Projecto inclui prisão de alta segurança do regime fascista

Património histórico em risco de ser entregue a privados

O Governo quer transformar a Fortaleza de Peniche numa unidade hoteleira privada, assim como outros 29 imóveis classificados. O PCP denuncia mercantilização do património.

Fortaleza de Peniche
CréditosF Nando / CC BY-SA 3.0

O projecto «Revive» prevê a concessão a privados de monumentos históricos, por um período entre 30 e 50 anos, para o desenvolvimento de unidades hoteleiras e turísticas. Da lista inicial de 12 imóveis consta a Fortaleza de Peniche, prisão-símbolo do regime fascista, por onde passaram cerca de 2 mil presos políticos até ao 25 de Abril.

Da primeira lista constam 12 imóveis, de Norte a Sul do País. O Convento de São Paulo (Elvas), os Castelos de Vila Nova de Cerveira e de Portalegre, os Mosteiros de São Salvador de Travanca (Amarante), de Arouca, de Santa Clara-a-Nova (Coimbra), os Pavilhões do Parque D. Carlos (Caldas da Rainha), o Paço Real de Caxias, o Forte do Guincho (Cascais) e a Quinta do Paço de Valverde (Évora) são os outros equipamentos integrados no projecto.

Esta iniciativa foi lançada em conjunto pelos ministérios da Cultura, da Economia e das Finanças. Estão envolvidos a Direcção-Geral do Património Cultural, a Direcção-Geral do Tesouro e Finanças e o Turismo de Portugal. O Governo vai criar uma linha de financiamento, com condições especiais, para apoiar os projectos para os espaços concessionados que pode ir até aos 150 milhões de euros.

Fortaleza de Peniche – símbolo da resistência anti-fascista

A Fortaleza de Peniche funcionou como prisão entre o início do século XIX e o 25 de Abril de 1974.  A partir da década de 1930 foi transformada em prisão de segurança máxima, destinada a encarcerar os presos políticos do regime fascista recém implantado.

Algumas das mais célebres fugas das cadeias fascista deram-se em Peniche. A 17 de Dezembro de 1954, o dirigente comunista António Dias Lourenço evadiu-se do «Segredo», nome pelo qual era conhecido entre os presos o baluarte redondo onde estavam instaladas as celas de isolamento, e saltou para as águas ao largo da Fortaleza.

A fuga colectiva de 3 de Janeiro de 1960 devolveu a liberdade a dez dirigentes do PCP, entre os quais se encontrava Álvaro Cunhal, que viria a ser eleito secretário-geral do partido pouco depois.

O Museu Municipal foi instalado na Fortaleza em 1984, onde funciona o «núcleo da Resistência», abrangendo o «Segredo», o parlatório e as celas de alta segurança. É possível visitar a cela onde esteve encarcerado Álvaro Cunhal, assim como alguns dos desenhos a carvão que produziu durante o período em que lá esteve preso.

«A política do património não pode estar sujeita ou subordinada ao "mercado" e à política de turismo»

O PCP, através de uma nota do seu gabinete de imprensa, declarou a sua oposição ao projecto do Governo, alertando que se trata de entregar 30 imóveis históricos a «grupos privados para montarem o seu negócio, em detrimento da plena fruição pública».

Os comunistas salientam que esta se trata «de uma matéria que diz respeito à memória colectiva de um povo», e que «não podem ser alienados ou alteradas as suas características, nomeadamente físicas e de usos» destes monumentos, «apenas por mera vontade do governo e de interesses privados».

A inclusão da Fortaleza de Peniche, a concretizar-se, é para o partido «um dos mais significativos ataques à memória colectiva dos portugueses». Pelo que encerra de testemunho histórico, o espaço deve ser valorizado e divulgado, «com a actualização e enriquecimento do projecto de musealização existente».

Em contrapartida, o PCP exige a suspensão imediata do projecto «Revive» e o lançamento de um «Programa Nacional de Emergência para o Património Cultural», que trate a política do património que intensifique «a ligação cultural entre as populações e o património, integre o património edificado na vida e quotidiano do País, resultando numa valorização e preservação vivida e fruída colectivamente».

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