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Raimundo como qualquer um

A eleição de Paulo Raimundo terá um doce simbolismo para todos esses anónimos que ganham mal e trabalham muito, que andam enlatados nos comboios e são da comissão de utentes. Numa palavra: os que lutam.

CréditosManuel Almeida / Agência Lusa

Paulo quem? Como é que eles se atrevem? A escolher para secretário-geral um anónimo, um filho da mulher das limpezas, um padeiro qualquer, um tipo que as televisões nunca chamaram para comentar nada nem fora predestinado por quem é chamado para comentar tudo, carpinteiro, ou padeiro, ou animador, ou lá qualquer coisa que se estuda à noite e que nunca ninguém tratará por doutor –  só por camarada – Paulo quem?

Paulo Raimundo é tão anónimo como nós, os que comunistas são e que por isso anónimos ficarão, excepto como o Paulo, excepto nas lembranças anónimas da refinaria de Matosinhos, nas greves anónimas dos motoristas dos autocarros de Braga, nos socalcos anónimos do Douro vinhateiro, nos intestinos anónimos dos hotéis do Algarve, nas lutas anónimas dos arquitectos do Porto.

Tal como o Paulo, Portugal é um país de gente anónima que tem de deixar de ser. Quantos escritores falariam melhor de literatura do que Marques Mendes? Quantos dirigentes sindicais explicariam melhor que José Júdice, e de forma mais informada e eloquente, as consequências sociais da inflação? Quantas vezes é que a dupla Milhazes e Rogeiro têm contraditório? Quantos milhares de nós conseguem proezas de decência, coragem e dignidade em condições de total anonimato? Paulo quem?

«Quantos escritores falariam melhor de literatura do que Marques Mendes? Quantos dirigentes sindicais explicariam melhor que José Júdice, e de forma mais informada e eloquente, as consequências sociais da inflação?»

Paulo Raimundo é anónimo porque, nas televisões e nos jornais, #ComunistaNãoEntra, mesmo que se assuma, há 30 anos, as mais altas responsabilidades políticas e mesmo que, desde então, se fale pelo PCP em conferências de imprensa que a comunicação social da classe dominante decide ignorar.

A eleição de Paulo Raimundo terá um doce simbolismo para todos esses anónimos: os que construíram Tebas e o convento de Mafra; os que arriscam o pêlo pelos colegas porque têm princípios; os que ganham mal e trabalham muito; os que vivem em bairros onde a Ana Gomes não vai; os que andam enlatados nos comboios e são da comissão de utentes; os que esticam orçamentos por famílias de quatro. Numa palavra: os que lutam.

Com ou sem mediatismo, mesmo sem nunca ter sido deputado, até sem ser licenciado. Tanto como o nosso povo. Vindo dele e sem dele sair. Como são os comunistas.

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