O Projecto de Lei (PL) 2.963/2019, aprovado pelo Senado na passada terça-feira e que segue para debate e votação na Câmara dos Deputados, permite a compra, por pessoas físicas ou jurídicas estrangeiras, de um quarto do território dos municípios brasileiros.
«Uma área equivalente a duas vezes a região Sudeste do Brasil, ou 2,12 milhões de quilómetros quadrados, ficará disponível para a compra por estrangeiros», sublinha o Brasil de Fato.
A mesma fonte explica que a legislação actual, de 1971, só permite a aquisição de terras a estrangeiros residentes no Brasil, empresas já autorizadas a funcionar no país ou empresas brasileiras cuja maioria do capital social pertença a estrangeiros.
A proposta agora aprovada no Senado baixa a fasquia das exigências, contemplando pessoas físicas e empresas estabelecidas fora do território brasileiro e mesmo sem sede no Brasil. O aval para negociação caberá ao Conselho de Defesa Nacional.
Antes da votação, o Partido dos Trabalhadores (PT) ainda apresentou uma proposta para retirar o projecto da agenda, mas esta foi rejeitada por 35 votos contra 20.
«Somos o maior produtor de grãos do mundo, mas nós estamos vivendo inflação, picos inflacionários por falta de determinados produtos, em função da ocupação da terra somente para a produção de commodity. Imagine se a gente entregar 25% do nosso território para estrangeiros?», questionou o senador Rogério Carvalho (do PT de Sergipe). «Nem estou falando da questão da soberania, que é outro debate. Eu estou falando de ter comida na mesa, da capacidade de fazermos da terra um instrumento de distribuição de riqueza neste país», frisou.
Agronegócio, aumento dos custos de produção, ameaça à segurança alimentar
Entidades ligadas ao agronegócio – o autor da proposta é o senador Irajá Abreu (do Partido Social Democrático), que integra a chamada bancada ruralista – referem que a abertura deste mercado poderá gerar receitas que rondam os oito mil milhões de euros.
«Investimentos estrangeiros significam aumento da demanda por terra e tendem a puxar os preços das terras para cima. Isto tornará a produção mais cara, afinal a terra é um componente importante dos custos de produção», disse Sérgio Sauer, professor da Universidade de Brasília e investigador de temas ligados à reforma agrária, terra e território, numa entrevista ao Brasil de Fato na altura da apresentação do projecto, em Setembro de 2019.
Por seu lado, Alexandre Conceição, da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), alertou para os riscos que a liberalização traz não só para a soberania, mas também para a segurança alimentar dos brasileiros.
«Temos 100 milhões de hectares de terras agricultáveis e 4,5 milhões de sem-terra. Portanto, não [é preciso] devastar, não [é preciso] pôr fogo na Amazónia: basta distribuir a área [pelos] sem-terra para a gente produzir alimentos saudáveis, protegendo a natureza, dentro da agroecologia», disse.
«O programa do governo actual é desfazer tudo o que a Constituição de 1988 fez, que é garantir a função social da propriedade da terra e a soberania nacional», denunciou.
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