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Combater o medo, agindo com prudência e em nome dos mais fracos

Estamos confrontados com um tempo que nos é estranho, tão estranho que leva alguns a pensar tratar-se, apenas, de uma curta pausa numa normalidade que segue dentro de momentos.

A sombra de um estudante projecta-se no chão, entre as marcas de entrada e saída de uma escola no Seixal, no primeiro dia de aulas presenciais depois do alívio das medidas de emergência para controlo da pandemia em curso, no Seixal, a 18 de Maio de 2020. A fotografia foi escolhida pelo britânico «The Guardian» como uma das melhores fotos do dia.
A 18 de Maio mais de 500 estabelecimentos de ensino reabriram portas para receber os alunos do 11.º e 12.º anos, depois de dois meses com aulas à distânciaCréditosEPA/MANUEL DE ALMEIDA / LUSA

Algo do género, parou-se em meados de março, fomos postos à prova, mas agora tudo voltará a ser como era antes, sem outras consequências. Não será assim e, pelo contrário, abriram-se brechas que poderão provocar graves ruturas económicas e sociais, com profundas implicações na descapitalização do Estado (de quem os inimigos, agora, exigem tudo), na sua capacidade para continuar a garantir as indispensáveis funções sociais que lhe estão acometidas e a promover os serviços públicos que lhes dão corpo, implicações, ainda, no trabalho e na vida de todos os trabalhadores, do setor público e do privado.

Este é um contexto favorável ao grande capital que espreita para se aproveitar das fragilidades criadas para surgir como salvador da Pátria, apoderando-se ainda de mais recursos, e também favorável a alguns afilhados políticos que operam e lucram no chamado setor social e nunca perdem uma oportunidade para ganhar influência junto de um poder que os alimenta. Isto para dizer que não criar condições para o regresso à normalidade, ainda que limitada, não seria bom para o futuro da nossa sociedade, mas, sem esquecer que de uma eventual imprudência nos passos a dar poderá resultar uma situação, que ninguém deseja, de ainda maior gravidade do que a atual. Dizia-me um amigo, proprietário de um pequeno restaurante de diárias, frequentado por trabalhadores das imediações, que «com dificuldade, mas deu para aguentar, uma segunda situação como esta e não se aguenta mais, será o estoiro!».

Encerrados em 13 de março, os estabelecimentos de educação e ensino irão reabrir, de forma faseada, como todos os serviços e empresas. As prioridades são (sempre) discutíveis, ainda mais quando não correspondem a um único critério, mas cruzarão quatro tipos de interesses: saúde, educação, economia e sociedade. Seguramente, na situação que vivemos, não poderia haver um único critério. A questão, neste momento, é encontrar um ponto de equilíbrio: é certo que quanto mais se arrastar o confinamento, mais se afundará a economia e o futuro da vida de todos nós; porém, quanto mais rapidamente se procurar estancar a quebra económica mais possibilidades há de surgir uma segunda onda infeciosa de dimensão elevada. É preciso encontrar o ponto de equilíbrio entre todos estes interesses e as escolas não poderão, obviamente, ficar de fora. Uma resposta que também não pode esquecer que, em menos de dois meses, dois milhões de portugueses perderam rendimento, ficando em lay-off ou no desemprego, aumentou em 50% a pobreza e foi atirada para os braços da caridade uma quantidade enorme de pessoas que têm direito a uma vida digna não tendo que viver de mão estendida.

Tal como aconteceu em outros momentos, mais uma vez os professores e a Escola Pública assumirão a sua responsabilidade social, contribuindo para que se deem os passos necessários no sentido da normalidade. Deram-nos no passado, saberão dá-los agora, num tempo em que deles se espera (e exige) um contributo que não se esgote no interior das paredes da escola, mas extravase para além delas, sendo suporte do tremendo desafio que se coloca a toda a sociedade e a cada pessoa em particular.

Porém, o regresso às escolas tem riscos que terão de ser minimizados através da realização de testes, de proteção dos mais frágeis, de equipamentos de proteção para todos, de desinfeção periódica, de normas de distanciamento físico, higiene sanitária e etiqueta respiratória, de avaliação periódica da situação… tudo isto sem nunca aliviar para que se minimizem os riscos.

O regresso acontece sem que se tivessem feito testes à comunidade escolar das secundárias do território continental; apenas nas regiões autónomas, em instituições de ensino superior, nas creches e em alguns municípios eles foram total ou parcialmente realizados. Esteve mal o Governo ao não aceitar a realização de testes, que seriam mais um fator de confiança e permitiria ter um retrato mais fiável da situação epidemiológica no país, mas também por violar o compromisso de só avançar com uma nova fase de desconfinamento após avaliar a anterior. Inicia-se a segunda fase em 18 de maio sem, contudo, ter sido avaliado o impacto da primeira que começou no passado dia 4.

Acresce que não existe consenso dentro da comunidade científica sobre a reabertura já, pelo facto de o valor de Rt (transmissibilidade) estar ainda perto de 1 e por não haver evidências de que já estamos numa fase consolidada de descida. E é por haver mais dúvidas do que certezas que acaba por ser imprudente a abertura de escolas e creches no dia 18 de maio, uma decisão que, assim, acaba por ser eminentemente de natureza política, com a assunção do risco por parte do governo.

Na preparação de condições de segurança sanitária apenas duas escolas foram desinfetadas pelos militares, ficando de fora, por exemplo, a escola de Idães que levou o Presidente da República a fazer testes e a respeitar os 14 dias de quarentena. Os militares deram formação ao pessoal auxiliar das escolas e foram estes que higienizaram as instalações escolares. Quanto a equipamentos de proteção individual, chegaram a todas as escolas, embora, nuns casos, em quantidade suficiente para o que falta do ano letivo e, em outros, apenas para uma semana de funcionamento.

Há ainda duas preocupações neste recomeço: as relacionadas com o respeito pelos direitos laborais, nomeadamente em relação a horários de trabalho, serviço distribuído, entre outros que terão de ser observados; também o aspeto pedagógico preocupa, com diversas medidas que estão a ser tomadas – permuta de turmas entre docentes a um mês do final do ano, redução para metade das aulas previstas para alunos inscritos em exames, ausência de qualquer resposta a alunos cujas famílias optem por se manterem em casa ou manutenção do regime habitual de acesso ao ensino superior – a deixarem transparecer a ideia de alguma irracionalidade.

Vamos, então, ver como tudo corre, contribuir para que corra com a normalidade possível e pensar, sobretudo isso, que as famílias trabalhadoras e os seus filhos são quem mais sofre com tudo o que se está a passar e, dentro das limitações que se impõem e com os cuidados que se exigem, tentar atenuar os fossos que a pandemia escavou e o poder político poucas vezes compensou adequadamente.


Professor; Secretário-geral da FENPROF.

O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AE90)

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