O direito dos povos a trilhar o seu próprio caminho é sempre muito respeitável até os interesses económicos e imperialistas saírem beliscados. Que o digam os irlandeses, os chilenos, os espanhóis (e também os bascos, os galegos, os catalães), e mais recentemente o povo ucraniano, envolvido numa guerra de procuração entre a Rússia e os EUA, cada um procurando legitimar a sua intervenção no respeito da soberania daquelas populações.
Longe dos holofotes mediáticos, as Ilhas Salomão, um pequeno arquipélago da Oceânia, a leste da Papua Nova Guiné, sob domínio inglês até ao final dos anos 70, são a mais recente vítima da hipocrisia norte-americana.
Em causa está a assinatura de um tratado de defesa entre esta nação de pouco mais de meio milhão de habitantes e a República Popular da China. Não se conhece, detalhadamente, o conteúdo do acordo mas, segundo declarações do presidente salomónico, este permitirá a entrada de forças militares chineses em caso de desastres naturais e agitação social.
Medo de base militar chinesa na região lança o pânico entre os EUA e aliados
«Os Estados Unidos respeitam o direito das nações a tomar decisões soberanas nos melhores interesses dos seus povos». A menos que essas decisões não estejam alinhadas com os seus designios geo-estratégicos, nesse caso, «os EUA teriam sérias reservas e seriam forçados a agir em conformidade».
Foi esta a súbtil ameaça que os sub-secretários de estado responsáveis pelas relações com o leste asiático e pacífico fizeram, após uma visita à ilha na última semana. O primeiro-ministro australiano, o conservador Scott Morrison, teve reacção semelhante: uma base militar chinesa na ilha seria uma «linha vermelha» para os EUA e a Austrália, «não a vamos aceitar na nossa região e na nossa soleira».
Num jogo sem regras
Coincidência ou não, os argumentos usados (neste caso pelos Estados Unidos, a Austrália e a Nova Zelândia), são praticamente idênticos aos invocados pela Rússia no que toca à expansão da NATO para o leste europeu e, mais recentemente, à adesão da Ucrânia a esse bloco político-militar.
Esta situação põe a nu a hipócrita posição dos EUA no que toca à guerra na Ucrânia: nunca esteve em causa a defesa do direito do povo ucraniano a decidir, ou definir, as suas alianças, apenas o interesse geo-estratégico de fragilizar a posição da Rússia, sacrificando, como se veio a comprovar, milhares de pessoas para cumprir os seus desígnios.
Algo que ficou patente depois da intervenção militar russa: ao contrário do que era proclamado publicamente, nunca esteve programada a entrada da Ucrânia na NATO. A rétorica apenas serviu para escalar o conflito com a Rússia, também ela interressada em defender as suas elites, detentoras dos grandes grupos económicos, interessadas na guerra.
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