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Maria Lamas, Uma Mulher do Nosso País

Temos em Maria Lamas um exemplo de luta, de escolhas e de sentidos, movidos pelo desejo de um mundo melhor para todos. É nesse exemplo que todos se podem inspirar.

Créditos / Médio Tejo

Nas palavras introdutórias da sua obra maior As Mulheres do Meu País, Maria Lamas (1893-1983), cujo 130.º aniversário celebramos este ano, releva o sentido e profundidade daquele documento etnográfico original e impactante:

«O desejo de conhecer, em todos os seus aspectos, a vida da mulher portuguesa, surgiu no meu cérebro e no meu coração há muitos anos. Foi quando eu própria me encontrei na encruzilhada onde é forçoso escolher um caminho, e me reconheci sem preparação para a luta, nem outra bússola que não fosse a minha sinceridade e a minha responsabilidade de mãe

Se o caminho se faz caminhando, a luta faz-se lutando. Se, por um lado, a transformação do real se faz através da prática, actuando sobre a realidade; por outro lado, a teoria aponta direcções e dá a conhecer outras lutas, com sentidos semelhantes, com metas iguais. A teoria não se faz sem a prática, e a prática não se faz sem a teoria. Ou seja, para transformar o real é preciso conhecê-lo. Essa monografia, composta por texto, fotografias e gravuras, encerra em si também um caminho de aprofundamento do conhecimento do real, dando a conhecer a vida árdua da Mulher sob o regime fascista português, denunciando-o, dando elementos para outras lutarem, para outros perceberem o país. 

Temos, hoje, em Maria Lamas, um exemplo de luta, de escolhas e de sentidos, movidos pelo desejo de um mundo melhor para todos. É nesse exemplo, de luta pelos Direitos das Mulheres e pela Paz, para evocar apenas os que mais ressaltam, que todos os que se encontram em encruzilhadas morais se podem inspirar, acrescentando a militância em causas justas à sinceridade e ao instinto – que a Maria Lamas apareceu como a responsabilidade de Mãe de querer e lutar por um mundo melhor para os seus filhos, um mundo de Paz.

«Se, por um lado, a transformação do real se faz através da prática, actuando sobre a realidade; por outro lado, a teoria aponta direcções e dá a conhecer outras lutas, com sentidos semelhantes, com metas iguais.»

Quando celebramos um nome, para essa celebração ser completa e culturalmente profícua, também temos de evocar os sentidos que a vida, por detrás desse substantivo, tomou. Não basta uma cronologia onde se assinalam os feitos e os resultados finais e laudatórios, para mais quando recheados por uma luta árdua pelos objetivos mais nobres que a humanidade pode ter. Quando falamos de Maria Lamas, evocamos uma vida que se entreteceu de nobres causas, pelo bem comum, por um mundo melhor. Muita tinta já foi discorrida acerca desta mulher do nosso país, porém, nestes tempos que correm por entre os nossos dedos, em que a Paz se apresenta como algo de distante, e os meios de comunicação de massas dominados pelo capital a apresentam [à Paz] como algo de oco e os defensores da mesma são vilipendiados, nunca é demais relembrar o exemplo de Maria Lamas, na sua luta por uma Paz mundial e definitiva.

Foi na «palavra» que Maria Lamas se destacou. Portanto, chamamos ao nosso modesto texto mais algumas palavras repletas de conteúdo, de vida e de luta, porque atuais, porque verdadeiras, porque são o que importa nesta evocação:

«Nos protestos gerais contra a guerra, que muitos teimam em considerar inevitável, não há somente o desejo e a voz dos vivos, que defendem o seu direito de viver e de quererem que os seus filhos vivam pacificamente. Há também o grito lancinante daqueles que morreram pela liberdade e paz de todos os povos, aqueles que sacrificaram a sua juventude, os seus sonhos, a sua vida, para que a guerra desaparecesse do Mundo.» 

Esta passagem pertence ao texto de uma conferência proferida em 1950, sob o título «A Paz e a Vida». Nele, a escritora elucida-nos, com a força da vida e o peso da morte, em torno da catástrofe que é a guerra, a vários níveis: os mortos, os feridos, os órfãos; a destruição de cidades, de escolas, de hospitais e de património cultural e artístico. A guerra traz à tona o mais nefasto da sociedade humana, para além das mortes nas frentes de combate, a prostituição, a usura, o tráfico e tantos outros crimes imperam como modos de sobrevivência duns, exploração de muitos e enriquecimento doutros. Importa, então, gravar bem as palavras de Maria Lamas nas nossas mentes, para que caminhemos no sentido da Paz – total, permanente e culturalmente enraizada.

«Neste momento em que se tomam as mais graves decisões nacionais e internacionais, que podem conduzir novamente à guerra [que globalmente nunca cessou, mas que está à beira de se agravar apocalipticamente, hoje, outra vez], devemos ter a coragem de enfrentar esse perigo, sem subterfúgios, sem cobardia moral nem cómoda indiferença

E, acrescentamos as palavras finais da conferência, que, com toda a razão, tanto ontem, 1950, como hoje, 2023, soam como agulha de bússola, norteando a moral: 

«Se todos nós, homens e mulheres soubermos querer, a Paz será a mais bela conquista deste século, porque a batalha da Paz é a batalha da Vida

Sigamos os bons exemplos de mulheres e homens que a História nos deu. Enveredemos pelo caminho da Paz e da verdade. Exijamos o fim da guerra! Por um mundo de cooperação entre os povos. Por uma sociedade nova, sem exploração do homem pelo homem. 

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