Jean Charles exige a demissão do primeiro-ministro haitiano, Ariel Henry, que acusa de alta traição, e prevê uma «maré humana» nas ruas da capital, Porto Príncipe, em resposta ao governo, ao sector privado e ao Ocidente, que defendem uma nova intervenção o Haiti, disse o ex-senador à imprensa.
«O destacamento de uma força militar estrangeira no país solicitado pelo governo de Ariel Henry é para proteger os interesses dos capitalistas e dos colonos. Não somos o pátio das traseiras dos Estados Unidos», afirmou Moïse Jean Charles à plataforma Gazette Haïti, citado pela Prensa Latina.
No passado dia 6 de Outubro, o Conselho de Ministros deu luz verde a Henry para pedir ajuda militar estrangeira, com o destacamento de tropas especializadas capazes de fazer frente aos grupos criminosos armados que têm bloqueado a distribuição de combustível e de recuperar o controlo de esquadras, portos e aeroportos no país antilhano.
Alguns dias depois, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, pediu o envio «sem demora» de forças internacionais para o Haiti, face ao agravamento da situação de insegurança e para ajudar o país caribenho, que enfrenta «imensos problemas humanitários».
O pedido deve ser analisado formalmente esta semana, no Conselho de Segurança da ONU, havendo a possibilidade de que Rússia e China bloqueiem o envio de tropas para o Haiti. No entanto, tanto os EUA como o Canadá já confirmaram o envio de viaturas blindadas e outros equipamentos.
Grande parte da população e membros do Senado não viram com bons olhos o pedido de ajuda formulado por Henry e exigiram que fosse retirado. Os protestos têm-se sucedido nas ruas.
No passado dia 12, a Comunidade das Caraíbas (Caricom) ofereceu-se como mediadora para um diálogo entre as partes em conflito no Haiti, instando-as a reunir-se com urgência «neste momento crítico da história do país, para pôr fim ao impasse político».
Com esse «impasse», têm-se repetido as notícias de mortes por cólera, de incapacidade de funcionamento dos hospitais, de fome a atingir «níveis catastróficos», de assassinatos e violações.
A solução para os problemas não passa pela intervenção externa
Para Moïse Jean Charles, o pedido do governo tem «carácter ilegítimo». Por essa razão, várias organizações têm estado a dinamizar, desde segunda-feira passada, mobilizações diárias contra a crise política, o nível crescente de violência e o pedido de intervenção estrangeira por parte do governo de Ariel Henry.
Com o lema «Abaixo Ariel Henry, abaixo a ocupação», os organizadores reafirmam o direito a uma vida mais digna, sem violência e sem «invasões». Prevê-se que as mobilizações continuem até meados de Novembro, referiu Jean Charles.
Entre outros aspectos, os oponentes à intervenção externa lembram que a Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (Minustah) foi criada em 2004, tendo como objectivo propalado pôr fim à crise política no país. No entanto, cinco anos depois do fim da missão, em 2017, o Haiti vive um cenário pior, criticam os defensores da soberania nacional.
As tropas estrangeiras são acusadas, nomeadamente, de terem contribuído para espalhar a cólera no Haiti, participado em massacres e cometido violações e outros abusos sexuais nos bairros pobres.
O pedido de intervenção é «escandaloso»
Camille Chalmers, analista político e economista, disse à Prensa Latina que o pedido de intervenção externa para lidar com grupos criminosos é «escandaloso».
Chalmers, também dirigente da Plataforma Haitiana para o Desenvolvimento Alternativo, afirma que se assiste actualmente à construção da opinião pública para justificar uma intervenção militar, inclusive com a utilização dos grupos criminosos que fazem parte do sistema.
«Criar uma situação caótica, insustentável, de crise humanitária, é um elemento para justificar a intervenção militar que querem fazer no Haiti, de modo a garantir o controlo absoluto do sistema político e descartar qualquer possibilidade de um projecto popular, de um projecto das classes populares, bem como a ligação possível a Cuba ou à Venezuela», disse Chalmers.
O economista lembra que, durante a formação da Polícia sob o mandato da Minustah, especialistas afirmaram que o tipo de armamento não era adequado nem suficiente.
«É uma incapacidade construída, mantida e reproduzida para justificar a dominação e a intervenção e, nesse sentido, foram amplamente demonstradas as ligações que existem entre os grupos criminosos armados e o poder executivo», frisou.
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