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A situação é antiga e não espanta ninguém. Já Pinto de Almeida, antigo director do serviço de Obstetrícia do Hospital de Setúbal, se tinha demitido do seu cargo a 6 de Agosto, referindo a «falta de profissionais que obrigou ao encerramento da urgência» no início desse mês, como a gota de água que o levou a abandonar o serviço com uma falta de profissionais crónica.

Antes ainda, a 2 de Fevereiro deste ano, numa conferência de imprensa realizada pela Ordem dos Médicos, pelo director clínico (demissionário) do Hospital de Setúbal, Nuno Fachada, e pela Câmara Municipal de Setúbal (CMS), se tinha frisado o problema da falta de pessoal médico: «não há profissionais suficientes» afirmou Maria das Dores Meira, então presidente da CMS, garantindo que «a ministra da Saúde e o secretário de Estado têm conhecimento desta necessidade».

Após o anúncio da demissão de Nuno Fachada, na semana passada, que se referiu, uma vez mais, à falta de profissionais existentes no Centro Hospitalar de Setúbal (CHS), é agora a vez da restante direcção clínica, directores de serviço e departamentos, coordenadores de unidades e comissões e chefes da equipa de urgência, num total de 87 profissionais renunciarem aos cargos que ocupam.

Foram vários os motivos a forçar a mão de Nuno Fachada: a «situação de rotura e agravamento nas urgências médicas, obstétrica» e as muitas «dificuldades noutras escalas como a pediátrica, cirúrgica, via verde AVC e urgências internas».

Os dez profissionais de saúde que o Governo prometeu contratar, em resposta à tomada de posição do director clínico demissionário, não serão mais do que um paliativo para um centro hospitalar com carências em praticamente todos os sectores. Só na unidade de Obstetrícia, como alertou Pinto de Almeida, estão a trabalhar apenas 11 dos 23 especialistas necessários. Destes, dois já pediram a aposentação e outros dois estarão na mesma situação em 2022.

Para Nuno Fachada, parece evidente que «o Hospital de São Bernardo, como está, não consegue mais responder à sua população. É o momento de se cumprir o prometido: o CHS tem de ser convertido para o "grupo D" dos hospitais. Ou seja, deixar de ser financiado como um simples hospital distrital e passar a ser uma unidade multidisciplinar».

«Seria trágico ver as ansiadas obras servirem para agravar o pesadelo já existente»

Em Junho de 2021, o conselho de administração do CHS anunciava o projecto para o alargamento do Hospital de São Bernardo, em Setúbal, uma antiga reivindicação dos profissionais deste equipamento e da CMS. A verba para a construção deste espaço foi incluído no âmbito das negociações para o Orçamento do Estado de 2021, por iniciativa do PCP.

O Hospital Ortopédico do Outão e o serviço ambulatório de Psiquiatria não serão incluídos nestas obras de ampliação, alertando Nuno Fachada para o risco de que esta empreitada, indispensável para a população da Península de Setúbal, venha a «servir para condensar o resto do centro hospitalar».

Também a CMS, em comunicado no passado mês de Junho, lançou um alerta «à população e às comunidades hospitalar e educativa para que, com a autarquia, se mantenham atentas e intervenientes para que as propostas agora aprovadas sejam efectivamente concretizadas», e que cumpram, efectivamente, com o seu objectivo de reforçar os cuidados de saúde para a população.

André Martins, que toma posse amanhã como presidente da CMS, já anunciou nas suas redes sociais que as «primeiras reuniões oficiais realizam-se na segunda-feira de manhã, dia 11 de Outubro, com o presidente do Conselho de Administração do CHS, Manuel Roque, e o director clínico demissionário, Nuno Fachada», para analisar conjuntamente os problemas deste sector e o papel que o município pode ter nesta situação.

Audições em lista de espera

Em comunicado enviado ao AbrilAbril, o grupo parlamentar do PCP refere já ter solicitado audições com o Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Setúbal e com a Ministra da Saúde, sobre a situação do Centro Hospitalar, a 21 de Abril de 2021, tendo este partido dirigido um novo repto face aos desenvolvimentos da semana passada.

O PCP relembra que foi por sua iniciativa que «no Orçamento do Estado para 2021 ficou prevista a transferência de 17,2 milhões de euros para o Centro Hospitalar, com vista à sua ampliação através da construção de um novo edifício». Estando esta e outras medidas por concretizar.

«A valorização e a requalificação do Centro Hospitalar de Setúbal, através do reforço do investimento nas instalações e equipamentos, da valorização dos profissionais de saúde e da contratação dos profissionais de saúde necessários, são fundamentais para o seu futuro e para melhorar a prestação de cuidados de saúde aos utentes», considera o Partido Comunista Português.