O ano de 2020 ficou marcado por dificuldades acrescidas para os trabalhadores e suas famílias. Por um lado, com todos os problemas que o surto epidémico trouxe; por outro, pelo aproveitamento que dele foi feito pelo grande patronato para aumentar a exploração e tentar fazer tábua rasa dos direitos.
A epidemia revelou as fragilidades de um país marcado por décadas de políticas de direita, de submissão às imposições da União Europeia e de serviço ao grande capital. Um país com uma estrutura produtiva debilitada fruto de opções políticas concretas de sucessivos governos, de desinvestimento na saúde, na educação, na segurança social, que deixaram o país em piores condições para responder ao problema de saúde pública bem como à situação económica.
«É urgente inverter o caminho de décadas de desinvestimento, de transferência de soberania, de privatização dos principais sectores e empresas, de desvalorização do trabalho e dos trabalhadores, de perda sucessiva de poder de compra»
As medidas desequilibradas a favor do capital, que têm vindo a ser avançadas pelo governo para responder aos problemas económicos e sociais, não só não respondem, como abrem caminho para a instrumentalização da situação que vivemos, particularmente por parte das grandes empresas e multinacionais, para intensificar a exploração. Aproveitando o modelo de precariedade e baixos salários que tem grassado no nosso país, com uma legislação laboral que não protege os trabalhadores e com uma ACT cujas debilidades vão muito além da falta de recursos humanos, o ataque às condições de trabalho e aos direitos dos trabalhadores tem sido feroz: despedimentos massivos de trabalhadores com vínculos precários, cortes nos salários e remunerações, desregulação dos horários de trabalho, roubo de direitos, crescente bloqueio da contratação colectiva entre outros.
A este ataques, a que se somam os relativos à segurança e saúde nos locais de trabalho e nas deslocações para os mesmos, acresce uma intensa campanha ideológica que procura convencer da inevitabilidade da perda de direitos e retribuições, com a justificação da pandemia. Procuraram silenciar a voz dos trabalhadores e de quem os defende, tentando cercear a intervenção da CGTP-IN e dos seus sindicatos. Não conseguiram. A luta dos trabalhadores levou à rua a denúncia e combate às tentativas de atropelos, afirmando a todo o momento que, ao contrário do que nos querem fazer acreditar, as reivindicações dos trabalhadores de que a CGTP-IN é portadora precisam da intensificação da luta e da sua convergência.
Apesar das tentativas de limitação dos direitos e liberdades sindicais por parte do capital, os trabalhadores e os seus sindicatos de classe assumiram sempre a luta como factor determinante no combate à exploração, resistindo às pressões e ameaças patronais, aos ataques aos direitos, tantos deles perpetrados por via das medidas do governo na resposta ao surto epidémico.
O 1.º de Maio, tendo tido características diferentes daquelas a que estamos habituados, foi um momento de extraordinária importância na afirmação da luta, provando que os direitos e a liberdade sindical não estão suspensos e que é possível, com confiança, determinação, organização e protecção da saúde de todos, levar a cabo as acções necessárias para defender os direitos de quem trabalha.
«apenas valorizando o trabalho e os trabalhadores, efectivando os direitos, aumentando os salários, é possível garantir um Portugal com futuro e encontrar respostas para os problemas»
Foram muitas centenas de lutas desenvolvidas ao longo do ano que passou, nos sectores público e privado, nos locais de trabalho, empresas, serviços, sectoriais e convergentes, que revelaram que é urgente valorizar o trabalho e os trabalhadores e que essa valorização é um eixo central do desenvolvimento do nosso país. O aumento geral dos salários, do Salário Mínimo Nacional (SMN), das pensões, a segurança no emprego, a aposta na produção nacional e no papel dos Estado para o desenvolvimento do País, são reivindicações justas que ganham neste quadro ainda maior actualidade e urgência.
Foi possível, por via da luta, repor direitos e travar despedimentos colectivos e de trabalhadores com vínculos precários, recuperar direitos e afirmar os conteúdos da contratação colectiva, aumentar salários, corrigir injustiças e travar avanços na desregulação e intensificação dos tempos de trabalho. Foi para isso imprescindível a intervenção, acção e luta dos trabalhadores organizados nos sindicatos de classe da CGTP-IN, que estiveram e continuam a estar onde são precisos – com os trabalhadores.
Saímos do ano de 2020 em luta e entramos no ano de 2021 a lutar. Há um caminho longo a percorrer. Os impactos das medidas desequilibradas do governo e dos aproveitamentos do patronato estão à vista: desemprego e pobreza.
«O governo do PS desperdiçou oportunidades importantes para construir soluções […]. A luta é o caminho e vai prosseguir, nos locais de trabalho e nas empresas, em torno das reivindicações concretas dos trabalhadores, com a certeza de que só assim é possível resistir à ofensiva que temos pela frente, defender e conquistar direitos, melhorar as condições de vida e de trabalho e desenvolver o país»
O caderno de encargos não é pequeno. O governo do PS desperdiçou oportunidades importantes para construir soluções e responder aos problemas dos trabalhadores e do país. O Orçamento do Estado para 2021 deixou muito a desejar no sentido de promover uma mudança de rumo que garanta as necessidades dos trabalhadores e do País – apesar de ter ido ao encontro de algumas reivindicações da CGTP-IN, ainda que de forma insuficiente. Também o aumento do SMN, fruto da luta e intervenção, ficou aquém do possível e necessário. Mantém-se uma legislação laboral que não protege a parte mais frágil e cujas normas gravosas são lesivas para os trabalhadores. Sabendo-o, o governo opta pelo caminho de tentar «regulamentar» em vez de revogar, como no caso do escandaloso aumento do período experimental para os jovens, conhecidos que são os impactos que esta norma teve no aproveitamento para «descartar» trabalhadores neste período; na contratação colectiva, assumindo que existe um problema, o governo opta por suspender os prazos da caducidade, quando o que devia de fazer era revogar as normas que a sustentam e reintroduzir o princípio do tratamento mais favorável, repondo o direito a contratação colectiva que tem sido tão atacado.
A luta é o caminho e vai prosseguir, nos locais de trabalho e nas empresas, em torno das reivindicações concretas dos trabalhadores, com a certeza de que só assim é possível resistir à ofensiva que temos pela frente, defender e conquistar direitos, melhorar as condições de vida e de trabalho e desenvolver o país.
É urgente inverter o caminho de décadas de desinvestimento, de transferência de soberania, de privatização dos principais sectores e empresas, de desvalorização do trabalho e dos trabalhadores, de perda sucessiva de poder de compra, caminho este que tem condicionado a eficácia da intervenção pública quando o que se exige é a reversão dos processos que alienaram importantes instrumentos para a implementação dos direitos consagrados na nossa Constituição.
«Foi possível, por via da luta, repor direitos e travar despedimentos colectivos e de trabalhadores com vínculos precários, recuperar direitos e afirmar os conteúdos da contratação colectiva, aumentar salários, corrigir injustiças e travar avanços na desregulação e intensificação dos tempos de trabalho»
O aumento dos salários em 90€ para todos os trabalhadores, o aumento das pensões, a fixação dos 850€ a curto prazo para o SMN, o combate à precariedade, a luta pelas 35 horas e contra a desregulação dos horários de trabalho, a valorização das carreiras e profissões, a exigência do cumprimento e da reposição de direitos, a revogação das normas gravosas da legislação laboral, o investimento nos serviços públicos e nas funções sociais do Estado, a reposição da idade legal de acesso à reforma nos 65 anos, entre outras, são reivindicações justas e urgentes, que dão mais força à dinâmica reivindicativa nos locais de trabalho e confirmam a importância da luta convergente para dar resposta aos problemas laborais e sociais e colocar o país no rumo do progresso e da justiça social.
Que não haja enganos: apenas valorizando o trabalho e os trabalhadores, efectivando os direitos, aumentando os salários, é possível garantir um Portugal com futuro e encontrar respostas para os problemas. A melhoria das condições de trabalho e de vida são condições essenciais para o desenvolvimento e progresso económico e social.
Só construiremos um país soberano e desenvolvido valorizando aqueles que produzem a riqueza: os Trabalhadores!
Vamos à luta!
Ana Pires é dirigente sindical, membro do Conselho Nacional da CGTP e da sua Comissão Executiva.
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