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Protecção ocidental encoraja Israel a continuar «a matar e ocupar»

O AbrilAbril falou com Salim Nazzal, escritor e secretário do Fórum Cultural Palestino Europeu, refugiado na Noruega, e Nisreen Lubbad, resistente palestina, sobre a Nakba e o agravar da agressão israelita das últimas semanas.

Em Lisboa, Salim Nazzal e Nisreen Lubbad, acompanhados por Carlos Almeida, do MPPM, foram ouvidos pelo Grupo Parlamentar de Amizade Portugal-Palestina (GPA-PP), na Assembleia da República, representados por Joana Mortágua, do BE, Bruno Dias, do PCP, e os deputados Tiago Brandão Rodrigues e Miguel Matos do PS. 
Em Lisboa, Salim Nazzal e Nisreen Lubbad, acompanhados por Carlos Almeida, do MPPM, foram ouvidos pelo Grupo Parlamentar de Amizade Portugal-Palestina (GPA-PP), na Assembleia da República, representados por Joana Mortágua, do BE, Bruno Dias, do PCP, e os deputados Tiago Brandão Rodrigues e Miguel Matos do PS. Créditos / MPPM

Salim Nazzal, escritor, dramaturgo e poeta palestino, secretário do Fórum Cultural Palestino Europeu, nasceu num campo de refugiados no Líbano. A família foi expulsa das suas casas em 1948, pelas forças de ocupação israelita. Nisreen Lubbad, refugiada palestinina residente em Madrid, activa na resistência palestina à ocupação israelita, nasceu, tal como Salim, num campo de refugiados.

São experiências transversais a sucessivas gerações de palestinianos, expulsos das suas casas: muitos milhões vivem, ainda, em campos de refugiados ou espalhados um pouco por todo o mundo. Em Gaza e na Cisjordânia, a estratégia de limpeza étnica continua a ser a mesma, centenas de pessoas são assassinadas anualmente, para dar lugar a novos colonatos.

«Os judeus sionistas tomaram a Palestina como se de um apartamento mobilado se tratasse».

O AbrilAbril conversou com Salim e Nisreen pouco antes do arranque de uma sessão de solidariedade com a Palestina, evocativa dos 75 anos da Nakba, organizada pelo Movimento pelos Direitos do Povo Palestino e pela Paz no Médio Oriente (MPPM), na Casa do Alentejo, em Lisboa, que juntou várias dezenas de pessoas no dia 15 de Maio. 

A Nakba, catástrofe ou desastre em árabe, designa o êxodo palestino de 1948, após a criação do estado de Israel (cujo dia de independência se assinala a 14 de Maio), que se traduziu na expulsão de mais 750 000 palestinianos das suas casas e terras, na destruição de 500 vilas e aldeias palestinas, na morte de 15 mil homens, mulheres e crianças da Palestina.

Como explicou Salim, «não há apenas um Nakba: é uma política continuada». A continuada acção militar de Israel foi o nosso ponto de partida.

Com o assassinato de um jovem palestiniano de 22 anos [na manhã de dia 15 de Maio, quando gravámos a entrevista], o número total de palestinianos mortos pelas forças de ocupação israelitas desde o início do ano subiu para 152 (33 dos quais apenas nos últimos dias). Qual é a actual situação na Palestina?

Salim – Matam quem eles querem. Fazem-no porque se sentem protegidos por todo o mundo. Porque se fossem condenados, ou se houvesse uma forte condenação de todo o mundo, seriam muito mais cuidadosos, mas eles sabem que estão protegidos e que os americanos estão sempre prontos a defendê-los. Isso encoraja-os a continuar a matar, a ocupar. 

A eleição do novo governo, com pessoas como Bezalel Smotrich [actual ministro das Finanças, de extrema-direita] e Itamar Ben-Gvir [ministro da Segurança Nacional, também de extrema-direita], extremistas que apelam à Nakba, à destruição dos palestinianos só veio agravar a situação. Um deles disse que queriam renovar a Nakba, a catástrofe de 1948.

Estas pessoas são extremistas e ninguém parece disposto a pará-las. Antes, Israel tinha de justificar as suas acções, inventar alguma questão moral, mas agora já nem disso precisa: podem matar e sabem que estão protegidos.

Nisreen – São assassinos. Eles, os israelitas, não querem nenhum palestiniano a viver na Palestina. As políticas de extermínio são o dia a dia, todos os dias, todos os dias mandam matar os palestinianos, e isso só tem vindo a piorar.

Estão a decorrer protestos sem precedentes em Israel, contra o governo israelita. Embora pouco, ou nada, mencionem os crimes cometidos por Israel contra os palestinianos. Qual é a vossa perspectiva sobre o novo mandato de Benjamim Netanyahu?

Nisreen – Não me podes perguntar a minha opinião sobre eles. Eles são ocupação, é isso que Israel é: ocupação militar.

Salim – Nós não precisamos de embelezar a ocupação exigindo 20 postos de controlo, em vez de diz, ou de que os reduzam para 10 pontos de controlo. É como quando alguém está numa prisão e se aumenta a quantidade de comida: continua sempre a ser uma prisão.

Tudo aquilo de que falamos quando nos referimos às agressões do Governo israelista são consequências da ocupação: os assassínios, a destruição de casas, etc. Independentemente do Governo no poder, o imperativo é acabar com a ocupação, acabar com este regime e deixar que o povo palestiniano decida o seu futuro.

Eles não podem decidir o futuro por nós, somos 14 milhões, eles não têm o direito de decidir o nosso futuro. O nosso futuro é a liberdade, não sermos escravos. Essa é a verdadeira, e grande, questão.

Houve um momento singular no último Festival Eurovisão da Canção, em que a representante polaca expressou o seu total compromisso com a Ucrânia e, na mesma frase, atribuiu a pontuação máxima a Israel, que bombardeava, nesse mesmo momento, a Palestina. Como se sentem os palestinianos face à disparidade de tratamento no ocidente?

Salim – O mundo ocidental é, numa palavra, hipócrita. Têm uma tendência para a dupla moralidade. Tal como acabaste de dizer: quando é na Ucrânia, são combatentes pela liberdade, mas os palestinianos são sempre terroristas. 

Trata-se de uma dupla moral. Não há volta a dar, a ocupação é a ocupação: é contra os direitos humanos, é contra todas as resoluções das Nações Unidas. Temos mais de 36 resoluções, aprovadas nas Nações Unidas, a nosso favor, assinadas também pela Europa, e eles nem sequer respeitam a sua própria assinatura. 

Nós dizemos-lhes para respeitarem o que assinaram, aquilo que todos nós, em conjunto, acordámos, mas, claro, eles acabam sempre por fazer o contrário: são hipócritas que apoiam a ocupação e o apartheid, contra todas as leis, quer sejam leis nacionais ou internacionais.

Nisreen – A ocupação israelita quer fazer parte da Europa e é por isso que estão a entrar por todas as portas que lhes permitam afirmar-se como tal. Mas isso não pode ser, não se pode ser apagar a realidade: a Palestina é a Palestina, nem hoje, nem amanhã, será Israel, por mais que participem em festivais ou torneios de futebol...

Von der Leyen fez umas declarações no dia da declaração de independência israelita (14 de Maio) nas quais afirmava que a União Europeia celebra os «75 anos da democracia mais vibrante do Médio Oriente»...

Salim – Ouvi o porta-voz da União Europeia a falar em «fazer florescer o deserto». Os judeus sionistas tomaram a Palestina como se de um apartamento mobilado se tratasse. Comemorar o quê, afinal? A destruição de cidades inteiras? O Nakba não é apenas uma coisa que aconteceu num passado distante, esquecida num museu... é algo contínuo, que acontece todos os dias: esta é a estratégia do sionismo. Eles querem uma Palestina sem pessoas.

Mesmo na África do Sul, aliás, durante o Apartheid, eles queriam ter controlo sobre o povo e a terra, mas os judeus sionistas só querem mesmo a nossa terra, sem que nós lá estejamos, o que se reflecte nas suas estratégias e políticas.

Perante tanta luta, tantos ataques, tanta brutalidade indiscriminada, porque é que é importante continuar a falar da Nakba hoje, 75 anos depois?

Salim – Não há apenas um Nakba: é uma política continuada. Uma estratégia. Desde o primeiro dia, eles não quiseram que lá ficassemos, sempre nos quiseram substituir. Na África do Sul, mantiveram as pessoas porque queriam dar-lhes uso. No nosso caso, 70% foi expulsa do país.

Nada mudou. Não mudou uma única coisa. A situação está a piorar ainda mais, nomeadamente com este governo. É por isso que eles nunca aceitaram os nossos direitos enquanto povo. Nunca. Mesmo no Acordo de Oslo, recusaram-se a reconhecer o povo palestiniano e o seu direito à autodeterminação. É por isso que estão a encher o nosso país de colonatos.

Onde é que alguma vez poderemos construir um Estado livre, quando temos mais de 700 000 colonos na Cisjordânia, na Palestina? Quando Gaza e a Cisjordânia são apenas 22% do território da nossa pátria (abdicámos de 78% em Oslo)? Nem isso é suficiente para Israel. 

É esta a mentalidade com que nos confrontamos. Não há um único acordo que eles respeitem, armam-se em deuses.  Temos de lutar para mudar a realidade, é o único caminho que resta aos palestinianos.

E como é que os palestinianos conseguem ultrapassar estas adversidades?

Nisreen – Nunca desistiremos da nossa luta, vamos lutar até que a Palestina seja livre. Não existe ocupação que dure para sempre, mesmo que aguente 400, 800 anos, sem que nada mude, vamos sempre continuar a lutar.

Voltarei à minha aldeia, com os meus filhos, tenho a certeza de que será em breve. Todos nós mantemos a memória da Nakba, tanto a minha geração como as gerações mais novas. Somos refugiados e vamos voltar para a Palestina.

Uma criança de 3 anos vai dizer que é originário desta ou daquela aldeia na Palestina, embora viva, mesmo que sempre tenha vivido num campo de refugiados. Os palestinianos que vivem no Líbano, na Síria, em qualquer parte do mundo, não se esquecem nunca que são palestinianos e que vão voltar, mais cedo ou mais tarde. É certo.

Salim – Ben Gurion (primeiro primeiro-ministro de Israel) disse: «Os velhos vão morrer e os novos vão esquecer». Não é verdade. Os mais novos não se esquecem da sua casa, a Palestina, e continuam a lutar por ela. Não a podemos esquecer, construímos, nesta terra, a nossa cultura, ao longo de milhares de anos, como é que a poderíamos esquecer?

Como olham para os recentes desenvolvimentos no Médio Oriente: a normalização das relações entre países como a Síria, o Irão e a Arábia Saudita ou o cessar-fogo no Iémen?

Salim –Parece-me uma evolução muito positiva. O acordo entre o Irão e a Arábia Saudita permitiu reduzir a tensão na região, o que é, objectivamente, do interesse dos palestinianos. É também por isso que Israel não está satisfeita com o acordo: toda a política israelita se baseia em fomentar a divisão em toda a região do Médio Oriente.

Não ficaram, com certeza, satisfeitos ao ver que estes povos se estão a reaproximar.

Nisreen – Estamos de acordo com a normalização de relações entre países como a Arábia Saudita, o Irão, a Síria, etc... Se não houver ocupação israelita, acho que toda esta zona do mundo árabe será melhor.

Nos últimos anos, instituições e governos europeus têm tentado desqualificar activistas pró-palestinianos através de calúnias ou do cancelamento de concertos e exposições (o caso mais notório, e recente, foi o de Roger Waters). O que podem os activistas europeus fazer para ajudar?

Salim – Existe na Europa um movimento crescente de solidariedade para com a Palestina e esperamos que este ajude a exercer pressão sobre o governo israelita. Queremos que os governos da Europa reconheçam o Estado da Palestina e se posicionem firmemente contra a expansão dos colonatos. Não interessa se as pessoas são de direita ou de esquerda, desde que defendam o que é justo. Justiça é justiça.

Por que razão são as ocupações recusadas em todo o mundo, excepto na Palestina? Porque é que este é o único lugar onde devemos ter em conta os sentimentos do ocupante? Nunca houve nada assim, em que nos obrigam a ter em conta os sentimentos do ocupante. Não o ocupado. Porquê? Por causa da história europeia...

Porque é que temos de pagar pela história da Europa? Não é a nossa história! Eles impõem-na e nós temos de pagar o seu preço. A Nisreen nasceu num campo de refugiados, eu nasci num campo de refugiados, tudo por causa desta política europeia. É uma perspectiva completamente hipócrita: de um lado, eles lutam pelo seu país, do outro, nós, que defendemos a nossa terra, somos os terroristas. Parem! Este jogo tem de ser travado!

A França e a Alemanha fizeram, recentemente, declarações conjuntas em que apelam a um cessar-fogo na Palestina. Ao mesmo tempo, o Ministério dos Negócios Estrangeiros da Alemanha fez uma declaração em que condena os ataques com rockets contra Israel (depois do assassinato de dezenas de pessoas na Palestina). 

Salim – O meu povo está sob ocupação. Há um ocupante e há um ocupado. É preciso ter uma posição firme contra o ocupante. Não se pode estar sempre a fazer equivalências. Pedem-nos para pensarmos no pobre ocupante. Eles não são pobres nenhums: têm mísseis, têm armas automáticas, Israel tem o maior exército do Médio Oriente e é apoiado por todo o mundo ocidental. Não somos culpados pela história da Europa.

Nisreen – Não é culpa dos palestinianos e a Europa não pode limpar as suas mãos dos crimes que ajudou a cometer. Vários governos europes, por exemplo, estão a aplicar uma lei para não permitir que os palestinianos que vivem na Europa lutem ou apoiem o nosso povo.

Na Alemanha, por exemplo, há um grupo chamado Samidoun [Rede de Solidariedade com os Prisioneiros Palestinianos] que tem promovido várias manifestações em defesa dos presos nos cárceres israelitas e que está, constantemente, a ser boicotado pelo governo alemão, recusando-se a dar autorização para acções, arrancam as bandeiras palestinianas, não deixam que as hasteiam.

O boicote a instituições israelitas é muito, muito, importante!

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