António Costa reagiu este domingo às notícias sobre o acolhimento de refugiados da Ucrânia no nosso país, pedindo «serenidade», um dia depois de a Câmara Municipal de Setúbal ter reafirmado a comunicação enviada ao Governo no início de Abril, e que este deixou sem resposta.
Ontem também, o presidente da associação Refugiados Ucranianos afirmou à Lusa não perceber, por um lado, «como é que Portugal continua a ter um partido como o PCP, nem por que as organizações não filtram as pessoas que lá trabalham» e, por outro, «como é que Portugal, um país democrático, continua a ter um partido como o PCP».
Num acto de ingerência e, aqui sim, falho de princípios democráticos, o dirigente associativo foi ainda mais longe ao afirmar que lhe custava perceber «como é que não filtram as câmaras, as organizações não filtram as pessoas dentro de próprias» associações, «quem são, o que é que fazem e quais são as ideias deles».
Domingos Abrantes, um dos muitos militantes comunistas que passaram pelos cárceres do fascismo, afirma ao AbrilAbril que as declarações proferidas ontem pelo presidente da associação são de «extrema gravidade». «O senhor ainda não percebeu que não está na Ucrânia, onde o Partido Comunista foi o primeiro a ser ilegalizado, como é clássico, e a seguir tudo o resto, à excepção do partido do presidente [Servo do Povo] e dos partidos nazis», afirmou.
Os povos russo e ucraniano têm direito a viver em paz. É preciso acabar com esta guerra fraticida. Conta-se que perguntaram uma vez a Roosevelt a opinião que tinha do ditador nicaraguense Anastasio Somoza. O dirigente dos EUA respondeu sem dúvidas: «É um filho da puta, mas é o nosso filho da puta». É preciso esclarecer que Putin tem muito destas características, mas não é nosso. Os comunistas não têm nada que ver com a dinastia que nasceu com Ieltsin, de quem Putin é herdeiro político, e com a destruição da União Soviética. O poder dos oligarcas que se estabeleceu depois da destruição do socialismo real é um regime capitalista neoliberal em que a riqueza dos oligarcas faz-se à conta da miséria da maioria da população. A subida destes governantes ao poder na Rússia teve o apoio precioso e por vezes determinante das várias administrações dos Estados Unidos da América e dos governos cúmplices da União Europeia. Putin tem razão quando diz que as nações na União Soviética ganharam estados e uma forte existência política e cultural com a Revolução de Outubro. Lenine e os outros dirigentes revolucionários perceberam que a revolução socialista só era possível no Império Russo, se conseguisse dar liberdade política e cultural às nações subjugadas pelo Império Russo. Que não era possível libertar a classe operária e os camponeses russos sem libertar os povos do império da subjugação colonial. Nesse sentido, é possível dizer que a actual Ucrânia deve muito a Lenine e aos demais revolucionários. Mas isso não faz da Ucrânia um país artificial. São os povos que decidem constituir as nações. Nem Putin pode declarar a inexistência da Ucrânia, nem o presidente dos EUA, Joe Biden, pode declarar que os povos do Donbass não têm direito a decidir a forma da sua organização política. Os comunistas não têm nenhuma simpatia pelo actual governo ucraniano, herdeiro de um golpe de Estado apoiado pela NATO e que teve como principais medidas: a proibição do Partido Comunista Ucraniano, a perseguição dos falantes de língua russa (grande parte da população), o encerramento dos canais de televisão em língua russa e a integração dos batalhões neonazis nas forças armadas ucranianas. Os comunistas não esquecem os 50 homens, mulheres e crianças queimados vivos, em 2 de Maio de 2014, na casa dos Sindicatos de Odessa, por essas milícias neonazis. Não perdoam os sucessivos massacres e bombardeamentos à população do Donbass. Mas isso não significa apoiar uma invasão imperialista da Ucrânia. Esta escalada de guerra não começou hoje e não é independente da promoção do golpe de Estado de 2014, que derrubou o governo, corrupto, mas eleito da Ucrânia. Nem este clima de confrontação pode ser desligado da escalada militarista da NATO e do crescente cerco por bases militares ao território da Rússia. Os ucranianos têm o direito de viver em paz, como os russos têm o direito de não serem cercados por bases militares e rampas de lançamento de mísseis hostis. A acção militar promovida por Putin e o seu grupo apenas conduz à morte de pessoas inocentes e ao reavivar da NATO nos restantes países da Europa. Mas a paz na Ucrânia, a autodeterminação de todos os povos da região só é possível com a paz e com estados democráticos libertos das amarras dos autocratas ucranianos e russos. Só a democracia e o socialismo podem combater a cegueira dos nacionalismos promovidos pelos autocratas capitalistas desses países. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Opinião|
Guerra da Ucrânia. Não em nosso nome
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Igualmente grave, destaca Domingos Abrantes, é «o silêncio das autoridades públicas, e de certas pessoas que se dizem democratas de esquerda, quando existe todo este ataque a um partido que é um dos construtores do Portugal democrático». Ao mesmo tempo deixa claro que, «naturalmente, nem todos os ucranianos que estão em Portugal são como este dirigente, que exibe símbolos nazis».
Ao presidente da associação de refugiados junta-se a embaixadora da Ucrânia em Portugal, que, numa entrevista recente, criticou e acusou os comunistas de participarem na «campanha de desinformação» russa. Não menos curiosa foi a participação de Inna Ohnivets no desfile organizado pela Iniciativa Liberal, no 25 de Abril, tendo em conta a conduta ética que deve nortear os diplomatas creditados em Portugal e o facto de a iniciativa ser contra a natureza da Revolução ocorrida há 48 anos.
Estas atitudes, particularmente a da embaixadora, percebem-se melhor à luz da realidade vivida na Ucrânia a partir de 2015, onde desde então o Partido Comunista permanece ilegalizado, existindo uma Lei de Descomunização com penas até cinco anos de prisão. Em Março, e sob o pretexto de serem «pró-russos», o presidente Zelensky, que no final de 2021 condecorou um dos líderes do batalhão neonazi Azov, Dmytro Kotsyubaylo, proibiu a actividade de 11 partidos políticos, incluindo o maior partido da oposição.
Situações em sintonia com o período negro do fascismo, que Portugal viveu, onde todos os que tinham ideias e opiniões contrárias ao poder eram apelidados de comunistas.
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