De acordo com os dados divulgados pela Comissão Pastoral da Terra, no período entre Janeiro e Agosto deste ano registou-se um aumento nos índices de violência e assassinatos em conflitos no campo.
Questionado pelo Brasil de Fato sobre as eventuais questões que influenciaram este aumento, Alexandre Conceição, da direcção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), afirmou que «a luta pela terra sempre acarreta violência».
«Primeiro, a violência do latifúndio, da concentração de terras, e, com o governo fascista e ultra-neoliberal do Jair Bolsonaro, essa violência aumentou muito mais. Porquê? Porque trouxe para o Palácio do Planalto e para as instituições do Estado brasileiro as milícias e o latifúndio atrasado e escravocrata, que gera a violência do campo», explicou.
«o governo de Bolsonaro "é um governo de conflito com aqueles que sempre defenderam a natureza, a reforma agrária e a democracia"»
Sobre aquilo que mudou, Conceição destacou a destruição das políticas públicas e do programa de reforma agrária, «garantido na nossa Constituição», bem como de outros programas públicos relativos à comercialização e produção de alimentos, ou de «subsídios para que a agricultura familiar siga produzindo alimentos».
«O governo destruiu isso e, ao mesmo tempo, abriu as portas para que a grilagem de terra, através do latifúndio, aumentasse ainda mais», sublinhando que o governo de Bolsonaro «é um governo de conflito com aqueles que sempre defenderam a natureza, a reforma agrária e a democracia».
No que respeita aos grandes confrontos que a luta dos camponeses manteve em 2021, o dirigente do MST apontou «três grandes inimigos»: o latifúndio, que «não produz alimentos e está devastando a natureza»; o governo, com uma política de devastação da Amazónia e de expansão da fronteira agrícola para a produção de commodities; o Congresso Nacional, por destruir o orçamento das políticas públicas para a reforma agrária e a agricultura familiar.
No entanto, mesmo num contexto de pandemia – «que nos fez segurar um pouco mais as lutas políticas» –, Alexandre Conceição afirmou com clareza que os camponeses venceram «esses ataques frontais em 2021». «O governo quis nos atacar, mas nós vencemos. Nós não perdemos nenhum assentamento e nenhum acampamento. Conseguimos produzir alimentos e distribuir mais de 5 mil toneladas de alimentos para o povo brasileiro», sublinhou.
«O governo quis nos atacar, mas nós vencemos. Nós não perdemos nenhum assentamento e nenhum acampamento.»
Outro elemento destacado foi a produção de mais alimentos saudáveis, também para combater aquilo que o MST já vinha a alertar desde 2015, que a fome voltaria ao Brasil «por conta da inflação e por conta da política neoliberal adoptada pelo governo Temer e de Bolsonaro».
«Nesse sentido – disse – produzimos alimentos para nos abastecer, nos alimentar e, ao mesmo tempo, atender as milhões de famílias que hoje passam fome. São mais de quinze milhões de pessoas que acordam e não tem o que comer», sublinhando o papel solidário da reforma agrária popular, que tem em curso a campanha «Natal Sem Fome».
Trata-se de uma campanha nacional do Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra que visa ajudar «milhões de trabalhadores» que perderam empregos, casas, familiares, «e não têm o que comer», explicou.
Questionado sobre o papel dos movimentos populares do campo na defesa da soberania alimentar, Alexandre Conceição afirmou que esta é o oposto do que o governo de Bolsonaro tem feito.
«Soberania significa a gente ter acesso à terra e ter direito de escolher o que produzir, como produzir e como se alimentar», frisou, acrescentando que a soberania alimentar passa também «pela distribuição da terra, pelo cuidado com a natureza e, ao mesmo, a produção de alimentos saudáveis, para que a gente tenha uma agricultura familiar pujante no Brasil», que «produz 70% de todos os alimentos que vão para a mesa dos brasileiros».
«Estamos indo na contramão do governo e o governo está indo na contramão do povo brasileiro», disse.
No que respeita às perspectivas para 2022, o dirigente do MST disse que o movimento tem pela frente «grandes tarefas», sendo uma das principais «recuperar a nossa democracia, que nos foi roubada no golpe da presidente Dilma».
«Estamos indo na contramão do governo e o governo está indo na contramão do povo brasileiro»
Nesse sentido, indicou que o MST quer organizar uma «ampla campanha, massiva, popular», para discutir um projecto e um programa de emergência «para tirar o Brasil do atraso, do fascismo, da fome e da miséria em que nos encontramos». E isso passa pela eleição de Lula da Silva para presidente da República.
Outra tarefa – a que o MST vai dar continuidade – é da organização do povo, «ocupando o latifúndio, construindo e debatendo com a sociedade a reforma agrária popular».
«Porque a reforma agrária popular é justamente isso: precisamos da terra para que a terra dê a resposta de alimentação, emprego e rendimento para a sociedade brasileira», afirmou.
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