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|crimes de guerra

Morreu Henry Kissinger, o mais estimado criminoso de guerra norte-americano

Obama agradeceu-lhe o exemplo de «liderança» e George W. Bush evocou uma das «mais fiáveis e distintas» personalidades dos EUA, «um amigo» para Hillary Clinton. Kissinger morreu sem responder pelos seus inúmeros crimes.

Henry Kissinger, secretário de Estados EUA, cumprimenta o ditador Augusto Pinochet, durante visita ao Chile realizada em 1976
Augusto Pinochet, o ditador chileno, cumprimenta Henry Kissinger. O ex-Secretário de Estado norte-americano esteve directamente envolvido nas preparações para o golpe de estado contra o Governo democraticamente eleito de Salvador Allende, garantindo um continuado apoio dos EUA ao regime fascista que matou milhares e torturou mais de 40 mil pessoas. Créditos / Ministerio de Relaciones Exteriores de Chile

Entre 1965 e 1973, os Estados Unidos da América largaram 2 756 941 toneladas de explosivos no Cambodja, uma campanha de terror que causou a morte a centenas de milhares de civis, com estimativas a chegar às 600 mil vítimas, para além de dois milhões de refugiados. Mais de 10% dos ataques norte-americanos foram indiscriminados, semeando a morte pelo país. A escala deste ataque contra a população civil não tinha, na altura, precedentes (em toda a II.ª Guerra Mundial, os Aliados, no seu conjunto, usaram pouco mais de 2 milhões de toneladas).

O esquema foi conduzido directamente pela Casa Branca: primeiro por Lyndon Johnson, depois por Richard Nixon e o seu falcão, Henry Kissinger. Frustrado com a humilhante derrota no Vietname, Nixon exigiu o intensificar do ataque contra o país do sudeste asiático e Kissinger foi rápido a convocar «uma campanha de bombardeamento massivo no Cambodja. Largar tudo o que voa sobre tudo o que se mova», ordem que ficou registada em escutas.

É apenas um dos inúmeros crimes de guerra, crimes cometidos contra a humanidade, perpretados por Kissinger, uma figura sinistra que determinou a praxis norte-americana a nível internacional na segunda metade do século XX.

Foi através da pressão de Kissinger que os EUA começaram a trabalhar no golpe militar contra o presidente democraticamente eleito no Chile, Salvador Allende. Depois da instituição da ditadura fascista de Pinochet, Kissinger deixou, em 1976, garantias ao ditador: «Queremos ajudar, não prejudicar-vos. Prestaram um grande serviço ao Ocidente ao derrubarem o Allende».

Documentos desclassificados em 2004 mostram Henry Kissinger a assegurar à ditadura argentina (de Videla) de que os EUA não causariam «dificuldades desnecessárias». Quando Kissinger diz a Cesar Augusto Guzzetti, ministro dos Negócios Estrangeiros argentino, «se conseguirem acabar antes de o Congresso regressar aos trabalhos, melhor», o diplomata norte-americano referia-se ao assassinato de opositores políticos (pelo menos 30 mil foram mortos pela ditadura de Videla).

Em 1988, poucos meses depois do início da primeira Intifada na Palestina, uma conversa privada de Henry Kissinger com um grupo de representantes de organizações judaicas nos EUA foi divulgada pelo New York Times. Nela, o antigo Secretário de Estado das administrações de Nixon e Gerald R. Ford defendia que Israel «devia impedir a entrada de câmaras de televisão e repórteres nos territórios ocupados, no âmbito dos seus esforços para reprimir os protestos violentos», dando o exemplo do regime de Apartheid da Rodésia, África do Sul.

Suharto, ditador indonésio instalado pelos Estados Unidos e Inglaterra em 1965 (entre 500 000 e um milhão de comunistas e simpatizantes foram assassinados nesse período) recebeu a «luz verde» de Ford e Kissinger em 1975. Era o sinal esperado por Suharto, que avançou com a ocupação militar de Timor-Leste. Até 200 000 pessoas (de uma população de menos de 900 000) foram mortas nesse ataque sancionado pela administração norte-americana.

O processo revolucionário português, que acabou com 48 anos de uma sangrenta ditadura fascista, também não lhe escapou. Numa reunião na Casa Branca a 27 de Março de 1975, Kissinger afirma que «os europeus estabeleceram dois objectivos [quanto a Portugal]: a realização de eleições e evitar a tomada do poder pelos comunistas. Acho que podemos conseguir esses dois objectivos e, mesmo assim, "perder" o país porque os comunistas "governam" através do MFA. O que vamos fazer se este tipo de Governo quiser manter o país na NATO? Quais os efeitos disso em Itália? E em França? Provavelmente, temos que atacar Portugal, qualquer que seja o resultado, e expulsá-lo da NATO».

Por muito caricato que possa parecer, Henry Kissinger recebeu o Prémio Nobel da Paz em 1973, pela negociação de um cessar-fogo no Vietname, um prémio dividio a meias com Le Duc Tho, dirigente comunista vietnamita. Duc Tho rejeitou ser distinguido (um caso, quase, único; apenas Sartre também rejeitou um Nobel) ao lado de um criminoso de guerra.

Um dia de luto para [todo] o poder político e económico dos Estados Unidos da América

Há momentos que unem. No dia da morte de Henry Kissinger, republicanos e democratas unem-se nos elogios ao diplomata. Afinal de contas, trata-se de um dos maiores heróis do poder político, o criminoso de guerra que formou todos os criminosos de guerra que se lhe seguiram.

«Tanto a Laura e eu [George W. Bush] sentiremos a falta da sua sabedoria, do seu charme e do seu humor. Estaremos sempre gratos pelas contribuições de Henry Kissinger», afirmou o antigo presidente norte-americano, responsável pela criminosa invasão do Iraque, sustentada numa mentira.

Hillary Clinton, por seu lado, sempre considerou Henry Kissinger «um seu amigo», assumindo que se aconselhou com um homem responsável pela morte de milhões de pessoas em todo o mundo quando foi Secretária de Estado entre 2009 e 2013: [Kissinger] «mantinha-se regularmente em contacto comigo, partilhando observações astutas sobre líderes estrangeiros e enviando-me relatórios escritos sobre as suas viagens». Durante as eleições presidenciais de 2016, Clinton, Donald Trump e Mitt Romney encontraram-se com Kissinger.

Nesse mesmo ano, 2016, a administração liderada por Barack Obama homenageou Henry Kissinger publicamente. A estima de Obama pelo criminoso de guerra não é chocante, mesmo se não considerarmos o facto de o ex-presidente ter aprovado mais de 542 ataques com drones, matando 3797 pessoas, incluindo civis, durante o seu mandato.

Numa entrevista dada por Kissinger em 2014, ao USA Today, o antigo diplomata aparece sentado ao lado de duas fotos autografadas. Nixon expressou o seu «profundo apreço» pelo trabalho sanguinário de Kissinger. Obama, na mensagem que dedicou a Kissinger, expressou o seu apreço pelo exemplo de «liderança continuada».

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