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|mobilidade e transportes

Transportes Públicos: aumentos dos bilhetes são inaceitáveis e perigosos

A publicação dos preços para 2024 expõe uma das contradições que o Governo se tem recusado a resolver: o preço dos passes inter-regionais, que, mesmo sem aumentos, continuam muito elevados.

Créditos / Wikipédia CC BY-SA 2.0

Estão anunciados os preços, decididos pelo Governo, para os transportes públicos em 2024. No essencial, devem destacar-se dois elementos: a manutenção do valor dos passes em toda a rede, o que é um elemento positivo e que vai no sentido certo; um aumento muito significativo nos bilhetes ocasionais (quadro 1), que é quase sempre superior à inflação de 2023, chegando mesmo a triplicar esse valor, o que é um elemento muito negativo, e que vai no sentido errado.

Com excepção da Transportes Metropolitanos de Lisboa, que decidiu manter igualmente os preços dos bilhetes ocasionais, as restantes empresas subiram esses preços, com as subidas mais altas a registarem-se na privada Fertagus, como está na sua natureza.

Se olharmos para o quadro 1, e pensarmos que a inflação de 2023 está neste momento nos 3,54%, ficamos com uma ideia de quão elevados são os aumentos nos preços dos bilhetes ocasionais que vão ocorrer a 1 de Janeiro de 2024.

Quadro 1

Por detrás deste aumento tão significativo dos bilhetes ocasionais está a ideia de que muitos destes bilhetes são «para turistas», o que, se é verdade nas zonas de maior turistificação (Lisboa e Porto, por exemplo), não pode fazer-nos ignorar que existem muitos cidadãos que, não utilizando (ainda) regularmente o transporte público, usam-no ou poderiam usá-lo de forma ocasional, mas são desmotivados dessa opção pelo preço. O exemplo de Lisboa, com os seus bilhetes mais caros nos carros eléctricos e nos elevadores eléctricos, assumidamente para atingir o bolso do turista, é o exemplo máximo desta perversão. O mesmo poder político (PS/PSD) que gasta milhões a mudar as frotas de motores a combustão para motores eléctricos, em nome do ambiente, é depois aquele que faz pagar mais caro o transporte em eléctrico que em autocarro para o mesmo percurso.

O perigoso destas práticas, que olham para o turismo como uma fonte inesgotável de novas taxas e receitas, é esquecer que esse aumento de preços também afecta os não turistas, todos aqueles que cá vivem e trabalham com rendimentos muito inferiores à maioria dos que nos visitam. Esquecendo ainda que podem acabar por matar a «galinha dos ovos de ouro».

Fertagus, o mau exemplo

Se olharmos para o quadro 2, veremos que a Fertagus não só tem os maiores aumentos de todas as empresas, como tem praticado aumentos sucessivos maiores que a CP (veja-se a comparação com os preços de 2012) e que está cada vez mais cara face à CP Lisboa para as mesmas distâncias. Os utentes pagam entre mais 37% e mais 95% na Fertagus pela mesma distância percorrida que na CP!

Além da penalização aos utentes, estes números também significam que a compensação pela integração no passe é cada vez maior para a Fertagus face à CP Lisboa, apesar de ser esta última quem transporta o grosso dos passageiros ferroviários na AML.

Quadro 2

Tudo dados que demonstram como a exploração privada da ferrovia é muito pior para os utentes e para o Estado, mesmo apesar de explorar comboios públicos, linhas públicas e estações públicas. O que só agrava a decisão do Governo PS (e de Pedro Nuno dos Santos, para quem sobre este alimenta ilusões) de ir renegociando o alargamento do prazo da concessão em vez de realizar a integração deste serviço na CP Lisboa.

A 30 de Setembro de 2024, a concessão da Fertagus termina pela quarta vez. É tempo de integrar este serviço na CP Lisboa, e aumentar-lhe a oferta, como começa a fazer falta sem que o privado, que nunca comprou um comboio, dê quaisquer sinais de o pretender fazer.

Continua por resolver o problema dos passes inter-regionais

Por fim, a publicação dos mapas de preços para 2024 expõe uma das contradições que o Governo se tem recusado a resolver: o elevado preço dos passes inter-regionais, que, mesmo não sofrendo aumentos, continuam com preços muito elevados. Não são poucas as pessoas que utilizam ligações inter-regionais de forma pendular, por exemplo, de Vendas Novas, Torres Vedras, Entroncamento, Tomar para Lisboa, e de Braga, Guimarães, Barcelos para o Porto. É, aliás, uma tendência que se reforçará, principalmente se a política de habitação continuar a expulsar as camadas trabalhadoras das grandes cidades e seus arredores, onde continua a concentrar o emprego.

«Na falta de uma política intermodal, e na falta de apoios à CP para se inserir plenamente nesta dinâmica, a melhor forma de viajar entre muitas localidades – o uso da rede inter-regional/intercidades da CP – está excluída de um preço mensal para o passe que verdadeiramente estimule o uso deste meio de transporte.»

Ora, num momento em que os passes metropolitanos intermodais de Lisboa e Porto custam 40 euros, e o passe mensal nacional para os comboios regionais custa 49 euros (mas só dá acesso aos comboios regionais que nestas ligações são escassos ou inexistentes) é um absurdo os preços que os utentes destas ligações inter-regionais suportam. De Lisboa a Vendas Novas o Passe CP custa 203,10 euros; de Lisboa ao Entroncamento o preço são 218,25 euros; do Porto para Braga ou Guimarães o passe CP custa 237,50 euros. É verdade que em muitas destas localidades existem apoios locais ao passe, assumidos pela câmaras municipais ou pelas CIM (comunidades intermunicipais) ou pelas Áreas Metropolitanas mas sem receber o devido apoio estatal: em Vendas Novas o passe ferroviário pode ser reduzido para 120 euros a residentes, em Torres Vedras o passe rodoviário para Lisboa é de 70 euros, a ligação rodoviária Braga-Porto tem um passe de 65 euros, etc. Mas estes apoios não só não são universais, como absorvem de forma desigual verbas das diferentes autarquias, e acabam por ser soluções minimalistas, pois em quase todas as situações os utentes ou são ainda forçados a passes muito caros ou os passes não são intermodais nem valem para todos os modos de transporte e todas as empresas.

A falta desta integração intermodal da CP com a rede rodoviária nas diferentes regiões prejudica, antes de mais, a própria CP. O total das receitas anuais do serviço regional da CP é de 29,5 milhões de euros (11,2% das receitas totais da empresa, em 2022). É um serviço altamente deficitário, mas que é essencial que exista, se modernize e cresça na oferta e na procura. A inclusão da oferta regional no conjunto dos passes regionais e inter-regionais não afectaria significativamente a receita, mas poderia aumentar muito a procura e por essa via acabar por aumentar a receita e essencialmente valorizar o investimento feito. Já a oferta inter-regional (intercidades nos dias de hoje) não aparece individualizada nos relatórios públicos da CP (e o estudo que o Governo se comprometeu a fazer sobre o assunto, se existe, não é público), mas a sua integração no conjunto dos passes das CIM teria o mesmo efeito potenciador da procura e das receitas já apontado à oferta regional.

Na falta de uma política intermodal, e na falta de apoios à CP para se inserir plenamente nesta dinâmica, a melhor forma de viajar entre muitas localidades – o uso da rede inter-regional/intercidades da CP – está excluída de um preço mensal para o passe que verdadeiramente estimule o uso deste meio de transporte. Com as autarquias a gastarem significativos recursos públicos em políticas casuísticas, que muitas vezes acabam a empurrar os utentes para o transporte rodoviário (isto quando a sua falta de atractividade não acaba a promover o transporte individual).

«A resposta mais coerente é a criação de passes inter-regionais completamente intermodais, incluindo sempre as ligações regionais e inter-regionais da CP.»

A resposta mais coerente é a criação de passes inter-regionais completamente intermodais, incluindo sempre as ligações regionais e inter-regionais da CP. Esta reivindicação tem sido expressa desde 2019 em múltiplas iniciativas na Assembleia da República, nomeadamente pelo PCP, mas o Governo tem empurrado o problema com a barriga, não incluindo essa dimensão nem no Programa de Apoio à Redução Tarifária, nem no Contrato de Serviço Público da CP.

O alargamento do passe ferroviário nacional (que hoje só serve para o serviço regional, mas deveria ser alargado à restante oferta, nomeadamente onde não existe oferta regional) é uma outra possibilidade, que até está admitida em lei desde há dois anos, mas para as ligações pendulares peca pela falta de intermodalidade (na generalidade das situações, os utentes também precisam de transporte público não ferroviário nas pontas do serviço). O passe ferroviário nacional nasceu essencialmente para estimular o uso da rede ferroviário nacional nas férias, não é a resposta aos problemas do transporte público diário das populações.

A falta da plena intermodalidade nos passes regionais e a não criação de passes inter-regionais intermodais é a grande lacuna do PART que está por superar. Os restantes problemas são todos de falta de oferta.

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