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Índia: mais um jornalista detido em Caxemira ao abrigo da Lei da Segurança Pública

Trata-se do quarto jornalista de Caxemira a ser preso com recurso à controversa lei nos últimos anos. Grupos de defesa dos direitos humanos e de fiscalização dos media consideram a tendência «preocupante».

Majid Hyderi, jornalista de Caxemira (Índia) 
Créditos / Newsclick

Ao abrigo da Lei de Segurança Pública (PSA, na sigla em inglês), as autoridades de Jammu e Caxemira – território da União Indiana que perdeu autonomia constitucional em 2019 – deram ordem de prisão a Majid Hyderi, jornalista e comentador político, dias depois de ter sido detido pela Polícia, que o acusou de «conspiração criminosa» e «extorsão».

Desde que foi preso na sua residência, no Bairro de Peerbagh, em Srinagar, na semana passada, Hyderi já foi transferido para a prisão Kot Balwal, em Jammu, a cerca de 250 quilómetros da chamada capital de Verão do território, indica o Newsclick.

Esta acção contra o jornalista foi amplamente condenada pela população local, incluindo alguns dirigentes políticos, que a classificaram como «profundamente perturbadora», refere a fonte.

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Governo de Modi acusado de atentar contra a liberdade de imprensa

Várias organizações de jornalistas na Índia uniram-se para exigir que os portais noticiosos Kashmir Walla e Gaon Savera estejam operacionais e acessíveis de imediato, após o bloqueio que lhes foi imposto.

Créditos / Newsclick

O Press Club of India (PCI), o Indian Women's Press Corps (IWPC), a Press Association, o Delhi Union of Journalists (DUJ) e a Working News Cameramen's Association emitiram um comunicado conjunto, esta quinta-feira, em que expressam a sua «enorme preocupação» e «forte condenação» relativamente à acção recente, levada a cabo pelo Ministério indiano da Electrónica e da Tecnologia da Informação, de bloquear os portais de notícias Kashmir Walla e Gaon Savera, bem como os seus perfis associados nas redes sociais.

As associações sublinham o carácter arbitrário da acção, uma vez que, «aparentemente, nenhum motivo foi apontado para justificar a medida drástica».

Neste sentido, sublinham, a decisão do ministério de bloquear o acesso às plataformas noticiosas referidas «levanta sérias questões sobre o estado da liberdade de imprensa e a liberdade de expressão» na Índia.

As plataformas afectadas afirmam que a acção foi tomada sem aviso prévio, comunicação oficial ou possibilidade das partes envolvidas deliberarem sobre as potenciais questões em causa.

Newsclick

Esta decisão unilateral é encarada pelas organizações de jornalistas como uma «violação dos direitos fundamentais consagrados na Constituição» da Índia.

Acrescentam, no comunicado conjunto, que «uma paisagem mediática diversa e vibrante é essencial a uma democracia saudável» e que «a liberdade de imprensa constitui a pedra angular deste ambiente».

«O bloqueio arbitrário da presença digital do Kashmir Walla não só asfixia esta liberdade, como dificulta o acesso do público a diversas fontes de informação», afirmam.

A detenção recente do editor do Kashmir Walla «sem justificação transparente» envia uma «mensagem assustadora» aos jornalistas de todo o país, afirmam, pedindo ao governo que permita aos profissionais da comunicação social realizar o seu trabalho «sem receio de represálias ou intimidação».

Neste contexto, as várias associações de jornalistas exigem a imediata reposição das plataformas noticiosas afectadas, e dizem esperar que o Kashmir Walla e o Gaon Savera «possam continuar a operar sem impedimentos ou medo».

«Defendemos a liberdade de imprensa, o jornalismo responsável e o direito de qualquer cidadão a aceder à informação de forma livre», afirmam.

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O ex-ministro-chefe Omar Abdullah escreveu na rede social X (Twitter) que as medidas tomadas contra Hyderi reflectem a intolerância da actual administração contra qualquer forma de contestação na região.

«As notícias sobre a detenção de Majid Hyderi ao abrigo da PSA são profundamente perturbadoras. Se forem correctas, é mais um exemplo da actual administração de Jammu e Caxemira a mostrar quão intolerante é a qualquer crítica», disse o líder do partido Conferência Nacional.

Abdullah defendeu que o jornalista «não pode ser visto como uma "ameaça" à segurança pública, mesmo que ameace algumas reputações». «Se alguém não gostou de alguma coisa que ele disse, então que recorra às leis de difamação disponíveis», acrescentou.

A Lei da Segurança Pública foi aplicada a Majid Hyderi depois de lhe ter sido concedida fiança, refere o portal indiano, acrescentando que se trata do quarto jornalista de Caxemira a ser preso ao abrigo da controversa lei nos últimos anos.

«Ter a ousadia de chamar as coisas pelos nomes tornou-se um crime»

M.Y. Tarigami, dirigente do Partido Comunista da Índia (Marxista), também condenou a aplicação da Lei de Segurança Pública ao jornalista, e criticou as autoridades por recorrerem à força contra profissionais da comunicação social na região.

«Majid Hyderi é um acrescento recente à lista de jornalistas visados pela PSA. É lamentável que o facto de dizer a verdade ao poder ou ter a ousadia de chamar as coisas pelos nomes se tenha tornado um crime. O governo está a usar todos os métodos musculados para intimidar os jornalistas até à submissão», denunciou o dirigente comunista em comunicado.

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Governo de Modi revoga estatuto especial de Caxemira

O governo indiano anunciou esta segunda-feira a revogação da autonomia constitucional do estado de Jammu e Caxemira. Partidos de esquerda denunciam que se trata de um ataque à «democracia e ao federalismo».

Soldados indianos patrulham uma localidade em Jammu e Caxemira
Créditos / Twitter

A revogação do artigo 370 da Constituição, que garante um estatuto especial a Jammu e Caxemira, permitindo que esse estado indiano faça as próprias leis, foi decretada, com efeito imediato, pelo presidente da Índia, Ram Nath Kovind.

A decisão foi comunicada no Parlamento, em Déli, pelo ministro do Interior indiano, Amit Shah, por entre os protestos da oposição. «Toda a Constituição será aplicada ao estado de Jammu e Caxemira», disse Amit Shah. «A partir do momento em que o presidente dá o consentimento [à lei] e [esta] é publicada no Diário Oficial, nenhuma das disposições do artigo 370 será aplicável», acrescentou, citado pela HispanTV.

O artigo 370 garantia um estatuto autónomo a Jammu e Caxemira, que tinha a sua própria Constituição, bandeira e independência para decidir sobre todas as questões excepto as relativas a defesa, comunicações e assuntos externos.

O ministro do Interior disse ainda no Parlamento que o governo decidiu dividir o estado em duas partes, que serão regidas por vice-governadores nomeados pelo governo central: um para Jammu e Caxemira e outro para Ladakh, a parte tibetana da região, indica a Prensa Latina.

A lei que, desde 1949, garantia um estatuto especial à Caxemira indiana proibia que os cidadãos indianos residentes fora deste estado aqui comprassem propriedades, ocupassem empregos governamentais ou lugares nas universidades, refere a HispanTV.

Por seu lado, a PressTV sublinha que o território, altamente militarizado, pode passar a viver uma situação em que os residentes, de maioria muçulmana, são colonizados por colonos hindus, apoiados por tropas que são «forças de ocupação».


Recorde-se que Índia e Paquistão reivindicam o controlo da região de Caxemira desde que se tornaram independentes do domínio colonial britânico, em 1947 – sendo que cada um dos países controla apenas uma parte do território e já travaram duas guerras por causa do seu domínio.

A revogação do estatuto de autonomia ocorre num cenário de tensão crescente, sendo que responsáveis da região, que acusam as tropas indianas de aterrorizar os habitantes, afirmaram temer o aprofundamento dessa situação.

Antes do anúncio do fim do estatuto de autonomia, as autoridades indianas tinham pedido aos turistas presentes na região que a abandonassem – por alegadas ameaças terroristas, ainda que alguns órgãos de comunicação afirmem que tal se deve ao receio de distúrbios.

Além disso, as autoridades enviaram para o território pelo menos mais 10 mil tropas e impuseram restrições à celebração de actos públicos, bem como o encerramento de todas as instituições de educação.

Partidos progressistas denunciam «ataque severo» de Modi à democracia

Diversos partidos progressistas, entre os quais o Partido Comunista da Índia (Marxista), emitiram um comunicado em que criticam de forma veemente o «desmantelamento do estado de Jammu e Caxemira», classificando-o como um «ataque à Constituição da Índia, à democracia e ao federalismo».

Na nota, os partidos signatários sublinham que «a União Indiana foi formada» tendo por base a unidade e o reconhecimento das imensas diversidades que existem. «Claramente, o RSS/PJB [Partido Bharatiya Janata e organização de extrema-direita RSS] não consegue tolerar qualquer diversidade», denunciam.

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Irfan Hafiz Lone, advogado e comentador, que participou em vários debates em noticiários com Hyderi, condenou a acção contra o jornalista, considerando-a um «desrespeito descarado» pelas disposições constitucionais.

«A liberdade de expressão é exclusiva da Constituição. A falsa acusação contra Majid Hyderi, um jornalista profissional, é uma tentativa de amordaçar a liberdade de expressão e silenciar jornalistas corajosos», denunciou Hafiz Lone nas redes sociais.

Grupos de fiscalização dos media têm-se mostrado preocupados com os desafios que os jornalistas enfrentam em Caxemira na sequência da revogação do Artigo 370 da Constituição indiana, em Agosto de 2019, que garantia um estatuto autónomo a Jammu e Caxemira – tinha a sua própria Constituição, bandeira e independência para decidir sobre todas as questões excepto as relativas a defesa, comunicações e assuntos externos.

Desde então, muitos jornalistas foram intimados, viram as suas residências revistadas e os seus aparelhos electrónicos confiscados pelas forças de segurança, refere o Newsclick. Outros foram presos ao abrigo da Lei de Segurança Pública e da Lei de Prevenção de Actividades Ilícitas (UAPA).

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