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Mais do que uma empresa, a Altice «é um grupo financeiro especulativo»

Cerca de dois mil trabalhadores da Altice de todo o País concentraram-se esta quarta-feira em Lisboa para protestar contra o despedimento «ilegal e fraudulento» de 246 funcionários. 

Créditos / Antena1

Desde o início do mês que as organizações representativas dos trabalhadores da Altice Portugal têm vindo a promover acções de luta contra a intenção, por parte da empresa, de avançar com um despedimento colectivo de mais de 200 funcionários. Com uma média de idades de 50 anos, entre os que sentem o seu futuro ameaçado há casos com mais de 40 anos de empresa. 

Hoje, dia de greve geral, centenas e centenas de trabalhadores concentraram-se ao início da tarde junto às instalações da antiga Portugal Telecom, em Picoas, onde gritaram «Esta administração não é solução», seguindo depois para os ministérios do Trabalho e das Infraestruturas. Entretanto, esta manhã, foram cerca de 150 os que se manifestaram na Ilha da Madeira para protestar contra a decisão avançada pela dona da Meo, em finais de Junho.

Em declarações ao AbrilAbril, Manuel Gonçalves, presidente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores das Telecomunicações e Audiovisual (SINTTAV/CGTP-IN), revela que o sentimento dos trabalhadores na concentração, em Lisboa, é de alegria, pelo facto de se reunirem tantos manifestantes no quadro da pandemia, e de angústia, pela ameaça de despedimento.

Manuel Gonçalves recorda que já foi pedida uma reunião com o primeiro-ministro, mas que António Costa escolheu reencaminhar o protesto dos trabalhadores para os dois ministérios.

O dirigente denuncia que o número de queixas por parte dos clientes da Meo tem vindo a aumentar por haver cada vez menos serviço especializado, e que a empresa, além de «não se preocupar com a qualidade do serviço, nem com o País», «é um grupo financeiro especulativo».

As estruturas que integram a Frente Sindical, onde além do Sinttav estão, entre outros, o Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Correios e Telecomunicações (SNTCT) e o Sindicato dos Trabalhadores de Telecomunicações e Comunicação Audiovisual (STT), ambos afectos à CGTP-IN, defendem que, além de «ilegal e fraudulento», este despedimento colectivo «é um acto economicista e claramente político», com o objectivo de acarretar «mais e mais receitas para o accionista».

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CGTP exige ao Governo que trave os despedimentos

Impedir os processos em curso e alterar o quadro legislativo de forma a limitar o recurso ao despedimento colectivo são algumas das reivindicações que a central sindical entregou esta tarde ao Governo.

CréditosJosé Sena Goulão / Agência Lusa

«À boleia da Covid-19, empresas que receberam apoios do Estado usam o surto epidémico, uma legislação permissiva e agem por vezes à margem da própria lei para desencadear o despedimento colectivo», lê-se na missiva entregue ao fim da tarde no Ministério do Trabalho, após uma conferência de imprensa com a secretária-geral, Isabel Camarinha, que juntou várias das estruturas sindicais afectas à CGTP-IN.

A central sindical enfatiza serem grandes empresas e grandes grupos económicos a recorrer a práticas com vista aos despedimentos, não obstante algumas acumularem «fabulosos» lucros e distribuírem milhares de euros em dividendos e, noutros casos, terem recebido ajudas do Estado. São exemplo a TAP e a Eurest, que receberam apoios estatais no último ano, mas também a Securitas, a Altice e a Petrogal, entre outras. 

A estrutura denuncia que as ameaças de despedimento com o recurso às rescisões por «mútuo acordo» ou ao mecanismo da transmissão de estabelecimento proliferam. É o caso da banca, com o Santander Totta, o BCP, o Montepio, o BPI e o Novo Banco a ameaçarem cortar uma fatia considerável da força de trabalho, e do sector aeroportuário, com a Portway e a ANA a solicitarem inclusive o aumento das quotas para as rescisões. 

1150

Mais de 1150 trabalhadores estão envolvidos em processos de despedimento colectivo, só em oito empresas – Eurest, TAP, ISS Facility Services, Securitas, Loomis, Spitfire, Altice e Petrogal 

Neste sentido, exige que o Governo tenha uma acção imediata para travar os processos que estão em desenvolvimento, «salvaguardando os postos de trabalho e as condições laborais existentes», e promova medidas no plano legislativo, capazes de limitar e reduzir o recurso à figura do despedimento colectivo, «para evitar que no futuro se replique o aproveitamento que agora está a ser feito deste mecanismo».  

A CGTP-IN alerta para o «diversificado» recurso a práticas de repressão laboral, que vai da inactividade dos trabalhadores que as empresas querem despedir à contratação de trabalhadores em regime de outsourcing.

Posto isto, e além de exigir a revogação das medidas que facilitam os despedimentos e reduzem as indemnizações, a Intersindical reclama iniciativas legislativas que «obriguem à integração dos trabalhadores das empresas de trabalho temporário que ocupem postos de trabalho permanentes nas empresas utilizadoras». Ao mesmo tempo que reivindica a aplicação da contratação colectiva a todos os trabalhadores, «independentemente do vínculo e da empresa de origem».

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Em 2020 duplicaram os despedimentos colectivos

Num ano marcado pela pandemia, estes processos duplicaram face a 2019, num valor que supera também 2014, último ano da troika no País.

Créditos / noticiasdesines.com

Foram 698 as empresas que deram início a processos de despedimentos colectivos no ano passado, abrangendo um universo total de 8299 trabalhadores, segundo dados facultados pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social ao Expresso.

Do total, e com os números disponibilizados até Novembro, 37% são micro empresas e 39,5% correspondem a pequenas empresas. Só recuando a 2013 se encontram registos piores, ano em que se contabilizaram 990 processos, abrangendo 9167 trabalhadores.

Os dados revelam que os diversos mecanismos de apoio que o Governo disponibilizou nos últimos meses às empresas não foram suficientes para travar uma escalada de despedimentos colectivos.

É o caso da proibição de despedimento por parte das empresas, que apenas foi decretada para o período de vigência dos apoios e até 60 dias após o seu fim, como aconteceu com o lay-off simplificado (medida que abrangeu, entre Março e Julho de 2020, mais de 115 mil empresas e 900 mil trabalhadores), o apoio à retoma, ou o incentivo extraordinário à normalização de actividade.

Veja-se, porém, que as empresas apoiadas, não podendo despedir durante o período do apoio, podem não renovar contratos a termo e podem avançar para os despedimentos após o fim do apoio.

Tendo em conta a situação de 2021, que aponta para sinais de nova queda da economia fruto do novo confinamento geral, serão cruciais medidas políticas mais decididas de apoio ao emprego para travar uma escalada no desemprego.

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Se, por um lado, os despedimentos interferem com o contexto familiar, por outro, defende a central sindical, «é a economia regional que é fortemente ameaçada», enquanto a «já debilitada» coesão territorial «é hipotecada».   

«O papel económico e social que as empresas envolvidas nestes processos desempenham para o desenvolvimento do País e a coesão social e regional, [...] papel que tem nos trabalhadores o elemento central, exige que sejam travados os despedimentos e se promovam as medidas para a real efectivação do emprego com direitos e estabilidade», lê-se no documento entregue ao Governo.   

São também reiteradas críticas à submissão de Portugal às políticas da União Europeia, com a CGTP-IN a salientar que, perante as metas traçadas para a descarbonização, o Governo iniciou um plano «mais ambicioso» em comparação com economias mais robustas, como a alemã, ao estimular o encerramento da Central Termoeléctrica de Sines e o Parque Petroquímico de Matosinhos, «sem acautelar alternativas credíveis que garantam o aprovisionamento energético nacional».

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O dirigente do Sinttav, Manuel Gonçalves, acredita que a intenção de mandar embora estes trabalhadores tem como objectivo reduzir o peso da empresa a tempo da sua venda. Segundo avançou a Reuters, no mês de Junho, a multinacional estaria a sondar potenciais interessados no negócio português.

Entretanto, adquiriu 12,1% da British Telecom por 2,2 mil milhões de libras, convertendo-se no maior accionista da empresa britânica.

Em 22 de Junho, a dona da Meo anunciou que iria avançar com um despedimento colectivo, uma decisão que classificou de «difícil», mas «indispensável, essencialmente devido ao contexto muito adverso» no sector das telecomunicações. A empresa, que desde 2015 tem vindo a desbaratar o património da então Portugal Telecom, como as antenas, parte da fibra óptica e património imobiliário, obteve em 2020 uma subida de 0,5% nas receitas, atingindo os 2,12 mil milhões de euros. 

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