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|Defesa Nacional

Governamentalização das Forças Armadas. Enquadramento institucional (I)

As recentes audições na Comissão de Inquérito da Assembleia da República ao caso de Tancos contêm trechos elucidativos de como os militares têm sido confrontados com ingerências de Governantes.

O ministro da Defesa Nacional, João Gomes Cravinho e o Chefe do Estado-Maior do Exército, José Nunes da Fonseca, durante as comemorações do Dia do Exército, Guimarães, 28 de Outubro de 2018.
O ministro da Defesa Nacional, João Gomes Cravinho e o Chefe do Estado-Maior do Exército, José Nunes da Fonseca, durante as comemorações do Dia do Exército, Guimarães, 28 de Outubro de 2018. CréditosHugo Delgado / LUSA

Governamentalização das Forças Armadas: chavão ou destruição da instituição?

Recordemos Setembro de 1982, altura em que a extinção do Conselho da Revolução trouxe como seus herdeiros o Tribunal Constitucional e o Conselho de Estado e pôs fim a Órgãos de Soberania obrigatoriamente preenchidos por militares. Alterações a reboque da chamada normalização democrática e da pretensa subordinação dos militares ao poder político no quadro de uma dita «democracia» ocidental. Se a partir dessa data realizássemos uma pesquisa factual, sobrariam exemplos do mau trato a que os militares e a Instituição Militar (IM) foram sujeitos e poucos seriam os exemplos de Chefes militares que frontalmente se recusaram a conviver com a desconsideração da IM. As exceções confirmariam a regra.

As recentes audições na Comissão de Inquérito da Assembleia da República (AR) ao caso de Tancos contêm trechos elucidativos de como os militares têm sido confrontados com ingerências de Governantes que pouco ou nada têm a ver com política de Defesa Militar e quando tais ingerências com isso se relacionam não constituiriam, em termos militares, prioridade. Mas também evidenciam até onde uma pretensa impoluta maneira de ser militar é máscara de comportamentos manobristas que só se podem compreender pelo desejo de «ser poder» mesmo que para isso se desrespeite o que se afirma defender.

Quem estes caminhos escolhe infringe o RDM, tem de ser afastado, está fora deste tempo e do futuro que se impõe construir.

Audições que não alteram a realidade de em muitos militares subsistir a convicção de que o «gueto» institucional, a que as Forças Armadas (FA) foram circunscritas, tem algo de «complexo de Édipo1» dos políticos, sendo a mãe, a democracia como a conhecemos de 25 de Abril de 1974 para cá. Em defesa do regime consagrado na Constituição, é tempo de responsabilizar os Chefes militares num quadro legal de exercício de funções que privilegie a consagração dos princípios do comando completo, ou seja, deles e só deles é a responsabilidade de tudo o que sob as suas ordens se encontra e só a eles cabe determinar do que precisam e de como administrar para que se cumpram as missões prescritas. Concomitantemente, os Chefes militares são os que devem prestar contas sobre o desempenho das organizações que comandam e, quando a Lei constitua fator de estrangulamento ao cumprimento da missão, é deles a responsabilidade de submeter as correspondentes propostas de alteração.

Dos militares-cidadãos-militares e do seu enquadramento constitucional

Atente-se ao texto constitucional e retenhamos o respaldo que o mesmo consagra para os militares enquanto cidadãos. Sim, porque os militares, antes de o serem, são cidadãos e como tal importa respeitar o que a Constituição prescreve em termos de Direitos dos mesmos: «Todos os cidadãos têm o direito de tomar parte na vida política e na direção dos assuntos públicos do país» e «o direito de ser esclarecidos objetivamente sobre atos do Estado e demais entidades públicas e de ser informados pelo Governo e outras autoridades».

Os militares não estão nem podem estar excluídos destes direitos. Acresce que a formação militar parece ser motivo de desqualificação para o acesso a cargos públicos o que, a acontecer, contraria o Artigo 50.º da Constituição.

Aceita-se e é justificável que a participação cívica e politica dos militares seja objeto de restrições, (por exemplo: a propaganda e o proselitismo politico enquanto no exercício de funções militares) mas tais restrições de direitos terão de ser quanto baste2, ou seja, na medida do estritamente necessário. Para que a restrição seja aceitável é preciso demonstrar que, se a restrição não existisse, o cumprimento da sua função militar ficaria prejudicado. Nos termos do texto constitucional nunca o alcance da restrição pode configurar uma proibição. Acresce que em termos de direitos e deveres fundamentais o Capítulo III (Direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores) da nossa Constituição deve ter uma leitura conducente à sua aplicação aos militares. Os militares, por serem militares, não deixam de ser trabalhadores, muitos reúnem as duas condições de trabalhadores e combatentes, alguns predominantemente combatentes mas que nem por isso deixam de ser trabalhadores e casos há em que a vida se encarrega de limitar o desempenho como combatente para o exponenciar em outras atividades não menos nobres (ex: formação de combatentes).

Do enquadramento constitucional da Defesa Nacional

A Defesa Nacional (DN) integra a Parte III-Organização do Poder Politico, Título X da nossa Constituição, que prescreve constituir obrigação do Estado assegurá-la e o seu objetivo constitucionalmente estabelecido não é outro mas sim este: «garantir, no respeito da ordem constitucional, das instituições democráticas e das convenções internacionais, a independência nacional, a integridade do território e a liberdade e a segurança das populações contra qualquer agressão ou ameaça externas».

Como se tem conjugado tal obrigação com a condição de Portugal como «produtor de segurança»? Estamos perante um enviesamento do texto constitucional. Enviesamento, porque se desrespeita o que constitucionalmente é prioritário quando exportamos o que aqui nos faz falta para treinar, aprontar e ter disponíveis a qualquer momento e em qualquer lugar do território nacional, FA, ainda que de postura iminentemente defensiva, nem por isso menos capazes de cumprirem a missão que a elas e só a elas a Constituição comete a defesa militar da República.

As FA obedecem «aos órgãos de soberania competentes, nos termos da Constituição e da lei» mas «estão ao serviço do povo português, são rigorosamente apartidárias e os seus elementos não podem aproveitar-se da sua arma, do seu posto ou da sua função para qualquer intervenção política». Entre obedecer e estar ao serviço vai a adequação das ordens à Constituição e à Lei e no povo português reside o patamar mais elevado do poder subordinante. Nos termos constitucionais as nossas FA estão ao serviço do povo e não podem ser entendidas como «guarda pretoriana do poder». O império romano fez escola, mas Abril abriu portas que, recorrentemente, o povo português tem afirmado não querer ver fechadas, afirmação de vontade livre e democraticamente expressa. Assinale-se ainda que qualquer revisão do texto constitucional, para ser legal, não pode no seu teor beliscar, entre outros limites materiais não menos importantesOs direitos, liberdades e garantias dos cidadãos; os direitos dos trabalhadores, das comissões de trabalhadores e das associações sindicais; o sufrágio universal, direto, secreto e periódico na designação dos titulares eletivos dos órgãos de soberania, das regiões autónomas e do poder local, bem como o sistema de representação proporcional; o pluralismo de expressão e organização política, incluindo partidos políticos, e o direito de oposição democrática; a separação e a interdependência dos órgãos de soberania., a «independência nacional e a unidade do Estado».

Como se deverá adequar a Instituição FA ao enquadramento constitucional descrito?

Naturalmente que os cidadãos que as integram só deverão ver restringidos os seus direitos constitucionalmente consagrados na exata medida em que, sem tais restrições, fique demonstrado poderem incumprir com as suas obrigações estritamente militares.

Em que medida condiciona o cumprimento das suas obrigações militares, o manifestarem-se fardados; terem associações que coletivamente os podem representar junto do poder judicial, na concertação social e na negociação (com a tutela ou com quem em sua representação administra) de adequadas condições de remuneração e trabalho? Há que responder sem ideias pré-concebidas e sem preconceito!

Recentremos o texto na resposta à pergunta de abertura, Governamentalização das Forças Armadas, chavão ou destruição da Instituição?

Se recuássemos a 1982 e inventariássemos as inúmeras iniciativas conhecidas pelos três R (Redimensionar, Reformar e Reequipar = Reduzir, Reduzir, Reduzir) sobressairia que não só aos sucessivos Governos cabem responsabilidades. Os Chefes militares, foram escolhidos a dedo e daí que muito do que foi (des)feito a eles se ficou a dever. Poucos quiseram e souberam modernizar - resistindo = transformar e adequar. As exceções confirmam a regra e merece ser referido que foi no EX que, inevitavelmente, maiores teriam que ser, foram e são as dificuldades.

Feito o enquadramento constitucional, na segunda parte deste artigo abordaremos a legislação e regulamentação em vigor e concluiremos com o que sugerem recentes declarações de diversos ex-responsáveis militares na Comissão de Inquérito da AR ao caso de Tancos.

(continua)


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990

  • 1. Mate-se o pai (da democracia) para com ela em plenitude fazermos pela vida. Assim que ela se aperceber quem em segundas núpcias a desposou, será tarde, a submissão e opressão prevalecerão. Certamente não pretendem que a ação dos militares vire o complexo de Édipo em complexo de Electra!
  • 2. Ver, a este propósito: o artigo de opinião de António Bernardo Colaço, «A condição militar e o direito de contratação coletiva», em DN de 20 de Novembro de 2018; a intervenção, gravada em vídeo, de António Bernardo Colaço na conferência A Realidade do Sindicalismo Militar na Europa, realizada em Lisboa a 22 de Fevereiro de 2019; e artigo «Juiz afirma que militares podem ter sindicatos», em DN de 21 de Fevereiro de 2019. Não há nada a recear do reconhecimento da liberdade sindical e direito à greve de militares, pelo contrário, a sociedade portuguesa só ficaria a ganhar com esse reconhecimento. Na Suécia existem sindicatos militares há mais de 100 anos, têm reconhecido o direito à greve e nunca a ele tiveram de recorrer (minuto 1 aqui).

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