|alterações climáticas

Porque o voo espacial de um bilionário vale pelas emissões de mil milhões de pobres

Um estudo patrocionado pela Oxfam determinou que o 1% mais rico do planeta vai emitir, em 2030, 30 vezes mais carbono do que aquilo que está convencionado pelo acordo de Paris.

Elon Musk, que nas últimas semanas se tornou a pessoa mais rica de sempre, apresenta o foguetão Falcon 9, produzido pela sua empresa SpaceX, que vai levar passageiros ao espaço durante umas horas 
Créditos / Getty Images

Com base no trabalho desenvolvido pelo Instituto para a Política Ambiental Europeia (IEEP, Institute for European Environmental Policy) e o Instituto do Ambiente de Estocolmo (SEI, Stockholm Environment Institute), o estudo identifica claramente os responsáveis pela dificuldade em atingir as metas a que o mundo se propôs: «O 1% mais rico, que é menor do que a população da Alemanha, vai ser responsável por 16% do total de emissões de gases de efeito de estufa».

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Pequeno passo para poucos homens, uma pegada gigante para a humanidade

Relatório de instituição intergovernamental traça um retrato negro sobre as consequências das alterações climáticas, mas a responsabilidade dos 1% mais ricos do planeta é convenientemente esquecida, acusa Oxfam.

Plantação de árvores nas áreas desertas da Região Autónoma Uigure de Xinjiang, China. Este projecto converteu 66 mil hectares de deserto em bosques, em linha com o esforço nacional que, desde 1978, mais do que duplicou a área ocupada por florestas ou bosques no País, atingindo quase 25% da área total 
CréditosZhang Guigui / China Daily

O relatório divulgado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, conhecido por IPCC na sigla em inglês, é categórico nas conclusões da sua investigação. O planeta vai mesmo aquecer pelo menos 1,5ºC, isto nas perspectivas mais positivas, até 2030, dez anos mais cedo do que o esperado.

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A Amazónia já não é o pulmão do mundo

A floresta tropical da Amazónia, no Brasil, passou a emitir mais dióxido de carbono do que aquele que consegue absorver. É a primeira vez, desde que há registos, que esta situação se verifica.

Uma foto divulgada pelo Greenpeace mostra fumo dos incêndios florestais no estado do Pará, Altamira, Brasil. 26 de Agosto de 2019.
CréditosVictor Moriyama

As conclusões do artigo publicado ontem na revista científica Nature são categóricas: Os incêndios e queimadas que destroem, todos os anos, milhares de hectares da floresta tropical, muitas provocadas deliberadamente com o objectivo de libertar terreno para a exploração agrícola ou pecuária, assim como o abate de árvores, roubou à Amazónia a sua qualidade respiratória.

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Amazónia perdeu quase 100 hectares de floresta por hora em 2020

Ambientalistas sublinham que o «crime» é «incentivado pela redução da fiscalização» e directamente pelas autoridades, ao proporem legislação no sentido oposto ao controlo da destruição ambiental.

Queimada no estado de Rondónia, em 2020 
CréditosBruno Kelly / Amazônia Real

«A cada hora, a Amazónia brasileira perdeu 96 hectares da sua cobertura florestal no ano de 2020. Ao fim de um dia, foram desmatados 2309 hectares. Nesse ritmo, ao terminar de ler esta reportagem, o equivalente a 32 campos de futebol da floresta amazónica terão sido devastados», lê-se no portal Amazônia Real, que se refere aos dados divulgados na passada sexta-feira pela MapBiomas.

Em 2020, ano marcado pelos efeitos da pandemia da Covid-19, o desmatamento da maior floresta tropical do mundo aumentou 9% em relação a 2019. De cada dez hectares desflorestados no Brasil, seis tiveram lugar na Amazónia, com a devastação a atingir os 842 983 hectares.

Para o Amazônia Real, o governo de Bolsonaro levou a sério o «passar a boiada» (actualizar/flexibilizar normas, no caso, para o avanço do agronegócio) defendido pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que é investigado por crime ambiental e enriquecimento ilícito.

O segundo Relatório Anual do Desmatamento 2020, elaborado pelo MapBiomas, mostra que, no Brasil, entre Janeiro e Dezembro, foram emitidos 74 218 alertas de desmatamento para uma área superior a 1,3 milhão de hectares. Por comparação com 2019, o aumento da área abrangida foi de 14%.

A MapBiomas, iniciativa que integra diversas entidades dedicadas a estudos e acções de protecção ambiental, verificou que 99% de todo o desmatamento do país sul-americano ocorreu de forma ilegal, ou seja, sem a devida autorização dos órgãos ambientais. Nem mesmo áreas protegidas, como unidades de conservação e terras indígenas, escaparam da acção dos prevaricadores.

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Desflorestação no período de Bolsonaro é 82% superior aos anos anteriores

Os alertas de desmatamento da floresta amazónica indicaram uma área de 8426 quilómetros quadrados em 2020, o equivalente a cerca de cinco cidades de São Paulo.

Organismos oficiais verificaram um aumento de 83,9% na devastação da floresta entre Janeiro e Novembro deste ano por comparação com o mesmo período de 2018
Nos dois primeiros anos de governo de Bolsonaro aumentou a devastação da floresta amazónica Créditos / A Crítica

Os dados foram divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) na sexta-feira passada e foram registados pelo projecto Deter-B, que indica praticamente em tempo real a localização de acções ilegais em zonas preservadas.

A área devastada na Amazónia em 2020 – 8426 quilómetros quadrados – corresponde ao segundo pior índice da série histórica do Deter, que começou a operar em 2015; só é suplantada por 2019, primeiro ano de governação de Jair Bolsonaro, em que foi desflorestada uma área de 9178 quilómetros quadrados.

Ou seja, nos dois primeiros anos do governo de Bolsonaro, a área desflorestada na Amazónia é 82% superior, em média, à dos três anos anteriores. Mesmo com a redução de 8% de 2019 para 2020, a média de área desmatada nestes dois anos é de 8802 quilómetros quadrados, bem acima da registada entre 2016 e 2018: 4844 quilómetros quadrados, informa o Portal Vermelho.


Numa nota à imprensa, o secretário executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini, comentou estes dados afirmando que «Bolsonaro tem dois anos de mandato e os dois piores anos de Deter ocorreram na gestão dele». «As queimadas, tanto na Amazónia quanto no Pantanal, também cresceram por dois anos consecutivos. Não é coincidência, mas sim o resultado das políticas de destruição ambiental implementadas pelo actual governo», sublinhou.

Já no início de Dezembro, quando veio a público que a devastação da Amazónia batia recordes no Brasil, o Observatório dirigiu duras críticas ao governo brasileiro, tendo emitido uma nota em que denunciava que os números cumprem «um projeto bem-sucedido de aniquilação da capacidade do Estado Brasileiro e dos órgãos de fiscalização de cuidar de nossas florestas e combater o crime na Amazónia».

Por seu lado, Rômulo Batista, porta-voz da Campanha Amazônia da Greenpeace, disse que aquilo a que se tem assistido nos últimos dois anos é um desmantelamento de «todas as políticas e conquistas ambientais feitas desde a redemocratização do país».

Em entrevista ao Brasil de Fato, afirmou que «Bolsonaro vê o meio ambiente como um entrave económico» e que tanto ele como os seus ministros «apostam na abertura de terras indígenas para mineração e no desmatamento para o aumento da produção agrícola».

Destacou que o «desmatamento não traz riqueza» e lembrou que a «ciência aponta que a Amazónia está muito próxima de um ponto de "não retorno" também chamado de ponto de "inflexão", que é quando a floresta perde a capacidade da sua automanutenção».

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Marcos Reis Rosa, doutor em Geografia pela Universidade de São Paulo, afirma que, tendo em conta as informações disponíveis em bancos de dados como o Cadastro Ambiental Rural (CAR), é possível identificar o autor em qualquer desmatamento ocorrido no Brasil. Dos mais de 5,5 milhões de imóveis rurais cadastrados no Brasil, sublinha, houve registo de desflorestação em apenas 0,99%.

«Só um por cento teve desmatamento, o que bastou para fazer este estrago não só ao meio ambiente mas também à nossa imagem lá fora. Mas é este 1% que faz barulho, que tem representantes no Congresso, que está lá para fazer lei para ampliar o desmatamento, lei para amnistiar ocupação ilegal», disse Rosa, um dos autores do relatório da MapBiomas, em entrevista à Amazônia Real.

«O crime não pára»

Líder de Conversão Zero do WWF-Brasil – um dos parceiros institucionais da MapBiomas –, Frederico Machado avalia que a fragilidade dos trabalhos de fiscalização em campo por causa da pandemia foi apenas mais uma oportunidade encontrada para o avanço da desflorestação.

«O crime não pára. É até incentivado pela redução da fiscalização. Por falas das nossas autoridades, propondo legislação no sentido oposto ao controle da destruição ambiental. Há o desmantelamento das nossas agências ambientais. Isso tudo é muito grave, e a pandemia foi mais um momento de oportunidade», disse Machado.

Entre os cinco biomas brasileiros, a Amazónia concentrou 60,9% da área desmatada no país em 2020. Segue-se o Cerrado (31%), a Caatinga (4,4%), o Pantanal e a Mata Atlântica, ambos com 1,7%, e o Pampa (0,1%).

Entre os 27 estados da federação, os que compõem a Amazónia Legal lideram o ranking do desmatamento. Só no Pará, registou-se mais de um quarto (26,4%) da desflorestação detectada em todo o país.

Seguem-se Mato Grosso (12,9%), Maranhão (12,1%), Amazonas (9,2%) e Rondónia (8,3%). Tanto Mato Grosso quanto o Maranhão integram outros biomas – Cerrado e Pantanal, no primeiro caso, e Cerrado, no segundo.

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A desflorestação funciona como um efeito dominó, repercutindo-se no que resta da floresta. O estudo demonstra que em qualquer área em que, por queimada ou abate, se verifique uma percentagem de desflorestação superior a 30%, toda a floresta circundante perde a sua capacidade de absorver CO2.

A recolha de dados decorreu entre 2010 e 2018, utilizando pequenos aviões, de duas em duas semanas, para recolher mais de 600 amostras a uma altitude de 4500 metros. A investigação constatou que a pegada carbónica da floresta é de 1.5 biliões de toneladas, das quais só um terço volta a ser reabsorvida pela Amazónia. Esta quantidade de poluição é equivalente à produzida pelo Japão, o quinto maior poluente.

A destruição de floresta está directamente relacionada com o aumento da temperatura na área e, consequentemente, o agravar das situações de seca, mais severa e com mais consequências na vida vegetal e animal.

Outro estudo, dinamizado por um conjunto alargado de cientistas e publicado em Abril, recolheu dados sobre a capacidade de absorção de dióxido de carbono em 300 mil árvores da Amazónia, ao longo de 30 anos, tendo chegado a conclusões em tudo semelhantes, mesmo partindo de um método de recolha de dados totalmente diferente. O estudo demonstra que, só na última década, a floresta reduziu em 20% a sua capacidade de retenção de CO2.

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O nível do mar parece também destinado a aumentar significativamente nas próximas décadas, 50cm até ao final do século. Neste caso, as piores expectativas apontam para uma subida de dois metros até 2200, o dobro da pior previsão feita em 2019. O enfraquecimento dos mais importantes absorvedores de gases de efeito de estufa, CO2 e Metano, contribui invariavelmente para o advento de novos cenários catastróficos para o clima no planeta.

Para a organização não governamental Oxfam, dedicada à erradicação da pobreza, o artigo é também explícito no contributo dos países mais ricos para o agravamento da situação climática: «A população correspondente ao 1% mais rico do mundo, aproximadamente 63 milhões de pessoas, é responsável por mais do dobro da poluição carbónica que os 3,1 mil milhões que compõem a metade mais pobre da humanidade».

Contudo, é esta pequena percentagem, com «dinheiro e poder, que vai poder comprar alguma protecção contra os efeitos do aquecimento global, ao contrário da população desprivilegiada». Mas o relatório do IPCC é claro – «não o conseguirão fazer para sempre».

A Oxfam exorta os países mais ricos a pagar a sua «dívida climática aos países em desenvolvimento, aumentando o financiamento destinado à adaptação aos efeitos das alterações climáticas e para a transição para energias limpas». 

Xie Zhenhua, enviado especial Chinês para as questões do clima, proferiu declarações semelhantes numa reunião sobre este assunto no início de Agosto. Os países mais ricos experienciaram um período de industrialização de mais de 200 anos, não se podendo esperar que os países em desenvolvimento atijam as metas para a descarbonização no mesmo período de tempo.

«Num tão curto espaço de tempo, a China enfrenta ainda muitas dificuldades e desafios para atingir a descarbonização», afirma Zhenhua, lembrando que, mesmo assim, o projecto do governo Chinês prevê atingir a neutralidade carbónica em 2060, 15 anos mais cedo do que as previsões dos Estados Unidos e 30 anos antes da União Europeia.

O comunicado da Oxfam exige que os países mais ricos «cumpram a sua promessa de entregar 100 mil milhões anuais para ajudar os países pobres a combater as alterações climáticas», denunciando ainda que, até agora, não só não o fizeram como sobre-inflacionaram as suas contribuições, que a organização estima terem sido três vezes menos do que anunciado.

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«As emissões dos 10% mais ricos do planeta são, por si só, o suficiente para ultrapassar a meta estabelecida pelo acordo de Paris, independentemente daquilo que os restantes 90% façam», informa o comunicado de imprensa da Oxfam, organização não governamental dedicada à erradicação da pobreza.

Para atingir o objectivo de limitar o aumento da temperatura a 1.5ºC de aquecimento, até 2030, «as promessas já não são suficientes». Em média, a população mundial teria de reduzir para metade a sua pegada, cerca de 2.3 toneladas de CO2 por ano até 2030.

Nafkote Dabi, responsável pela política climática da Oxfam, considera absurda a forma como a sociedade parece ignorar os abusos da elite bilionária: «As suas emissões sobredimensionais estão a inflamar eventos climáticos extremos em todo o mundo, para além de porem em causa os esforços internacionais para limitar o aquecimento global».

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«A crise climática é uma crise de direitos das crianças»

Pequenos demais para tão grandes problemas. Pela primeira vez as alterações climáticas serão analisadas, pela UNICEF, em função do risco que correm as crianças em todos os países do mundo.

Crianças refugiadas brincam nos destroços de um carro no campo Khan Younis, Faixa de Gaza, Palestina
CréditosMohammed Saber / Agência Lusa

Um relatório da UNICEF, «Index de risco climático para as crianças», desenvolvido em parceria com movimento juvenil Fridays for Future, chama a atenção para os riscos e vulnerabilidades a que as mais de duas mil milhões de crianças estão expostas, face aos impactos das alterações climáticas no mundo.

Com o objectivo de ajudar «à priorização da acção em prol daqueles que mais se encontram em situação de risco», o relatório tem por base a análise de dados geográficos, estabelecendo um ranking de países em função dos perigos que a sua população infantil enfrenta.

Os principais perigos provocados pelas alterações climáticas, identificados neste relatório, são as ondas de calor, ciclones, inundações fluviais ou costeiras (alterações repentinas); escassez de água e exposição a doenças (alterações lentas e a longo prazo); e a exposição à poluição do ar e da poluição com chumbo (degradação ambiental).

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Pequeno passo para poucos homens, uma pegada gigante para a humanidade

Relatório de instituição intergovernamental traça um retrato negro sobre as consequências das alterações climáticas, mas a responsabilidade dos 1% mais ricos do planeta é convenientemente esquecida, acusa Oxfam.

Plantação de árvores nas áreas desertas da Região Autónoma Uigure de Xinjiang, China. Este projecto converteu 66 mil hectares de deserto em bosques, em linha com o esforço nacional que, desde 1978, mais do que duplicou a área ocupada por florestas ou bosques no País, atingindo quase 25% da área total 
CréditosZhang Guigui / China Daily

O relatório divulgado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, conhecido por IPCC na sigla em inglês, é categórico nas conclusões da sua investigação. O planeta vai mesmo aquecer pelo menos 1,5ºC, isto nas perspectivas mais positivas, até 2030, dez anos mais cedo do que o esperado.

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A Amazónia já não é o pulmão do mundo

A floresta tropical da Amazónia, no Brasil, passou a emitir mais dióxido de carbono do que aquele que consegue absorver. É a primeira vez, desde que há registos, que esta situação se verifica.

Uma foto divulgada pelo Greenpeace mostra fumo dos incêndios florestais no estado do Pará, Altamira, Brasil. 26 de Agosto de 2019.
CréditosVictor Moriyama

As conclusões do artigo publicado ontem na revista científica Nature são categóricas: Os incêndios e queimadas que destroem, todos os anos, milhares de hectares da floresta tropical, muitas provocadas deliberadamente com o objectivo de libertar terreno para a exploração agrícola ou pecuária, assim como o abate de árvores, roubou à Amazónia a sua qualidade respiratória.

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Amazónia perdeu quase 100 hectares de floresta por hora em 2020

Ambientalistas sublinham que o «crime» é «incentivado pela redução da fiscalização» e directamente pelas autoridades, ao proporem legislação no sentido oposto ao controlo da destruição ambiental.

Queimada no estado de Rondónia, em 2020 
CréditosBruno Kelly / Amazônia Real

«A cada hora, a Amazónia brasileira perdeu 96 hectares da sua cobertura florestal no ano de 2020. Ao fim de um dia, foram desmatados 2309 hectares. Nesse ritmo, ao terminar de ler esta reportagem, o equivalente a 32 campos de futebol da floresta amazónica terão sido devastados», lê-se no portal Amazônia Real, que se refere aos dados divulgados na passada sexta-feira pela MapBiomas.

Em 2020, ano marcado pelos efeitos da pandemia da Covid-19, o desmatamento da maior floresta tropical do mundo aumentou 9% em relação a 2019. De cada dez hectares desflorestados no Brasil, seis tiveram lugar na Amazónia, com a devastação a atingir os 842 983 hectares.

Para o Amazônia Real, o governo de Bolsonaro levou a sério o «passar a boiada» (actualizar/flexibilizar normas, no caso, para o avanço do agronegócio) defendido pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que é investigado por crime ambiental e enriquecimento ilícito.

O segundo Relatório Anual do Desmatamento 2020, elaborado pelo MapBiomas, mostra que, no Brasil, entre Janeiro e Dezembro, foram emitidos 74 218 alertas de desmatamento para uma área superior a 1,3 milhão de hectares. Por comparação com 2019, o aumento da área abrangida foi de 14%.

A MapBiomas, iniciativa que integra diversas entidades dedicadas a estudos e acções de protecção ambiental, verificou que 99% de todo o desmatamento do país sul-americano ocorreu de forma ilegal, ou seja, sem a devida autorização dos órgãos ambientais. Nem mesmo áreas protegidas, como unidades de conservação e terras indígenas, escaparam da acção dos prevaricadores.

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Desflorestação no período de Bolsonaro é 82% superior aos anos anteriores

Os alertas de desmatamento da floresta amazónica indicaram uma área de 8426 quilómetros quadrados em 2020, o equivalente a cerca de cinco cidades de São Paulo.

Organismos oficiais verificaram um aumento de 83,9% na devastação da floresta entre Janeiro e Novembro deste ano por comparação com o mesmo período de 2018
Nos dois primeiros anos de governo de Bolsonaro aumentou a devastação da floresta amazónica Créditos / A Crítica

Os dados foram divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) na sexta-feira passada e foram registados pelo projecto Deter-B, que indica praticamente em tempo real a localização de acções ilegais em zonas preservadas.

A área devastada na Amazónia em 2020 – 8426 quilómetros quadrados – corresponde ao segundo pior índice da série histórica do Deter, que começou a operar em 2015; só é suplantada por 2019, primeiro ano de governação de Jair Bolsonaro, em que foi desflorestada uma área de 9178 quilómetros quadrados.

Ou seja, nos dois primeiros anos do governo de Bolsonaro, a área desflorestada na Amazónia é 82% superior, em média, à dos três anos anteriores. Mesmo com a redução de 8% de 2019 para 2020, a média de área desmatada nestes dois anos é de 8802 quilómetros quadrados, bem acima da registada entre 2016 e 2018: 4844 quilómetros quadrados, informa o Portal Vermelho.


Numa nota à imprensa, o secretário executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini, comentou estes dados afirmando que «Bolsonaro tem dois anos de mandato e os dois piores anos de Deter ocorreram na gestão dele». «As queimadas, tanto na Amazónia quanto no Pantanal, também cresceram por dois anos consecutivos. Não é coincidência, mas sim o resultado das políticas de destruição ambiental implementadas pelo actual governo», sublinhou.

Já no início de Dezembro, quando veio a público que a devastação da Amazónia batia recordes no Brasil, o Observatório dirigiu duras críticas ao governo brasileiro, tendo emitido uma nota em que denunciava que os números cumprem «um projeto bem-sucedido de aniquilação da capacidade do Estado Brasileiro e dos órgãos de fiscalização de cuidar de nossas florestas e combater o crime na Amazónia».

Por seu lado, Rômulo Batista, porta-voz da Campanha Amazônia da Greenpeace, disse que aquilo a que se tem assistido nos últimos dois anos é um desmantelamento de «todas as políticas e conquistas ambientais feitas desde a redemocratização do país».

Em entrevista ao Brasil de Fato, afirmou que «Bolsonaro vê o meio ambiente como um entrave económico» e que tanto ele como os seus ministros «apostam na abertura de terras indígenas para mineração e no desmatamento para o aumento da produção agrícola».

Destacou que o «desmatamento não traz riqueza» e lembrou que a «ciência aponta que a Amazónia está muito próxima de um ponto de "não retorno" também chamado de ponto de "inflexão", que é quando a floresta perde a capacidade da sua automanutenção».

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«Só um por cento teve desmatamento, o que bastou para fazer este estrago não só ao meio ambiente mas também à nossa imagem lá fora. Mas é este 1% que faz barulho, que tem representantes no Congresso, que está lá para fazer lei para ampliar o desmatamento, lei para amnistiar ocupação ilegal», disse Rosa, um dos autores do relatório da MapBiomas, em entrevista à Amazônia Real.

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Entre os cinco biomas brasileiros, a Amazónia concentrou 60,9% da área desmatada no país em 2020. Segue-se o Cerrado (31%), a Caatinga (4,4%), o Pantanal e a Mata Atlântica, ambos com 1,7%, e o Pampa (0,1%).

Entre os 27 estados da federação, os que compõem a Amazónia Legal lideram o ranking do desmatamento. Só no Pará, registou-se mais de um quarto (26,4%) da desflorestação detectada em todo o país.

Seguem-se Mato Grosso (12,9%), Maranhão (12,1%), Amazonas (9,2%) e Rondónia (8,3%). Tanto Mato Grosso quanto o Maranhão integram outros biomas – Cerrado e Pantanal, no primeiro caso, e Cerrado, no segundo.

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O nível do mar parece também destinado a aumentar significativamente nas próximas décadas, 50cm até ao final do século. Neste caso, as piores expectativas apontam para uma subida de dois metros até 2200, o dobro da pior previsão feita em 2019. O enfraquecimento dos mais importantes absorvedores de gases de efeito de estufa, CO2 e Metano, contribui invariavelmente para o advento de novos cenários catastróficos para o clima no planeta.

Para a organização não governamental Oxfam, dedicada à erradicação da pobreza, o artigo é também explícito no contributo dos países mais ricos para o agravamento da situação climática: «A população correspondente ao 1% mais rico do mundo, aproximadamente 63 milhões de pessoas, é responsável por mais do dobro da poluição carbónica que os 3,1 mil milhões que compõem a metade mais pobre da humanidade».

Contudo, é esta pequena percentagem, com «dinheiro e poder, que vai poder comprar alguma protecção contra os efeitos do aquecimento global, ao contrário da população desprivilegiada». Mas o relatório do IPCC é claro – «não o conseguirão fazer para sempre».

A Oxfam exorta os países mais ricos a pagar a sua «dívida climática aos países em desenvolvimento, aumentando o financiamento destinado à adaptação aos efeitos das alterações climáticas e para a transição para energias limpas». 

Xie Zhenhua, enviado especial Chinês para as questões do clima, proferiu declarações semelhantes numa reunião sobre este assunto no início de Agosto. Os países mais ricos experienciaram um período de industrialização de mais de 200 anos, não se podendo esperar que os países em desenvolvimento atijam as metas para a descarbonização no mesmo período de tempo.

«Num tão curto espaço de tempo, a China enfrenta ainda muitas dificuldades e desafios para atingir a descarbonização», afirma Zhenhua, lembrando que, mesmo assim, o projecto do governo Chinês prevê atingir a neutralidade carbónica em 2060, 15 anos mais cedo do que as previsões dos Estados Unidos e 30 anos antes da União Europeia.

O comunicado da Oxfam exige que os países mais ricos «cumpram a sua promessa de entregar 100 mil milhões anuais para ajudar os países pobres a combater as alterações climáticas», denunciando ainda que, até agora, não só não o fizeram como sobre-inflacionaram as suas contribuições, que a organização estima terem sido três vezes menos do que anunciado.

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Metade da população infantil mundial (cerca de mil milhões de crianças), está directamente exposta, em razão do País em que habita, à influência de fenómenos climatéricos extremos. A grande maioria destes países «de maior risco, são os que menos contribuem para as causas das alterações climáticas». Os 33 países com risco extremamente alto «emitem menos de dez por cento do total dos gases de efeito estufa do mundo».


Maiores poluidores sofrem menos

Os dados apresentados traçam um cenário dramático. «820 milhões de crianças (mais de um terço do total de crianças no mundo) estão actualmente expostas a ondas de calor», ao mesmo passo que 920 milhões de crianças estão directamente expostas à escassez de água.

90% das crianças do mundo vivem em ambientes com um elevado grau de poluição do ar, enquanto mais de 800 milhões estão em contacto permanente com ambientes contaminados por chumbo, na água, ar, solo e na comida.

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Transição energética deve ter preocupações sociais

A transição energética deve ser acompanhada de um processo de reindustrialização, e não do encerramento de unidades industriais, por forma a garantir os postos de trabalho e a sustentabilidade social.

Refinaria da Petrogal em Leça da Palmeira, Matosinhos. Foto de arquivo
Créditos / JM

Em comunicado divulgado pela comissão central de trabalhadores da Petrogal, esta defende que a salvaguarda do planeta só faz sentido «num quadro de progresso social e económico», pelo que a chamada «transição energética» deve ser «socialmente responsável».

Amplamente difundida nos meios de comunicação social e impulsionada em larga medida pelo Governo, a «transição energética» ou a «descarbonização» centram o problema na redução e eliminação das emissões de dióxido de carbono para a atmosfera, suportada num consenso maioritário da comunidade científica sobre o impacto negativo daquelas emissões para o agravamento do aquecimento global. 

A comissão de trabalhadores refere que «o aplauso de algumas associações ambientalistas e de alguns partidos» à antecipação do encerramento da central termoeléctrica de Sines para Janeiro de 2021 revela uma «visão apocalíptica» que apenas pretende justificar medidas que põem em causa a independência energética.

Exemplo disso são as declarações que sugerem uma substituição de emissões a partir de Portugal por outras oriundas de Marrocos em que não se pretende diminuir as emissões globais mas apenas «fazer batota» para manipular os números da União Europeia, afirmam os representantes dos trabalhadores.

«O Governo continua a pôr em causa, de forma totalmente inaceitável e irresponsável, a independência energética do País e a destruir centenas de postos de trabalho», pode ler-se no comunicado.

No documento afirma-se ainda que a transição energética «não pode surgir contra os trabalhadores», pelo que a preservação dos postos de trabalho deve ser «o elemento central para o pretendido desenvolvimento sustentável».

«A transição energética deve surgir numa perspectiva integrada e de fileira com aproveitamento de todos os recursos disponíveis, e com a alavancagem dos investimentos em tecnologias (...) para concretizar a descarbonização e garantir [que é] sustentável e socialmente responsável», afirma a comissão de trabalhadores.

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Um combate eficaz contra a pobreza, o investimento em infraestruturas de serviços de acesso a água, saneamento e higiene, a criação de estruturas de apoio médico e nutritivo e o combate ao analfabetismo poderiam diminuir significativamente o risco para centenas de milhões de crianças. Cada um destes progressos isoladamente significaria uma diminuição de 310, 415, 460 e 275 milhões de crianças, respectivamente, se focarmos individualmente cada uma destas áreas de intervenção. 

A República Centro Africana, o Chade e a Nigéria estão no topo da lista de países mais vulneráveis. Angola e Moçambique partilham, com Madagáscar e os Camarões a 10.ª posição do ranking. Os primeiros países Europeus na lista estão na posição 102, França, Itália e Roménia. Portugal está na posição 135, representando um risco médio-baixo para a sua população infantil.

Apenas seis países têm um risco baixo de sofrer consequências graves das alterações climáticas na sua população infantil: Suécia, Estónia, Finlândia, Nova Zelândia, Luxemburgo e, no fundo da tabela, a Islândia.

Estes dados não implicam que os efeitos do aquecimento global sejam neutros nos países com um risco baixo, ou médio-baixo, tão somente que estão melhor equipados economicamente e posicionados geográficamente para dar uma melhor resposta aos fenómenos que se agudizarão nas suas áreas geográficas.

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É o suficiente para provocar «efeitos catastróficos para a população mais vulnerável no planeta, que já enfrenta, hoje em dia, tempestades mortíferas, fome e miséria».

As discrepâncias são gritantes. Em 2030, a metade mais pobre da população mundial vai continuar com um rácio de produção de carbono significativamente abaixo da média de 2.3 toneladas, enquanto uma única pessoa, pertencente ao 1% mais rico, terá de reduzir a sua pegada em 97%, isto só para chegar à média no final da década.

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