Mais um 8 de Março, mais «homenagens» bacocas ou alertas isolados do todo que as mulheres enfrentam diariamente. Mais do que celebrar, a data instituída em 1911 aponta para o que ainda falta fazer para atingirmos a tão necessária igualdade de direitos.
O Parlamento debate esta tarde o tema da violência doméstica, por iniciativa do PSD. Qual estratégia de comunicação, no Público, a deputada social-democrata ao Parlamento Europeu Maria da Graça Carvalho assina um texto sobre abusos e violência, conjuntamente com uma deputada irlandesa.
A violência doméstica e no namoro é um flagelo que urge combater, mas que resulta de uma desvalorização da mulher em várias esferas da vida. Afinal de contas, violências há muitas, e as mulheres sentem-nas todos os dias. Sentem-nas quando se levantam cedo para ir trabalhar, sabendo que ganham menos do que os seus pares só porque são mulheres; quando trabalham ao fim-de-semana ou nos dias feriado e ficam sem tempo para a família, apesar de os espaços comerciais onde trabalham não precisarem de estar abertos nesses dias; quando percebem que não há uma rede pública de creches capaz de lhes aliviar o orçamento; quando as compras do supermercado lhes comem cada vez mais salário, e já não conseguem levar para casa tudo o que precisariam para alimentar condignamente a família, apesar dos lucros das grandes superfícies. Sentem-nas também quando já não conseguem pagar a habitação, mesmo as que têm empregos com vínculos estáveis; quando percebem que a urgência pediátrica (ou obstétrica) fechou e a «alternativa» não «é já ali»; quando se confrontam com uma sobrecarga de trabalho em todas as esferas da sua vida; quando são vítimas de violência doméstica ou no trabalho e percebem que o Estado não lhes dá a resposta necessária; ou quando enfrentam longas jornadas de trabalho.
Nesta, como noutras matérias, não há inevitabilidades e muitas destas violências podiam facilmente ter um ponto final. Bastava que, no Parlamento, PSD e restante direita, mas também o PS, tivessem vontade política e votassem nesse sentido as propostas que regularmente lá entram para melhorar a vida de quem trabalha e assim reduzir desigualdades. De nada serve reconhecer que existem, como o fez hoje António Costa, se não se tomam medidas efectivas para que acabem.
«Em todo o mundo, o progresso dos direitos das mulheres está a desaparecer diante dos nossos olhos», lamenta-se também hoje António Guterres, recordando previsões recentes de que, a este ritmo, serão necessários mais 300 anos para alcançar a plena igualdade.
Citando o Movimento Democrático de Mulheres (MDM), «não há desculpa» para que a vida de quem trabalha, em particular das mulheres, não seja plena de direitos e dignidade. Isso mesmo se gritou no Porto, no último sábado, e deverá ecoar nas ruas de Lisboa no próximo dia 11. Porque não há desculpa para que as mulheres, que representam 61% da população com Ensino Superior, recebam os salários mais baixos ou que 55% das pessoas que vivem abaixo do limiar da pobreza sejam mulheres e que sejam estas também a receber os valores mais baixos de reforma.
A elevação dos direitos das mulheres é indissociável da valorização do trabalho e de todos os trabalhadores, da melhoria geral das pensões e do reforço dos serviços públicos. Não há desculpa para que, 113 anos depois da criação do Dia Internacional da Mulher, ainda haja tanto por que lutar.