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|Comissão de inquérito à TAP

Relatório Comissão TAP. Uma visão parcial para salvaguardar o PS e a privatização

A proposta de relatório, divulgada esta quarta-feira, é um documento parcial que se recusa a ver a realidade exposta pelos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).

CréditosJosé Coelho / Agência Lusa

A proposta de relatório inclui uma justa crítica ao processo de privatização de 2015, nomeadamente pela forma como o governo do PSD e do CDS-PP consumou o processo contra a maioria do Parlamento recentemente eleito, com uma maioria absoluta de deputados eleitos por partidos que, expressamente, haviam prometido reverter a privatização total ou parcialmente.

Inclui a necessária crítica à forma como a privatização de 2015 foi concretizada, onde o facto mais grave é o papel desempenhado pelos fundos Airbus, os 226,5 milhões de euros que a Airbus entregou a David Neeleman, em troca da opção de compra detida pela TAP dos 12 A350 e como comissão pela venda à TAP de seis mil milhões de euros em aviões, e que este usou para comprar e capitalizar a TAP.

O relatório inclui ainda a necessária crítica ao secretismo com que o governo do PSD e do CDS-PP conduziu este processo, enterrando a informação sobre os fundos Airbus, e objectivamente escondendo-os do povo português. Mas o relatório falha quando procura ilibar o Governo PS desse processo de ocultação. O ministro Pedro Marques foi obrigado a reconhecer perante a CPI que conhecia os fundos Airbus desde uma investigação conduzida em 2016 ao processo de privatização. Teve a oportunidade de colocar essa informação no contraditório à Auditoria do Tribunal de Contas e não o fez. Teve a oportunidade de informar o Governo e o seu sucessor sobre este processo e não o fez. Teve a oportunidade de anular a privatização e optou por não o fazer, preferindo simular uma nacionalização onde, mais uma vez, o lucro era todo privado e os riscos eram todos públicos.

Há um processo de ocultação da verdade ao povo português sobre a compra da TAP com o dinheiro da própria TAP, que objectivamente envolveu, quer o PSD/CDS, quer o PS. E em ambas as situações o secretismo do processo serviu para ocultar a verdade ao povo e dificultar o controlo democrático.

Posteriormente, quando a pandemia se abateu sobre a TAP, e David Neeleman se recusou a capitalizar a companhia aérea, o Governo aceitou pagar-lhe 55 milhões para ele sair da TAP, sem qualquer razão para tal, pois como ficou demonstrado na CPI, os 5 milhões de capital social que adquirira valiam zero nesse momento e as prestações acessórias estavam a ser pagas pela TAP, avião a avião, à Airbus. O relatório recusa-se a ver esta realidade para tentar proteger o PS e até se atreve a justificar esse comportamento.

A proposta de relatório faz ainda uma avaliação tendenciosa do processo de reestruturação espoletado na sequência da pandemia. Foi perfeitamente aceite por todos os deputados da CPI que a Manutenção e Engenharia Brasil era quem empurrava a TAP para resultados líquidos negativos, e que sozinha provocou um buraco de mil milhões de euros entre 2006 e 2021. O relatório também o reconhece, mas sem tirar qualquer conclusão desse facto. A única reestruturação de que a TAP necessitava – além de receber os apoios pelos prejuízos provocados pela pandemia – era libertar-se finalmente dessa unidade e ser ressarcida dos prejuízos que a mesma lhe provocara. Em vez de recomendar uma investigação mais apurada às causas completamente incompreensíveis para que sucessivos governos tenham pactuado com este negócio – denunciado desde 2006 pelos trabalhadores e pelo PCP – o relatório opta por assumir os factos, mas recusar as consequências.

Ficou ainda exaustivamente demonstrado na CPI que o processo de reestruturação tinha ido longe demais, que os despedimentos e cortes salariais tiveram efeitos contraproducentes na companhia. Em vez de recomendar a imediata reversão desses cortes, o relatório opta por um conjunto de declarações piedosas sobre os trabalhadores mas sempre destinadas a validar as razões dos despedimentos e dos cortes

Quem acompanhou a CPI percebeu perfeitamente que a TAP foi gerida, mesmo quando pública, como se se tratasse de um grande grupo económico meramente destinado a gerar lucros para os seus accionistas. A gestão da TAP e a acção de quem a tutelava não se preocupava com gerar emprego de qualidade, com promover a estabilidade laboral, com satisfazer as necessidades estratégicas do País. Mesmo quando era gestão pública, ela imitava o pior da gestão privada, por exemplo com gestores públicos a ganharem 100 vezes o salário mínimo e dez vezes o salário do primeiro-ministro. Mas o relatório, em vez de criticar essa realidade, aceita-a, aceita estes salários, e pede alterações à lei para os legalizar. O relatório aceita a dupla moral em vigor: para os administradores, salários e regalias quase infinitas; para os trabalhadores, sacrifícios e cortes que a coisa está mal. Esta é a dupla moral que serve objectivamente para colocar esses administradores ao serviço de quem alimenta estas lógicas e estes privilégios: a acumulação privada. Uma lógica errada quando nas empresas privadas e que deve ser erradicada das empresas públicas.

O funcionamento da CPI alertou ainda para a gravidade da generalização do funcionamento tipo Tribunal Arbitral para decidir da reivindicação de privados face ao Estado. É por acordo entre advogados, à margem da lei, que é decidido pagar meio milhão de euros a Alexandra Reis, e por acordo entre advogados sem qualquer relação com uma dívida jurídica ou moralmente existente, que é decidido pagar 55 milhões a David Neeleman. Mas o relatório decide ignorar este problema, não retirando quaisquer consequências sobre esta generalização.

O funcionamento da CPI mostrou o quão pouco transparente é hoje o funcionamento do Estado, fragilizando-o perante interesses privados, particularmente de grandes grupos económicos. O melhor exemplo é, novamente, o dos Fundos Airbus. Nada foi tornado público sobre eles até 2022. O facto de ter sido a Airbus a dar o dinheiro a David Neeleman com que este comprou e capitalizou a TAP é hoje reconhecido por todos, incluindo os próprios. Mas, durante sete anos, esteve escondida em pilhas de papéis e classificada como informação confidencial. A Parpública conhecia, mas nem os administradores da Parpública conheciam os Fundos Airbus que eram matéria reservada do Presidente e do assessor jurídico. A Comissão de Acompanhamento à Privatização emite um relatório, que a lei diz que deve ser público, e que o Ministério das Finanças não publica porque «não tem um site onde o fazer». A auditoria pública do Tribunal de Contas é completamente omissa sobre os Fundos Airbus. Perante a evidente necessidade de tornar tudo isto mais transparente, mais público, mais auditado pelo povo português, o que o relatório propõe é aumentar o secretismo sobre processos e documentos.

Para terminar, o relatório pretende ser neutro perante o próximo processo de privatização, já iniciado. Mas não é. Desde logo porque muitos dos seus defeitos visam não só proteger o PS, mas também proteger o objectivo de privatizar a TAP. É que se há coisa que ficou evidente nesta Comissão é que está na altura de parar com as tentativas de privatizar a TAP e de a gerir ao serviço do povo e do País.

Veremos agora o que resulta da discussão sobre esta proposta de relatório, que se realizará a 13 de Julho, e se a maioria absoluta do PS não vai ser usada para defender o PS e o seu projecto de privatizar de novo a TAP. À custa da verdade.


Este artigo integra a série de apontamentos de análise à comissão parlamentar de inquérito à TAP, disponíveis aqui

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