O Parque de Campismo da Galé, onde moravam cerca de 500 pessoas, era um entrave à expansão do projecto Costa Terra, que pretende instalar «204 moradias, 3 aparthotéis com 560 camas, 4 aldeamentos turísticos com 775 camas, 4 conjuntos de apartamentos turísticos com 823 camas, uma estalagem com 40 camas e um campo de golfe de 18 buracos, além de vários equipamentos complementares na linha litoral de Grândola».
Numa conversa com o AbrilAbril, o presidente da Câmara de Grândola explica o que a autarquia está a fazer para travar a especulação imobiliária e garantir o desenvolvimento sustentável do concelho. Desde o ano passado que a Câmara Municipal de Grândola vem salpicando o espaço mediático por alegadamente aprovar um excesso de camas turísticas no concelho. Esta quarta-feira, o Município divulgou um comunicado onde faz o enquadramento do planeamento daquele território desde os anos 60 do século passado. A nota, afirma António Figueira Mendes, pretende «repor a verdade» sobre um processo onde a aposta, frisa, continua a ser a salvaguarda da sustentabilidade ambiental e a preservação da qualidade de vida dos habitantes do concelho. Vamos então por partes. Em 2022, a Câmara de Grândola suspendeu parcialmente o Plano Director Municipal (PDM), travando assim o licenciamento de novos empreendimentos. A iniciativa, que passou na Assembleia Municipal com a abstenção de PS e PSD, contemplava medidas preventivas tendo em conta a necessidade de «salvaguardar e preservar o estado actual do território», ou seja, travar a especulação imobiliária e garantir o desenvolvimento sustentável. Esta suspensão vigorará até à conclusão do procedimento de alteração do PDM, que, afiança o autarca, estará concluído no espaço de dois a três meses. O objectivo, diz, foi travar a introdução de mais camas turísticas nas freguesias de Melides e do Carvalhal, «que são as que estão a sofrer maior pressão». «Vamos procurar conter nestas o desenvolvimento de mais projectos turísticos», acrescenta, recordando que na revisão do PDM, efectuada em 2017, estava plasmada a intenção de criar alguns benefícios para quem investisse em turismo no interior do concelho, mas o objectivo não foi bem sucedido. «Todos os investimentos que foram sendo apresentados foram sempre nesta zona [Melides e Carvalhal], que, não sendo uma faixa costeira, está mais perto do litoral», constata o presidente da autarquia. Ainda assim, insiste, o grande objectivo é «contrariar a especulação», sobretudo naquelas duas freguesias, e «potenciar o desenvolvimento do interior do concelho». A preocupação em travar a especulação e o crescimento desenfreado de empreendimentos turísticos naquele território já tem mais de 50 anos. Afinal de contas, a beleza e as singularidades do concelho de Grândola, onde a grande maioria dos terrenos que confinam com a faixa litoral são privados, estiveram sempre debaixo de olho de interesses imobiliários e turísticos. Nos anos 60 do século passado, em plena ditadura, esses terrenos começaram a ser adquiridos por grupos financeiros, estando então previstas mais de 70 mil camas para Tróia. «Antes da Revolução de Abril, o concelho de Grândola chegou a ter um Plano que previa, apenas para a península de Tróia, uma ocupação populacional na ordem dos 70 mil habitantes (Plano Andresen, aprovado em Março de 1965). À luz desse Plano, chegaram a ser concretizados alguns grandes empreendimentos turísticos no início dos anos 70, através da Torralta», lê-se no comunicado da Câmara de Grândola. Mais tarde, estudos desenvolvidos por grandes grupos financeiros deram lugar ao Plano de Desenvolvimento Urbanístico da Península de Tróia – Bases da Nova Estruturação (aprovado em Janeiro de 1974), onde se previam mais de 120 mil camas turísticas em toda a faixa litoral do concelho. Após o 25 de Abril, «e apesar dos muitos compromissos já firmados e dos vários planos aprovados pela Direcção-Geral do Planeamento Urbanístico e pela Direção Geral do Turismo, a Câmara Municipal (executivo liderado pelo Partido Comunista) conseguiu controlar e disciplinar o crescimento territorial e turístico na Costa, promovendo a elaboração e aprovação do Plano de Intervenção Integrada para a faixa litoral». Aprovado na década de 80, este plano ambicionava «promover um desenvolvimento turístico sustentável, proteger os valores naturais, ambientais e culturais da faixa litoral, bem como salvaguardar os interesses das populações locais, garantindo solos para construção de habitação nos aglomerados urbanos do litoral e assegurando a continuidade das atividades económicas tradicionais, principalmente a agricultura». A partir daqui, e em articulação com as competentes entidades regionais e nacionais, foi conseguida uma redução para 22 mil camas, graças à aprovado do primeiro PDM de Grândola, seguindo-se, em 2000, o Plano de Urbanização de Tróia. Até ao momento, segundo a Câmara Municipal, encontram-se aprovadas e/ou executadas no concelho 5639 camas turísticas, incluindo as camas programadas. Tendo em conta o estipulado no Plano Regional de Ordenamento do Território do Alentejo (PROTA), o PDM de Grândola prevê uma intensidade turística máxima no concelho de 14 915 camas. O número tem sido colocado em causa, nomeadamente por associações ambientais, que tentam responsabilizar a autarquia pela sua definição, quando o que vem inscrito no PROTA, e que resulta de estudos de impacto ambiental e de pareceres de organizações, como a Agência Portuguesa do Ambiente, é que «a Intensidade Turística máxima para as sub-regiões dos pólos turísticos nacionais — Litoral Alentejano e Alqueva — é dada pela relação de 1 cama turística por 1 habitante residente (1:1)». Apesar disso, «só se ataca a Câmara, o que não deixa de ser curioso», constata Figueira Mendes. O presidente reforça que, «ao longo destes 50 anos sempre houve a preocupação de preservar», mesmo que as preocupações ambientais não ocupassem espaço, como hoje. «Em 1980 ainda não havia enquadramento jurídico para o plano que fizemos, mas isso demonstrou a preocupação que tínhamos, porque esta zona estava pejada de projectos de intenções e havia uma série de empreendimentos clandestinos ao longo de toda a costa», explica. A par da alteração do PDM, António Figueira Mendes destaca o trabalho que a autarquia vem realizando, no quadro das suas competências, de «conter o impacto de operações projectadas e preservar os valores ambientais em presença, num quadro em que deliberações determinantes são da responsabilidade de entidades da Administração Central». Neste caso, sensibilizando os promotores turísticos para a importância de reduzir as áreas de construção e o número de camas e para apelar à sua colaboração no estudo e na aplicação «de processos alternativos de captação de água», como a dessalinização (ver caixa acima). Porque, insiste, «há aqui uma mistura de imobiliário e turismo, que depois conduz a estes investimentos. Mas isto está previsto há muitos e muitos anos, foram planos discutidos publicamente, tiveram o parecer de todas as entidades e ninguém nessa altura interveio ou contestou». De 2001 a 2013, com a Câmara Municipal de Grândola liderada por um executivo do PS, foram aprovados planos de pormenor dos grandes projectos turísticos, ao mesmo tempo que se pôs fim ao estacionamento gratuito nas praias. No Verão de 2013, a empresa municipal SAP, que havia sido constituída no no ano 2000, foi extinta e os parques de estacionamento das praias do Pego, Carvalhal e Comporta foram entregues às empresas privadas detentoras dos terrenos. Entre 2005 e 2013, lê-se no comunicado, «foram elaborados e aprovados todos os planos de pormenor» para as áreas de desenvolvimento turístico (ADT), com excepção de Melides, nas quais se desenvolvem os denominados grandes projectos turísticos, «e que, no limite, permitiriam realizar 21 800 camas turísticas». A crise financeira de 2008 veio travar alguns desses projectos que ficaram a dever direitos de edificação aos chamados Projectos de Interesse Nacional (PIN), da responsabilidade do Governo, através dos quais grandes grupos económicos e financeiros adquirem território protegido a baixo custo para depois o sobrevalorizar, alimentando a especulação imobiliária. No concelho de Grândola, a ADT4 das Fontainhas (Costa Terra e Pinheirinho) é um dos exemplos a quem foi atribuído o estatuto PIN, mas que, tal como sucedeu com a ADT3 do Carvalhal, ficou por concluir. No âmbito do processo de alteração do PDM em curso, o presidente da Câmara de Grândola salienta que a população será chamada a participar, através de debates promovidos pelo município. A alteração que decorrer deste processo de avaliação e auscultação, onde a autarquia alerta desde já que não irá permitir mais do que as 14 915 camas, terá depois de passar pelo crivo de instituições como a APA, Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) e Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Alentejo. «O objectivo é garantir um desenvolvimento equilibrado do território e pugnar por um modelo de desenvolvimento que favoreça as populações, continuando a contrariar projectos e a corrigir erros do passado, contrários ao interesse do concelho de Grândola e da sua população, lê-se no comunicado. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Local|
Figueira Mendes: O nosso foco continua a ser a protecção ambiental
De 120 mil camas a menos de 15 mil
Qual é a situação agora?
No entretanto houve um viés
Debates públicos
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A expectativas destes fundos é vender os lotes por um preço mínimo de mais de três milhões de euros. Em 2021, o parque foi comprado por 25 milhões de euros pelo fundo norte-americano Discovery Land Company, que assumiu todo o projecto Costa Terra. Nessa altura, António Figueira Mendes, presidente da Câmara Municipal de Grândola (CMG), exigiu que o acesso à praia da Galé se mantivesse aberto ao público, independentemente dos interesses privados.
O primeiro passo no processo da Costa Terra foi iniciado em 2006, com o aval do despacho conjunto do Ministério da Economia e do Ambiente do Governo XVII do PS, de José Sócrates.
As propostas apresentadas pelo PCP, BE e Livre na Assembleia da República, a 17 de Maio de 2024, no sentido de salvaguardar o interesse público na praia da Galé e que o Governo salvaguarde o funcionamento do parque de campismo nos seus moldes actuais, foram chumbadas pelo PS, PSD, CDS-PP e IL.
Os comunistas defendem que «o desenvolvimento turístico deve acontecer de forma integrada e harmoniosa, que inclua a acessibilidade, a fruição e o lazer para as populações, valorizando a qualidade ambiental, paisagística e natural, salvaguardando o acesso da população às zonas balneares». No seu projecto, o BE considera a operação imobiliária em curso no concelho é «mais um exemplo de como a pressão turística de luxo está a privatizar e a elitizar zonas costeiras privilegiadas que sempre foram de usufruto popular».
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