Realiza-se hoje em Sines uma iniciativa destinada a exigir o encerramento da refinaria de Sines até 2025. Ou, dizendo o mesmo de outra forma: uma iniciativa destinada a exigir que a partir de 2025 Portugal passe a importar todos os produtos refinados do petróleo, sejam combustíveis, alcatrão, óleos base, ceras sintéticas, etc.
Porque Portugal necessita de consumir produtos refinados do petróleo, e vai necessitar durante muitos anos, até serem encontradas e implementadas as soluções concretas que permitam a não utilização deste recurso (que até está condenado a ser cada vez mais escasso). Para o fazer tem duas opções: importar esses produtos ou manter a Refinaria de Sines (e até reabrir a Refinaria de Matosinhos criminosamente encerrada pela Galp).
O argumento para a reivindicação de «encerrar a refinaria de Sines até 2025» é a necessidade de descarbonizar para reduzir o aumento da temperatura média do planeta e os seus impactos sobre o clima. O que os promotores não conseguem explicar – nem tentam – é em que medida passar a importar o produto refinado noutras refinarias estrangeiras melhora o ambiente do planeta.
Ou então, se a sua proposta é que a partir de 2025 Portugal deixe de utilizar produtos refinados do Petróleo, deixando uma grande dúvida que tão pouco esclarecem: os promotores pretendem que daqui a quatro anos todas as ambulâncias, todos os tractores, todos os barcos de pesca, todos os aviões – os de passageiros, os de carga e os de combate a incêndios – deixem de ser utilizados em Portugal?
«O que os promotores não conseguem explicar – nem tentam – é em que medida passar a importar o produto refinado noutras refinarias estrangeiras melhora o ambiente do planeta.»
Pretendem que, de cada vez que as energias renováveis não forem capazes de abastecer a rede nacional, em vez de importar, esta seja desligada? Que sejam encerradas as milhares de fábricas e unidades de produção que não sobrevivem sem a utilização de produtos refinados do petróleo? Que os comboios diesel deixem de ser utilizados, os camiões não eléctricos (todos) e os barcos de transporte de mercadorias sejam parados? Só se estiverem a pensar emigrar para um país onde essas medidas não sejam aplicadas porque este ficaria transformado num inferno.
Dir-me-ão alguns, neste ponto: tem calma, eles falam em 2025 mas é só para mostrar bem a urgência da coisa, a necessidade de tomar medidas, de acabar com o blábláblá. O problema é que a possibilidade de encerrar a refinaria é uma realidade. Não por razões ambientais, claro, para as quais os accionistas da Galp se estão pura e simplesmente a marimbar.
Mas para aumentar a taxa de lucro e a rentabilidade dos capitais investidos na Galp. Os capitalistas da Galp já fecharam a penúltima refinaria nacional (a de Matosinhos) e de há muito que estudam o encerramento da última, a refinaria de Sines.
Aliás, hoje já importam gasóleo refinado. Para esses capitalistas, maioritariamente estrangeiros, faz muito mais sentido investir na produção de petróleo (pois...) e nas energias renováveis nos EUA e Grã-Bretanha, cujas margens de lucro são muito maiores do que das refinarias. Só estão à espera que sejam criadas as condições para que o Governo português financie o encerramento para o decidirem. Condições que acções como a de hoje objectivamente ajudam a criar.
Greta Thunberg já revelara uma similar insuficiência na crítica aos COP26, quando a sintetizou como «blábláblá». É que se é verdadeira a crítica de que a Conferência também foi um espectáculo destinado a criar a ideia de que os Estados estão a fazer o possível e necessário para enfrentar o problema, e é ainda mais verdadeira a sua constatação de que são os povos que têm que tomar nas suas mãos a resolução do problema, essa crítica ignora que estão a ser aprovadas medidas concretas, com efeitos concretos sobre os povos e os países.
Milhões de milhões de euros de recursos públicos estão a ser desviados para os grandes grupos económicos do sector energético, mecanismos especulativos e de mercado estão a desviar outra parte desses recursos para os mesmos de sempre, autênticas guerras estão a ser travadas pelo domínio do planeta e dos seus recursos, e quem já está a pagar a factura são os povos – no preço da energia, na inflação e nas crises que maduram.
Não é por acaso que em Portugal os maiores beneficiários das medidas «pela descarbonização» são os accionistas da Galp, da EDP, da Repsol e de outros grupos económicos. Os mesmos que beneficiam das medidas de mercado para a energia e para o carbono.
É preciso parar com muito do que está a ser feito em nome da descarbonização e começar a tratar o problema de forma científica, socialmente responsável e livre do controlo dos grandes grupos económicos.
A luta – consequente – por uma descarbonização que responda à evidência científica do seu impacto sobre o planeta, tem que ir mais à raiz, ser verdadeiramente radical, e enfrentar o grande capital monopolista da única forma eficaz: retirando-o do controlo do poder político e expropriando-o.