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«A Colónia» de Marco Martins regressa em Julho ao palco da Culturgest

A peça baseada numa colónia de férias para filhos de presos políticos portugueses, onde as crianças aprenderam a liberdade, regressa à Culturgest, em Lisboa, entre os dias 10 e 13 de Julho.

Créditos / DR

O trabalho estreado em Dezembro conta a história de uma colónia de férias para filhos de presos antifascistas, entre os três e os 14 anos, criada nas Caldas da Rainha, em 1972, pela Comissão Nacional de Apoios aos Presos Políticos. Durante duas semanas, 18 crianças puderam conhecer outras crianças, puderam brincar. Passados mais de 50 anos, sobem a palco para contar as suas histórias.

Em entrevista à Lusa, em Dezembro, Marco Martins considerou esse gesto fundamental e agradeceu-lhes «a coragem e ousadia» de falarem «sobre o dia da prisão dos pais, das visitas às prisões», para que «tudo aquilo por que os pais passaram, tudo aquilo por que eles próprios passaram não tenha sido para nada».

A produção de A Colónia impôs-se a Marco Martins depois de ler uma reportagem de Joana Pereira Bastos, sobre esta colónia, no semanário Expresso, em 2022, que valeu à jornalista o Prémio Gazeta de Imprensa.

Para o encenador e realizador tornou-se cada vez mais urgente pôr a história em palco. As comemorações dos 50 anos do 25 de Abril deram o pretexto.

A ideia inicial era «falar sobre a PIDE e o modo de esta operar». A partir daí iniciou uma investigação rigorosa, desde os arquivos da PIDE na Torre do Tombo, aos contactos com a autora da reportagem, com resistentes como Teresa Dias Coelho e Margarida Lisboa, nascidas em ditadura, com antigos presos políticos, como o conhecido casal Domingos Abrantes e Conceição Matos, que também fazem parte do elenco, e com crianças que passaram férias na colónia.

Hoje, aqueles que, naquele Verão de 1972 puderam brincar em liberdade, num espaço protegido de ameaças, são adultos, quase todos com mais de 60 anos. Alguns não quiseram falar, nem aparecer em cena. Mas a memória das sombras da ditadura, das suas ameaças, permanece. Daí a urgência.

A dramaturgia do espectáculo foi sendo desenhada passo a passo, conforme a investigação avançava, partindo das questões que desde o início lhe eram evidentes: «Como contamos esta história e como é que esta história é transmitida através do tempo, através das pessoas?» É «através das histórias» que a memória se transmite. Outro factor importante para avançar no projecto foi a ideia de que hoje «os miúdos sabem muito pouco sobre o 25 de Abril», começa a ser «uma coisa muito distante».

Num cenário dividido em dois pisos, Marco Martins sobrepõe camadas sobre camadas de testemunhos, de memória, narração sobre narração.

Na base de A Colónia estão documentos e testemunhos de todo o elenco e há também referências a textos de Bertolt Brecht, Czeslaw Milosz, Deborah Levy, Filippo Marinetti, Gonçalo M. Tavares, Jean-Luc Godard, Anne Marie Miéville, Slavoj Zizek e William Shakespeare.

As interpretações são de Manuela Canais Rocha, Conceição Lopes, Conceição Matos, Domingos Abrantes, Humberto Candeias, Olga Sequeira Santos, Rita Veloso, Valentina Marcelino e João Pedro Vaz, com Sara Carinhas, Ana Vilaça, Rodrigo Tomás e Anderson Ramos, Arthur Lupi, Beatriz Ribeiro, Diana Soares, Inês Paulino, Joaquim Queiroz, Laura Trueb, Leonardo Martins, Lurdes Ferraz, Milena Mavie, Niurka Sacramento e Pedro Conceição. A música é de B. Fachada e João Pimenta Gomes.

«Para mim tem sido quase uma terapia. Todos os medos que tinha na altura, com a idade e o crescimento, fui resolvendo, mas agora estou a regressar a eles. E realmente deixa-nos a pensar: como é que há regimes que permitem que estas coisas aconteçam às crianças?», afirmou Valentina Marcelino, actual directora-adjunta do Diário de Notícias, participante da colónia em 1972. 

Marco Martins irá depois adaptar a peça ao cinema, num filme de época a ser rodado este ano.

Com agência Lusa

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