research Institute, 18 por cento de todas as vendas de armas russas foram para África entre 2016 e 2020. A dependência africana do trigo e fertilizantes russos e ucranianos é ainda maior - um quarto dos países africanos recebe um terço do seu trigo da Rússia e da Ucrânia. O Egipto conhece demasiado bem o significado disto. O aumento dos preços dos cereais russos e ucranianos nos meses que antecederam a Primavera árabe em 2011 desempenhou um papel crucial na criação das condições sociais para os protestos que eclodiram em toda a região. Mas a maior dependência ou vulnerabilidade do Sul Global em relação à Rússia não conta a história toda. Muitos destes Estados também vêem uma hipocrisia flagrante ao enquadrar a guerra da Ucrânia em termos da sobrevivência da ordem baseada em regras. Do seu ponto de vista, nenhum outro bloco minou mais o direito internacional, as normas ou a ordem baseada em regras do que os Estados Unidos e o Ocidente. Exemplos não faltam. Nos últimos anos, os EUA subverteram a ordem baseada em regras quando Donald Trump retirou-se do Conselho de Direitos Humanos da ONU devido às suas críticas ao tratamento dado por Israel aos palestinianos e cortou verbas à Organização Mundial de Saúde no meio da pandemia da covid-19, por esta não endossar acusações fantasiosas contra a China, e sancionou altos funcionários do Tribunal Penal Internacional por procurarem investigar os crimes de guerra americanos no Afeganistão. (O mesmo EUA que se recusa a ser investigado por crimes de guerra pede que o tribunal investigue os crimes de guerra russos na Ucrânia). Há também a flagrante ilegalidade da invasão do Iraque pela administração George W. Bush, a intervenção da administração Obama na Líbia, o apoio contínuo dos EUA e do Reino Unido à guerra saudita no Iémen (que deixou 13 milhões de pessoas em risco de fome) e a celebração da resistência armada ucraniana contra os invasores russos, condenando ao mesmo tempo não só a resistência palestiniana contra a ocupação israelita, mas também proibindo a oposição económica não violenta a essa ocupação de décadas. E depois há a «guerra global ao terror», que desestabilizou grande parte do Médio Oriente e do Norte de África, matando mais do dobro do número de pessoas que os próprios terroristas assassinaram desde os ataques de 11 de Setembro. De facto, embora os EUA tenham desempenhado um papel instrumental no estabelecimento das regras e normas da ordem pós Segunda Guerra Mundial, começaram quase imediatamente a quebrá-las. Durante os seus dois mandatos, o Presidente Dwight D. Eisenhower autorizou nada menos que 104 operações encobertas, que incluíam derrubar governos e armar revoltas regionais. Mas agora os EUA exigem que os países do Sul Global façam sacrifícios maciços e dispendiosos - com pouca consideração pelas suas vulnerabilidades e necessidades de segurança - para salvar uma ordem que os próprios EUA têm estado na linha da frente na sua violação. Voltar a uma ordem em que os EUA possam continuar a agir fora do direito internacional é equivalente a pedir ao Sul Global que faça sacrifícios insuportáveis para manter o excepcionalismo americano. A outra linha de argumentação dos meios de comunicação árabes denuncia a dupla conversa do Ocidente. Democracia? Liberdade? Crimes de guerra? Os direitos dos povos à autodeterminação? Serão os Estados Unidos, que bombardearam a Sérvia e a Líbia, que invadiram o Afeganistão e o Iraque, os mais qualificados para reivindicar o direito internacional? Não utilizaram também munições de fragmentação, bombas de fósforo, projécteis de urânio empobrecido? Os crimes dos militares norte-americanos no Afeganistão e no Iraque foram amplamente documentados sem nunca conduzir a acusações, a destruição infligida a estes dois países excede em muito o que tragicamente está a sofrer a Ucrânia. A Palestina, que está totalmente ocupada há décadas enquanto a Ucrânia está parcialmente ocupada há algumas semanas, continua a ser um ponto doloroso no Médio Oriente, mas não suscita qualquer solidariedade por parte dos governos ocidentais, que continuam a oferecer um cheque em branco a Israel. «Não é inútil recordar», observa um jornalista local, «os cânticos entoados durante as manifestações, as declarações iradas que, ao longo dos anos e décadas, têm implorado sem resultados para ajudar o povo palestiniano bombardeado em Gaza ou que vive sob a ameaça de incursões, assassinatos, assassínios, apreensões de terras e demolições de casas na Cisjordânia, uma área que todas as resoluções internacionais consideram territórios ocupados». A comparência do Presidente Volodymyr Zelensky perante o Knesset, traçando um paralelo entre a situação do seu país e a de Israel «ameaçada de destruição», indignou muitos, sem, além disso, obter o apoio esperado de Telavive, ligado às suas estreitas relações com Moscovo. Finalmente, o tratamento diferenciado concedido aos refugiados ucranianos, brancos e europeus em comparação com os do «resto do mundo», asiáticos, norte-africanos e subsaarianos, despertou uma amarga ironia no Médio Oriente, como em todo o Sul. Dir-se-á que isto não é novidade, que as opiniões árabes (e os meios de comunicação social) sempre foram anti-ocidentais, que a «rua árabe», como por vezes é desdenhosamente chamada nas chancelarias europeias e norte-americanas, não tem muito peso. Afinal, na primeira Guerra do Golfo (1990-1991), a Arábia Saudita, o Egipto e a Síria deixaram-se arrastar para a guerra ao lado dos Estados Unidos, contra a vontade das suas populações. No caso da Ucrânia, por outro lado, estes países, mesmo quando são aliados de longa data de Washington, distanciaram-se do Tio Sam, e não apenas da Arábia Saudita. A 28 de Fevereiro, o ministro dos Negócios Estrangeiros dos EAU, Sheikh Abdullah bin Zayed Al-Nahyane, encontrou-se com o seu homólogo russo Sergei Lavrov em Moscovo e saudou os estreitos laços entre os dois países. E o Egipto não respondeu à injunção não diplomática dos embaixadores do G7 no Cairo para condenar a invasão russa. Até Marrocos, um aliado fiel de Washington, esteve convenientemente «ausente» da votação da Assembleia Geral da ONU sobre a Ucrânia no dia 2 de Março. No momento que as medida e as linhas divisórias ideológicas de outrora se desvanecem, que as promessas de uma «nova ordem internacional» feitas por Washington no rescaldo da primeira Guerra do Golfo se afundam nos desertos iraquianos, um mundo multipolar está a emergir no caos. Oferece uma margem de manobra mais ampla para o «resto do mundo». Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Internacional|
Metade do mundo condena a guerra na Ucrânia mas não confia no Ocidente
Há várias formas de ver o mundo
Quando as regras internacionais só são cumpridas por uns
Quando os aliados dos EUA no golfo o abandonam
Dois pesos e duas medidas
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Os EUA e a NATO travam, com crescente envolvimento, uma guerra de procuração na Ucrânia contra a Rússia, em que a linha de separação entre a guerra híbrida e a guerra directa perde visibilidade. Os falcões da NATO continuam a esgrimir clamorosamente a retórica nuclear. Liz Truss, na qualidade de candidata à liderança do Reino Unido, disse-o claramente quando se afirmou pronta para premir o botão nuclear mesmo que isso significasse a aniquilação global.
O comandante das forças estratégicas do Pentágono, almirante Charles Richard, afirmou nestes dias que um conflito militar directo com a Rússia e a China é possível.
Os repetidos disparos da artilharia ucraniana contra a central nuclear de Zaparojie, a maior da Europa, são motivo de grande inquietação. Estranha-se que a missão da AIEA que visitou as instalações, contando com especialistas em balística, se tenha abstido de revelar a proveniência dos ataques. Tudo isto adensa a suspeita que paira no horizonte: será que a estratégia incendiária dos EUA procura, de alguma forma, um desastre nuclear, sacrificando não só a Ucrânia mas também a Europa?
«Os EUA e a NATO travam, com crescente envolvimento, uma guerra de procuração na Ucrânia contra a Rússia, em que a linha de separação entre a guerra híbrida e a guerra directa perde visibilidade.»
É pois desonesta e completamente insustentável a afirmação de Biden de que «ninguém ameaçou a Rússia». É o argumento risível, por cá replicado por comentadores e colunistas mais empedernidos, de que a NATO não constitui uma ameaça à Rússia. Como acertadamente referiu o representante bielorrusso em assinalável intervenção na Assembleia Geral das Nações Unidas, foi o alargamento da NATO que tornou «inevitável» esta guerra. Em grande medida, independentemente dos cálculos, métodos, reais objectivos e contradições da classe dirigente da Rússia capitalista, poder-se-ia acrescentar.
A cavalgada da NATO em direcção às fronteiras russas é o eixo da dinâmica hostil anti-russa (e contra a Bielorrússia, país que desde 1994 se tem destacado pela luta corajosa em defesa da independência e soberania e do direito a decidir sobre o seu caminho de desenvolvimento) que estilhaça a segurança europeia. Desde a dissolução do Pacto da Varsóvia e do colapso da URSS, a NATO já vai no sexto alargamento (com a incorporação em curso da Suécia e Finlândia), quebrando todas as garantias em contrário dadas à última direcção soviética e ao governo da Rússia no início dos anos 90. Os EUA, cujo orçamento de defesa ultrapassa o da Rússia em mais de dez vezes, têm estacionados na Europa mais de 100 mil militares. É uma evidência que são os EUA, a NATO e a UE os principais agentes da corrida armamentista, intensificada nos últimos anos, promovendo a mobilização crescente de meios e a criação de bases militares nos países da Europa Oriental, dentro da estratégia assente desde o final da URSS de assédio permanente sobre a Rússia.
O militarismo e a lógica implacável de alargamento da NATO é indissociável da dinâmica hegemónica e expansionista do imperialismo no plano económico, servindo a estratégia do grande capital. A adesão à NATO dos antigos estados europeus do campo socialista precedeu, regra geral, a sua integração na UE.
Biden, Blinken, Nuland, Pyatt – a equipa operacional do golpe Euromaidan está de regresso à Ucrânia. Entretanto, continuamos a ser informados de que tudo está a acontecer por causa da «agressão russa». No dia 24 de Março deste ano, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, assinou o decreto 117/2021 no qual determina que a política oficial do seu regime é a de «reconquistar» a Crimeia à Rússia; e identifica o porto de Sebastopol como alvo prioritário desta estratégia. A iniciativa foi acompanhada pelo transporte de avultados meios de guerra, incluindo comboios de tanques, em direcção ao Leste ucraniano, a região onde Kiev tem mantido um cerco e actos de guerra contra as populações civis, essencialmente a cargo de unidades militares e paramilitares nazis. A decisão de Zelensky provocou uma reacção simétrica por parte da Rússia: reforço das capacidades militares na Península da Crimeia e nas imediações da fronteira oriental da Ucrânia. A comunicação social corporativa, sobretudo a «de referência», só conta esta parte da história, encaixando-a na narrativa da «agressão russa». Para se ter uma noção da real gravidade da situação, porém, é necessário conhecer o cenário completo. «os jogos de guerra “Defender Europe 2021» [envolvem] 40 mil efectivos de 25 países europeus, norte-americanos e africanos para «demonstrar a capacidade dos Estados Unidos em ser um parceiro estratégico nos Balcãs, Mar Negro, no Cáucaso, Ucrânia e em África”» Volodymyr Zelensky não retirou o decreto da sua cartola porquesimplesmente lhe apeteceu ou porque o considere como a mais aconselhável maneira de desviar as atenções da caótica situação interna em que o golpe Euromaidan mergulhou a Ucrânia desde 2014. As circunstâncias demonstram que este ex-comediante de TV transformado em presidente está sob o controlo directo de Richard Moore, chefe dos serviços secretos britânicos MI6, que o recebe em Londres e dirige pessoalmente o cumprimento do guião belicista que ele próprio traçou para ser cumprido a partir de Kiev. Esta ligação foi demonstrada pela televisão Rossiya 1 e está, naturalmente, associada à integração da Ucrânia, do Mar Negro e das regiões bálticas em geral nas gigantescas manobras militares da NATO «Defender Europe 21» que estão a decorrer até finais de Junho. Moore foi antigo embaixador britânico na Turquia, pelo que terá facilitado os contactos entre Erdogan e Zelensky, que têm recentes desenvolvimentos terroristas na região do Mar Negro. Zelensky tem, portanto, as costas bem quentes. Por isso, o seu chefe de Estado-Maior, o general Ruslan Komchak, anunciou que se «prepara para realizar uma ofensiva na Ucrânia Oriental», operação essa em que «está prevista a participação de membros da NATO». Será? Ao que a NATO tem respondido, sobretudo durante reuniões efectuadas em meados de Abril em Bruxelas, que está ao lado do regime ucraniano na sua defesa da «integridade» do país – declaração curiosa de uma aliança que se dedica a desintegrar países: Jugoslávia, Iraque e Líbia falam por si. «Integridade» da Ucrânia significa, neste contexto, o regresso da Crimeia à soberania de Kiev e o reforço da repressão contra as populações russófonas das províncias da região do Donbass – Donetsk e Lugansk – que não reconhecem o regime de base nazi nascido do golpe de 2014. Foi precisamente para evitar uma situação de repressão militar como a que vigora no Donbass que a população da Crimeia votou massivamente em referendo a sua reintegração na Rússia, da qual fora separada por acto administrativo assumido nos anos cinquenta do século passado pelo dirigente soviético Nikita Krushchov. Quando Zelensky assinou o decreto que espoletou a situação em desenvolvimento no terreno e nas chancelarias, o secretário da Defesa norte-americano e chefe do Pentágono, Lloyd Austin, declarou o «apoio inabalável dos Estados Unidos à soberania da Ucrânia». Washington sinalizou assim que não se tratou de um acto isolado do chefe do regime ucraniano e que existe uma interrelação entre o decreto presidencial e a invasão do Mar Negro e da Ucrânia pela NATO sob a cobertura dos jogos de guerra «Defender Europe 2021». Exercícios estes envolvendo 40 mil efectivos de 25 países europeus, norte-americanos e africanos para «demonstrar a capacidade dos Estados Unidos em ser um parceiro estratégico nos Balcãs, Mar Negro, no Cáucaso, Ucrânia e em África». Ninguém no seu perfeito juízo iria supor que a Rússia ficaria impávida e serena perante tais acontecimentos. Pelo que estamos a viver as incidências de uma inquietante provocação montada para apresentar as medidas defensivas adoptadas por Moscovo como uma evidência da «agressão russa». Dado o sinal por Austin, os acontecimentos tornaram-se vertiginosos. No dia 6 de Abril, o chefe do regime de Kiev telefonou ao secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, para lhe testemunhar que «a NATO é a única maneira de terminar com a guerra no Donbass» e, portanto, a «sua presença deve ser permanente e um poderoso travão à Rússia, que continua a militarização em larga escala e dificulta as movimentações de navios mercantes». Em 10 de Abril, Zelensky foi recebido em Istambul pelo «sultão» Erdogan, como já se percebeu por intercessão directa do chefe do MI6. Na sequência do encontro, 150 soldados turcos foram deslocados para Mariupol, cidade ucraniana do Mar Negro, de modo a enquadrar o contingente de mercenários «islâmicos» que os serviços secretos turcos (MIT) estão a recrutar sobretudo em Idlib, na Síria, para combater na Ucrânia tal como têm feito na Líbia e no Azerbaijão. Em Mariupol encontra-se também a chamada Brigada Islâmica Internacional que a Turquia criou recorrendo a mercenários tártaros. Antes de se avistar com o presidente turco, Volodymyr Zelensky tinha feito um acordo com o Qatar sobre o arrendamento de um porto no Mar Negro, precisamente Mariupol. O Qatar tem sido um dos países que fornece forças especiais para processos susceptíveis de envolver intervenções da NATO, como aconteceu na Líbia. Em 13 de Abril reuniu-se em Bruxelas a Comissão NATO-Ucrânia, para avaliar «o estado da segurança» neste país; o ministro dos Negócios Estrangeiros de Kiev, Dmytro Kauleb, informou sobre «os últimos desenvolvimentos» e a oportunidade serviu para o chefe de Estado Maior Komchak reafirmar o lançamento da «ofensiva na Ucrânia Oriental». Os participantes na reunião comprometeram-se a assegurar a «integridade territorial» da Ucrânia, acusaram os «rebeldes do Leste» de «quebrar o cessar-fogo» e a Rússia de reforçar os dispositivos militares, sobretudo na Crimeia. Exigiram a «retirada militar russa da Ucrânia», isto é, da Península da Crimeia – território russo. Em declarações à imprensa, esta terça-feira, um porta-voz do Kremlin sublinhou ainda que a integração da Ucrânia na NATO não será aceite pela população do Donbass e só irá exacerbar a crise. A Rússia não vê sinais de que Kiev queira abandonar a «retórica belicosa», «acalmar-se de alguma forma» e assumir o controlo das Forças Armadas da Ucrânia na linha de contacto no Donbass, que «frequentemente são a causa de provocações» nessa parte do Sudeste do país, disse ontem à imprensa Dmitry Peskov, porta-voz do Kremlin, citado pela TASS. Numa visita à Índia, o ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, afirmou que a Rússia espera que os países ocidentais pressionem a Ucrânia no sentido de cumprir o Acordo de Minsk sobre a guerra no Donbass, alcançado em Fevereiro 2015 entre a Ucrânia, a Rússia, a França e a Alemanha. O cenário de guerra continua a aprontar-se nas fronteiras da Rússia. A provocação de domingo passado já fez o seu caminho, mas outras poderão promover novos passos para uma situação incontrolável. Os acontecimentos em curso no Estreito de Kerch, que liga o Mar Negro ao Mar de Azov, têm que se lhe diga. É que, muito para lá do óbvio carácter provocatório do comportamento do regime neonazi da Ucrânia, está a cumprir-se uma agenda secreta menos óbvia e potencialmente mais perigosa do que os factos a que vamos assistindo. Até onde nos levará este caminho? Sem fazer futurologia, poderemos fazer uma ideia repescando antecedentes, identificando protagonistas e antecipando desenvolvimentos, alguns dos quais estão inscritos no calendário. Dois navios militares e um rebocador ucranianos dirigiam-se no domingo passado ao Estreito de Kerch, em rota do Mar Negro para o Mar de Azov, ao que parece com destino à cidade de Mariupol, quando foram interceptados a tiro por navios russos. Registaram-se três feridos sem extrema gravidade, os barcos foram apresados, os tripulantes detidos. Mais uma malfeitoria da Rússia do inqualificável Putin, informa, a uma só voz, a comunicação social mainstream, sem dar-se ao trabalho de aprofundar minimamente a situação. Nem é preciso. De acordo com os dogmas estabelecidos, o regime da Ucrânia é neonazi mas “democrático”, goza das boas graças de entidades acima de quaisquer suspeitas como a União Europeia e a NATO; e a Rússia é a Rússia, fica tudo dito. Mas aprofundemos a situação por nossa conta e risco. Está comprovadíssimo que: - Os navios militares ucranianos receberam advertências russas por rádio informando as tripulações de que o estreito estava fechado por razões de tráfego e segurança; - Os comandantes das três embarcações fizeram-se de surdos em relação aos avisos: “ignorámos deliberadamente os pedidos russos para não avançarmos mais”, confessou o comandante Volodymir Lesovoy; - Os navios ucranianos transportavam armamento e munições: armas ligeiras e armas automáticas de grande calibre, de acordo com a mesma confissão; - A bordo seguiam agentes dos serviços militares de espionagem (SBU), segundo revelou o director desta entidade, Vasyl Hrytsak; - “Estava consciente de que as acções da Marinha Ucraniana no Estreito de Kerch eram provocatórias”, afiançou ainda o comandante Lesovoy.1 Foi, portanto, um dos responsáveis ucranianos envolvidos na operação quem a qualificou: “uma provocação”. É muito importante conhecer o contexto geográfico e geopolítico em que este incidente ocorre. A Rússia e a Ucrânia partilham águas territoriais tanto no Mar Negro como no Mar de Azov segundo normas estabelecidas por um acordo bilateral estabelecido em 2003. A situação, porém, alterou-se a partir do golpe de Estado fascista na Ucrânia, em 2014, seguido pela reintegração da Crimeia na soberania russa, conforme decisão tomada por grande maioria, em referendo, pela população da península. Uma vez que a Crimeia se tornou território russo, a segurança do Estreito de Kerch passou a ser assumida por Moscovo, pela aplicação automática dos artigos 19 e 21 da Lei Internacional Marítima. Foi neste âmbito que as autoridades russas pediram aos navios ucranianos para não avançarem, uma vez que tinham encerrado temporariamente a passagem devido a manobras de tráfego e à segurança da nova ponte que, desde o início deste ano, liga o território continental russo à Península da Crimeia. Deve dizer-se que, apesar do agravamento das tensões entre os dois países vizinhos, sobretudo a partir de 2014, os navios ucranianos, tanto civis como militares, têm passado normalmente o Estreito de Kerch segundo as normas internacionais, neste caso aplicadas através de meios russos. No entanto, assim como não reconhece a reintegração da Crimeia na Rússia, a Ucrânia não aceita agora que a segurança no Estreito de Kerch seja garantida por Moscovo, ponto de partida para a violação da Lei Marítima Internacional por parte de Kiev. Uma situação que não tinha antecedentes, apesar de, repete-se, as relações entre a Ucrânia e Moscovo se terem deteriorado sobretudo a partir de 2014. Pelo que é legítimo registar que alguma coisa determinou a mudança de comportamento da Ucrânia. É certo que durante todo este ano foram observados sinais de que as tensões estavam a aumentar na região do Mar de Azov. Um navio de pesca russo, registado na Crimeia, foi apresado e a sua tripulação humilhada no dia 24 de Março. As autoridades ucranianas recusaram-se a tratar os tripulantes como cidadãos estrangeiros e, depois de maus tratos psicológicos e físicos, acabaram por permitir que seguissem para a península mas confiscando-lhes os passaportes, atitude que viola normas internacionais. Em Outubro, outra embarcação russa, desta feita um petroleiro, foi retida no porto ucraniano de Khersen. O clima regional deteriorou-se, principalmente, a partir da inauguração da ponte ligando o território continental russo à Crimeia, sobre o Estreito de Kerch, uma obra que reforçou a agressividade da Ucrânia face à irreversibilidade da mudança de soberania da península. Embora as tensões tenham vindo a convergir em torno das normas de passagem do Estreito de Kerch, registaram-se outros acontecimentos de âmbito mais geral e regional que devem ser encarados à nova luz projectada pelo incidente de domingo passado. Um deles foi a decisão do Tribunal Constitucional de Kiev no sentido de alterar a Constituição do país de modo a abrir caminho para a integração na União Europeia e na NATO. O procedimento nada tem de surpreendente – a NATO e a União Europeia fomentaram o golpe que facilitou este passo – mas causa fissuras no tecido político e demográfico do país, além de ultrapassar mais uma linha vermelha em relação às posições russas quanto à instalação da NATO nas suas fronteiras. No dia 7 de Novembro, o governo da Ucrânia aprovou a Resolução 934 que produz alterações às normas sobre a aplicação da lei marcial, nomeadamente no que diz respeito à evacuação obrigatória de populações e à definição de categorias populacionais para estabelecer o modo como deve decorrer o processo. Em particular, o documento estipula “as tarefas e funções do comando militar, ministérios, outras autoridades executivas centrais, órgãos estaduais e órgãos de evacuação temporária para a implementação de medidas de um regime legal de lei marcial”. Em suma, nos últimos meses vêm-se registando alguns acontecimentos na Ucrânia, sobretudo este cuidado especial com a actualização da lei marcial, reveladores de que os acontecimentos no Estreito de Kerch não surgem do nada, encaixando-se antes numa cadeia de premeditação propícia a criar um incidente específico – “uma provocação”, como confessou o comandante Volodymir Lesovoy. A situação internacional e regional actual abre várias pistas sobre a razão de ser e a utilidade deste episódio. 8% expectativa de Poroshenko nas sondagens para as próximas eleições presidenciais na Ucrânia, antes do incidente de Kerch A imposição da lei marcial é uma delas – e já foi consumada. Através desta decisão, o presidente da Ucrânia e a estrutura nazi-fascista que o envolve, com pólo no Batalhão Azov e respectivas ramificações, ficam de mãos livres para prosseguir o seu caminho no sentido da pretendida instauração plena de uma ditadura, sempre a pretexto do combate à “ameaça russa”. Confrontado com eleições marcadas para Março de 2019 e creditado pelas sondagens nuns minguados oito por cento de popularidade, o presidente Piotr Porochenko só tem a ganhar em consagrar-se o mais rapidamente possível como comandante-em-chefe de uma nação em estado de guerra contra um inimigo poderoso. A partir de agora, e pelo menos até finais de Janeiro – estas situações são facilmente prorrogáveis –, o presidente pode ilegalizar partidos, reforçar a censura à comunicação social, aterrorizar estratos populacionais com invasões de residências, prisões arbitrárias e confiscação abusiva de materiais. E também reforçar a ofensiva militar e a repressão de índole fascista sobre as populações da região de Donbass, sobretudo Donetsk e Lugansk. Quem sabe se Porochenko não conseguirá mesmo evitar as eleições presidenciais, facilmente adiáveis como prorrogáveis são os estados de excepção, desde que continue nas boas graças do Batalhão Azov cumprindo a sua agenda fascista? «A partir de agora, e pelo menos até finais de Janeiro – estas situações são facilmente prorrogáveis –, o presidente pode ilegalizar partidos, reforçar a censura à comunicação social, aterrorizar estratos populacionais com invasões de residências, prisões arbitrárias e confiscação abusiva de materiais» Este facto não fere, como não feriu em 2014, as férreas convicções “democráticas” da União Europeia e da NATO, que já garantiram estar sempre do lado da Ucrânia, como disse alto e bom som o secretário-geral da aliança militar, Jens Stoltenberg; ou como fez o próprio Conselho de Segurança da ONU, ao tomar o partido de Kiev quanto ao processo de discussão do incidente do Estreito de Kerch. Palavras e actos que, em nível subliminar, contemplam respostas aos apelos menos diplomáticos feitos pelo ex-comandante da NATO James Stavridis – “metam o Putin na ordem!” – e pelo embaixador ucraniano em Berlim, Andrij Melnik - “ponham o Putin no lugar!” Melnik pediu ainda mais: novas sanções contra a Rússia, a que Trump e Bruxelas se preparam para fazer a vontade; bloqueio de todas as importações de gás natural e petróleo da Rússia e “congelamento” do gasoduto NordStream 2, que tem início em território russo e termo na Alemanha. Este assunto já fia mais fino: a senhora Merkel parece não estar pelos ajustes e muitos governos europeus não estarão dispostos a pagar a energia a preços descomunais por causa de três tiros num barco de dois canos nos apertos da entrada do Mar de Azov. A situação tem ainda, obviamente, outras repercussões latentes, relacionadas com o previsto diálogo entre Trump e Putin, à margem da próxima reunião do G20. De Bruxelas a Washington há muita gente que não deseja encontros entre os dois presidentes, por causa do mito segundo o qual o dirigente russo “mete no bolso” o norte-americano. E o estado a que as coisas chegaram pode fazer-lhes a vontade; ou, pelo menos, concentrar na falsa questão ucraniana as palavras que deveriam dedicar-se a problemas reais como a Síria e a Península da Coreia, por exemplo. Agora com poderes reforçados, o presidente Porochenko já pediu mais navios de guerra da NATO para o Mar Negro; e a Rússia, pelo sim pelo não, vai despachar sistemas defensivos S-400 para a Península da Crimeia. Isto é, o cenário de guerra continua a aprontar-se nas fronteiras da Rússia; e se a provocação de domingo passado já fez o seu caminho, outras poderão promover novos passos para uma situação incontrolável. Com a Europa “democrática” e a aliança militar “democrática” encorajando, dando força e cobrindo sempre a Ucrânia fascista como sua ponta de lança. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. «Kiev passou da crítica ao quadro político para resolver a crise no Donbass para ameaças de acção militar e espero que (...) as capitais europeias exijam que [o presidente ucraniano] Zelensky implemente o Acordo de Minsk», disse Lavrov, citado pela TeleSur, no final de uma reunião com o seu homólogo indiano, Subrahmanyam Jaishankar. Por seu lado, o ministro ucraniano para os territórios temporariamente ocupados, Alexey Reznikov, disse ao canal ICTV que Kiev não enviará delegados a Minsk quando forem retomadas as consultas do Grupo de Contacto Trilateral (integrado por Rússia, Ucrânia e a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa – OSCE). Reznikov advogou a busca de «uma cidade e de um país diferentes», argumentando que «a Bielorrússia está sob influência da Rússia» e «não tem confiança» nela. A tensão entre ambos os países agudizou-se depois de o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, ter aprovado um decreto que visa a recuperação da Crimeia, reintegrada na Rússia após o referendo realizado em Março de 2014, pouco depois do golpe de Estado fascista em Kiev, com a decisão favorável da esmagadora maioria da população do território. Moscovo enviou tropas para a fronteira com a Ucrânia e acusou Kiev de ter levado a cabo «múltiplas» acções de provocação na «linha de separação» com as forças militares das autoproclamadas repúblicas populares de Donetsk e Lugansk, no Donbass. Ambas as partes se acusaram de violações do cessar-fogo e pela escalada do conflito. Peskov recordou esta terça-feira que o presidente russo, Vladimir Putin, manteve há alguns dias uma conversa com a chanceler alemã, Angela Merkel, e com o presidente francês, Emmanuel Macron, na qual expôs as preocupações de Moscovo com a situação na Ucrânia e, em particular, com as acções do país vizinho para agravar o cenário de conflito no Sudeste. Em declarações à imprensa, Dmitry Peskov disse ainda que o Kremlin tem sérias dúvidas de que a adesão da Ucrânia à NATO a ajude a lidar com os seus problemas internos, tendo sublinhado que, com esse passo, Kiev só irá agravar «a crise», uma vez que a ideia da integração na NATO é «profundamente inaceitável» para os milhões de pessoas que vivem nas autoproclamadas repúblicas populares de Donetsk e Lugansk, refere a TASS. O aviso do Kremlin sobre o reforço das fronteiras russas ocorre depois de Kiev se ter referido à «postura pró-activa» dos EUA no «apoio à soberania» e «restauração da integridade territorial» ucraniana. Moscovo alertou que não irá ficar de braços cruzados caso a NATO destaque tropas para a Ucrânia, um passo que «levaria a um novo aumento de tensões perto das fronteiras» e que «requererá medidas adicionais por parte da Rússia para garantir a sua segurança», afirmou esta sexta-feira à imprensa Dmitri Peskov, porta-voz do Kremlin. Antes disto, revela a RT, o Ministério ucraniano da Defesa emitiu um comunicado sobre a conversa telefónica mantida dia 1 de Abril com o secretário da Defesa dos EUA, Lloyd Austin, que comunicou aos ucranianos a «postura pró-activa» do seu país «no apoio à soberania e aos passos para restaurar a integridade territorial da Ucrânia». «Os EUA não deixarão a Ucrânia sozinha face à escalada da agressão da Rússia», afirmou o Ministério ucraniano da Defesa, que acusa Moscovo de anexar e ocupar a Crimeia, e de apoiar o movimento de resistência antifascista na região do Donbass, no Leste do país, onde recentemente, lembra a RT, se registaram novos episódios de violência na linha de demarcação com os territórios das repúblicas de Donetsk e Lugansk. Na entrevista que a RTP1 transmitiu esta segunda-feira, Jens Stoltenberg, secretário-geral da NATO, falou dos «muitos desafios complexos» com que a Aliança Atlântica se depara, mas nada do expansionismo militarista e das guerras de rapina que promove. Quem tiver visto e ouvido, de cabo a rabo, a conversa de Stoltenberg ontem à noite na RTP terá ficado com a impressão de ter acabado de ver e ouvir o cavaleiro branco de uma «santa aliança» pronta a dar cabo dos negrumes do mundo: terrorismo, o Daesh ou chamado Estado Islâmico, as ameaças cibernéticas, a assertividade da Rússia, a proliferação de armas na Coreia do Norte, os conflitos que «existem» no Norte de África, no Médio Oriente, Iraque, Síria, Afeganistão. Conflitos que por aí «há», que por aí «surgiram», e a que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN ou NATO, na sigla em inglês) tem de fazer frente. Apesar de ter passado uma boa parte da entrevista a falar da Rússia, no início o secretário-geral da NATO rejeitou a ideia de que a Aliança Atlântica esteja a «enfatizar a tensão com a Rússia na Europa de Leste», sublinhando que «a maior operação militar de sempre» da NATO decorre no Afeganistão. Não fez, no entanto, qualquer menção ao histórico, mais recente ou afastado, do intervencionismo dos «aliados da NATO» no país da Ásia Central. Também não se esperava que falasse de Reagan e talibans. Referindo-se à acção global da Aliança Atlântica, disse que esta integra «a coligação global para derrotar o Daesh» e que a NATO «fez muitos progressos nessa coligação, derrotando o Daesh no Iraque e na Síria». Mais à frente, não se quis comprometer em excesso, afirmando que a NATO não está no terreno no Norte da Síria: «Apoiamos a coligação com aviões-radar, mas não estamos no terreno», disse. «Também não se esperava que falasse de Reagan e talibans.» Nem «ai», nem «ui» sobre o facto de a coligação internacional que opera na Síria o fazer sem autorização do governo de Damasco e sem um mandato das Nações Unidas. E, aqui, também não houve menção ao esforço da Rússia – ao lado de Damasco. «A Nato está preparada para defender qualquer aliado, contra qualquer ameaça, é essa a mensagem principal, o ideal principal da NATO», disse, salientando que «a razão pela qual a NATO é forte e unida não é para provocar um conflito, mas sim para evitar um conflito». Percebe-se o ultraje sentido por quem olha para o mundo e vê as guerras de agressão e saque do capitalismo, as operações de desestabilização fomentadas pelos Estados Unidos da América no pátio traseiro global – as de agora e outras mais –, tendo a NATO por braço armado. O ex-primeiro-ministro norueguês trouxe ainda à tona a ideia da «paz na Europa durante quase 70 anos, um dos mais longos períodos de paz durante séculos na Europa», sem lhe ocorrer a menção da destruição da Jugoslávia e do golpe de 2014 na Ucrânia, com o apoio dos Estados Unidos e da União Europeia (UE), com a guerra subsequente no Donbass, onde a população rejeitou a ameaça fascista e se ergueu em armas. Sobre a Rússia, Jens Stoltenberg afirmou que «é possível combinar defesa, dissuasão e diálogo». Ou seja, deu sequência ao discurso do vizinho maléfico que acossa a Europa em paz com os seus bandos de hackers e as suas campanhas de propaganda e desinformação. O secretário-geral da NATO disse mesmo que a Rússia está «mais assertiva». Tão marota que até usa «ferramentas diferentes» e, por isso, a impoluta NATO «está a responder com o reforço das ciberdefesas». A UE também já se precaveu. «Parceria estratégica» com a Rússia é coisa que não existe – não por falta de tentativa da NATO, frisou, mas porque Moscovo «decidiu tentar reestabelecer esferas de influência e, de certa forma, controlar os seus vizinhos, como vimos na Geórgia, Moldávia e na Ucrânia». E isto é algo que a NATO, tutelada pelos Estados Unidos da América, carregada de arsenais em prol da paz no mundo e a cavalgar há anos sobre os despojos da União Soviética e amigos, não pode tolerar. Assim, a NATO vai procurar uma forma de dizer que «são firmes», que «são fortes», mas tentando reduzir a tensão, para evitar um conflito e manter um diálogo, disse Stoltenberg. Já a Rússia não tem nada de se preocupar com o facto de estar rodeada por países que se tornaram membros da NATO, pois foi uma decisão de «nações soberanas e independentes». E, se preocupações tem quanto à existência de uma Frente Leste da Aliança Atlântica, a culpa é sua, «consequência directa das [suas] acções agressivas contra a Ucrânia», justificou Stoltenberg, aludindo à situação no Donbass, no Leste da Ucrânia, e à reintegração da Crimeia na Federação Russa. O secretário-geral da NATO insiste que a integridade territorial e a soberania da Ucrânia foram violadas na Crimeia e no Donbass, por forças apoiadas pela Rússia e com apoio militar russo, mas, como se estivesse num universos paralelo, não fez uma alusão, ao golpe de 2014 em Kiev, ao fascismo na Ucrânia – ou na Polónia ou na Letónia. Nem se referiu como, em Julho do ano passado, a NATO promoveu os Irmãos da Floresta, que lutaram «contra o Exército Vermelho pelas suas pátrias», no Báltico, e que integravam muitos membros das SS nazis ou colaboradores com as forças nazis invasoras. O secretário-geral da NATO afirmou que os EUA têm mostrado que «estão empenhados nos laços transatlânticos», acrescentando que Washington está mesmo a aumentar a presença militar no continente europeu, depois de anos de declínio. «É um compromisso que vemos não são só em palavras, mas também em factos», frisou Stoltenberg. Não abordando a questão do aprofundamento da militarização da UE, a criação da chamada cooperação estruturada permanente (CEP) e a complementaridade – que já defendeu noutros momentos – entre aquilo a que chama Defesa Europeia e a NATO, o responsável da Aliança Atlântica sempre se referiu à necessidade de cooperar em matéria de defesa na UE para «resolver a fragmentação da indústria de defesa europeia». Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Peskov, por seu lado, sublinhou que a percepção da Rússia como inimigo e adversário é «deslocada» e «inadmissível», uma vez que Moscovo «não ameaça ninguém e nunca o tinha feito», baseando toda a sua política neste principio, informa o portal russo. Na quinta-feira, em resposta a alertas do lado ucraniano sobre movimentações de tropas russas junto à fronteira, Peskov já tinha afirmado que a transferência de tropas dentro da Federação Russa não devia preocupar ninguém, nem constitui uma ameaça para ninguém, revelou a TASS. O funcionário do Kremlin reafirmou que «as tropas russas nunca participaram, nem estão a participar agora em conflitos armados em solo ucraniano», acrescentando, citado pela mesma fonte, que «nem a Rússia, nem os países europeus, nem outros países do mundo gostariam de ver a guerra civil na Ucrânia incendiar-se outra vez como resultado das provocações e dos passos provocadores dos militares ucranianos». No Donbass, região do Leste da Ucrânia de maioria russa, onde as populações se insurgiram contra o golpe de Estado fascista de Maidan que depôs Viktor Yanukovich, em 2014, patrocinado pela União Europeia e os Estados Unidos, e onde foram autoproclamadas as repúblicas populares de Donetsk e Lugansk, a situação agudizou-se no passado dia 26 de Março, segundo a RT, com a morte de quatro soldados das Forças Armadas ucranianas, perto da localidade de Shumy, embora outras fontes assinalem, já há algum tempo, a violação repetida do cessar-fogo por parte das tropas ucranianas. O novo governo, imposto sem eleições, permitiu que grupos paramilitares fascistas dessem rédeas ao ódio anti-russo e anti-comunista. Milhares de mulheres e homens deram corpo à resistência. Quando se cumpriam quatro anos da rebelião antifascista que se espalhou como pólvora por todo o leste da Ucrânia, atravessei a fronteira através da Rússia num autocarro onde viajavam meia centena de antifascistas de vários países. Respondendo ao apelo do grupo musical italiano Banda Bassotti, que tocou duas vezes em Portugal na Festa do «Avante!», percorreram durante uma semana os territórios em resistência visitando orfanatos, hospitais, fábricas, sindicatos e autarquias. No primeiro dia, entre Rostov-sobre-o-Don, cidade russa no Norte do Cáucaso, e a fronteira com a auto-proclamada República Popular de Lugansk (RPL), atravessámos cerca de uma centena de quilómetros de estepe. Enquanto viajávamos por terras de cossacos, Mitya Dezhnev explicava-me como teve de fugir da sua terra para a Rússia e de como não podíamos deixar esquecer os comunistas que todavia resistiam na Ucrânia controlada por Kiev. «Queres ouvir uma canção que era muito popular no tempo da União Soviética?», perguntou-me em inglês antes de começar num quase perfeito português a cantar o «Avante, camarada!». Foi em 2014, uma semana depois do massacre que vitimou cerca de meia centena de pessoas em Odessa, na Ucrânia, que as populações do leste do país se insurgiram contra o golpe de Estado patrocinado pela União Europeia e pelos Estados Unidos que depôs Viktor Yanukovich. O novo governo, imposto sem eleições, permitiu que grupos paramilitares fascistas dessem rédeas ao ódio anti-russo e anti-comunista. Sem qualquer protecção e ante a ofensiva fascista, milhares de mulheres e homens concentraram-se nas principais praças das localidades insurrectas e deram corpo à resistência. Primeiro, tomaram as instituições e desarmaram as forças de segurança e, depois, organizaram-se militarmente constituindo milícias antifascistas. Nessa semana, as principais regiões da industrial Bacia do rio Don, conhecida como Donbass, declararam a independência e constituíram-se em dois países: a República Popular de Donetsk (RPD) e a RPL. Depois de pesados bombardeamentos que vitimaram milhares de pessoas, o apoio militar russo foi decisivo para evitar a barbárie e a conquista destes territórios por Kiev. O cessar-fogo que formalmente se mantém é desmentido na prática pelos sucessivos confrontos na linha da frente. As sucessivas provocações patrocinadas pela NATO continuam a causar vítimas entre os civis que moram em localidades ao alcance da artilharia ucraniana. Empurrados, primeiro pelas perseguições e depois pela guerra, dezenas de milhares de ucranianos continuam exilados na Rússia ou nas zonas sob controlo das forças democráticas. Neli Zadiraka foi outra das pessoas que conheci nessa condição. É uma das deputadas da sede do poder legislativo da RPL, o Conselho Popular de Lugansk. Foi obrigada a abandonar a sua casa em Rubezhnoe, território da região ocupado pela Ucrânia. Foi ela que, em 2014, leu a declaração de independência da RPL e, por essa razão, é considerada terrorista pelo governo ucraniano. Neli apontou para a estrela vermelha do brasão da jovem república e explicou-me que se inspira nos símbolos e valores da União Soviética. Esse foi, aliás, um elemento presente em toda a viagem. Para além da preservação e do respeito pelos monumentos e símbolos, a presença da foice e do martelo é constante. Em conversa com vários habitantes de Lugansk e Donetsk, a chegada do fascismo ao poder na Ucrânia veio reforçar as convicções políticas dos cidadãos de ambas as repúblicas. Mas não é algo recente. Em 2012, nas últimas eleições antes do golpe fascista, o Partido Comunista da Ucrânia conquistou 13,2% dos votos em todo o país. Em Kiev, obteve somente 7,23% e no ocidente houve regiões em que aquele partido não superou os 2%. Mas no oriente, sobretudo, nas regiões de Donbass, os valores oscilaram entre os 18% de Odessa e os 29,46% de Sebastopol, na Crimeia. Em Donetsk, os comunistas chegaram aos 18,85% e, em Lugansk, atingiram os 25,14% dos votos. Em Makeeva, cidade vizinha de Donetsk, a organização local do Partido Comunista da RPD organizou uma iniciativa cultural que envolveu centenas de pessoas para receber gente de tantos países, numa cerimónia em que se entregaram os cartões a dois combatentes especiais. Um miliciano vindo do Texas e outro da Colômbia que escolheram atravessar o mundo para abraçar a causa antifascista ao lado dos soldados desta região. O colombiano decidiu baptizar-se com o nome de guerra Alfonso Cano em homenagem ao comandante histórico das FARC e contou-me que decidiu voluntarizar-se para combater o fascismo em Donbass como parte das suas convicções políticas. São muitos os combatentes internacionalistas que participam nos exércitos das duas repúblicas. Na companhia de Boris Litvinov, Primeiro Secretário do Partido Comunista da RPD, que foi, aliás, o primeiro a encabeçar o Soviete Supremo da RPD, o novo órgão legislativo daquele país, conhecemos um dos corações industriais da Europa. Antes de chegarmos a uma das mais importantes minas de carvão da Europa, erguia-se um muro escrito recentemente com spray: «Somos cidadãos da União Soviética». Em 2013, antes do golpe, a Ucrânia produzia 84,8 milhões de toneladas. Três anos depois, esses números baixaram para menos de metade: 41,8. O objectivo do imperialismo, quando interveio na Ucrânia, não foi apenas levar mais longe as fronteiras da NATO, violando uma vez mais os compromissos assumidos com os últimos dirigentes soviéticos. Foi também controlar um país com importantes recursos, sobretudo na região que agora resiste ao avanço das forças apoiadas pelos Estados Unidos e União Europeia. Nas últimas semanas, a guerra intensificou-se e muitas das pessoas com que conversei admitem que o governo de Kiev pode estar a preparar uma provocação a larga escala durante o Campeonato Mundial de Futebol. Petro Poroshenko, presidente da Ucrânia, acaba de ser recebido em Espanha por Pedro Sánchez, novo chefe do governo, e falava abertamente ao diário El País do falso assassinato do jornalista Arkadi Babchenko como uma técnica necessária para proteger os dissidentes. Sem qualquer vergonha, acrescentou que há uma campanha russa de notícias falsas para destabilizar o mundo. É este o carácter de um governante que anunciava meses depois do golpe que faria tudo para que as crianças da Ucrânia pudessem ir à escola e para que as de Donbass ficassem fechadas em caves. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Pelas mortes, o governo da Ucrânia responsabilizou «forças de ocupação russas», referindo-se, segundo a RT, a efectivos da República Popular de Donetsk, cujos representantes negaram qualquer ligação ao facto e, posteriormente, declararam que os militares ucranianos morreram por terem pisado um explosivo durante uma inspecção a campos minados. A este propósito, Peskov disse que «não tentava fazer passar os desejos por realidade». «Para nossa desgraça, a realidade na linha de contacto é bastante aterradora, têm lugar provocações por parte das Forças Armadas da Ucrânia, e não são casos isolados, mas múltiplos», afirmou. No que respeita à Crimeia, o governo russo considera a sua integração no país um facto consumado e inteiramente legítimo. A Ucrânia nunca reconheceu os resultados do referendo realizado em Março de 2014, pouco depois do golpe de Estado em Kiev, em que a maioria esmagadora da população do território se pronunciou a favor da reintegração na Rússia. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. A observação de Peskov segue-se à afirmação feita, também esta terça-feira, pelo presidente ucraniano de que «a NATO é a única via para acabar com a guerra no Donbass», na sequência de uma conversa telefónica com o secretário-geral da Aliança Atlântica, Jens Stoltenberg. Também ontem, o vice-ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Sergei Ryabkov, disse à TASS que Moscovo tinha discutido a situação no Donbass com a administração norte-americana, alertando-a para as «consequências das políticas provocadoras de Kiev no Donbass», bem como para «o comportamento cada vez mais desafiante» dos seus apoiantes ocidentais, liderados pelos EUA. Na segunda-feira, um representante do Departamento de Estado norte-americano afirmou que Washington estava disponível para «interagir» com Moscovo sobre a situação no Leste na Ucrânia. Quanto às movimentações de tropas russas perto da fronteira com a Ucrânia e na Crimeia, considerou-as «credíveis», refere ainda a TASS, e instou a Rússia a não realizar acções «que possam conduzir a uma escalada». Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Na ocasião, Stoltenberg congratulou-se pelo facto de a NATO «ajudar a Ucrânia a concretizar as suas aspirações euro-atlânticas» e prometeu «continuar a desenvolver» a cooperação com este país, e também com a Geórgia, sobre as questões «da segurança no Mar Negro». Ainda em Bruxelas e também em meados de Abril o secretário de Estado norte-americano, Anthony Blinken, avistou-se com os ministros dos Negócios Estrangeiros de França, Alemanha, Itália e Reino Unido para proclamar o apoio à «integridade territorial» da Ucrânia; saudou a «contenção de Kiev» perante as «provocações russas» enquanto acusava Moscovo de «retórica incendiária», de multiplicar «ataques na zona de contacto» e de reforçar os dispositivos militares na região. Enquanto isso, dois cruzadores norte-americanos movimentaram-se em direcção ao Mar Negro para juntar-se aos vastos meios navais e aéreos da NATO já ali presentes; e cinco aviões militares de transporte Hércules C-130 viajaram de Estugarda para Kiev. A Aliança Atlântica, entretanto, criou um centro de treino de tiro de precisão em Mariupol. Recorda-se que um dos episódios fulcrais do golpe Euromaidan foi a utilização de snipers georgianos que dispararam simultaneamente sobre manifestantes e polícias para acelerarem os confrontos e o desfecho «democrático» pretendido pela NATO e a União Europeia. A Rússia, por seu lado, tem respondido à militarização da Ucrânia pela NATO sob pretexto dos exercícios «Defender Europe 21» com o reforço dos dispositivos militares na Península da Crimeia e na sua fronteira com a Ucrânia, neste caso através da recolocação do importante corpo de pára-quedistas de Pskov. Sendo certo que Zelensky não agiu sozinho ao assinar o decreto sobre «reconquistar» a Crimeia poderá levantar-se uma interrogação clássica: porquê agora? Na verdade, já não resta muito tempo aos Estados Unidos para tentarem alcançar um dos objectivos essenciais dos últimos anos que é o de impedirem a construção do gasoduto North Stream 2 acordado entre a Rússia e a Alemanha para abastecer a Europa de gás natural russo. Os trabalhos estão em fase de conclusão, apesar de várias empresas europeias se terem retirado devido às sanções de Washington, e continuam a ter o apoio da poderosa economia alemã. «A realização das gigantescas manobras anuais “Defender Europe”, dedicadas aos mares Negro e Báltico e à Ucrânia em particular, definiu a janela de oportunidade própria para Zelensky atear o rastilho de uma situação altamente provocatória, que envolve a movimentação de capacidades nucleares» Liquidar este projecto de cooperação é, para os dirigentes de Washington, uma via para entorpecer ainda mais as relações entre a União Europeia e Moscovo e, sobretudo, para perturbar gravemente a cooperação especial entre a Rússia e a Alemanha, que se desenvolve claramente à revelia das posições da União Europeia e, sobretudo, da NATO. Enquanto proclama a necessidade de preservar a «integridade» da Ucrânia, Berlim mantém a aposta no gasoduto, incorrendo na reprovação de Washington. A realização das gigantescas manobras anuais «Defender Europe», dedicadas aos mares Negro e Báltico e à Ucrânia em particular, definiu a janela de oportunidade própria para Zelensky atear o rastilho de uma situação altamente provocatória, que envolve a movimentação de capacidades nucleares. Está implícita nestas movimentações a intenção de transformar a operação provocatória numa situação de tensão permanente a alto nível, terreno propício para os especialistas em criar focos de confronto que povoam a região, sobretudo os enraizados grupos nazis em que assenta a operacionalidade do regime de Kiev. O presidente russo, Vladimir Putin, tentou deitar um pouco de água na fervura entrando directamente em contacto com o presidente francês e a chanceler alemã alertando-os para os riscos que estão a ser vividos e pelos quais a Europa pagará um preço incalculável se forem levados às últimas consequências. Merkel e Macron, porém, são peixes graúdos da NATO mas não são a NATO. É tudo gente de «boas famílias», bem-parecida e muito fashion, instruída nas melhores universidades, defensora de causas para melhor as adulterar, mas sempre muito polida, com estilo. Intelligence Online, uma newsletter internacional que divulga recados dos serviços secretos ocidentais, publica um curto texto sob o sugestivo título «Biden vai acabar na Síria o que Obama começou». Mais palavras são desnecessárias: a frase vale pelas 10 ou 20 mil palavras de um programa de governo. Ilusões para que vos quero. Basta passar uma vista de olhos pelo currículo belicista do novo presidente dos Estados Unidos da América, Joseph Biden, para antever uma gestão a condizer, pesem embora os floreados e fogos-de-artifício com que foi celebrada a sua conturbada e controversa eleição. O asfixiante aparelho global de propaganda quis fazer passar ao mundo a imagem branqueadora de que uma nova era começa, estamos perante uma ruptura em relação à tragédia dos últimos quatro anos. Nada mais enganador. Como diria o último ditador fascista de Portugal, apresentando a sua «primavera», estamos perante uma «evolução na continuidade». Entre Trump e Biden a diferença é de estilo, de polimento, de verniz que tanto agrada à camada bem pensante da comunicação «de referência». A substância é a mesma, com mais globalismo e menos nacionalismo, uma espécie de «América primeiro em todo o lado» em vez de um doméstico «América primeiro». Antes de ser presidente, Biden foi vice-presidente de Barack Obama e senador durante décadas. Por isso é possível encontrá-lo apoiando vivamente o racismo institucionalizado na sociedade norte-americana – por muito que queiram limpar-lhe a imagem – e guerras imperiais a fio como as invasões de Granada (1983) e do Panamá (1989), a destruição da Jugoslávia com os bombardeamentos de Belgrado (1999), as invasões do Afeganistão (2001) e do Iraque (2003); ou então aconselhando os presidentes democratas e irmanando-se aos presidentes republicanos, de Reagan à família Bush conforme os casos. Não é excessivo lembrar que nestas gestas imperiais para exportar a «democracia», impôr medidas «humanitárias» ou cumprir o mandamento R2P (Responsabilidade para Proteger, uma invenção democrata) não existem diferenças de fundo entre democratas e republicanos, quanto muito praticam-se métodos mais ou menos elaborados de gestão da propaganda de guerra. Já como vice-presidente, Biden desempenhou papéis de primeiro plano na reactivação da guerra do Afeganistão (2009), na ocupação do Iraque, nas revoluções coloridas que ficaram genericamente conhecidas como «primaveras árabes», nas atrocidades que provocaram a destruição da Líbia, no golpe que levou o fascismo ao poder na Ucrânia (2014) e no lançamento da sanguinária agressão contra a Síria. É esse trabalho inacabado, o do desmantelamento e destruição da Síria, que Biden se propõe agora concluir como presidente – a crer nos vaticínios da comunidade dos serviços secretos ocidentais. E que serve apenas como exemplo pontual de uma agenda intervencionista à escala global, como é apanágio da bem-falante, neoliberal pura e tecnocrática elite democrata. Dois sinais imediatos revelam os contornos dessa agenda: o reforço da NATO e o regresso ao activo, mais coisa menos coisa, do esquadrão de dirigentes e assessores das administrações Obama, o presidente que, na história dos Estados Unidos, cometeu mais assassínios extrajudiciais explorando, principalmente, o crescente recurso aos drones. A revalorização da NATO na perspectiva norte-americana é uma consequência esperada do regresso dos democratas ao poder. Expoentes do globalismo neoliberal e da progressiva supressão dos Estados na via para o governo global – meta tão acarinhada pelo seu guru Henry Kissinger – têm numa Aliança Atlântica pluricontinental o instrumento militar transnacional para assegurar a gestão das guerras existentes, sejam os conflitos convencionais ou as guerras frias com a Rússia e com a China, sempre sob comando operacional dos Estados Unidos. Em relação ao gigante asiático, não existem indícios em Washington de um abrandamento do clima de confrontação instaurado por Trump, admitindo-se que possa ter cambiantes eventualmente na frente comercial; na vertente militar não será de excluir um endurecimento, olhando para alguns nomes que integram o esquadrão de dirigentes e assessores de Biden. Quanto ao novo presidente, o mote está dado: tanto Putin como Xi Jinping são «bandidos». O regresso à NATO, depois da deriva de Trump, será processado, como sempre, sob o comando operacional dos Estados Unidos mas com «partilha de responsabilidades», isto é, através do aumento das despesas militares dos Estados membros – e que já era uma exigência do antecessor de Biden. É grande a satisfação nas chancelarias europeias, principalmente as que respeitam o fundamentalismo atlantista, sentimento ecoado também pela comunicação de «referência», sempre rendida ao «charme» democrata, tão distante e afinal tão próximo da metodologia trauliteira da mais recente versão republicana. Quanto às despesas militares, não faltará dinheiro aos Estados membros. Do fundo da criatividade dos think tanks democratas surgiu a ideia de criar um banco da NATO, a instituição onde os governos poderão encontrar financiamento para constante «modernização» dos arsenais de guerra e reforço dos lucros dos colossos da indústria militar à custa dos bens dos contribuintes. A administração de Joseph Biden é nova, mas os seus principais membros nem tanto. Têm origem no núcleo central das administrações Obama, pelo que não surpreende que desejem prosseguir e terminar o que no fundo iniciaram. O que não pressagia nada de bom para o mundo. O novo secretário de Estado, a quem compete substituir o fascista e sionista cristão Michael Pompeo, é Anthony Blinken, um «príncipe da diplomacia» para a comunicação bem-falante mas, na realidade, um fanático da confrontação com a Rússia, um defensor da entrega de armas letais ao regime fascista da Ucrânia, um defensor do intervencionismo norte-americano como expressão de «dever moral», um fervoroso «excepcionalista» dos Estados Unidos como nação com o «destino manifesto» de guiar o mundo. Olhado como um sonhador do «romantismo transatlântico», Blinken desempenhou a função de secretário de Estado adjunto de Obama e nessa qualidade foi determinante para a sangrenta destruição da Líbia, o início da carnificina na Síria e também para o apoio militar e político à Arábia Saudita na agressão ao Iémen – a origem da maior crise humanitária da actualidade. Não lhe faltam também as credenciais como intrépido defensor de Israel: entre as suas primeiras decisões estão as de confirmar tudo o que Donald Trump fez contra o direito internacional em relação a Jerusalém Leste, aos Montes Golã e à colonização dos territórios palestinianos. Também não demonstrou qualquer intenção de «destituir» Guaidó na Venezuela e de abandonar o golpismo contra este país; defende inclusivamente que as sanções sejam «mais efectivas». Anthony Blinken resumiu assim no podcast Intelligence Matters o seu conceito para lidar com as guerras eternas em curso: «Operações sustentadas, de média dimensão, discretas, talvez realizadas por forças especiais para apoiar actores locais». Trata-se, afinal, de materializar o discurso de posse de Biden e segundo o qual os Estados Unidos se tornaram «a principal força do Bem no mundo». Apesar de democrata, Anthony Bliken trabalha amiúde com o neoconservador republicano Robert Kagan, autor da bíblia imperial intitulada «Projecto para o Novo Século Americano», usada como referência pelos últimos presidentes norte-americanos independentemente dos respectivos rótulos políticos. O novo secretário de Estado fez-se rodear por homens e mulheres com inegável pedigree e provas dadas nos tempos de Obama. Victoria Nuland, por exemplo, mulher do citado Robert Kagan, foi uma figura operacional do golpe na Ucrânia que levou ao poder organizações nazis, por acaso despreza a União Europeia e defende a aceleração e intensificação do confronto com a Rússia. A sua designação é qualificada como uma provocação directa a Vladimir Putin. Joseph Biden nomeou o general de quatro estrelas Lloyd Austin para secretário da Defesa e chefe do Pentágono. Foi comandante do CENTCOM, o comando norte-americano para as operações no Médio Oriente e chefiou, a partir do Verão de 2010, as tropas de ocupação do Iraque. Para muitos é um «criminoso de guerra». Assumiu posteriormente o comando adjunto das Forças Armadas, no período que coincidiu com as fases iniciais das agressões contra a Líbia e a Síria. Actualmente era administrador da Raytheon, um dos gigantes da indústria de guerra dos Estados Unidos e dos que mais lucra com os conflitos alimentados pelo império. A designação de Austin foi considerada, apesar de tudo, uma surpresa. A favorita para chefe do Pentágono era uma funcionária imperial por excelência, Michèle Flournoy, recomendada por Hillary Clinton e que se bate, por exemplo, para que os Estados Unidos se armem de maneira a serem capazes de dizimar todos os submarinos, navios de guerra e mercantes chineses no Mar da China Meridional em 72 horas. Tanto zelo não foi, apesar de tudo, desperdiçado porque Flournoy não ficou longe da esfera do poder Biden. A empresa que fundou juntamente com o actual secretário de Estado Blinken, a Westexec Advisors, foi recrutada para aconselhar o Departamento de Estado sobre o Médio Oriente, em particular a Síria. Teremos, em breve, novidades destas áreas – e não serão boas. Jack Sullivan, no Conselho de Segurança Nacional, é outra recomendação de Hillary Clinton, esta directamente aceite. Sullivan gosta de brincar com o fogo. Esteve nas decisões que conduziram ao envolvimento da NATO na Líbia em aliança com os terroristas islâmicos – grupos estes que actualmente conduzem os movimentos jihadistas no Mali e no Níger, «justificando» a presença de tropas coloniais nessa região africana. E fez pressão para transformar em confronto assumido entre a Rússia e os Estados Unidos as escaramuças esporádicas ocorridas na Síria entre militares russos e norte-americanos. Biden nomeou Avril Haines como directora nacional de inteligência, cargo para o qual parece especialmente dotada. Como directora adjunta da CIA, nos tempos de Obama, coordenou o programa de assassínios selectivos com drones cometidos pelo presidente. Censurou o relatório sobre a tortura da CIA apresentado no Senado e tornou-se conselheira presidencial adjunta de segurança nacional, posição em que substituiu o actual secretário de Estado, Anthony Blinken. Uma das especialidades de Haines tem bastante actualidade. Em 2018, intervindo na Camden Conference, previu o aparecimento a breve prazo de um vírus que afecta o aparelho respiratório humano e que rapidamente se espalharia através do planeta; em Outubro de 2019, poucas semanas antes de identificado o «vírus de Wuhan», foi uma figura central do «Evento 201», uma reunião em Nova York na qual foi simulada a situação decorrente do aparecimento de um coronavírus de fortíssimo contágio e susceptível de matar milhões de pessoas em todo o mundo. A super-espia de Biden alia assim as capacidades de vidente aos reconhecidos talentos operacionais. William Burns foi colocado à cabeça da CIA. Começou a carreira ainda na administração de Reagan, um republicano de quem Trump tentou seguir o caminho; depois de ter sido embaixador na Rússia foi secretário de Estado adjunto de Obama, precisamente nos períodos das guerras da Líbia, da Síria e do golpe na Ucrânia. Por falar em CIA e respectivos braços, Samantha Power encabeça agora a USAID (Agência para o Desenvolvimento Internacional), instância que, a coberto da diplomacia, é um instrumento fundamental da ingerência norte-americana nos assuntos de outros países, designadamente as revoluções coloridas e outras operações de mudança de regime. Considerada uma intervencionista de choque, Samantha Power é discípula de Madeleine Albright, com quem se familiarizou na teorização sobre intervenções humanitárias e outras formas de provocar a substituição de governos que caiam em desgraça perante os Estados Unidos. Madeleine Albright, apesar da sua idade, continua no activo e é uma inspiração para os membros da administração Biden. A sua obra-prima, a destruição sangrenta da Jugoslávia, é o ponto alto dessa referência. A nova administração norte-americana conta com a activíssima e mediática colaboração da poderosa constelação que manipula a chamada sociedade civil de acordo com os interesses da clique globalista dominante do Partido Democrata. Tratam-se de entidades altamente financiadas, como por exemplo a Human Rights Watch, a Amnistia Internacional e a Freedom House, organizações não-governamentais da área dos «direitos humanos» e que têm como missão branquear as atrocidades cometidas pelos governos dos Estados Unidos nessa matéria. O financiamento desse universo é assegurado, em parte, pelas principais fundações norte-americanas associadas principalmente ao Partido Democrata, de entre as quais se destacam a Ford, a Rockfeller e outras instituições como o Brookings Institute, o Carnegie Endowment, o New Endowment for Democracy (NED) e também o Fórum Económico Mundial de Davos – o mesmo que prepara o Great Reset, o «grande reinício» do capitalismo à sombra dos efeitos sociais, geopolíticos e geoeconómicos da pandemia de Covid-19. Com uma influência avassaladora na comunicação social corporativa, este aparelho emanando do vetusto e enraizado Conselho de Relações Externas de que Kissinger foi um dos fundadores, alimenta a ideologia dominante do globalismo neoliberal, desde o capitalismo «verde» aos conceitos distorcidos de guerra e paz, à extinção progressiva da influência dos Estados, a manipulação do desenvolvimento tecnológico e a governação global apresentadas como zénite da evolução «progressista» da sociedade. Os meios que fabricam a opinião dominante incensam e adoram este aparelho do qual a clique do Partido Democrata é o agente executivo mais influente. É tudo gente de «boas famílias», bem-parecida e muito fashion, íntima de Hollywood e dos meios cor-de-rosa «chic», instruída nas melhores universidades, defensora de causas para melhor as adulterar, mas sempre muito polida, com estilo. Até parece que as vítimas das carnificinas e dos atentados à democracia que essa elite patrocina através do mundo são elas próprias responsáveis pelas incidências fatais que as atingem. A administração Biden simboliza tudo isto. Só tem ilusões sobre o seu papel quem não consegue ou não quer escapar à realidade virtual que nos oprime. José Goulão, Exclusivo O Lado Oculto/AbrilAbril Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Outra circunstância que favorece o clima de elevada tensão instaurado é a reconstituição, em torno de Joseph Biden agora como presidente dos Estados Unidos, da equipa operacional da estrutura do Partido Democrata norte-americano que montou o golpe ucraniano de 2014 e que fez do regime assim implantado em Kiev um instrumento provocatório ao serviço do expansionismo da NATO e dos desígnios imperiais de Washington. Anthony Blinken, secretário de Estado norte-americano, ele próprio de origem ucraniana, era membro do Conselho de Segurança Nacional e depois secretário de Estado adjunto no período em que a administração Obama/Biden promoveu o golpe. Blinken canalizou através de Victoria Nuland, operacional do Departamento de Estado em funções no terreno, os cinco mil milhões de dólares para instaurar «um bom governo em Kiev», como recomendou o actual secretário de Estado. Nuland esteve em pessoa na Praça Maidan, em Kiev; gravações de conversas nas quais participou dão conta do processo como foram escolhidos os dirigentes ucranianos empossados na ocasião, entre eles alguns quadros de chefia do arreigado sector nazi com passado hitleriano. O interlocutor de Nuland nessas conversas foi Geoffrey R. Pyatt, actual embaixador dos Estados Unidos na Grécia, de onde dirigiu as operações que criaram, à revelia da vontade popular, um país conhecido como Macedónia do Norte, mais uma parcela da antiga Jugoslávia agora submetida às ordens da NATO e da União Europeia. Pyatt era embaixador na Ucrânia em 2013/2014. Agora é o titular da diplomacia de Washington na Grécia, país que acolhe os jogos de guerra «Iniochos 21» da NATO, centrados no Mar Egeu e também com participação de tropas israelitas e dos Emirados Árabes Unidos, por sua vez integrados na macro estrutura dos exercícios «Defender Europe 21». Biden, Blinken, Nuland, Pyatt – a equipa operacional do golpe Euromaidan está de regresso à Ucrânia, dando a ideia nítida de que pretende retomar o que iniciou e levá-lo até às últimas consequências nas fronteiras com a Rússia. Entretanto, continuamos a ser informados de que tudo está a acontecer por causa da «agressão russa». Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Opinião|
Cronologia de uma provocação aterradora
Acontecimentos vertiginosos
A «contenção» de Kiev
Internacional|
Rússia acusa a Ucrânia de não assumir o controlo das suas forças armadas
Opinião|
O enredo da provocação no estreito de Kerch
Em que contexto?
Antecedentes
Para quê?
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Escalada de tensões e provocações
Adesão da Ucrânia à NATO não será aceite por quem vive no Donbass
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Rússia tomará «medidas adicionais» se a NATO destacar tropas para a Ucrânia
Internacional|
Secretário-geral da NATO entrevistado na RTP
Fascismo na Ucrânia ou destruição da Líbia? Não, ameaça russa!
Diálogo, sim, mas a culpa é da Rússia
EUA reforçam presença militar na Europa
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«A realidade na linha de contacto é bastante aterradora»
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Resistência antifascista em Donbass
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As razões do fenómeno
Opinião|
Perfil da nova tropa de choque do império
Aposta em força na guerra
Quem é quem na nova administração
Senhores e Senhoras da guerra e dos golpes
Constelação cintilante
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Recorde-se que, em relação à Ucrânia, a cimeira da NATO de Bucareste, em 2008, prometeu a sua adesão (e da Geórgia). Em resultado do golpe de Estado da Maidan1 de Fevereiro de 2014, a antiga segunda república soviética em termos económicos e demográficos converteu-se em centro avançado da campanha russófoba e da desestabilização e ameaça militar contra a Rússia. Perdeu de facto a sua soberania e independência nacionais. Os destinos do país, a composição do governo, as principais leis, a economia e a gestão das empresas estruturantes passaram a ser em grande medida decididos desde o exterior. Hoje é «carne para canhão» de uma guerra – iniciada não este ano, mas em 2014 – que representa uma tragédia para os povos ucraniano e russo, e cujas responsabilidades o pensamento único dominante necessita totalmente de assacar à Rússia.
O poder da oligarquia ucraniana, acolitada aos desígnios determinados em Washington (seguidos por Londres, Bruxelas, Berlim, Paris…), empurrou o país para um caminho sangrento e destrutivo, contrário aos interesses e aspirações fundamentais do povo ucraniano, exacerbando os factores de divisão e discriminação interna e provocando a ruptura da sua integridade. Sim, a estratégia de «revolução colorida» surtiu efeito na Ucrânia; os mais de cinco mil milhões de dólares que Victoria Nuland reconheceu, durante o golpe da Maidan, que os EUA investiram na «promoção da democracia» na Ucrânia desde 1991 conduziram, depois do ensaio da «revolução laranja» de 2004, à efectiva ruptura de 2014.
A partir do golpe armado da Maidan, as forças ultranacionalistas e neonazis assumiram um papel determinante nos destinos da Ucrânia, qualitativamente bem acima da sua representação eleitoral. Facto saliente que a narrativa do combate entre democracia e autocracia no mundo opta, diligentemente, por ignorar e silenciar. Como ofusca a paulatina instauração da ditadura após 2014, passando hoje pela proibição do Partido Comunista da Ucrânia e das forças políticas da oposição ao poder herdado do golpe da Maidan, incluindo partidos representadas no parlamento nacional, o encerramento de órgãos de comunicação social, a perseguição da língua e cultura russas (que Kiev pretende substituir pelo introdução do idioma polaco e a «abertura» geral do país à Polónia...), o aprofundamento do pavoroso assalto à memória e a reescrita da história.
O mito da ucrainização (um país, um povo, uma língua) foi sempre um projecto americano e de sectores minoritários dentro do país. Nunca reflectiu os interesses e a realidade moderna nacional da Ucrânia, a sua história, construção estatal e fronteiras, legadas da era soviética. Um caminho que coloca hoje em causa a continuidade do próprio Estado ucraniano, dificulta uma solução política e contribui para aproximar o cenário de partição do país, que pode estar tenebrosamente a ser negociada debaixo da mesa.
«O mito da ucrainização (um país, um povo, uma língua) foi sempre um projecto americano e de sectores minoritários dentro do país. Nunca reflectiu os interesses e a realidade moderna nacional da Ucrânia, a sua história, construção estatal e fronteiras, legadas da era soviética.»
Uma última nota. O curso dos acontecimentos mostra que os EUA, sacrificando a Ucrânia e a segurança na Europa, tiraram partido do agravamento, até a um nível insuportável, do clima de ameaça existencial que efectivamente pende sobre a Rússia, e assim é percepcionado em Moscovo. Objectivamente, a Rússia foi colocada numa situação muito complexa em que todas as opções eram más e o tempo não corria a seu favor. O reconhecimento desta realidade não equivale a caucionar as respostas e decisões da direcção russa, nem tampouco objectivos e acções que decorrem da natureza (de classe) do poder russo. Como não isenta o capitalismo russo, cuja restauração o Ocidente apoiou activamente, e lembre-se que Pútin desempenhou elevados cargos durante o governo de Iéltsin, de grandes responsabilidades na evolução da situação no período pós-soviético, incluindo na Ucrânia. Os EUA conhecem as debilidades e dependências do capitalismo russo e a condição económica semi-periférica da Rússia, apesar dos enormes recursos e potencial, da poderosa capacidade de dissuasão nuclear e do muito relevante papel desempenhado por Moscovo na rearrumação de forças mundial (relações com a China, Organização de Cooperação de Xangai, BRICS, etc.).
Manifestamente, Washington aposta na espiral de ódio e confrontação, de humilhação nacional e imposição arbitrária de sanções para acicatar sentimentos nacionalistas, promover as tendências de emergência do chauvinismo grão-russo, contando aprofundar as clivagens na sociedade e poder russos e exponenciar debilidades de toda a ordem. O curso da guerra na Ucrânia parece estar a demonstrá-lo.
Na presente encruzilhada decidem-se os contornos da ordem mundial de amanhã. A hegemonia dos últimos 30 anos do chamado Consenso de Washington debate-se com a roda da história, num combate feroz e tomado por uma crescente irracionalidade que urge travar. O imperialismo não poderá reverter o curso da história, mas a construção da ansiada nova ordem económica internacional é um processo não linear, sinuoso, com recuos e ziguezagues, parafraseando Lénine. Será, sobretudo, determinado pela dinâmica de emancipação dos povos e dos explorados no nosso século e há que contar com este elemento.
- 1. Sobre o tema ver, por exemplo, Ucrânia – retrato de um golpe de estado – Revanchismo neofascista e agenda imperialista
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