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Sono das crianças e sesta no Pré-escolar – um tema a trazer à luz do dia

O debate sobre os horários e condições laborais das famílias e a questão da sesta das crianças durante todos os anos do pré-escolar assume hoje uma grande importância, ainda que esta não lhe seja dada

O final do Verão significa início ou re-início para muitas famílias trabalhadoras e para os seus filhos. Constroem-se ou retomam-se rotinas essenciais ao trabalho e à escola. Rotinas nem sempre fáceis, que se moldam muito mais ao tipo de Emprego, de Educação e de condições sociais existentes do que à saúde humana e ao bem-estar.

Dentro destas rotinas, com a palavra «horários» como ponto-chave e o relógio como soberano, o sono das crianças é uma das batalhas. Esta pode ser pode ser uma boa altura, por isso, para voltarmos ao importante tema dos horários de sono.

A infância é um período particular da vida onde as famílias, em geral, tentam fazer o melhor e o mais adequado a um crescimento saudável e à criação de bons hábitos. De acordo com a Associação Portuguesa do Sono, «Um bom sono é muito importante para uma vida saudável. Ter um padrão de sono adequado na infância é um alicerce que favorece a continuação de um sono de qualidade na vida adulta.»

A Sociedade Portuguesa de Pediatria (SPP), num dos seus estudos recentes (Junho de 2017) alerta para a importância dos hábitos de sono na Infância dizendo-nos que «Não se pode viver sem dormir, assim como não se pode viver sem respirar. A alternância entre a vigília e o sono constitui um ritmo fundamental da espécie humana assumindo particular importância durante a infância. [...] O sono é um estado muito complexo que serve para reorganizar todas as nossas funções e garantir a nossa recuperação física e psíquica.»

Assim, é essencial que as famílias estejam alerta para actuarem na criação de bons hábitos de sono: «É da responsabilidade das famílias cumprir as regras essenciais para a higiene do sono: 1) promover um horário regular de deitar a criança todos os dias mantendo essa regularidade aos fins-de-semana, com uma diferença máxima de 30 minutos; 2) ter uma rotina de deitar estabelecida com um ritual que precede a ida para a cama sempre idêntico (vestir o pijama-lavar os dentes-contar história, a título de exemplo); 3) deitar a criança ainda acordada permitindo o uso de objeto de transição como uma fralda, chucha ou boneco; 4) evitar adormecer em local que não a própria cama; 5) evitar atividade estimulante antes de adormecer como exercício físico e 6) não permitir a utilização de ecrãs (televisão, telemóvel, tablet ou consola de jogos) antes de adormecer.»

Que condições têm hoje as famílias trabalhadoras para cumprirem estas recomendações básicas? Pensemos naquilo que é fácil de observar em qualquer final de dia, nas longas filas de trânsito ou no caos dos transportes públicos.

As situações de crianças que adormecem a caminho de casa, entretidas à frente de ecrãs, que demonstram necessidade de dormir mais tempo ou dão sinais de clara exaustão física e emocional são-nos infelizmente cada vez mais familiares.

Também a SPP faz um levantamento das condições em que se encontra uma grande percentagem das crianças no nosso país, comparando-as com as de outros países europeus. Neste mesmo estudo podemos ler que «em comparação com os restantes países europeus o tempo total de sono diário apurado nas crianças portuguesas em idade pré-escolar é dos mais baixos, principalmente entre os 4 e os 5 anos de idade [...] as crianças portuguesas dormem, em média, menos 1 hora. A diferença chega a 1,5 horas aos quatro e cinco anos […] a hora de deitar tardia relaciona-se com a flexibilidade dos pais na hora de deitar mas também com os horários do fim do dia das famílias.»

Os horários de trabalho extensos e o desrespeito pelos direitos de maternidade e paternidade estão, de acordo com a CGTP-IN, entre as situações que mais levam os trabalhadores e os seus sindicatos ao recurso aos tribunais de trabalho. Numa iniciativa recente, de março de 2018, «Semana da Igualdade», foram denunciados publicamente 1017 locais de trabalho onde foram identificados problemas relacionados com o tema, tendo participado e denunciado casos concretos mais de 60 mil mulheres.

Os hábitos diários, e consequentemente, a saúde dos filhos destes trabalhadores, têm uma relação directa com estes indicadores. É referido ainda no estudo da SPP que «Devido à realidade e limitações/impedimentos à qualidade de vida quotidiana familiar, principalmente para as famílias inseridas num contexto urbano, é de salientar que uma elevada percentagem só consegue que as suas crianças em idade pré-escolar (3 aos 5/6 anos) adormeçam entre as 21h e as 22h. Por conseguinte, a média de sono noturno será, na melhor das probabilidades, de apenas 9 a 10 horas […] Se para a criança entre os 3 e os 5 anos de idade, a duração total do sono em 24 horas deverá ser de 10 a 13 horas há de imediato uma falta de 2 a 4 horas de sono. Num elevado número de crianças esta privação motiva a ocorrência de sestas tardias ou no trajeto até casa, com interferência no sono noturno e a alterações de comportamento que se repercutem sobre o bem-estar da criança e da família.»

Alterações estas que vão desde o curto prazo, como «perturbação da memória, sonolência diurna ou humor variável», até consequências mais graves a longo prazo, tais como «hipertensão arterial, depressão e maior probabilidade de disfunção familiar e depressão materna».

A acrescer a esta situação, é vista como aceitável a suspensão da sesta a partir da entrada no Jardim de Infância (ou na melhor das hipóteses a partir dos 4 anos) não existindo um período de descanso, colchões, espaços adequados e ambiente sem estímulos exteriores. É conhecida a prática que se se vem banalizando nos Jardins de Infância (muitos deles privados ou entregues ao sector particular e cooperativo) de retirar a sesta da tarde às crianças entre os 3 e os 5 anos, substituindo-a por actividades lúdicas ou pedagógicas. Nas poucas instituições públicas existentes, esta é mesmo a norma.

Com a situação laboral descrita, as difíceis rotinas de muitas famílias e o exemplo dado nas instituições escolares, o hábito da sesta durante as férias e fins-de-semana vai-se esbatendo. Os pediatras alertam, no entanto para a importância que esta tem, em particular neste contexto:

«A atual situação de inexistência de recomendações claras sobre a sesta para a criança na creche e nos infantários condiciona um importante risco para a saúde e bem-estar atual e futuro das nossas crianças. Em Portugal as crianças, principalmente as que frequentam os estabelecimentos públicos, em norma, não realizam a sesta após os 3 anos de idade.

[...]

A sesta parece promover uma alteração qualitativa na memória que envolve a abstração. A abstração, particularmente importante para os lactentes em desenvolvimento, é essencial no desenvolvimento cognitivo e da linguagem, permitindo grande plasticidade na aprendizagem. Na idade pré-escolar, a sesta tem sido referida como recurso valioso para a consolidação da memória

[…]

É atualmente prioritário assegurar a todas as crianças uma quantidade suficiente de sono de boa qualidade nos momentos apropriados, de acordo com as suas necessidades individuais».

O debate sobre os horários e condições laborais das famílias e a questão da sesta durante todos os anos do pré-escolar assume hoje uma grande importância, ainda que esta não lhe seja dada. Exemplo disto foi a pouca visibilidade dada à apresentação de um Projecto de Resolução por parte do PCP que «Recomenda ao Governo que estude a possibilidade de introdução da sesta na Educação Pré-Escolar».

Neste documento, considerando as vantagens da sesta, recomenda-se que, para crianças com menos de 24 meses de idade, seja feito um plano individualizado adaptado à criança (número, horário e duração das sestas) e que a duração do tempo diurno de sono seja de 2 a 3 horas, dividido por 1 a 3 sestas. Entre os 24 e os 36 meses de idade é recomendado que haja uma única sesta, com uma duração aproximada de 2 horas, devendo ter lugar, preferencialmente, ao início da tarde. Nas crianças entre os 3 e os 5/6 anos a duração da sesta deverá ser igual ou inferior a 90 minutos.

São ainda avançadas recomendações gerais sobre a necessidade de serem garantidas as condições adequadas a todas as crianças em idade pré-escolar, a fim de assegurar a qualidade do sono da sesta – como a existência de colchões, um ambiente calmo, de temperatura adequada, com ruído limitado e com vigilância – bem como a existência de um plano individual de sesta para cada criança, devidamente articulado com a família, devendo ainda a sesta ser promovida pelos educadores de infância na presença de manifestações de sono ou necessidade de sesta pela criança.

A qualidade do sono e das rotinas infantis são um importante tema a debater nas reuniões escolares, com os educadores de infância e outros pais, informando e partilhando este tipo de recomendações. Este é um tema que está também ligado à criação de respostas pré-escolares de maior qualidade, em particular à criação de uma rede pública, que hoje não existe, vocacionada para o bem-estar infantil e não para o lucro ou para os interesses de cada IPSS em particular, e onde a participação democrática dos pais e dos trabalhadores educativos será respeitada de outra forma.

São os pais, os educadores e os especialistas em saúde infantil, aqueles que estão interessados numa vida melhor para as nossas crianças, que podem fortalecer este debate, observando a realidade e alicerçando sobre ela os seus argumentos. Um amplo debate, com a sociedade alerta para a saúde infantil, dará mais razão à reivindicação legítima de uma maior atenção à questão da sesta e dos horários das famíias. É necessário trazer para a luz do dia a discussão sobre horários e condições de trabalho, sobre a qualidade do Pré-escolar e os hábitos que este pode promover.


A autora escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AE90)

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