Quando se querem fabricar ideias anti-trabalhadores, até a verdade serve. Nos últimos dias, vários títulos noticiosos procuram fazer passar a ideia do grande patronato – sem grande criatividade e talvez afectados pela silly season – de que é negativo o aumento do número de trabalhadores na função pública.
Os comentários surgiram a propósito dos dados divulgados pela Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP) em 16 de Agosto passado. Na Síntese Estatística do Emprego Público (SIEP) relativa ao segundo trimestre de 2021, o emprego no sector das administrações públicas situou-se, a 30 de Junho de 2021, em 731 258 postos de trabalho, representando um aumento de 3,7% relativamente ao período homólogo.
O que esses comentários não destacam é que, na administração central, o aumento de emprego se verificou essencialmente na educação, ensino e investigação (48,6%), na saúde (41,7%) e nas Forças Armadas (8,2%). Os contratados são, na maioria, profissionais de saúde (médicos, enfermeiros, técnicos de diagnóstico) e de educação (educadores de infância e docentes dos vários graus de ensino).
Fica a questão: quando vamos aos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde, às repartições de finanças ou à Segurança Social, quando olhamos para a realidade na Escola Pública, o que é que constatamos? Faltam ou não trabalhadores para serviços mais eficientes e céleres na resposta às necessidades das populações?
Não obstante, volta e meia lá se juntam mais «achas à fogueira» na perspectiva de dividir para reinar, na tentativa de colocar funcionários públicos contra trabalhadores do sector privado e procurando dar a ideia de um Estado «obeso» e ineficiente.
Mais e melhor serviço público requer trabalhadores
De acordo com a Pordata, em 1968 registava-se um total de 196 755 trabalhadores, entre administração central, regional e local. Era um retrato do desinteresse do regime fascista pelas funções sociais do Estado nos mais diversos campos, mas sobretudo na saúde e na educação.
O 25 de Abril permitiu o desenvolvimento tanto das funções sociais do Estado como do Poder Local democrático. Em 2005 os trabalhadores do Estado eram 731 485, ainda assim abaixo da média europeia.
Com as políticas de austeridade, iniciadas no último ano da governação de José Sócrates mas sobretudo acentuadas nos anos de governo do PSD e do CDS-PP, a redução dos trabalhadores do Estado acompanhou a perda da qualidade do serviço prestado e criou graves constrangimentos em todas as áreas.
Entre 2011 e 2014 os funcionários do Estado passaram de 727 785 a 656 376, o número mais baixo de trabalhadores da função pública na última década e meia. Uma sangria que correspondeu a um ataque brutal aos serviços públicos e às funções sociais do Estado. Apenas em 2012, no primeiro ano de exercício pleno de funções do governo de PSD/CDS-PP, foram despedidos perto de 30 mil trabalhadores.
A nova correlação de forças na Assembleia da República, saída das eleições de 2015, e a vigorosa luta dos trabalhadores, reverteram o depauperamento do emprego no Estado, que em final de 2019 se cifrava em 698 540 trabalhadores.
Contratados a prazo são hoje mais de 93 mil, uma subida de 37,7% nesta legislatura, o que mostra as limitações do Programa de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários do Estado (PREVPAP). O número de trabalhadores do Estado contratados a prazo registou uma subida ao longo da actual legislatura, segundo os dados da Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP), tratados num estudo do economista Eugénio Rosa. No final de Março deste ano eram 93 037 os funcionários públicos com vínculos precários, mais 37,7% em comparação com Setembro de 2019, quando o segundo Governo de António Costa tomou posse. O autor do estudo avança que a este fenómeno não escapam o que classifica como «profissões vitais». No período em causa, o número de trabalhadores no sector da Saúde aumentou em 2623, sendo que 2520 (96,1%) ficaram ligados à administração pública por um contrato a prazo. Já na Educação, o número de funcionários cresceu em 13 154, dos quais 12 663 (96,3%) foram contratados a prazo. Globalmente, os novos trabalhadores do Estado aumentaram em 36 116 desde o início da legislatura. Destes, avança Eugénio Rosa, 25 495 (70,6%) foram admitidos a termo certo. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Trabalho|
Vínculos precários no Estado aumentam
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Registe-se que a radiografia que o Eurostat fez, em 2019, ao número de funcionários públicos nos países da União Europeia, revela que Portugal aparece na parte inferior da tabela. Isto é, enquanto a média da UE se situava nos 18%, o nosso País registava apenas 14%, contrastando, por exemplo, com os 29% da Suécia e os 28% da Dinamarca.
Os recentes dados da DGAEP, referentes a 30 de Junho de 2021, referem que o emprego no sector das administrações públicas representava 7,1% da população total, 14,2% da população activa e 15,2% da população empregada.
Em 2020 e 2021 a pandemia e a crise resultante veio demonstrar a necessidade de um número de profissionais suficiente ao serviço das funções sociais do Estado. Em Junho passado o número de trabalhadores do Estado ultrapassou finalmente o de 2011, ano em que começaram as chamadas políticas de austeridade.
E quanto à qualidade do trabalho?
Precariedade, estagnação salarial e falta de condições de trabalho são aspectos bem conhecidas dos trabalhadores da administração pública. Recorde-se as lutas que estes trabalhadores vêm travando, e também os militares e os profissionais das Forças de Segurança, em defesa de aumentos salariais, da valorização das carreiras e de alterações nos sistemas de avaliação do mérito.
Segundo estatísticas oficiais da DGAEP, os trabalhadores da Administração Pública com vínculos precários eram, no mês de Junho de 2020, mais de 80 mil, registando-se um aumento de 8,7% em termos homólogos.
Entre Junho de 2019 e o mesmo mês de 2020, realizaram-se mais 6453 contratos a termo. O sector empresarial do Estado, onde se incluem os hospitais, lidera o ranking da precariedade, com mais 3601 contratos a prazo neste período, seguindo-se a Educação, com mais 1539, e o Ensino Superior, onde existem mais 755 trabalhadores contratados a termo.
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