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|Eleições Parlamento Europeu

PS e AD fingem discordâncias na habitação, mas no Parlamento Europeu só convergem

No debate da passada terça-feira, Marta Temido e Sebastião Bugalho simularam divergências no que toca à habitação. A verdade é que numa pesquisa rápida podemos ver que quando foi necessário combater a especulação, PS e PSD ficaram do lado da banca.

No que toca à subida das prestações do crédito à habitação, Portugal é dos países mais afectados no quadro da União Europeia. A política destrutiva do BCE de aumento de taxas de juro impacta países de forma diferente, em parte porque a União Europeia não é uma zona económica óptima e, no caso da questão da Habitação, há grandes diferenças.

A título de exemplo, Portugal é dos países europeus com mais crédito à habitação a taxa variável, perfazendo 75% do seu stock de crédito à habitação, segundo os dados do Banco de Portugal de Março deste ano. 

Stock de empréstimos para habitação própria permanente, por tipo de taxa | Em percentagem
 

Veja-se ainda que, segundo os dados do Banco Central Europeu, até Junho de 2023, 73,15% do novo crédito à habitação português tinha sido feito à taxa variável. Já em Espanha apenas 22,33% dos créditos à habitação são com esse tipo de taxas. Actualmente, Portugal apresenta um recuo brutal no recurso à taxa variável, uma vez que, em Março deste ano, apenas 23% dos créditos foram feitos neste tipo de crédito, o que revela o receio das pessoas com a política de juros do BCE.

O BCE sabe bem que o aumento das taxas de juro directoras em 4,5% teria um impacto natural e brutal na taxa Euribor e, como tal, impacto também ele brutal nas prestações do crédito à habitação. A questão é que dentro da própria União Europeia, no que toca à habitação, Portugal está acima da média na percentagem de famílias com casa própria – ou seja, as que por sua vez pagam uma hipoteca ao banco.

Evolução da taxa Euribor

Em Portugal, 77,8% das pessoas vivem em agregados familiares com casa própria, já na Alemanha são 46,5%. Isto significa que o aumento das taxas de juro e, por sua vez, o aumento das prestações do crédito à habitação têm um impacto muito maior nas famílias portuguesas do que nas famílias alemãs. 

População a viver em casa própria

Importa relembrar que, de acordo com os dados do Banco de Portugal, em Junho de 2022, antes da primeira subida das taxas de juro decretadas pelo BCE, a prestação média mensal do stock de empréstimos para habitação própria permanente era de 293 euros e em Março de 2024 essa mesma média foi de 423 euros. Neste último mês, sabe-se também que 80% dos contratos de crédito à habitação tiveram uma prestação mensal entre os 144 euros e os 743 euros. 


Prestação média mensal do stock de empréstimos para habitação própria permanente | Valores em euros

Em 2024 o Salário Mínimo Nacional é de 820 euros e existem três milhões de trabalhadores que ganham até 1000 euros de salário bruto. Numa pequena comparação, em Espanha o Salário Mínimo Nacional a 12 meses é de 1323 euros e na Alemanha é de 2054 euros. Estes valores demonstram a discrepância da capacidade de resposta que existe em cada país para fazer frente ao aumento dos juros.

Enquanto Portugal é obrigado a ter uma política salarial assente em baixos salários por fruto das imposições da União Europeia e moeda única, e os trabalhadores são confrontados com o aumentos dos créditos à habitação, os sete maiores bancos arrecadaram lucros recorde de 4,6 mil milhões em 2023, em grande parte graças ao aumento das taxas de juro. Com os cortes nos balcões e nos trabalhadores, as comissões bancárias que não se alteraram e a subida das taxas de juro, no ano passado a banca portuguesa lucrou 8200 euros por minuto. 

Evolução da margem de lucro dos bancos

Com todo este caldo criado, com uma política do BCE que claramente beneficia as economias mais fortes, com salários mais robustos e com famílias menos dependentes do crédito à habitação, a acção dos deputados portugueses ao Parlamento Europeu era determinante para realizar uma firme oposição ao esbulho que se encontra em marcha. 

Trocas de acusações de quem converge na salvaguarda da banca

No debate da passada terça-feira, o cabeça de lista da AD, Sebastião Bugalho, e a cabeça de lista do PS, Marta Temido, trocaram um conjunto de acusações sobre as questões do direito à Habitação. A verdade é que num dos momentos em que era necessário fazer frente à banca e colocá-la, face aos lucros apresentados, a pagar os aumentos dos créditos à habitação, PS e PSD, no Parlamento Europeu, convergiram nas suas votações, revelando assim ter as mesmas opções de fundo.

A título de exemplo, no passado mês de Dezembro foi votado o relatório anual sobre o Banco Central Europeu, no qual se podiam inserir propostas de alteração. Os deputados do PCP, Sandra Pereira e João Pimenta Lopes, fizeram a seguinte proposta: «Considera que, no imediato, devem ser os lucros do sector bancário a suportar os impactos do aumento das taxas de juro de referência no crédito à habitação».

Eis que nesta pequena proposta houve 13 votos portugueses contra e foram todos de deputados do PS e PSD. Ainda sem Marta Temido e Sebastião Bugalho, é certo, mas há um histórico que os condiciona e não aparenta vir a ser diferente. 

Mas não é só em rejeições que PS e PSD convergem. Nos votos a favor também, mais precisamente naqueles que reiteram o caminho trilhado pelo BCE. Ambos os partidos votaram a favor da seguinte formulação do relatório: «Reitera a advertência da presidente Lagarde, segundo a qual o apoio orçamental deve ser temporário, direccionado e adaptado e não deve contrariar a missão da política monetária; insta os Estados-Membros a alinhar as respectivas políticas orçamentais com o objectivo da política monetária do BCE (...)».

Na realidade o posicionamento de ambos os partidos não divergem das votações na Assembleia da República. Ainda no passado mês de Maio, PS, PSD e Iniciativa Liberal chumbaram uma proposta que previa a criação de um regime especial de proteção da habitação própria ao colocar os lucros da banca a suportar o aumento das taxas de juro, através da redução das margens de lucro dos bancos, e que fosse garantida a renegociação mediada dos contratos de crédito à habitação, permitindo o alargamento do prazo de amortização, ou a aplicação de uma moratória de capital no pagamento do empréstimo.

Como se tal não fosse suficiente, os mesmos chumbaram também uma proposta previa a não admissão da penhora ou execução de hipotecas de imóveis que constituissem habitação própria e permanente dos devedores quando se comprovasse a inexistência de rendimentos suficientes para assegurar a sua subsistência ou do seu agregado familiar.

É no plano do concreto que se faz a prova do algodão e não nas divergências encenadas dos debates televisivos. Em matéria de habitação, quando se colocava a necessidade de fazer frente ao BCE e, por sua vez, aos grandes interesses da banca privada, PS e PSD faltaram à chamada, colocando-se do lado daqueles que viram no aprofundar das dificuldades uma forma de lucrar. 

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