|Manuel Gouveia

Elevadores da Carris: a liberalização mata!

De há muito que os lisboetas se habituaram a ver a situação degradante das escadas rolantes e elevadores do Metropolitano de Lisboa. O que não suspeitavam é que uma degradação similar pudesse estar a acontecer nos elevadores da Carris. Até à tragédia de ontem.

CréditosTiago Petinga / Agência Lusa

Rapidamente apareceram notícias sobre o facto de os guarda-freios da Carris já terem alertado para o estado da manutenção deste elevador. O Página UM deu nota do facto do contrato de manutenção dos elevadores ter terminado a 31 de Agosto e o concurso para o contrato que o deveria ter substituído ter sido anulado por causa do preço elevado das propostas apresentadas. Isto não implica que não houvesse contrato de manutenção em vigor, o normal seria ter prolongado o contrato anterior até novo contrato ser assinado (a não ser assim, e o Página UM garante que não é, os elevadores deveriam ter parado no dia 1, o Presidente da Carris deveria ter notificado quem o nomeou, Carlos Moedas, de tal facto, e isso não ter acontecido seria de uma enorme gravidade, a exigir pronta intervenção do Ministério Público e muito sérias consequências políticas).

«Quando vemos a Mariana Leitão a querer saber o que andam a fazer 100 mil funcionários públicos, apetecesse gritar-lhe que há uma coisa que não andam a fazer: a manutenção dos elevadores da Carris, que está subcontratada a privados, como a Mariana defende que deve acontecer com tudo e um par de botas.»

É pois preciso apurar as causas destas tragédia, mas há coisas que já se sabem e devem ser malhadas a quente. Porque os que fazem o mal e a caramunha andam todos os dias nas televisões a espalhar o veneno que amanhã pode custar a vida a mais gente.

Quando vemos a Mariana Leitão a querer saber o que andam a fazer 100 mil funcionários públicos, apetecesse gritar-lhe que há uma coisa que não andam a fazer: a manutenção dos elevadores da Carris, que está subcontratada a privados, como a Mariana defende que deve acontecer com tudo e um par de botas. Tal como está subcontratada a privados a manutenção dos elevadores e escadas rolantes do Metropolitano de Lisboa (com os miseráveis resultados conhecidos, apesar de não terem a trágica dimensão do que agora ocorreu com o Elevador da Glória). 

E no mesmo Página UM já citado vemos um Luís Gomes rapidamente apresentar a tese que a solução é privatizar a Carris. Os liberais são especialistas nisto: a cada desastre provocado pela liberalização, a resposta é sempre a mesma: mais liberalização.

Porque, independentemente das causas do acidente (que há que apurar e estudar), há uma realidade inegável e sobre a qual é necessário meditar: porque não assegura a Carris a manutenção deste seu material? Que maior segurança pode haver que uma equipa bem treinada, bem equipada, bem qualificada e bem remunerada de trabalhadores dedicados à manutenção e à segurança dos elevadores da Carris? Como aconteceu durante 120 anos! 

«Essa liberalização começou há uns 15 anos, quando a Carris destruiu a sua manutenção, por ordem do governo da altura (não interessa se PS ou PSD, são irmãos nas políticas liberalizantes impostas às empresas públicas), despediu centenas de trabalhadores, quebrou as cadeias de transmissão do saber, e passou a entregar ao mercado a manutenção dos seus elevadores.»

E não começou com este contrato (assinado em 2022) a manutenção privada dos elevadores da Carris, ao contrário do que lemos no mesmo Página UM. Essa liberalização começou há uns 15 anos, quando a Carris destruiu a sua manutenção, por ordem do governo da altura (não interessa se PS ou PSD, são irmãos nas políticas liberalizantes impostas às empresas públicas), despediu centenas de trabalhadores, quebrou as cadeias de transmissão do saber, e passou a entregar ao mercado a manutenção dos seus elevadores. Perante o protesto e o alerta dos sindicatos da Carris.

E esta é também a altura para recordar os alertas sucessivos que temos feito sobre o inferno que é o modelo liberal da contratação pública. Os concursos que se arrastam, a litigância obstrutiva, o cartel dos concorrentes, com as empresas a gastarem a subcontratar escritórios de advogados o que antes gastavam a contratar trabalhadores e técnicos qualificados. E tudo para depois ter um serviço mal feito, como todos os que vivemos na cidade sabíamos ser o caso das escadas e elevadores do Metro e agora sabemos ser também o caso dos elevadores da Carris. 

Faça-se a investigação necessária. Compreenda-se o acidente no concreto. Tomem-se as medidas que devem ser tomadas para minimizar o risco de esta tragédia voltar a acontecer. 

Mas, principalmente, libertemos-nos da ideologia liberal. Ela mata.

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