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«Reclamar do quê?» Greve geral marcou debate com primeiro-ministro

Montenegro manteve a sobranceria relativamente aos impactos que teria o pacote laboral desenhado pelo Governo. Alegou estabilidade, mas sem dar a percentagem de trabalhadores que vive «no arame». 

O primeiro-ministro do Governo PSD/CDS-PP, Luis Montenegro, com o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, durante o debate do Estado da Nação, na Assembleia da República. Lisboa, 17 de Julho de 2025. 
CréditosJosé Sena Goulão / Agência Lusa

O debate desta sexta-feira, na Assembleia da República, começou com um exercício de representação, protagonizado pelo primeiro-ministro, Luís Montenegro, e pelo líder da bancada do PSD, Hugo Soares, com ambos a desviar a atenção sobre o que motiva a greve geral da próxima quinta-feira, 11 de Dezembro. A facilitação dos despedimentos, o alargamento dos contratos a prazo, a desregulação dos horários, trabalho extra não pago e o fim da proibição de se externalizarem serviços após 12 meses de um despedimento colectivo são algumas das medidas inscritas no chamado «Traballho XXI», de que o Governo tem dito que não abdica, e que levou à marcação da greve geral. 

Não obstante, Luís Montenegro questiona a relevância da mesma. «Uma greve geral para reclamar do quê? Do Governo e do poder político», queixou-se o primeiro-ministro, que acha «um exagero» apelidar o pacote laboral de retrocesso civilizacional. Ao mesmo tempo, alega que a greve geral «não faz sentido», «numa altura em que o país vive uma circunstância onde o rendimento médio dos seus trabalhadores no ano de 2024 subiu 6,7%, e foi o maior aumento da OCDE, que se obteve pela via do aumento dos salários e da diminuição de impostos».

Pelo PS, José Luís Carneiro admitiu, entre outras críticas, que o pacote laboral «aumenta a precariedade» e «lança os jovens nos recibos verdes», mas deixando dúvidas quanto a uma defesa intransigente dos trabalhadores. «Porquê estas alterações quando estamos em quase pleno emprego e fizemos alterações há dois anos com a participação activa do PSD, que se absteve?», indagou o secretário-geral do PS.  

O anteprojecto de revisão do Código de Trabalho foi o único tema levado ao debate quinzenal pelo PCP, com Paulo Raimundo a acusar o primeiro-ministro de querer impor uma lei dos despedimentos «à americana». «Os senhores querem impor uma lei à americana: Estás despedido e escusas de cá voltar amanhã», declarou o secretário-geral do PCP.

Paulo Raimundo começou a sua intervenção com uma pergunta ao primeiro-ministro sobre o número de trabalhadores precários existentes em Portugal, mas Luís Montenegro não respondeu, refugiando-se numa provocação, ao questionar se o PCP pretende apoiar alterações à lei laboral em vigor.

«O senhor primeiro-ministro não sabe ou não quer dizer qual a taxa de precariedade hoje em Portugal», disse Raimundo, que deu a resposta. «É de 30%, gente que vive no arame todos os dias, gente que não tem condições de poder aceder a uma habitação. Estamos a falar de 2,7 milhões de trabalhadores que trabalham em horários desregulados, sem tempo para si, sem tempo para a sua família», apontou. 

Entre os chavões apresentados em defesa do anteprojecto de revisão, como estabilidade, previsibilidade do trabalhador e favorecimento da competitividade e produtividade da economia, Montenegro sustentou que numa «economia competitiva» haverá sempre trabalho por turnos, assim como horários de trabalho diferenciados, dando o exemplo de empresas tecnológicas, «onde jovens engenheiros informáticos, nomeadamente, fazem questão de não assinar vínculos permanentes».

Paulo Raimundo pegou precisamente neste ponto para lançar a sua segunda pergunta a Luís Montenegro: «Na lei actual, alguém que tem contrato permanente está impedido de mudar de emprego?» Luís Montenegro alegou não querer entrar «numa discussão casuística», pelo que voltou a ser o secretário-geral do PCP a responder, afirmando que, na lei em vigor, «não há nenhum artigo, nada que impeça um trabalhador efectivo, se quiser, ter a liberdade toda para se despedir e ir trabalhar para onde a entender».

O primeiro-ministro contrapôs que o tom com que Paulo Raimundo acabou a sua intervenção «e a forma como encara a discussão da reforma laboral estão datados», acusando o deputado de não «olhar para o futuro». 

Também o BE pegou no tema da revisão da legislação laboral, com Mariana Mortágua a questionar quais são as normas do anteprojecto que visam a adaptação do trabalho às inovações digitais. Mas Montenegro voltou a fugir à resposta, acusando os deputados que fazem perguntas sobre artigos específicos de recorrerem a uma «estratégia» para «desfocar» a discussão do que é importante. Mariana Mortágua, por sua vez, defendeu que o primeiro-ministro «ou não quer responder ou não conhece o anteprojecto». 

Antes, já a lider parlamentar do Livre, Isabel Mendes Lopes, tinha afirmado que o Governo do PSD e do CDS-PP «traz instabilidade ao país e à vida das pessoas», criticando a «afronta de reforma laboral». «Como é que exige estabilidade quando está a tornar precária e instável» a vida dos trabalhadores, criticou a deputada, responsabilizando o «documento inoportuno» e a «atitude arrogante» do Executivo pela marcação da greve.


Com agência Lusa

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