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|Comissão de inquérito à TAP

TAP: os privados no assalto ao pote

Na audição ao presidente da Comissão de Vencimentos ficou a ideia de que, numa gestão privada, se o accionista maioritário quiser ir ao pote, o papel da Comissão é estender-lhe o pote. Edificante.

CréditosMiguel A. Lopes / Agência Lusa

Ontem, o dia começou marcado por mais uma polémica artificial na comissão parlamentar de inquérito à TAP. O Governo recusou o envio de alguma documentação solicitada pelos grupos parlamentares, respondendo à comissão que entendia que esses documentos estavam fora do âmbito do inquérito. A dramatização e a ameaça foram subindo de tom ao longo do dia, com PSD e Chega a destacarem-se nesse campeonato.

Ao fim da tarde, o nível já tinha descido até o PSD ameaçar os outros deputados da comissão com queixas crime se se atrevessem a não aprovar a sua moção (basicamente, que fosse enviado para o Presidente da Assembleia da República uma queixa contra o Governo, em vez de responder ao Governo que a comissão não concordava com os seus argumentos e exigia os documentos solicitados). Ocasião aproveitada pelo deputado Bruno Dias para sublinhar que o PSD preferia a queixa ao documento, e que não são a verdade nem o apuramento de factos que o movem.

Depois de mais de uma hora de reunião, a comissão lá decidiu que o Governo (como qualquer outra entidade) tinha direito a ter opinião sobre a legalidade do envio de determinada documentação (por exemplo, os escritórios de advogadas recusaram entregar documentação, e o PSD ou o Chega nem protestaram), que a comissão tinha o direito de apreciar essa opinião e agir em conformidade, e que nesse sentido se iria informar o governo que deveria entregar os documentos solicitados. O PSD votou contra.

Só depois desta longa introdução se entrou na agenda do dia, que consistia na audição do actual presidente da Comissão de Vencimentos.

O grupo parlamentar do PS fez questão de demonstrar que os salários dos administradores da TAP no período pós recuperação do controlo público da gestão da TAP (2020-2023) eram inferiores aos salários dos administradores no período de gestão privada (2016-2020). O que é verdade e ficou demonstrado. Mais à frente ficaria também demonstrado que esses salários, no segundo período, eram ainda assim muito superiores aos praticados nas empresas públicas (o salário máximo numa empresa pública é o salário do primeiro-ministro, lembrou o PCP, cerca de oito vezes o salário mínimo nacional, enquanto o actual salário mensal da CEO da TAP supera os 53 salários mínimos).

Esta imoralidade é sempre justificada – e foi-o mais uma vez pelo presidente da Comissão de Vencimentos – se as empresas forem privadas, pois aí são os seus accionistas quem decide e quem paga esses salários. Ao que o PCP contrapôs que, desde logo no caso da TAP, quem pagou tudo o que os privados tiraram da TAP foi o povo português. E o mesmo acontece nas restantes empresas, de forma menos directa nuns casos, de forma igualmente directa no caso dos Bancos, por exemplo. Ou já nos esquecemos dos 21 mil milhões gastos a tapar os buracos da especulação e corrupção na banca?

No mesmo alinhamento, foi questionada a própria existência de uma Comissão de Vencimentos numa empresa pública, pois o vencimento dos gestores públicos está determinado e limitado por lei. Aliás, são esses limites, as excepções a esses limites contidas e não contidas no decreto-lei 39B/2020, e o facto de a administração da TAP e do Governo terem actuado fora desse quadro, que criou o problema jurídico com os salários, as indemnizações e os prémios dos administradores da TAP no período pós privatização.

Mas o PCP queria ir mais longe e foi mais longe. Questionou a existências das próprias Comissões de Vencimento na gestão privada. E deu um bom exemplo. Em 2016, a TAP, já sobre gestão privada, tem um resultado líquido negativo de 21,6 milhões de euros, e mesmo assim são pagos aos três administradores executivos, além dos 1,84 milhões de euros de salários base, e mais um conjunto de regalias, um prémio de quase um milhão de euros.

Os mesmos três administradores executivos vão receber outro prémio sobre 2017, aqui com um resultado marginalmente positivo. Em 2018 não são pagos prémios, porque a obtenção de lucro era um critério para a atribuição. Esse critério é eliminado para 2019, e perante quase 180 milhões de euros de resultado negativo estava para ser pago um prémio superior a um milhão de euros, que só acabou por não ser pago em 2020 devido à pandemia. «Ou seja, em quatro anos, a gestão privada provoca prejuízos de quase 300 milhões de euros, mais os prejuízos que deixou escondidos, e recebe prémios em três desses quatro anos. Três administradores executivos receberam, nesses quatro anos de gestão privada, mais de quatro milhões em salários e mereceram três milhões em prémios!»

A única resposta do presidente da Comissão Executiva foi que essa teria sido a vontade dos accionistas.

O exemplo seguinte colocado pelo PCP foi o facto de Fernando Pinto ter ficado como assessor da administração (na gestão privada) a partir de Janeiro de 2018, com uma remuneração de 130 mil euros por mês (173 salários mínimos, quando o salário do primeiro-ministro é de oito salários mínimos, recordamos) e regalias equivalentes a continuar a ser presidente da Comissão Executiva. Facto que o presidente da Comissão de Vencimentos não quis apreciar, pois estaria fora do âmbito da dita Comissão. Nem quis responder à pergunta de Bruno Dias: «Que pode estar a ser comprado por este valor?»

No fundo, durante toda a audição ficou a ideia de que, numa gestão privada, se o accionista maioritário queria ir ao pote, o papel da Comissão de Vencimentos é estender-lhe o pote. Edificante.

Mas havia mais uma questão. É que durante a gestão privada, os administradores receberam as suas remunerações através de prestações de serviço. Ora, se as remunerações são decididas por uma Comissão de Vencimentos, como é que podem ser pagas em prestações de serviços? E os descontos para a Segurança Social? E a transparência da gestão? Numa primeira resposta, o presidente da Comissão de Vencimentos ainda tentou defender, mais uma vez, que numa gestão privada isso era admissível. Para mais à frente afastar eventuais situações ilegais dessa admissibilidade.

O PCP denunciou o facto de o documento entregue à comissão parlamentar de inquérito, referente ao contrato de prestação de serviços da Atlantic Gateway com a TAP, vir classificado como secreto, e apresentou um requerimento para alterar essa classificação, para que fosse solicitada à TAP a lista de pagamentos feitos à luz desse acordo, e à Segurança Social a indicação dos valores recebidos por conta dessas remunerações.

Amanhã será ouvida a Parpública.


Este artigo integra a série de apontamentos sobre a comissão parlamentar de inquérito à TAP, disponíveis aqui.  

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