Avança o projecto de Bolsonaro de privatização dos Correios

O projecto de lei (PL) 591/21, apresentado pelo presidente Jair Bolsonaro, foi criticado pelos trabalhadores da empresa estatal, que se têm mobilizado, e pelos partidos da oposição, cujos deputados ontem defenderam o modelo nacionalizado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.

O PL foi aprovado com 286 votos a favor, 173 contra e duas abstenções. PT, PSB, PDT, PSOL, PCdoB e Rede deram orientação de voto contra a proposta, que passará a ser considerada no Senado.

Na sessão de debate, o relator do projecto, Gil Cutrim, afirmou que os Correios «não têm tido uma boa performance, e vêm perdendo a aprovação do povo brasileiro», indica o Brasil de Fato.

No entanto, esse argumento foi contestado pela oposição. «Do ponto de vista da melhoria e da eficiência que aqui tanto se diz necessário, não é vendendo o património do povo brasileiro que nós vamos criar as condições objectivas para melhorar a prestação do serviço», disse o deputado Odair Cunha (PT).

Outro deputado petista, Zé Neto, destacou que a actuação dos Correios durante a pandemia é uma prova da sua eficiência. «O que justifica vender os Correios? Interesse mercantil. O que vocês querem é desestatizar o Brasil. Vocês querem o Brasil uma fazendinha. Aliás, já fazem isso há muito tempo, a colonização, agora aquela bem atrasada, em que nós não tenhamos direito a nada. Os Correios são uma empresa estratégica para o Brasil», declarou.

Se há falta de investimentos, a culpa é do governo

Marcelo Freixo (PSB) destacou que, além de eficientes, os Correios são lucrativos. «Só no ano de 2019, foram 100 milhões de lucro. Quando se diz que não há investimento nos Correios, essa é uma deliberação política do próprio governo», apontou.

«Se é uma empresa lucrativa, se é uma empresa que tem eficiência, esse valor do lucro poderia ser investido na melhoria dos serviços dos próprios Correios. Não fazem porque querem sucatear para atender interesses privados que não serão de interesse da população», denunciou, citado pelo Brasil de Fato.

Alerta para a inconstitucionalidade da medida

Diversos deputados apontaram a inconstitucionalidade da proposta. A deputada Perpétua Almeida (PCdoB) lembrou que «está na Constituição a obrigação de o país ter o seu correio nacional».

«Essa empresa que o governo Bolsonaro com o apoio da Câmara quer privatizar tem 358 anos de existência e em 2020 teve um lucro de quase dois mil milhões de reais. É a única empresa presente em quase todos os municípios do Brasil e não depende do Tesouro da União. Pelo contrário, ela repassa em média 70% do seu lucro para o Tesouro Nacional», declarou ainda.

Renildo Calheiros (PCdoB) lembrou que «nem todas as áreas dão lucro, mas as que dão lucro compensam aquelas que não dão», chamando a atenção para o receio existente entre as populações de que a desintegração da empresa estatal deixe certas regiões sem cobertura.

Num comunicado emitido ontem, a Associação dos Profissionais dos Correios lembra que, segundo um parecer da Procuradoria-Geral da República, «uma eventual privatização dos Correios não poderia ser feita sem uma mudança constitucional».

E alerta: «Substituiremos serviço público pela exploração de actividade económica, com argumentos de que isso vai resultar em diminuição de preços para a população, uma falácia que não encontra paralelo na história e que só serve para iludir os que pagarão de facto a conta dessa medida – os cidadãos e as empresas brasileiras que usam os serviços postais.»