Sobre os conteúdos do pacote laboral do Governo da AD (PSD/CDS), mas também do Chega e da Iniciativa Laboral que o apoiam e defendem, já muito se disse sobre os seus efeitos nefastos para as classes trabalhadoras, e consequentemente para as suas famílias.
Contudo, importa continuar o esclarecimento, mostrar como são falsos certos argumentos que o Governo e o patronato usam para justificar a ofensiva antilaboral e, sobretudo, evidenciar a importância de uma grande greve geral face ao atual contexto político, em que o grande capital e as forças políticas que o representam nos órgãos do poder procuram levar por diante o projeto antidemocrático que há décadas anseiam por concretizar no nosso país.
Há fortes razões para fazer a greve geral
– No programa eleitoral da AD não constava a revisão das leis do trabalho
A ocultação desta intenção mostra claramente que o PSD/CDS tinham consciência dos graves prejuízos que as alterações iriam causar aos trabalhadores e, por isso, não as revelaram para não perderem as eleições.
É antidemocrática, falsa e imoral a posição do Governo!
– O pacote laboral tem um único propósito: aumentar a exploração
Ao contrário do que afirma o Governo, as alterações que são propostas não visam a modernização das empresas nem o aumento da produtividade. Destinam-se a desproteger mais os trabalhadores, seja no emprego ou na prestação do trabalho, na desregulamentação dos horários ou nas restrições à contratação colectiva. Visam perpetuar os baixos salários, eliminar direitos e agravar as condições de trabalho, alargar a prestação de trabalho não pago.
Ora, manter os trabalhadores em situação de baixos salários é manter um perfil de economia assente em baixas qualificações, em produções de baixo valor acrescentado e, consequentemente, é um travão à inovação, à modernização e à produtividade.
Acresce que os baixos salários reduzem o poder de compra ao mínimo possível, impedem o crescimento das empresas e o desenvolvimento do país. É neste ciclo insustentável que andamos, década após década, sem saída à vista, porque os sucessivos governos da política de direita não governam em função dos interesses nacionais e dos trabalhadores, mas sim no favorecimento dos grupos económicos que eles representam.
E é também por isso que o pacote laboral só interessa aos grandes grupos económicos, não interessa às micro e pequenas empresas. São os grupos económicos que beneficiam dos muitos milhões da baixa do IRC e de muitas outras benesses, enquanto as micro e pequenas empresas debatem-se com problemas de procura e tesouraria, aos quais o Governo não dá resposta.
«Acresce que os baixos salários reduzem o poder de compra ao mínimo possível, impedem o crescimento das empresas e o desenvolvimento do país. É neste ciclo insustentável que andamos, década após década, sem saída à vista (...).»
As grandes empresas e grupos económicos não têm problemas de produtividade, basta olhar para os resultados das maiores empresas nacionais que todos os anos superam o recorde de lucros (em 2024 foram distribuídos 2,9 mil milhões de euros em dividendos aos accionistas). Para este ano já se prevê novo aumento, num volume superior a 3,2 mil milhões de euros.
Em Portugal, um em cada dez trabalhadores encontra-se numa situação de pobreza e o salário médio ao invés de se aproximar do da média da União Europeia, afasta-se cada vez mais.
A modernização e a produtividade obtém-se com mais investimento em tecnologia, eficiência da gestão e valorização da mão-de-obra que é indispensável à criação de riqueza.
O Pacote laboral não serve estes objectivos, a sua única finalidade é aumentar a exploração dos trabalhadores!
– O pacote laboral acentua o velho modelo de retrocesso social
Os argumentos do Governo, invocando a modernização e a digitalização para justificar mudanças nas leis laborais devido à evolução das formas de trabalho é uma comprovada falácia.
Basta ver o que se passa em muitas empresas cuja actividade é desenvolvida pela prestação de trabalho sem as mínimas condições de trabalho e de dignidade (plataformas digitais, teletrabalho, call center, etc.), para perceber que de um modo geral as chamadas «novas» formas de trabalho, afinal não passam de velhas formas de exploração de mão-de-obra barata.
Existem situações em que impera uma autêntica selvajaria. Mas o Governo e o patronato anseiam por aumentar ainda mais a exploração, querem aprofundar o actual modelo de baixos salários, precariedade laboral e social, despedimentos facilitados e a baixo custo, horários de trabalho longos e desregulados. Para tal, defendem o regresso do «banco de horas» individual, alargar as formas de trabalho atípico e também alargar as possibilidades da prestação de mais tempo de trabalho não pago, retroceder nos direitos de maternidade e paternidade, entre outras medidas que representam novos retrocessos dos direitos laborais e sociais e o agravamento da exploração laboral.
Tudo isto interessa, sim, ao patronato, para aumentar a exploração. Mas nada disto serve aos trabalhadores. A estes, o que faz falta é que perante o surgimento de novas realidades como o teletrabalho ou o trabalho em plataformas digitais, seja garantida legislação que proteja os direitos consagrados na Constituição, isto é, que sejam revogadas as normas gravosas e no reforço de direitos e salários.
O que é preciso é garantir e reforçar os direitos dos trabalhadores!
– O pacote laboral condena à precariedade todos os jovens trabalhadores
A Constituição da República consagra o princípio da igualdade de oportunidades e tratamento no trabalho, proibindo qualquer discriminação quanto aos direitos e deveres laborais, pois são os mesmos para todos os trabalhadores, independentemente da sua idade.
O próprio Código do Trabalho estabelece estes princípios, só que os sucessivos governos têm produzido legislação complementar que os violam reiteradamente, sendo os jovens o principal alvo das discriminações.
Se a precariedade laboral já atinge um milhão e trezentos mil trabalhadores (cerca de um terço do total) e a taxa de precariedade que incide sobre os jovens trabalhadores com menos de 25 anos é cerca de 54%, a situação agrava-se ainda mais, com 70% dos novos contratos de trabalho em situação precária.
Perante esta realidade, que pretende fazer o Governo com o pacote laboral? Quer alargar ainda mais os motivos e os prazos para a contratação a prazo, revogar o limite de duração total das renovações e vulgarizar os contratos de muito curta duração. Mas também quer facilitar mais os despedimentos, incluindo os despedimentos sem justa causa e, veja-se até onde vai a agressão, que o patrão possa impedir a reintegração do trabalhador, mesmo que o tribunal decida que o despedimento foi ilícito.
Resumindo, com o pacote laboral todos os trabalhadores ficariam mais desprotegidos e os jovens, em particular, condenados a viver toda a sua vida profissional em situação de precariedade laboral.
O Governo e o patronato são responsáveis pela chaga social que já existe!
– A legislação laboral em Portugal protege menos os trabalhadores
Quando comparada com os países da União Europeia, a nossa legislação laboral é das que menos protege os trabalhadores, seja em termos de rendimentos, de direitos sociais ou de vínculos contratuais, onde a precariedade em Portugal é brutal.
A propalada rigidez que fala o Governo e o patronato é desmentida pelos factos. Antes do código do trabalho, instituído em 2003, já as leis laborais tinham sofrido muitas alterações para pior.
Começou logo, em 1976, com o I Governo Constitucional do PS/Mário Soares que, entre outros diplomas prejudiciais aos interesses dos trabalhadores, instituiu os contratos a prazo (primeiro grande golpe na garantia de estabilidade no emprego) e também decretou o alargamento do conceito de justa causa para despedimento. Quanto aos salários, impôs uma política de tectos máximos para aumento dos salários (aumentos abaixo da inflação).
«Com o pacote laboral todos os trabalhadores ficariam mais desprotegidos e os jovens, em particular, condenados a viver toda a sua vida profissional em situação de precariedade laboral.»
Ainda no período anterior ao código do trabalho, a legislação laboral sofreu inúmeras mutilações, sob a falsa necessidade de flexibilizar o mercado de trabalho, sendo que as alterações mais significativas operaram-se no sentido da maior precarização do trabalho, na desregulamentação e alargamento do tempo de trabalho e nas restrições à negociação e contratação colectiva como via de limitar direitos e conter o aumento dos salários.
A evolução da legislação laboral até à criação do Código do Trabalho foi muito negativa para os trabalhadores, mas o Código do Trabalho não mudou esse sentido, pelo contrário, ao sistematizar o acervo de leis até aí dispersas, o código aprofundou as principais linhas da ofensiva laboral, acolhendo todas as reivindicações das confederações patronais.
Até aos dias de hoje, o código do trabalho foi objeto de 24 revisões e todas elas no sentido de aprofundar mais dificuldades para os trabalhadores: generalizou-se a precariedade, intensificou-se a desregulamentação dos horários de trabalho, alargaram-se as formas atípicas de prestar o trabalho, impôs-se o boicote à contratação colectiva, com eliminação de direitos laborais e sociais, e foram introduzidas múltiplas formas de agravar a desvalorização salarial.
A legislação laboral não é rígida. Rígido é o poder patronal que desequilibra a relação laboral em prejuízo de quem trabalha.
– A CGTP-IN não assina acordos que sejam maus para os trabalhadores
Um dos falsos argumentos do Governo é dizer que a CGTP-IN nunca assina acordos. Ora, o que tem de ser dito é que a CGTP-IN e os seus sindicatos assinam os acordos que são bons para os trabalhadores e não assinam quando atacam direitos, limitam salários ou visam retroceder nas condições de trabalho.
Na concertação social, a CGTP-IN assinou vários acordos parcelares, nomeadamente os acordos tripartidos sobre Emprego e Formação; Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho; Modernização da Segurança Social e Evolução do Salário Mínimo Nacional. Também assinou dois acordos bilaterais com as confederações patronais sobre a Dinamização da Contratação Colectiva e Formação Profissional.
Foram acordos favoráveis aos interesses dos trabalhadores, mas a sua eficácia foi comprometida devido aos incumprimentos por parte dos Governos e/ou do patronato, principalmente os acordos sobre a evolução do salário mínimo e a dinamização da contratação colectiva.
Por outro lado, e esta é a vertente mais importante, os sindicatos da CGTP-IN sempre assinaram todos os anos centenas de acordos com os patrões, nos sectores e empresas, sobre salários e melhorias das condições de trabalho. Se hoje não há mais acordos realizados a responsabilidade é inteiramente dos Governos e do patronato. Do Governo, que impõe a caducidade das convenções colectivas; do patronato, que à boleia da caducidade envereda pelo boicote à própria negociação com os sindicatos.
É assim que, em 2003, meses antes da entrada em vigor do código do trabalho, 60,2% dos trabalhadores estavam abrangidos pela contratação colectiva actualizada em IRCT negociais mas, no final de 2023, eram apenas 22,6%.
De tudo isto resulta que o que faz falta é revogar o regime da caducidade e repor o princípio do tratamento geral mais favorável ao trabalhador e não este pacote laboral que não só recua aos piores tempos da troica, como até retrocede a muitas décadas quanto ao acervo de normas de proteção dos trabalhadores consubstanciadas no Direito do Trabalho.
Como diz a canção, para pior já basta assim!
– O ataque aos direitos sindicais visa desarmar a luta dos trabalhadores
No confronto com os trabalhadores o patronato procura anular os principais elementos que dão suporte à unidade, organização e desenvolvimento da luta.
É assim que nas mais de 100 propostas que constam do pacote laboral, uma parte significativa respeita a eliminar ou limitar importantes direitos sindicais, tais como as restrições à liberdade de organização e ação sindical nas empresas, aos direitos de informação e de reunião, ou ao direito de greve, neste caso com a imposição do alargamento de serviços mínimos que em muitas situações são serviços máximos. O Governo e o patronato precisam destas alterações para mais facilmente continuarem a ofensiva contra os demais direitos laborais.
Historicamente, os trabalhadores sabem que a melhor forma de defender os direitos é exercê-los.
A greve geral constitui um direito que deve ser exercido!
– A greve geral é a arma do trabalho contra o poder patronal absoluto
O Governo preparava-se para levar por diante a aprovação de uma legislação laboral muito má, procurando esconder dos trabalhadores os impactos nefastos nas suas vidas. Ao querer evitar a discussão das alterações nos locais de trabalho e na sociedade, o Governo tinha a intenção de arrumar rapidamente a questão na chamada concertação social, fora de quaisquer questionamentos indesejáveis.
Por isso, a greve geral não é extemporânea. É feita no tempo certo, porque foi o Governo que escolheu o timing para declarar esta autêntica declaração de guerra aos trabalhadores.
Mas, se, como diz o Governo, tem sido bom o desempenho económico do país, então, por maioria de razão, este é mais um argumento que torna injustificável insistir nas medidas que constam do pacote laboral.
«O Governo e o patronato precisam destas alterações para mais facilmente continuarem a ofensiva contra os demais direitos laborais.»
Num contexto de resultados económicos positivos, o que o Governo tem de fazer é legislar no sentido da valorização dos salários e na melhoria das condições de trabalho, distribuir melhor a riqueza criada pelos trabalhadores, combater as desigualdades e não em medidas que agravam a vida dos trabalhadores e das suas famílias. Entretanto, o anúncio da greve geral já constitui uma vitória, uma vez que obrigou o Governo e o patronato a virem a terreiro, espoletou a discussão, foram denunciados os objectivos escondidos e alargou-se a compreensão dos efeitos malévolos dos conteúdos do pacote laboral. Hoje, não só os trabalhadores, mas destacadas figuras da sociedade manifestam-se pela retirada do pacote laboral.
E é isso que se pretende com a adesão muito forte à greve geral. Por outro lado, a unidade criada em torno da luta contra o pacote laboral dá mais força aos trabalhadores para continuar outras muitas lutas que têm de travar nas empresas e locais de trabalho pelo aumento dos salários e melhores condições de trabalho.
Está nas mãos dos trabalhadores pôr o pacote laboral no caixote do lixo!
Concluindo,
O que está em causa neste pacote laboral é a tentativa do Governo e do patronato em aprofundar o actual modelo de baixos salários, precariedade laboral e social, despedimentos facilitados e a baixo custo, horários de trabalho longos e desregulados e, em geral, a degradação das condições de trabalho, acentuação das desigualdades e do retrocesso dos direitos laborais e sociais e potencial agravamento da exploração laboral.
Os trabalhadores estão perante uma peça essencial ao desenvolvimento do projeto antidemocrático que o grande capital e as forças políticas que o apoiam e representam nas instâncias do poder há décadas anseiam por concretizar no nosso país.
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