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Alta competição e comunicação social, algumas reflexões

A utilização do Desporto como um elemento de criação de atrito social contraria de forma brutal o seu potencial criativo, social e cultural. Quando se discute a expressão deste no espaço mediático são muitas as questões que se levantam. 

CréditosJosé Coelho / Agência Lusa

O destaque dado ao Desporto no Espaço Ciência da Festa do Avante! colocou os visitantes perante a necessidade de repensar a sua relação com este fenómeno. Estamos demasiado habituados a associar acontecimentos desportivos a consequências negativas, a polémicas e a violência, quando, na verdade, existe no Desporto um espaço de evolução cultural e humana, um campo de sociabilização, que tem que ser valorizado no seu poder transformador da sociedade. A minha participação na mesa de debate dedicada ao tema «Alta Competição e Comunicação Social» originou um conjunto de reflexões que gostaria de deixar aqui registadas. 

A forma como é olhada a comunicação social sofre hoje de uma tendência para a generalização negativa que tem que ser combatida, tendo em conta que essa construção de uma amálgama geradora de comportamentos violentos e de recusa acaba por ser um objetivo de quem procura que os cidadãos não tenham voz, nem acesso a uma visão abrangente dos acontecimentos do mundo. Ao tornar-se hábito não separar quem detém órgãos de comunicação social com quem trabalha em órgãos de comunicação social perde-se a oportunidade de gerar parcerias e ligações com quem pode ajudar a mudar o panorama que rejeitamos. 

«Estamos demasiado habituados a associar acontecimentos desportivos a consequências negativas, a polémicas e a violência, quando, na verdade, existe no Desporto um espaço de evolução cultural e humana, um campo de sociabilização, que tem que ser valorizado no seu poder transformador da sociedade.»

Isto porque, na origem do problema, estão questões de trabalho que afetam os trabalhadores da comunicação social, na precariedade, nos baixos salários, na diminuição das condições para desenvolver as missões que têm que cumprir. A redução dos espaços disponíveis, seja em tempo de televisão ou rádio, seja em caracteres nas páginas de jornais ou sites, afeta diretamente quem tem de produzir e analisar informação, ao mesmo tempo que são cada vez menores as oportunidades para acompanhar, no local, quer os eventos desportivos, quer os momentos de contacto com atletas e treinadores. É importante perceber que isto não é uma opção dos jornalistas, é um condicionalismo a que estão expostos. 

De certa maneira, como ficou claro na conversa com João Duarte, canoísta, e João Miguel «Paquito», treinador de boxe e atleta olímpico em 1980, o jornalista de desporto não só compreende bem a situação dos atletas como, em muitos pontos, se identifica com estes, nas dificuldades para organizar o seu trabalho, encontrar condições de treino e preparação, participar nas principais competições. Mais, as dificuldades dos atletas e treinadores de, muitas vezes, organizarem a sua própria expressão pública, pelas decisões dos clubes a que estão ligados, acabam por tornar ainda mais distante a sua presença na comunicação social e a expressão das suas ideias e ambições. 

Isto acontece porque uma outra confusão é constantemente feita na análise à presença do Desporto nos espaço mediático. O Desporto não é prioridade em lugar algum, apesar da importância social que lhe é reconhecida. Vivemos num momento onde acontecimentos desportivos, sobretudo associados ao futebol, são utilizados e manipulados para organizar momentos de entretenimento, normalmente caracterizado pela polémica, pela violência, pela agressividade. Mais importante do que o Desporto, aquilo que costuma estar em causa nesses espaços é a utilização dele para transformar a maneira como as pessoas vivem os acontecimentos, aumentando a sensação de frustração e injustiça, aumentando de forma grotesca pormenores de um jogo para o transformar numa trama que capta a atenção e a isola na negatividade. 

«O Desporto não é prioridade em lugar algum, apesar da importância social que lhe é reconhecida.»

Nisso, é certo, também colaboram muitos jornalistas e comentadores, e a forma como são essas polémicas que ocupam a maior parte dos horários de grande audiência, levam a que a ideia geral fique capturada por esse discurso. Mas lutar contra essa visão maioritária que acaba por não ser totalmente fiel ao que acontece no meio é uma obrigação de quem quer ter um entendimento mais profundo da realidade. Perceba-se que, no Desporto ou no Futebol, em particular, não se está num espaço de exceção em relação ao que é a nossa vida, o nosso trabalho, a nossa cultura, o nosso lazer. É também aí - arrisco a dizer, é sobretudo aí - que se constroem muitos dos ataques à nossa democracia e será, também aí que todos eles poderão ser aplacados. 

É por isso fundamental resistir à tentação típica das redes sociais, de elaborar todo o nosso julgamento a quente. É fundamental compreender como a delimitação dos discursos a uma visão clubista ou parcial acaba por fornecer pequenas vitórias para quem nos quer destruir enquanto sociedade. É, de forma clara e inequívoca, necessário entender qual o nosso papel na elaboração de uma sociedade mais democrática e justa. Aí, o Desporto tem um lugar destacado, pela forma como reúne em si aquilo que é o desenvolvimento humano em todas as suas possibilidades. 

Do debate realizado no Espaço Ciência pareceu-me importante ajudar a compreender esta visão mais aprofundada de como cabe a cada um contribuir para uma melhoria daquilo que temos pela frente. As visões críticas são necessárias, tal como é importante um maior estudo de determinadas opções que geram profunda insatisfação - a forma como as transmissões desportivas aparecem delimitadas e cada vez com menor variedade, a maneira como atletas e treinadores têm pouco espaço para falar das suas experiências e de como isso afeta a possibilidade de muitos terem mais apoios e melhores condições, tudo isso tem que ser compreendido e entendido à luz daquilo que são as grandes opções do mercado e as portas que se abrem para, no mundo em que vivemos, criar outros espaços para responder às ambições de cada um. 

Também por isso é fundamental continuar a valorizar o Desporto e a compreender o seu potencial transformador, tal como ficou bem expresso na exposição que pudemos visitar na Festa do Avante!.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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