Num auditório cheio, em Calcutá, académicos, jornalistas, personalidades, dirigentes políticos, trabalhadores chamaram a atenção para o crescente número de ataques às minorias e a camadas marginalizadas da população na Índia, bem como contra aqueles que questionam o governo central de direita.
A anteceder o encontro em defesa da Constituição do país sul-asiático, este domingo, teve lugar uma pequena peça teatral de conteúdo antifascista, indica o portal Newsclick. Seguiram-se várias intervenções a lembrar o conteúdo progressista da Constituição indiana, cujos valores estão hoje sob ataque.
Nesse sentido, pediu-se aos cidadãos do país que integrem uma frente unitária em defesa da Constituição e dos direitos nela consagrados, nomeadamente o acesso de todos, em regime de igualdade, a direitos e garantias.
A maioria dos oradores destacou o facto de os membros do actual governo não terem participado na luta pela liberdade do país e não terem aceitado a Constituição indiana na altura.
Esses são os mesmos que hoje lideram «ataques implacáveis» a minorias, adivasis (povos originários), dalits (intocáveis, no sistema de castas) e mulheres, observaram.
Um dos intervenientes foi o jornalista Siddharth Varadarajan (do portal The Wire), que denunciou os «ataques graves» à liberdade de expressão na Índia e deu exemplos de várias figuras detidas, incluindo professores, por se atreverem a expressar a sua opinião e a fazer frente ao discurso a favor da guerra nas redes sociais.
«Muitos de nós temos a coragem de expressar a nossa opinião, mas, como consequência, não sabemos o que nos vai acontecer, pois o conceito de liberdade de expressão foi perigosamente restringido na Índia contemporânea», disse Varadarajan, acrescentando que a «incerteza decorre de uma atmosfera de medo, que é um ataque directo ao direito à liberdade de expressão».
Neste contexto de «se apoias o governo, nada acontece; se te opões, és punido», pediu às pessoas que resistam.
Defesa da «unidade na diversidade»
Por seu lado, Mohammed Salim, dirigente do Partido Comunista da Índia (Marxista) e ex-deputado no Parlamento de Nova Déli (Lok Sabha), recordou que a Constituição indiana começa com «Nós, o povo» e insiste no conceito de «unidade na diversidade», bem como na igualdade de direitos para todos as camadas da população.
Neste contexto, chamou a atenção para os ataques que lhe são desferidos por parte da direita e da extrema-direita hindu – com esta a tentar «impor a uniformização dos hábitos alimentares e de vestuário à população do país». E referiu-se a agressões recentes no Norte do estado a pessoas que transportavam carne, sublinhando que esses mesmos podem amanhã atacar outros por «transportarem peixe e ovos, a dieta básica dos bengalis».
Salim chamou ainda a atenção para o facto de, em muitas partes do país, os bengalis estarem a ser «difamados e rotulados como naturais do Bangladesh». Neste contexto, lamentou que o conceito de «unidade na diversidade» esteja a ser condenado, com prejuízo para a unidade do país, frisando que a RSS (Rashtriya Swayamsevak Sangh; organização paramilitar hindu de extrema-direita) nunca aceitou a Constituição que defende este conceito.
Também Dipankar Bhattacharya, secretário-geral do PCI(ML) Libertação, destacou o facto de a extrema-direita nunca ter aceitado a Constituição indiana, acrescentando que o destino do texto depende daqueles que o defendem.
Bhattacharya condenou a «agenda draconiana» que o governo de Modi está a implementar contra os trabalhadores e as camadas mais desfavorecidas, e declarou: «Temos de lutar contra o fascismo – a longa noite não há-de durar.»
No final do encontro, ficou a promessa de realizar nova convenção, num local maior, e reiterou-se o apelo à acção colectiva e unitária contra «as políticas fascistas, o sectarismo, a polarização e a privatização» na Índia.
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