Segundo informação do Governo de Cabo Verde, o memorando de entendimento insere-se no quadro da cooperação técnica entre os dois países e será assinado naquele dia, no antigo campo de concentração, que há vários anos é o museu mais visitado do arquipélago, na presença da ministra da Cultura de Portugal, Graça Fonseca.
A decisão, segundo o Governo cabo-verdiano, resultou da reunião de trabalho que o ministro da Cultura e das Indústrias Criativas de Cabo Verde, Abraão Vicente, manteve com a homóloga portuguesa, na passada terça-feira, durante a visita oficial que está a realizar a Portugal.
«Este será o primeiro passo para o processo de candidatura deste património histórico nacional a Património da Humanidade», refere uma nota do Governo cabo-verdiano, sobre a assinatura do memorando de entendimento prevista para 5 de Julho, não tendo sido revelado o teor desse acordo.
Contudo, os governos de Portugal e de Cabo Verde já tinham acertado em Fevereiro de 2020, em Lisboa, os detalhes da cooperação técnica portuguesa à candidatura do ex-Campo de Concentração do Tarrafal a Património da Humanidade, que deveria avançar este ano, adiada depois para 2022 devido à pandemia e à crise económica provocada pela Covid-19.
O governo cabo-verdiano quer construir no ex-campo de concentração do Tarrafal um memorial aos que estiveram ali encarcerados durante o fascismo e apurar se ainda há restos mortais por trasladar. Em declarações à Lusa, o ministro da Cultura e das Indústrias Criativas de Cabo Verde, Abraão Vicente, recordou que as vítimas mortais do espaço, que ficou conhecido como «campo de morte lenta», foram enterradas ao longo dos anos no cemitério municipal do Tarrafal, localidade no Norte da ilha de Santiago. «Estamos a confirmar se ainda temos algum corpo por transladar», explicou o governante, a propósito das transformações que Cabo Verde quer dar ao antigo campo de concentração, no âmbito da candidatura a Património da Humanidade, a apresentar à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), em Março de 2021. «A ideia final é construir um memorial a todos quantos aí perderam a vida ou por lá passaram», acrescentou Abraão Vicente, embora sem adiantar mais pormenores sobre este processo, no âmbito da candidatura cabo-verdiana. Situado na localidade de Chão Bom, o antigo campo de concentração do Tarrafal foi construído em 1936 e recebeu os primeiros 152 presos políticos portugueses em 29 de Outubro do mesmo ano, tendo funcionado até 1954. Em 1962, foi reaberto com o nome de «Campo de Trabalho de Chão Bom», destinado a encarcerar os anticolonialistas de Angola, Guiné-Bissau e Cabo Verde. Ao longo dos anos, o Tarrafal recebeu nas suas celas comunitárias mais de 500 pessoas, entre 340 antifascistas portugueses e 230 anticolonialistas africanos, dos quais 106 angolanos, 100 guineenses e 20 cabo-verdianos. Alguns registos históricos apontam para 37 mortos naquela colónia penal, construída pelos próprios presos. Dos 340 portugueses encarcerados no Tarrafal, 34 acabaram por morrer, sucumbindo às doenças e condições de vida extrema no local. O autor do livro O campo de concentração do Tarrafal (1936-1954): A origem e o quotidiano, José Soares Tavares, explica que no caso dos presos portugueses, as trasladações foram feitas após o fecho do campo, em 1 de Maio de 1974, por vontade das famílias e por «acordo entre os estados». Ainda assim, refere que as sepulturas dos portugueses permanecem no cemitério do Tarrafal. Entre estes contam-se os casos de Bento Gonçalves, secretário-geral do PCP, e de Mário Castelhano, então líder da central anarco-sindicalista CGT. Desde 2000 que o antigo campo de concentração deu origem ao Museu da Resistência, o mais visitado do país, com mais de nove mil visitas anuais. Com agência Lusa Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Nacional|
Memorial para recordar os que passaram e morreram no Tarrafal
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Na altura foi anunciado que o acordo para a cooperação técnica visando a candidatura seria formalizado a 1 de Maio de 2020, no Tarrafal, ilha de Santiago, e que o dossier técnico da candidatura seria entregue à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO, na sigla em inglês) em 2021.
Trata-se da segunda candidatura de Cabo Verde à UNESCO, depois de, em Dezembro de 2019, aquela organização ter proclamado a morna, género musical típico cabo-verdiano, a Património Imaterial Cultural da Humanidade, processo que contou com o apoio de especialistas portugueses.
Unir a memória entre Tarrafal e Peniche
Acompanhado por Paula Silva, da Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC), o responsável cabo-verdiano do Instituto do Património Cultural (IPC), Hamilton Jair Fernandes, visitou o Museu Nacional Resistência e Liberdade, em Peniche, exemplo que, segundo o IPC de Cabo Verde, pretende aproveitar.
Este museu nasceu do reconhecimento da Fortaleza de Peniche enquanto espaço-memória e símbolo da luta pela liberdade em Portugal e da resistência à ditadura fascista do Estado Novo, tal como a transformação feita no antigo Campo do Tarrafal, que passou a Museu da Resistência.
«Histórias e memórias que se cruzam» e que vão unir «uma vez mais estes dois espaços, agora pelo conhecimento e preservação da memória histórica para as futuras gerações. É neste sentido que o IPC e a DGPC pretendem assinar um acordo de parceria para formalizar um acordo já existente», referia a nota.
O documento acrescentava que o «futuro acordo de parceria», em negociação entre o IPC e DGPC, visa a capacitação técnica em áreas como a museologia e gestão de museus, assistência técnica e intercâmbio entre técnicos das duas estruturas, além de mobilização de financiamentos, assim «como apoio técnico e científico ao projecto de candidatura do ex-Campo de Concentração do Tarrafal» a Património da Humanidade.
Situado na localidade de Chão Bom, o antigo Campo de Concentração do Tarrafal foi construído no ano de 1936 e recebeu os primeiros 152 presos políticos em 29 de Outubro do mesmo ano, tendo funcionado até 1956.
Reabriu em 1962, com o nome de «Campo de Trabalho de Chão Bom», destinado a encarcerar os anticolonialistas de Angola, Guiné-Bissau e Cabo Verde.
O espaço foi classificado Património Cultural Nacional através da Resolução n.º 33/2006, de 14 de Agosto, integra desde 2004 a lista indicativa de Cabo Verde a património da UNESCO, e foi alvo de uma reabilitação durante o ano de 2020, financiada pelo Estado cabo-verdiano.
Ao todo, foram presas neste «campo da morte lenta» mais de 500 pessoas: 340 antifascistas e 230 anticolonialistas.
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